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Antropologia Filosófica

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R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
17 
 
 
 
AA VVIIDDAA HHUUMMAANNAA 
 
 I. Visão histórica 
 1. O mecanicismo 
 2. O vitalismo 
 
 II. Elementos constitutivos do ser vivo 
 1. Significado pré-filosófico da vida 
 2. A vida como ação imanente auto-aperfeiçoante 
 a) A nutrição 
 b) O crescimento 
 c) A reprodução 
 
 III. O princípio vital e os graus da vida 
 1. Natureza do princípio vital: a forma substancial 
 2. Os graus da vida 
 3. A vida psíquica 
 4. Características da vida psíquica enquanto psíquica 
 a) Intencionalidade da vida psíquica 
 b) Consciência da vida psíquica 
 
 IV. Origem da vida 
 1. A geração espontânea da vida 
 2. A vida foi criada por um ser superior: Deus 
 
 
 
 
 
 
 
É evidente que o homem, em sua totalidade, é e permanece um ser vivo, e que, 
enquanto tal, acha-se submetido às leis do orgânico, de maneira que o comportamento do 
homem depende do ponto de vista biológico, da conservação da vida: é humano enquanto 
vive. 
Se o fenômeno da vida é um dado certo, seu significado não é tão óbvio, dado que 
abraça uma gama muito vasta de seres com características muito diferentes entre si; por 
exemplo, da flor que não fala e está quieta em um vaso, dizemos que vive; do cervo berra e 
corre pelos bosques dizemos que vive: o que é, portanto, a vida? 
 
 
 
 
 
 
I. VISÃO HISTÓRICA: MECANICISMO E VITALISMO 
 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
18 
 A pergunta sobre o que é a vida é tão antiga como o estudo da natureza. Os estudiosos 
em todo tempo se dividiram em duas categorias opostas: mecanicistas e vitalistas. 
 
1. O mecanicismo 
 O mecanicismo reduz o ente vivo a um agregado de substâncias que atuam uma sobre 
a outra com uma complexa atividade físico-química; e dado que o mecanicismo reduz as 
atividades físico-químicas a ações mecânicas (movimento local) esta teoria, que nega a 
diferença específica entre ser vivo e ser inanimado, chama-se mecanicismo; não seria outra 
coisa que uma máquina mais perfeita1, redutível e divisível em seus elementos. Entre seres 
vivos e não animados não existiriam diferenças essenciais ou qualitativas, mas somente 
diferenças acidentais ou de quantidade. O fenômeno da vida não teria nada de 
verdadeiramente novo, com respeito ao físico-químico, salvo uma maior complexidade. 
 Além de uma certa concepção filosófica, esta teoria está apoiada por diversos motivos 
que podemos sintetizar principalmente em dois: 
1) A química orgânica conseguiu fabricar sinteticamente certas substâncias que se 
acreditava que só os seres vivos poderiam elaborar; 
2) Descobriu-se que também nos seres vivos, como nos corpos não animados, acontecem 
mudanças e transformações de energia; portanto, pensa-se que os futuros progressos da 
química orgânica permitirão fabricar artificialmente a vida, e que as assim chamadas 
atividades vitais não seriam outra coisa que processos físico-químicos muito complexos. 
Podem considerar-se mecanicistas, Demócrito e Leucipo, fundadores do materialismo 
atomístico; Descartes com sua analogia entre organismo e máquina; os materialistas em geral, 
que negam qualquer diferença essencial entre ser vivo e não animados por motivos diversos: 
preconceitos anti-religiosos, cientismo. 
 
2. O vitalismo 
 O vitalismo sustenta a existência de uma diferença essencial entre o ser vivo e o 
inanimado, e admite no ente vivo um princípio vital. Consideram-se vitalistas: Aristóteles, 
Santo Tomás de Aquino, os escolásticos e neo-escolásticos, e alguns dos cientistas mais 
ilustres: Pasteur, Lamarck, Driesch2. 
 
 
II. ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO SER VIVO 
 
 O termo vida expressa um conceito abstrato formal tirado do verbo viver. Viver é o 
conjunto dos atos que caracterizam aos seres vivos; o que existe na realidade não é a vida, 
mas os seres vivos que realizam os assim chamados atos vitais. Distinguimos, portanto, o 
nível do ser, do nível do fazer. No plano do fazer temos o viver, quer dizer as atividades que o 
ser vivo realiza. Quais são as atividades exclusivas ser vivo? 
 
1. Significado pré-filosófico da vida 
 
1 R. Descarte, Traité de l'homme, cap. XVIII, no Oeuvres, a cargo de Adam e Tannery [A.T.], Paris, Vol. XI, 
p. 119-120; Les passions de l'âme, art. III, A.T., vol. XI, p. 329. 
2 H. Driesch, Der Vitalismus als Geschichte und als Lehre, Leipzig 1906. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
19 
 Para formarmos um conceito do ser vivo partamos de uma fenomenologia da vida 
mesma e depois procuremos um aprofundar filosófico do conceito obtido. O que é a vida de 
um ponto de vista não científico? Se formularmos a pergunta em geral, o sentido comum do 
homem responde: “vive aquilo que se move”. Se durante uma excursão à montanha 
encontramos uma serpente que se apresenta ameaçadora diante de nós, dizemos: cuidado, uma 
serpente! Se depois, com paus e pedras a deixamos fora de combate, dizemos: está morta. 
Quando a serpente se movia ameaçadora dizíamos: está viva; quando já não se move, dizemos 
que está morta. Portanto, a vida está no movimento e um primeiro conceito de vida é a 
capacidade de mover-se. 
 Surge em seguida uma dupla dificuldade; se entendermos o movimento só no sentido 
de movimento local, devemos dizer que a pedra que cai está viva porque se move de um lugar 
a outro, enquanto a flor que está em um vaso não vive porque está sempre ali e não se move; 
mas nada nos autoriza a restringir assim o significado de movimento; por outra parte, nós 
distinguimos o movimento da pedra e o movimento da serpente: o ser vivo se move, a pedra 
não se move, mas sim é movida. A vida está, portanto, no movimento imanente. 
 
2. A vida como ação imanente auto-aperfeiçoante 
 Aprofundando filosoficamente esta primeira aproximação ao conceito de vida, 
podemos chamar ser vivo àquele ser que é capaz de um movimento imanente auto-
aperfeiçoante. O movimento, como já o definiu Aristóteles, não é só o movimento local, mas 
também, “o ato do ente em potência enquanto em potência” 3. Por ser vivo entendemos então 
um ser capaz de fazer-se passar a si mesmo da potência ao ato. Mover-se a si mesmo significa 
exercitar uma ação que termina no sujeito agente, e se chama ação imanente; contrapõe-se à 
ação transitiva que termina em um objeto distinto do sujeito agente; a ação imanente no ser 
vivo é uma ação que enriquece e que aperfeiçoa ao mesmo sujeito agente, e temos assim uma 
ação imanente auto-aperfeiçoante4. 
 Elemento constitutivo do ser vivo é, portanto, a ação imanente, que não é só uma 
diferença de grau de maior ou menor complexidade, mas sim uma característica essencial, 
uma diferença irredutível, um salto qualitativo. O ser vivo realiza atividades imanentes auto-
aperfeiçoantes essencialmente diversas daquelas dos não animados e irredutíveis a elas. Trata-
se de resolver o problema de se existe uma diferença essencial ou qualitativa entre ser vivo e o 
inanimado. O problema resolveria facilmente se si pudesse conhecer diretamente a essência 
das coisas. Entretanto, a essência dos seres escapa ao nosso conhecimento imediato. Nós 
conhecemos a essência das coisas indiretamente, mediante o conhecimento de suas 
propriedades. Dado que a natureza ou essência de um ser é a causa pela qual esse ser tem 
essas propriedades em vez de outras, o critério para estabelecer uma diferença essencial entre 
dois seres será estudar suas propriedades ou manifestações essenciais. Pois os efeitos estão 
proporcionadosàs causas. 
 Ora, se todas as propriedades de um ser são reduzíveis às propriedades de outro ser, e 
entre as propriedades de um e outro há só uma diferença quantitativa, evidentemente, os dois 
seres não diferem essencialmente, mas somente de modo acidental. Por exemplo, o gelo, a 
água e o vapor de água, não diferem essencialmente porque as propriedades que os 
 
3 Aristóteles, Phys., III, 1, 201a 10; Phys., III, 2, 202a 8. 
4 Poderia-se objetar que este é um conceito contraditório, porque omne quod movetur ab alio movetur. Este 
princípio diz que uma coisa não pode estar em movimento e mover sob o mesmo aspecto e com respeito ao 
mesmo término, mas não impede que o mesmo sujeito esteja segundo um aspecto em ato e segundo outro 
aspecto em potência. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
20 
distinguem são entre elas reduzíveis. Mas se as propriedades de um ser se revelam realmente 
irredutíveis às propriedades de outro ser, portanto entre elas não se trata de um mais ou um 
menos, mas sim de uma total diferença e de um comportamento novo, conclui-se que entre os 
dois seres há uma diferença qualitativa e essencial, não somente quantitativa; os dois seres são 
essencialmente diversos. 
 Portanto, o problema da natureza da vida se resolve estabelecendo se existem 
realmente nos seres vivos propriedades ou manifestações irredutíveis as físico-químicas5. 
Posto que o problema concerne à diferença entre o ser vivo (qualquer que este seja) e o não 
animado, é necessário considerar as atividades comuns a todos os seres vivos. O número de 
atividades imanentes e o grau de auto-aperfeiçoamento aumentam ou diminuem na medida 
em que o ser vivo é mais ou menos perfeito, mais todavia, são estas as que constituem uma 
maior ou menor perfeição. Há, entretanto, um número mínimo de atividades imanentes auto-
aperfeiçoantes que todo ser vivo, por ser tal, as tem, a saber: nutrição, crescimento e a 
reprodução6. 
a) A nutrição 
 A nutrição é uma atividade que nos seres inorgânicos não se dá nem sequer de modo 
rudimentar; nestes se pode dar justaposição, mas não nutrição, pois esta consiste em uma 
contínua mudança de matéria ou metabolismo vital pelo qual o organismo escolhe substâncias 
químicas que lhe são convenientes e as converte em substância própria (anabolismo ou 
assimilação) e elimina as que não lhe convêm (catabolismo). A nutrição supõe, é verdade, 
ações transitivas, pois decompõe e transforma as substâncias que deve assimilar, mas não 
consiste propriamente nestas ações que o ser vivo exercita sobre outras substâncias, mas no 
apropriar-se da substância assimilada e, logo, no conservar-se, aperfeiçoar-se e enriquecer-se 
a si mesmo. O fenômeno da nutrição é, portanto, uma atividade imanente e auto-
aperfeiçoante; sua novidade, com respeito às atividades físico-químicas, não consiste na maior 
complexidade dos fenômenos físico-químicos, mas na organização destes que a constituem, 
precisamente, diversa e superior não somente quantitativa, mas qualitativa e essencialmente. 
b) O crescimento 
 O crescimento e o desenvolvimento são fenômenos típicos dos seres vivos. Assumindo 
a matéria do ambiente circundante e reorganizando-a segundo as estruturas próprias, o ser 
vivo, de uma só célula inicial, chega a milhões de células com um entrelaçamento 
extremamente complexo de atividades. O crescimento e o desenvolvimento do ser vivo não é 
de maneira nenhuma só quantitativo; é uma construção não por simples ampliação ou 
justaposição de matéria, mas sim por epigénese ou evolução interna para formas não presentes 
no embrião, a não ser em potência. O desenvolvimento manifesta algumas características que 
o diferenciam essencialmente das atividades e transformações do inanimado, pois o 
desenvolvimento comporta uma diferenciação crescente, regulável, em estádios sucessivos e 
irreversíveis. 
 
5 P. Grassé, L'évolution du vivant, Albin Michel, Paris 1973, p. 13: “Afirmar que os seres vivos estão 
constituídos pelos mesmos elementos que compõem os corpos inertes e que são sede dos fenômenos químicos e 
físicos que encontramos nestes últimos é, no fundo, algo de uma imensa banalidade e sem grande significado. 
“Como imaginar que os seres vivos possuam outra composição do momento em que existe uma só e única 
matéria multiforme? (...) Uma das diferenças radicais que opõem o fenômeno físico ao fenômeno biológico se 
funda na coerção absoluta do primeiro a obedecer as leis da matéria. (...) Mas o ser vivo não sofre a lei física sem 
reagir. Pode em diversas medida evitá-la”. 
6 Estas atividades estão bem ilustradas em um livro de 1946, mas que conserva ainda pleno valor: V. 
Marcozzi, La vita e l'uomo, Cea, Milano 1946, p. 12 ss. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
21 
 A diferenciação crescente se refere tanto às estruturas morfológicas como às funções 
fisiológicas: assim, no homem emergem células especializadas que formam tecidos que, por 
sua vez, combinam-se em órgãos diversos, e cada uma das partes assume funções próprias. 
Tal diferenciação leva a uma adaptação ao ambiente, cada vez mais autônoma: assim se passa 
do bebê que necessita os cuidados maternos ao adulto que é autônomo. 
 O crescimento do ser vivo se realiza em estágios sucessivos e irreversíveis, dos quais 
cada um pressupõe o precedente. De fato, o ser vivo pode deter-se em seu desenvolvimento, 
com risco de sua vida, mas nunca poderá retroceder e encontrar-se de novo num estado de 
desenvolvimento precedente, enquanto que as atividades físico-químicas são sempre 
reversíveis. Se tomarmos como exemplo o crescimento dos cristais, argumento que alguns 
usam para rebater o raciocínio precedente se verá a diferença com respeito ao crescimento do 
ser vivo. Por exemplo, nos cristais postos na água-mãe, o crescimento se deve ao feito de que 
as partículas se depositam sobre as caras do cristal mesmo e sem reação química; os cristais, 
portanto, crescem por aposição externa. No ser vivo, pelo contrário, o aumento acontece no 
interior do organismo. Nos cristais o fenômeno é reversível: colocados em uma solução não 
saturada, dissolvem-se, o que não acontece nos seres vivos. Portanto, também o crescimento e 
o desenvolvimento seguem leis diversas e opostas às do não animado, e isto mostra que entre 
seres animados e inanimados há uma diferença qualitativa. 
c) A reprodução 
 A reprodução consiste na capacidade da parte de um organismo de dar origem a outros 
organismos. Santo Tomás define a geração como “origo alicuius viventis a principio vivente 
conjunto” 7. Todas as formas de reprodução mostram duas características: 
1) A reprodução se realiza para conservar a espécie; 
2) O impulso a se reproduzir parte do interior do organismo. Há, portanto, na reprodução 
um duplo aspecto: finalista e imanente. Estes dois aspectos não se encontram nos 
fenômenos do mundo não animados semelhantes à reprodução. Por exemplo, a formação 
de cristais de forma e natureza iguais ao cristal que os origina, ou a produção de 
substância semelhante à própria por parte de alguns compostos químicos, não é 
reprodução porque falta o impulso interno, quer dizer, o caráter imanente; trata-se em 
ambos os casos de uma reação química reversível. Na reprodução, é verdade, o último 
estágio dá origem a uma atividade transitiva: produzir outro ser diverso do agente, mas 
em si mesmo é uma ação imanente porque o ser vivo prepara em si mesmo certas 
substâncias que depois darão origem ao novo ser. Portanto, também a reprodução 
obedece a leis diversas daquelas do não animados e é uma atividade irredutívelsomente 
aos componentes físico-químicos. 
 Podemos, portanto, concluir que a vida é um fenômeno essencialmente diverso e 
qualitativamente superior aos fenômenos físico-químicos. No decurso da história houve 
numerosos intentos de reproduzir artificialmente a vida; estes intentos se estiverem feitos com 
seriedade, são úteis ao menos porque evidenciam principalmente o diferente comportamento 
existente entre o mundo vivo e o não animado e, em segundo lugar, contribuem a aprofundar 
o conhecimento do aspecto físico-químico dos fenômenos vitais. Todo aspecto da vida 
vegetativa e sensitiva, usando uma expressão do Maritain, é “materialmente físico-químico, e 
formalmente vital”. Sob o aspecto material, os fenômenos da vida sensível se desenvolvem 
mediante reações químicas e físicas, mas, formalmente considerados, mostram um 
comportamento diverso. As leis que subjazem não são já as físico-químicas, senão leis novas. 
 
7 Cf. Tomás de Aquino, Summ. Theol., I, q. 27, a. 2. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
22 
Este comportamento novo exige, pelo princípio de causalidade, uma explicação adequada. O 
mecanicismo, reduzindo todos os fenômenos vitais a simples fenômenos físico-químicos, 
renuncia a uma explicação racional do comportamento novo e essencialmente diverso dos 
seres vivos e dos não animados. O vitalismo dá razão deste diversos comportamentos entre 
seres orgânicos e inorgânicos. 
 
 
III. O PRINCÍPIO VITAL E OS GRAUS DA VIDA 
 
 Vimos que as atividades imanentes até aqui explicadas requerem a existência de um 
princípio vital que lhes dê inteligibilidade; resolveu-se assim o problema do an sit, da 
existência do princípio vital. Necessitamos agora esclarecer qual é sua natureza, o quid sit. 
Tratando-se, portanto de um problema metafísico não nos surpreende que alguns biólogos que 
aceitam a existência do princípio vital não estejam de acordo no referente à sua natureza. 
 
1. Natureza do princípio vital: a forma substancial 
 Uma definição poderia ser a seguinte: o princípio vital é a forma substancial do ser 
vivo, superior ao dos inanimados, chamado usualmente alma. “Princípio da vida nos seres 
vivos -diz Santo Tomás- é a alma: de fato chamamos animados aos seres vivos e inanimados 
aos privados da vida”8. O princípio vital não é uma atividade vital como as outras, mas a 
forma substancial do ser vivo, e como tal, é o primeiro princípio de toda atividade. A forma 
substancial é uma substância, não um acidente, porque é um constitutivo essencial do ser 
vivo. Uma substância, entretanto, incompleta: não é ela mesma, mas sim o princípio pelo qual 
o composto é (ens quo), destinada a unir-se com a matéria para formar com ela uma só 
substância completa: o composto ser vivo (ens quod). 
 A alma concebida como forma substancial é aquilo pelo qual o corpo vivente é o que 
é; portanto, não tem sentido perguntar-se como se unem a alma e o corpo do qual é forma, já 
que se não estivesse unida ao corpo, ela não seria o que é, ou seja, forma de, ato desse corpo. 
 Como primeiro princípio da vida, a alma é ato primeiro ou substancial9, que dá o ser 
“simpliciter”, e não ato segundo ou acidental, que dá o ser “secundum quid”. A este respeito 
afirma Aristóteles que o ato coloca-se de dois modos: ao modo da ciência ou ao modo da 
atividade pensante. Enquanto que de fato o ato da ciência existe em nós também quando 
dormimos, o ato da atividade pensante, não; por isso a atividade pensante pressupõe a ciência. 
A atividade pensante, portanto, é ato segundo em relação à ciência, e a ciência é ato primeiro. 
A alma é ato como é ato da ciência, ou seja, ato primeiro, porque o ser vivo a tem quando 
dorme, inclusive quando não exercita aparentemente atividades vitais. 
 A alma, como forma substancial, é por isso mesmo o primeiro princípio e o único 
princípio da vida, fonte última de toda atividade. Se o princípio vital é único em cada ser vivo, 
os princípios próximos da vida são tantos quantos são as atividades vitais que o ser vivo 
realiza; assim, o olho será princípio próximo da visão, etc. A alma é o princípio vital, mas 
como se dão atividades vitais tão profundamente diversas, parecem-nos apropriado distinguir 
três principais tipos de alma: vegetativa, sensitiva e intelectual. Elas dão origem aos três 
 
8 Tomás de Aquino, Summ. Theol., I, q. 75, a.1 
9 Aristóteles, De Anima, II, 1, 412a 27-28: “e`ntele,ceia h` prw,th sw,matoj fusikou/ 
duna,mei zwh.n e;contoj”. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
23 
grandes tipos de seres vivos. Traçamos esta divisão segundo o critério da autonomia do ser 
vivo10. 
 
2. Os graus da vida 
 Há tantos graus de vida como modos nos quais a operação imanente depende do ser 
vivo: 
 a) a operação depende só no que se refere à execução; 
 b) a operação depende tanto no que se refere à execução como à forma; 
 c) a operação depende no que se refere à execução, à forma e ao fim; 
 portanto, três são os graus da vida. 
 O ser vivo, como temos dito, é o ser capaz de um movimento imanente auto-
aperfeiçoante. E no movimento se podem considerar três elementos: o fim pelo qual alguém se 
move a forma ou a essência em virtude da qual atua, e a execução do movimento. Em virtude 
destes três elementos que definem o modo como a operação imanente depende do ser vivo, 
distinguem-se três graus de vida: a vida vegetativa, a vida sensitiva e a vida intelectual. Na 
vida vegetativa a operação depende do ser vivo só quanto à execução; na vida sensitiva 
depende tanto quanto à execução como à forma; e na vida intelectual depende quanto à 
execução, à forma e ao fim. 
 Chamamos vegetativos ao ser vivo que tem em si só a execução do movimento, 
enquanto que o fim pelo que opera e a forma em virtude da qual opera os dão outros. Assim, 
uma planta assimila, cresce... para um fim que não escolheu e atua uma forma que não se 
procurou por si mesmo, mas sim lhe vêm concedidos pela natureza. Ao contrário o animal, ou 
seja, o ser vivo que tem um certo conhecimento, não escolhe por si seu fim (por exemplo, 
dirige-se a sua presa movido pelo instinto), mas atua em virtude de uma forma: a da coisa 
conhecida (deve perceber de algum modo a presa para poder tender a ela); quer dizer, em 
virtude de uma forma que se procurou por si com outra atividade, a atividade cognitiva. Por 
último, o ser vivo intelectual, o homem, leva em si não só a execução e a forma, mas também 
o fim, assim que opera por um fim que se escolheu livremente. A característica do ser vivo em 
geral é, portanto a atividade imanente; a característica do ser vivo sensitivo é o conhecimento 
sensível; e a característica do ser vivo intelectual é a liberdade, fundada sobre o conhecimento 
intelectual. Temos descrito assim os três reinos dos seres vivos. 
 
3. A vida psíquica 
 Esta divisão dos seres vivos em três graus nos leva a outra distinção posterior dentro 
dela: a dos seres providos de vida fisiológica -como as plantas- e a dos seres que, além da vida 
fisiológica, possuem um certo grau de vida psíquica -como os animais e o homem-. A vida 
puramente fisiológica é a vida vegetativa. A vida psíquica tem dois níveis: um inferior 
dependente intrinsecamente do organismo, que é a vida sensitiva (cognitiva e apetitiva), e 
outro superior, intrinsecamente independente do organismo, que é a vida intelectual (cognitiva 
e volitiva). Os dois níveis produzem no sujeito uns estados sentimentais ou afetivos, que 
constituem a vida sentimental ou afetiva, tanto inferior como superior.10 Tomás de Aquino, Summ. Theol., I, q. 18, a. 3 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
24 
Explicadas as características da vida vegetativa, podemos resumir-las assim: 
a) A unidade: já que quem vive não são propriamente as partes, mas sim o todo por 
obra de suas partes. 
b) A imanência: dado que o princípio e o fim estão e permanecem no mesmo sujeito. 
c) A finalidade: porque todas as atividades estão ordenadas a um fim que é a 
conservação do indivíduo e da espécie. 
 A vida psíquica, enquanto vida goza também destas características porque há uma 
contínua aquisição, assimilação e produção de conhecimentos e tendências ordenadas à 
perfeição e conservação do sujeito. Mas a vida psíquica enquanto psíquica tem características 
próprias que não se encontram de fato na vida fisiológica. Efetivamente, em toda a vida 
psíquica tem sempre lugar, por uma parte, uma experiência graças ao qual o sujeito se dá 
conta de algum modo de estar em vida, quer dizer, da própria atividade vital; e por outro lado, 
ao mesmo tempo, dá-se conta de que por ela conhece um objeto ou se orienta para o que 
conheceu precedentemente, todo o qual determina no sujeito os estados sentimentais ou 
afetivos. Assim, a atividade psíquica se divide em dois grandes grupos: a atividade psíquica 
cognitiva e a atividade psíquica tendencial. A estas atividades vai sempre unido o aspecto 
sentimental ou afetivo da vida psíquica. 
 Na atividade cognitiva o objeto se apresenta ao sujeito que o conhece. Na atividade 
tendencial o sujeito vai para o objeto apresentado ao conhecimento. Por último, o aspecto 
sentimental ou afetivo é aquele aspecto puramente subjetivo que consiste na impressão 
agradável ou desagradável que se produz no sujeito que conhece ou gosta. No conhecimento e 
na tendência existe sempre uma relação entre o objeto e o sujeito; no sentimento não existe 
relação alguma com o objeto, mas sim é só um modo de ser do conhecimento ou da tendência. 
 
4. Características da vida psíquica enquanto psíquica 
 Na vida psíquica enquanto psíquica há sempre três elementos distintos: o sujeito, o 
objeto e a atividade. Qualquer que seja o fato psíquico que se trate de qualificar, nele sempre 
encontraremos o sujeito, o objeto e a atividade pela qual o sujeito se faz consciente do objeto 
e este se apresenta “intencionalmente” ao sujeito. 
a) Intencionalidade da vida psíquica 
 A intencionalidade da vida psíquica consiste na referência ao objeto como algo 
distinto do sujeito. Toda forma e todo elemento da vida psíquica (impressão sensível, 
percepção, imagem, conceito, julgamento, volição, tendência...) é o que é por sua referência 
ao objeto. Quando se prescinde da relação ao objeto, não se podem considerar atividades da 
vida psíquica. Poder-se-ão considerar como algo que acontece em mim, que a física pode 
descrever, mas sem a referência ao objeto não pertencem à vida psíquica. A intencionalidade 
consiste, portanto nesta relação entre o sujeito e o objeto; relação que é essencial para a 
atividade própria da vida psíquica. De fato, é impossível conhecer se não existir quem 
conhece e se não haver um objeto conhecido; é impossível gostar se não haver quem gosta e 
se não existir o objeto apetecível. Em conclusão, na vida psíquica a intencionalidade está 
sempre presente. 
 Aqui estão alguns exemplos entre os mais conhecidos. Neste momento me dou conta 
perfeitamente dos caracteres tipográficos da página que estou lendo, do rumor que vem da rua 
a perturbar minha atenção, da resistência que oferece a meus braços a mesa em que me apóio. 
Estes são também objetos que aparecem em minha atividade psíquica suscitada pelas 
impressões produzidas sobre meus sentidos externos: vista, ouvido e tato. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
25 
 Do mesmo modo, eu posso concentrar-me sobre mim mesmo e dar-me conta de que 
estou estudando; posso dar-me conta da necessidade que tenho de estudar, do fim que tenho 
com o estudo e para o qual se orienta minha atividade. Estes são também objetos internos ou 
externos a mim mesmo que se apresentam a minha mente por meio do pensamento, da 
reflexão ou do desejo. Poderá aparecer o caso em que eu reflita sobre mim mesmo ou sobre 
minha atividade psíquica. Neste caso o sujeito que reflete e o objeto da reflexão são na 
realidade idênticos. Mas na percepção de sua identidade, eu os vejo de algum modo como 
dois extremos dessa identidade, que são o eu-sujeito e o eu-objeto de minha reflexão. 
b) Consciência da vida psíquica 
 Se a intencionalidade é a relação entre o sujeito e um objeto, pode definir-se a 
consciência como a relação entre a atividade psíquica e o sujeito, considerando a atividade, 
seja em si mesmo ou subjetivamente, seja em seu aspecto objetivo. A consciência consiste na 
propriedade graças ao qual o sujeito se dá conta da própria atividade e de quanto esta lhe 
apresenta no plano psíquico em forma de objeto distinto dela. 
 O elemento característico da atividade psíquica é sua interioridade e imanência no 
sujeito que a exercita e a recebe. O sujeito, portanto, é de alguma forma impressionado por tal 
atividade. Várias atividades da vida vegetativa são também interiores e imanentes, por 
exemplo, a nutrição; mas o sujeito não experimenta tal atividade, não se dá conta dela, a não 
ser a posteriori. Pelo contrário, a experiência que acompanha a atividade psíquica no sujeito é 
de tal forma interna e imanente que não pode ser conhecida imediatamente se não pelo sujeito 
mesmo. 
 Compreender-se-ão melhor estes conceitos com um exemplo prático. Considerando o 
caso analisado a propósito da intencionalidade, vemos que os caracteres tipográficos da 
página, o ruído da rua e a resistência da mesa me apresentam como dados indubitáveis, como 
algo exterior e antecedente à atividade de meus sentidos externos: vista, ouvido e tato. O que 
vejo, ouço e toco pode ser visto, ouvido e tocado por todos os que põem a mesma atenção 
que eu ponho. Pelo contrário, as operações psíquicas que eu exercito ao apreender estes 
objetos são essencialmente imanentes a mim mesmo, partem de mim, estão em mim, e são tão 
internas a mim mesmo que nenhum pode as observar dentro de mim, a não ser indiretamente 
através dos efeitos externos. Ninguém saberia nada delas se não as manifestasse eu mesmo. 
 Qualquer operação psíquica, seja que se oriente a objetos internos, seja que se oriente 
a objetos externos, é sempre interna ao sujeito que a realiza e é inseparável deste caráter de 
subjetividade que lhe é próprio. É portanto própria de todos os atos psíquicos, como tais, a 
relação com um sujeito que, de algum modo, os atribua a si mesmo, sendo sua causa e seu 
portador. 
 
 
IV. ORIGEM DA VIDA 
 
 O problema da origem da vida11 é difícil porque “a evidência empírica do que 
aconteceu, faz muito tempo que desapareceu”12. Os geólogos, reconstruíndo a grandes linhas 
a história da Terra, demonstraram que na era Azóica (Período Azóico) não se encontrava 
nenhum rastro de vida. No período imediatamente sucessivo aparecem os seres vivos mais 
 
11 Uma exposição clara e ampla se encontra no livro do Vittorio Marcozzi, La vita e l'uomo, cap. VI 
“Origini della vita”, pp. 127-138. 
12 F.Crick, ¿Ha muerto el vitalismo?, Bosch, Barcelona, 1979, p. 34. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
26 
antigos como as bactérias unicelulares, e depois, de modo imprevisto quase todos os tipos de 
organismos inferiores. A ausência de vida na era Azóica se prova pela constatação de que 
naqueles períodos longínquos a vida sobre a Terra era impossível.Qualquer que seja a teoria 
que se aceite sobre as origens de nosso planeta, é necessário admitir que a crosta terrestre foi 
um tempo incandescente, e tal estado de incandescência é incompatível com qualquer forma 
de vida. No que diz respeito a vida sobre a terra, houve um tempo em que não existia, depois 
aparece de modo imprevisto; surge, portanto, o problema da origem: de onde vem a vida? As 
respostas possíveis se podem resumir em duas: 
1) A vida vem por geração espontânea; 
2) A vida foi criada por um ser superior: Deus. 
 
1. A geração espontânea da vida 
 Segundo esta solução, a vida tem sua origem na transformação espontânea da matéria 
inorgânica em matéria vivente. Sustentada já pelos filósofos antigos, esta teoria se afirmou ao 
início da época moderna conquistando muitos cientistas. Mas os experimentos do Francesco 
Redi (1688), Lazzaro Spallanzani (1748) e Louis Pasteur (1861) demonstraram que não se dá 
geração espontânea de vermes, insetos, bactérias. Redi observou que as moscas não surgem 
diretamente da carne em putrefação, mas sim dos ovos depositados por elas na carne. 
Spallanzani estendia os experimentos aos infusórios, pelo qual o princípio omne vivum e vivo 
chegava a ser fundamental nas ciências biológicas. Pasteur matou todas as bactérias de uma 
substância orgânica esterilizando-a; conservou-a impedindo que novas bactérias chegassem a 
ter contato com ela. Se as bactérias tivessem tido origem por geração espontânea, depois de 
algum tempo, aquela substância orgânica devia ter produzido outras bactérias. Mas não foi 
assim: a substância se manteve incorrupta todo o tempo que se impediu o acesso das 
bactérias. 
 Do ponto de vista filosófico, a geração espontânea, sustentada pelos filósofos antigos, 
dado seu insuficiente conhecimento científico, não contradiz o vitalismo que eles mesmos 
sustentavam, ou seja, a superioridade específica do ser vivo sobre o não animado, nem o 
princípio de casualidade (o efeito não pode ser ontologicamente superior à causa). Isto se 
devia à crença de que o novo ser vivo era resultado da ação conjunta dos seres corpóreos e 
dos astros que os antigos, erroneamente, consideravam como corpos incorruptíveis, de 
natureza superior aos seres terrestres e animados por uma inteligência. Assim podiam explicar 
que da ação de um destes seres superiores sobre corpos não animados surgissem novos seres 
vivos inferiores, sem necessidade de procriadores da mesma espécie. 
 
2. A vida foi criada por um ser superior: Deus 
 Não é estranho escutar que a hipótese do criacionismo é anticientífica e implica um ato 
de fé. Mas isto não me parece verdadeiro. A fé é um ato de adesão do intelecto a uma verdade 
que em si escapa a nossa inteligência, mas que aceitamos pela autoridade daquele que nos 
propõe isso. A ciência pode ser empírica ou especulativo (filosofia). Evidentemente, a 
hipótese criacionista não entra no âmbito das ciências experimentais, mas sim no das ciências 
filosóficas. A solução criacionista não nega que a vida possa surgir do não animado, mas nega 
que dependa só da combinação de eventos e forças físico-químicas, já que cada efeito deve ter 
uma causa proporcionada, e esta para o ser vivo não se encontra só na ordem física-químico. 
É necessário, por isso, procurá-la em um princípio superior que determina e dirige os 
elementos físico-químicos no finalismo dos seres vivos. É necessário admitir este princípio 
superior para dar inteligibilidade ao ser vivo. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
27 
 A necessidade de uma causa superior como explicação adequada para compreender o 
surgir da vida da matéria inanimada é uma exigência absoluta da lei geral da causalidade, mas 
por este motivo é uma condição que transcende o campo das leis experimentais e se coloca no 
campo metafísico do ser enquanto tal e da casualidade absolutamente considerada. De fato, 
todas as correntes filosóficas que não querem refugiar-se na pura irracionalidade procuraram, 
apoiadas em seus princípios, determinar esta casualidade total e adequada. Pelo contrário, as 
filosofias materialistas, sejam mecanicistas, dinâmicas ou dialéticas, consideram que a causa 
adequada reside na matéria mesma, de tal maneira que o simples acumular-se quantitativo e a 
crescente complexidade estrutural seria a razão não só necessária, mas também suficiente da 
vida. Tal posição, entretanto, não pode sustentar-se. De fato, as formas de materialismo 
mecanicista negam o ponto de partida: a essencial superioridade do ser vivo em relação ao 
inanimado; embora com um grau de maior complexidade, a vida seria reduzida a pura e 
simples combinação de forças físicas e químicas. Por outra parte, as formas de materialismo 
dinâmico e dialético, que reconhecem esta superioridade essencial e, portanto a necessidade 
de um salto ontológico para superar, não uma pura diferença quantitativa e qualitativa, mas 
sim um grau de perfeição substancial, contradizem abertamente a exigência mais radical da 
casualidade, admitindo que o que é essencialmente inferior e mais imperfeito pode ser a causa 
exclusiva, total e adequada do que é essencialmente superior e mais perfeito. 
 Apresenta-se, portanto, necessário o recorrer a uma causa que supere essencialmente 
em perfeição o conjunto das causas puramente físicas e químicas, mas que ao mesmo tempo 
opere intimamente na natureza através das mesmas forças naturais do mundo físico-químico. 
A filosofia antiga e medieval atribuía esta casualidade superior aos astros ou, mais ainda às 
substâncias espirituais que em sua concepção moviam os céus. Vindas a menos as teorias 
científicas sobre as quais se apoiava tal concepção, não resta mais que recorrer ao Criador 
mesmo da natureza. Entretanto, a ação divina postulada para fazer inteligível o passo da 
matéria não animada à matéria vivente se pode conceber de dois modos distintos: pode-se 
admitir tanto uma criação imediata como uma criação mediata por disposição e combinação 
finalizada da matéria não animada. No segundo caso a ação divina não faz mais que mover o 
dinamismo intrínseco do mundo físico e químico para o término inscrito na natureza mesma 
das coisas. Neste sentido, a virtualidade atribuída aos elementos físicos e químicos não 
implica a presença da vida na matéria inanimada. De fato, a capacidade ativa de produzir a 
vida não corresponderia integralmente a nenhum elemento físico-químico isolado, e nem 
sequer separadamente a alguma estrutura inferior a do ser vivo ínfimo, mas, porém só a todo o 
complexo de substâncias e de estruturas, sob a moção divina que assegura a adequação causal. 
 De tal modo, sob a ação dos agentes externos, a virtualidade interna da matéria cresce 
progressivamente, aproximando-se sempre mais à disposição e organização requerida para o 
surgir da vida, até que em um certo momento, sempre sob a ação dos agentes externos e da 
moção divina universal que assegura a adequação causal, alcança o ponto crítico em que salta 
a faísca da vida; em outras palavras, a nova forma substancial específica da vida sai da 
matéria, suficientemente organizada e imediatamente disposta. 
 Nesta transformação progressiva da matéria podem entrar certamente fatores 
puramente casuais, ou seja, o encontro casual e preterintencional de séries causais 
independentes e de elementos físico-químicos diversos; mas imediatamente entram também 
em jogo fatores específicos determinados e tendenciais - as forças físico-químicas elementares 
- que por sua própria natureza estão ordenadas a produzir determinados compostos, ao início 
inorgânicos e posteriormente orgânicos sempre mais complexos, com uma finalidade real. 
 Capítulo I R. Lucas- Antropologia Filosófica 
 
28 
 Esta visão sintética dos fatores evolutivos se harmoniza plenamente com a visão 
teleológica da filosofia, segundo a qual Deus ordinariamente opera no mundo através das 
causas naturais, sem alterar suas características e seu curso natural, movendo cada causa 
particular segundo sua própria natureza. O impulso e a providência de Deus não eliminam o 
azar e a contingência, mas bem se servem daquilo que em relação às causas naturais é 
puramente fortuito e preterintencional para a realização de um intuito universal13. Fatores 
casuais e naturais são assim movidos e ordenados à consecução de um fim e à produção de 
um efeito, que é superior à natureza deles mesmos, mas que se realiza também por estes 
mesmos fatores sob a moção divina e segundo os planos supremos que a providência divina 
tem inscrito na mesma natureza criada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 Neste sentido S. Tomás afirma repetidamente que Deus com seu movimento e providência não elimina a 
contingência e o azar no mundo, mas pelo contrário, se serve de quanto em relação às causas naturais é 
puramente fortuito e preterintencional para a r/ealização de seus planos superiores: Summ. Theol., I, q. 22, a. 2 ad 
1 e a. 4; q. 103, a. 5 ad 1; a. 7 ad 2; q. 116, a. 1; In VI Met., lect. 3; Summ. C. Gent., III, C. 93-94. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
29 
AA EEVVOOLLUUÇÇÃÃOO BBIIOOLLÓÓGGIICCAA 
 
 
 I. A evolução como fato 
 1. Argumentos da paleontologia 
 2. Argumentos da anatomia comparada 
 3. Argumentos da biogeografia 
 
 
 II. As diversas teorias evolucionistas 
 1. Teorias afinalistas 
 a) Charles Robert Darwin 
 b) Hugo de Vries 
 c) A teoria sintética ou neodarwinismo 
 2. Observações críticas às teorias afinalistas 
a) Do ponto de vista científico 
b) Do ponto de vista filosófico 
 3. Teoria finalista 
 a) Jean-Baptiste de Monnet de Lamarck 
 b) O finalismo na natureza do ponto de vista científico 
 c) O finalismo do ponto de vista filosófico 
 
 
 III. A evolução e o homem 
 1. A humanização 
 2. A criação da alma espiritual 
 3. Monofiletismo ou polifiletismo? 
 4. Monogenismo ou poligenismo? 
 5. Unidade da espécie humana 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Já consideramos o que é a vida. Os organismos viventes, entretanto, nos mostram de 
maneira extraordinaria como são diversos os graus da vida, e pelo mesmo podemos dividir os 
viventes em três grandes categorias: vegetais, animais e homens. Mas, ainda assim, entre tanta 
variedade de formas, não se pode dizer que cada vivente seja completamente diverso de 
outros; mas além das diferenças individuais, é possível entrever algo comum que permite 
classificar os viventes em grupos cada vez menos genéricos, até reunir-lhes em agrupamentos 
mínimos, chamados “espécies”. Vegetais e animais se subdividem desse modo em tipos, 
classes, ordens, famílias, gêneros e espécies segundo a divisão sistemática da botânica e da 
zoologia. 
 
 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
30 
Tipo ou Phylum: é a organização mais ampla no reino. 
p.ex.: no reino animal: vertebrados. 
Classe: é a organização mais ampla dentro do tipo. 
p.ex.: entre os vertebrados: mamíferos. 
Ordem: é a organização mais ampla dentro da classe. 
p.ex.: entre os mamíferos: roedores, primatas. 
Família: é a organização mais ampla dentro da ordem. 
p.ex.: entre os primatas: homínidos. 
Gênero: é a organização mais ampla dentro da família. 
p.ex.: entre os homínidos: Homo. 
Espécie: é a organização mais ampla dentro do gênero. 
p.ex.: no gênero Homo: Homo sapiens. 
Variedade: é a organização mais ampla dentro da espécie. 
p.ex.: na espécie humana: europeu, australiano... 
 
 A espécie se define como o conjunto de organismos capazes de copular-se gerando 
prole fecunda, substancialmente semelhante pelos caracteres morfológicos, anatômicos e 
fisiológicos, que se distinguem somente por meio de diferenças puramente acidentais. As 
espécies que existem atualmente são muito numerosas. Há espécies morfologicamente 
superiores e espécies morfologicamente inferiores, tanto entre os animais como entre os 
vegetais. Classificando-as segundo um grau sempre maior de complexidade e de perfeição, 
obtém-se uma escala gradual, em cujo vértice se encontra o homem. 
 O problema das origens das espécies fica nestes termos: as espécies aparecem no 
tempo porque, como vimos, houve um tempo em que os viventes não existiam sobre a Terra. 
Como surgiram? Derivam por evolução umas das outras, ou têm origens distintas e 
apareceram por intervenção direta? Daqui derivam duas soluções ao problema: a solução 
evolucionista e a solução fixista14. 
 O fixismo tem certamente sua parte de verdade experimental, assim que consta, seja 
tanto pela experiência comum como pela científica, que em circunstâncias ordinárias um 
indivíduo gera sempre outro indivíduo da mesma espécie. Do ponto de vista filosófico, o 
fixismo apresenta vantagens inegáveis, porque encontra uma explicação óbvia a partir do 
princípio geral, segundo o qual, toda causa tende a produzir um efeito semelhante a si mesmo, 
quer dizer, tende a comunicar sua própria forma a uma matéria disposta a recebê-la. Por outra 
parte, entretanto, o fixismo se fundamenta sobre uma concepção estática e atomista. Mas 
admitindo-se uma concepção unitária, dinâmica e hierárquica da natureza, é a hipótese 
evolucionista, a que assume maiores probabilidades, isto é, o passo natural de uma forma 
inferior a uma superior por meio do dinamismo intrínseco e finalista da natureza, sempre sob 
o impulso de uma causa superior. Neste sentido, e à luz de quanto temos dito no capítulo 
precedente, não há oposição entre evolução e criação. Como diz Marcozzi: “Criar significa 
fazer de um nada, dar a existência a seres limitados e contingentes; o qual só a onipotência 
divina pode fazer. O ser, limitado ou contingente, pode receber a existência em estado 
definitivo, mas também pode recebê-la em seu estado potencial ou virtual, recebendo a 
capacidade de se desenvolver transformando-se. Este processo de formação, até que alcance 
 
14 Fixismo: Teoria segundo a qual as espécies biológicas são imutáveis e idênticas desde a sua criação por 
Deus. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
31 
sua fase final, pode ser breve, comprido, simples ou complexo, inclusive passando através de 
muitos e inumeráveis estados”15. 
 A evolução não se contrapõe à criação. A Igreja não se pronunciou nunca respeito ao 
evolucionismo. Condenou o materialismo, que não é uma teoria científica, mas sim uma 
posição filosófica. O evolucionismo, enquanto que sustenta a transformação dos viventes, é 
por outro lado uma hipótese científica; mas se o que pretende é eliminar o finalismo e a 
criação, então se converte em uma ideologia ou teoria filosófica. 
 Por evolução biológica se entende a origem de novas espécies viventes a partir de 
outras espécies preexistentes, por meio da geração biológica. O que é essencial ao conceito de 
evolução é o nexo genético e a explicação em base aos antecedentes. Está claro que este 
conceito de evolução não pode verificar-se no mundo inanimado, porque não há geração; a 
evolução se distingue portanto, da transformação. Quando se fala de evoluçãonão se deve 
confundir o fato da evolução com sua explicação. Pode ocorrer que um fato tenha sido 
comprovado, mas sua explicação permaneça desconhecida. Apesar das dificuldades, o fato da 
evolução é hoje geralmente admitido pelo mundo científico, e parece bastante consolidado16; 
não é tão clara, no entanto, sua explicação, que deu origem a diversas teorias evolucionistas. 
 
 
I. A EVOLUÇÃO COMO FATO 
 
 O fato da evolução é aceito atualmente por quase todos os estudiosos, porque conta em 
seu favor argumentos da paleontologia, da anatomia comparada, da biogeografia e da 
embriologia17. 
1. Argumentos da paleontologia 
 A paleontologia é o estudo dos seres orgânicos antigos, cujos restos conhecemos em 
estado de fóssil (παλαιός = antigo; v, vτoς = ser; λέγω = dizer). Para poder entender 
bem estes argumentos e a sucessiva aparição dos viventes é conveniente dar um esquema das 
eras geológicas. A história da Terra foi dividida em diversas eras, caracterizadas por 
fenômenos geológicos e biológicos particulares. As eras, por sua vez, dividem-se em 
períodos. Cada era, além de animais e plantas comuns, apresenta organismos próprios e 
característicos. Recordemos, com a tabela da página seguinte, a sucessão das eras e dos 
períodos geológicos, começando pelo atual. 
Os argumentos da paleontologia podem ser resumidos do seguinte modo: 
 a) Nos extratos geológicos mais antigos da Terra se encontraram somente fósseis de 
invertebrados; nos extratos geológicos sucessivos se encontraram fósseis de peixes, anfíbios, 
répteis e mamíferos. Isto implica que as diversas espécies viventes não apareceram 
contemporaneamente sobre a Terra, mas sucessivamente, e que primeiro apareceram os 
viventes mais simples e depois os mais complexos. Os últimos são os mamíferos, e o último 
dos mamíferos é o homem. 
 
15 V. Marcozzi, Il darwinismo oggi, in Civiltà Cattolica 134 (1983) I, 139. 
16 É precisamente por causa das dificuldades encontradas pela ciência que não todos os cientistas aceitam o 
fato da evolução: cfr. G. Sermonti - R. Fondi, Dopo Darwin. Critica all'evoluzionismo, Rusconi, Milano 1980. 
17 P. Grassé, L'évolution du vivant, p. 17: “A evolução está considerada pela quase totalidade dos zoólogos e 
botânicos como um fato e não como uma hipótese. Fazemos nossa esta apreciação e a fundamentamos acima de 
tudo nos documentos subministrados pela paleontologia, quer dizer pela história do ser vivo”. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
32 
 b) O estudo dos fósseis mostra que as diferenças entre espécie, famílias e gêneros não 
é clara. Encontraram-se fósseis de animais pertencentes a espécies intermediárias entre as 
grandes classes atuais: um exemplo famoso é o Archeopterix, animal com caracteres em parte 
de réptil e em parte de pássaro. 
 c) Existem séries de animais que se sucedem umas às outras no tempo e mostram 
modificações graduais, quer dizer, uma evolução. A série mais famosa é a do cavalo. 
 
 
TABELA DAS PRINCIPAIS DIVISÕES GEOLÓGICAS 
E DE SEUS CARACTERES PALEONTOLÓGICOS 
 
Eras 
geológicas 
Períodos 
geológicos 
Anos 
(milhões) 
Invertebrados Vertebrados 
Quaternária ou 
Antropozóica 
Holoceno 0,3 Atuais Reino do 
Homem Plistoceno 0,5 
 
 
Terciária ou 
Cenozóica 
Plioceno 15 
6
0
 m
il
h
õ
es
 d
e 
a
n
o
s 
 
a
n
o
sa
n
o
sa
n
o
s Reino dos 
acéfalos e dos 
Gastrópodes 
Numulitas 
 
Reino dos 
Mamíferos 
Mioceno 30 
Oligoceno 40 
Eoceno 50 
Paleoceno 60 
 
 
Secundária ou 
Mesozóica 
Cretáceo 80 
1
2
0
 m
il
h
õ
es
 d
e 
a
n
o
s 
Reino dos 
 
Amonitas e dos 
 
Belemnitas 
 
Primeiros 
pássaros 
 
Reino dos 
Répteis 
Jurássico 100 
Triásico 200 
 
 
Primaria ou 
Paleozóica 
Permiano 250 
3
5
0
 m
il
h
õ
es
 d
e 
a
n
o
s 
Reino dos 
Braquiópteros e 
 
Dos 
Trilobitomorfos 
 
Primeiros 
Répteis 
 
Reino dos 
peixes Ganóides 
Carbonífero 300 
Devoniano 400 
Siluriano 450 
Ordoviciano 500 
Cambriano 600 
 Arcaica o Pré-cambriano 4500 Fósseis quase desconhecidos 
 
 
 
 
 
 
2. Argumentos da anatomia comparada 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
33 
a) A dificuldade na classificação sistemática 
 Existe grande dificuldade na classificação sistemática de plantas e animais; existem 
muitas formas orgânicas que não parecem pertencer a nenhuma categoria, e são colocadas nos 
assim chamados grupos de transição. 
b) A homologia dos órgãos 
 Chamam-se homólogos aqueles órgãos que, em diferentes espécies, manifestam uma 
estrutura anatômica similar, embora realizem funções diversas. São órgãos homólogos a mão 
do homem, a asa do morcego, a pata do cavalo. Isto pareceria indicar que todos provêm de um 
tipo inicial comum. 
c) Em muitos animais existem vestígios de órgãos sem nenhuma utilidade: olhos em 
animais que vivem em cavernas escuras, rudimentos de membros posteriores em alguns 
sáurios e cetáceos. 
 
3. Argumentos da biogeografia 
 Nas ilhas oceânicas, existem espécies animais que se diferenciam notavelmente das 
espécies continentais. Por exemplo, ao oriente e ao ocidente do istmo do Panamá, a fauna 
marinha compreende muitas espécies que constituem casais (uma forma atlântica e uma 
pacífica). Entretanto, antes do Mioceno, dado que o istmo não existia, havia uma fauna única. 
A explicação mais óbvia da duplicação de formas, consiste em admitir que, depois da 
formação do istmo, as espécies da fauna atlântica e as da fauna pacífica tenham evoluído 
independentemente. “De outra forma terei que supor que depois da aniquilação da fauna 
primitiva, o Criador dotasse cada um dos dois oceanos de espécies que formam séries 
paralelas muito diferentes; hipótese pouco provável”18. 
 
 
II. AS DIVERSAS TEORIAS EVOLUCIONISTAS 
 
 Alguns estudiosos modernos quiseram ver em Santo Agustinho o precursor das teorias 
evolucionistas, porque em dois de seus livros faz referência às “rationes seminales”, das quais 
teriam surgido todos os viventes19. Parece que o mesmo Tomás de Aquino simpatizou com a 
teoria da evolução, pois diz: “A opinião de Santo Agostinho é mais razoável (que a de são 
Gregório) e defende mais eficazmente a Sagrada Escritura contra os ataques irônicos dos 
infiéis... e esta opinião eu gosto mais”20. 
 Santo Agostinho admite, explicando o Gênese, que Deus tenha criado os animais em 
forma embrionária. Teria escondido na natureza algo de “potencial”, sementes, quer dizer 
“rationes seminales”, das quais teriam se desenvolvido os organismos adultos, quando se 
tivessem apresentado as condições aptas. 
 Esta idéia original foi, durante séculos, única que possuía uma pequena menção da 
evolução. Alguns filósofos como Bacon, Descartes, Leibniz, deixaram entrever timidamente 
alguma idéia evolucionista. Mas era necessário esperar a metade do século XVIII para 
encontrar no Jean-Baptiste de Monnet de Lamarck, o verdadeiro fundador do evolucionismo, 
e para assistir à difusão imprevista destas teorias. Hoje são muitas as teorias científicas que 
 
18 Jolivet R., Traité de philosophie, vol. I, p.433. 
19 San Agustín, Sup. Gen. ad litteram, l. V, c. V; De civitate Dei, c. 9. 
20 Tomás de Aquino, Sent., II, disp. XII, q. I, a. 2: “...et haec opinio plus mihi placet”. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
34 
tratam de explicar o fato da evolução. Todas estas teorias,sob o aspecto filosófico, podem-se 
reduzir a duas concepções fundamentais: a teoria finalista e afinalistas. 
 A teoria finalist: sustenta que a natureza seguiu um plano, que os viventes não são 
frutos do azar e da fatalidade, mas resultado de forças e de leis ordenadas a obter os diversos 
viventes com seus organismos e estruturas. 
 A teoria afinalista: acusa os finalistas de passar por cima das causas naturais ao 
explicar os fenômenos, e sustenta que os viventes são frutos do acaso e da combinação de 
forças e leis naturais, tais como a seleção natural, sem nenhum “plano” ou “projeto”. 
 
1. Teorias afinalistas 
a) Charles Robert Darwin (1809-1882) 
 Botânico e biólogo inglês, escreveu uma obra que o fez famoso: On the origin of 
species by means of natural selection21, em que explica o mecanismo da evolução em chave 
afinalista22 recorrendo a dois fatores externos e casuais: a seleção natural e as variantes 
individuais. 
 O que é a seleção natural? Pode-se definir como o jogo casual de eventos que 
favorecem a sobrevivência dos indivíduos mais dotados e que melhor se adaptam ao 
ambiente. A seleção natural funciona de tal maneira que acumula em uma determinada 
direção as diferenças de organização, fazendo que essas diferenças sejam cada vez maiores, 
até que se dê origem a uma nova espécie. 
 A seleção natural se produz, segundo Darwin, mediante a luta pela existência. Na 
natureza há uma verdadeira luta; nesta luta sobrevivem os mais adaptados, quer dizer, aqueles 
organismos que apresentam algum caráter vantajoso, enquanto que os outros estão 
inexorávelmente condenados a desaparecer. A seleção natural, levada a cabo mediante a luta 
pela existência e continuada por milênios, teria produzido o grande fenômeno da 
transformação de um microorganismo em um homem; os viventes, como também a 
inteligência humana, derivam do desenvolvimento de espécies inferiores por combinações 
casuais de eventos. Entre tantas combinações prováveis, produziram-se aquelas que formam 
as estruturas orgânicas dos viventes, apoiadas na ação da seleção natural. Não podendo 
explicar a evolução apoiada somente pela casualidade, recorre-se ao poder da seleção. Esta 
teria a capacidade de escolher, entre todas as combinações possíveis, as mais aptas para 
manter e fazer progredir a vida. Bastaria chegar por acaso à formação de um vivente, para que 
só com isso já entre em jogo a seleção; esta favoreceria a existência e contribuiria a proteger 
as mutações vantajosas, eliminando as demais. 
b) Hugo de Vries (1848-1935) 
 O botânico holandês Hugo de Vries explica a evolução mediante a mutação genética, 
que é a mudança casual de um ou mais genes do indivíduo, que depois produzem mutações e 
mudanças mais ou menos significativas em suas características, dando assim origem ao 
desenvolvimento evolutivo. 
c) A teoria sintética ou neodarwinismo 
 
21 Tr. esp.: El Origen de las especies, E.D.A.F., Madrid 1965. 
22 V. Marcozzi, Il darwinismo oggi, in Civiltà Cattolica 134 (1983) I, 122-140. Além de tudo encontrado nos 
seus escritos, recebi valiosas sugestões nas conversações com o autor. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
35 
 R. Fischer, G. Haldane, S. Wright, G. Simpson23. A teoria se chama assim porque 
sintetiza o fator da mutação genética com o principal fator da teoria darwiniana, a seleção; é, 
portanto, a combinação de mutação + seleção. As mutações úteis seriam conservadas pela 
seleção; todas as demais seriam eliminadas junto com os indivíduos que as possuem. As 
pequenas mutações, acumulando-se nas distintas gerações, teriam produzido as formas dos 
diferentes viventes com seus organismos e funções, incluído o homem. A teoria sintética 
tende a explicar não só as modificações graduais dentro dos grupos menores, mas também as 
maiores modificações entre os grupos maiores mediante as mutações que se percebem e a 
ação da seleção natural. 
 
2. Observações críticas às teorias afinalistas24 
a) Do ponto de vista científico 
 1) Os caracteres adquiridos não se transmitem: é um dado já consolidado pela 
genética que os caracteres adquiridos não se herdam. 
 2) A adaptação ao ambiente: está confirmado que a adaptação ao ambiente intervém 
no processo evolutivo. 
 3) As mutações genéticas são muito pequenas: a genética demonstra que existem 
pequenas modificações hereditárias, devidas a uma mutação do patrimônio genético. 
Entretanto, estas modificações, que se dão espontaneamente na natureza ou se produzem 
artificialmente em laboratório, quase invariavelmente são nocivas para o organismo e 
produzem quase sempre más formações. Por outra parte, as mutações são tão pequenas que 
não representam uma mudança substancial de estrutura, e ocorrem sempre no âmbito da 
mesma espécie; embora se combinem entre elas, não se obtém nenhuma forma nova. Além 
disso, se as mutações se verificarem casualmente, por que devem verificar-se sempre na 
mesma direção? Por que as sucessivas mutações não poderiam destruir aquilo que tinham 
conseguido as precedentes? 
 4) requerer-se-iam mutações maiores: também o mecanismo mutação + seleção não é 
válido na formação de novas estruturas. De fato as mutações, também quando são positivas, 
levam em si uma vantagem que em realidade é intranscendente e sobre a que a seleção natural 
não pode atuar. Se o pescoço da girafa tivesse aumentado um metro em mil gerações, teria 
aumentado um milímetro por geração. Este ganho é virtualmente inútil para a seleção, que 
necessita mutações mais eficazes e substanciais. Os mesmos neodarwinistas o reconhecem, 
dado que recorrem a mutações desconhecidas; mas este recurso é gratuito. 
 5) O tempo geológico não bastaria: se a evolução tivesse acontecido com o 
mecanismo de mutações + seleção, o tempo geológico não teria sido suficiente. É impossível 
que um processo tão lento possa alcançar os resultados imponentes que se verificaram, 
inclusive dispondo de todo o tempo geológico. 
 6) As formas invariáveis: a teoria sintética não pode explicar a presença de numerosas 
formas invariáveis. Existem de fato organismo que permaneceram invariáveis da era Primária 
até nossos dias. Como explicar, no marco da teoria sintética, este fenômeno se o ambiente 
ecológico tiver mudado tão radicalmente? 
 
b) Do ponto de vista filosófico 
 
23 G. Simpson, This view of life, the word of an evolutionist, Harcourt Brace & World, New York 1964. 
24 Cf. P. Grassé, L'évolution du vivant, cap. IV: “La evolución y el azar”, pp. 157ss. 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
36 
 As teorias afinalistas estão de acordo ao afirmar que as causas da evolução são 
fortuitas e casuais, embora se diferenciam ao determinar sua natureza; para algumas teorias 
essas causas são internas ao organismo: mutações genéticas; para outras, são externas: 
seleção, ambiente; inclusive para outras, podem ser mistas. Todas estas teorias negam que há 
finalidade na natureza e procuram explicar a vida e sua evolução até chegar ao homem 
unicamente por meio da concorrência de causas físico-químicas e eventos fortuitos e 
casuais25. 
 Filosoficamente a evolução assim entendida, está em contradição com o princípio de 
razão suficiente e com o princípio de finalidade; supõe, de fato, que os viventes mais perfeitos 
derivam dos menos perfeitos sem a intervenção de uma causa proporcionada, e que no mundo 
não há leis nem direções preferenciais, quer dizer, finalidade. 
 Em um mundo puramente casual, no qual não existissem leis (causa eficiente) e 
direções preferenciais (causa final), não haveriacombinações estáveis, e muito menos, 
viventes, porque assim como por acaso se formaram, da mesma maneira, por acaso se teriam 
destruído. Pelo contrário, em nosso mundo os viventes não só se formaram, mas também se 
conservaram e evoluíram a formas cada vez mais complexas e perfeitas; o qual demonstra que 
a formação e evolução dos viventes não são obras do acaso. E de nada serve recorrer a 
evolução gradual dos viventes e à larga duração do tempo. 
 A formação gradual de uma estrutura, de por si improvável, não diminui sua 
improbabilidade, mais sim, acrescenta-a, se supormos que isso ocorre em um mundo sem 
direções preferenciais. De fato, a improbabilidade de que se forme essa estrutura deve 
multiplicar-se por todos os instantes de sua formação gradual, porque em um mundo 
totalmente fortuito, cada instante de permanência é independente do precedente e não está 
condicionado por ele. 
 Da mesma forma a enorme duração do tempo não supera a dificuldade, porque se o 
tempo aumenta a probabilidade de que se forme uma estrutura complexa, aumenta também a 
probabilidade de que sucessivamente seja destruída. Por isso, se não se admitirem na matéria 
leis estáveis e direções preferenciais, não se explica a formação e evolução dos viventes26. Do 
ponto de vista filosófico, requer-se uma causa proporcionada; o finalismo encontra esta causa 
proporcionada em uma Inteligência que atuou mediante as leis da natureza. 
 
3.A teoria finalista 
a) Jean-Baptiste de Monnet de Lamarck (1744-1829) 
 Botânico francês é considerado o verdadeiro fundador do evolucionismo. No ano 1809 
escreveu um livro titulado Philosophie zoologique no que propunha sua teoria sobre a 
evolução dos viventes, ou seja: a adaptação ao ambiente e a herança genética. Segundo 
Lamarck o mecanismo da evolução funcionaria da seguinte maneira: 
 1. Nos animais a adaptação ao ambiente aperfeiçoa e desenvolve os órgãos mais 
usados, enquanto que os menos usados se debilitam e tendem a desaparecer. 
 2. Quando as modificações produzidas pela falta de uso as adquirem os dois sexos da 
espécie, transmitem-se aos descendentes. Lamarck distingue entre a evolução ascendente e a 
evolução adaptativa. A evolução ascendente, que leva aos organismos a uma maior perfeição, 
 
25 Um dos protagonistas na Itália da explicação a-finalista do Darwin é o geneticista Giuseppe Montalenti; cf. 
L'evoluzione, Einaudi, Torino 1972; Charles Darwin, Editori Riuniti, Roma 1982. 
26 P. Grassé, L'évolution du vivant, pp. 172-173: “Na ausência de linhas orientadas, o mundo vivente seria um 
caos. Não haveria evolucionistas porque o incoerente escapa à ciência.” 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
37 
aconteceu por fatores internos aos viventes e segundo as leis da natureza. A evolução 
adaptativa, quer dizer, o conjunto de transformações acontecidas ao adaptar-se aos diversos 
ambientes, teria se realizado sobre tudo com o mecanismo da “transmissão das características 
adquiridas”. A explicação de Lamarck é finalista: a evolução segue um plano inscrito na 
natureza. Afirma: “O plano, seguido pela natureza na produção dos animais, compreende 
claramente uma primeira causa predominante, que confere à vida animal o poder de obter a 
organização gradualmente mais complexa e de aperfeiçoar gradualmente não só a organização 
total, mas também os aparelhos particulares segundo os vai formando. Esta progressiva 
complicação dos organismos foi realmente realizada pela causa principal em todos os animais 
extintos. A não ser que uma causa estranha, acidental e, portanto variável, tenha interferido na 
execução do plano antes mencionado, mas sem destruí-lo”27. 
 A explicação finalista sustenta que a produção dos viventes é fruto de um “projeto” 
inscrito na natureza, e, portanto, os viventes não são o fruto do puro acaso, mas o resultado de 
leis dirigidas a obter os diversos viventes com seus órgãos e estruturas28. Naturalmente tais 
resultados se obtiveram mediante a ação de causas naturais, químicas, físicas ou psíquicas, e 
não por uma ação “milagrosa”. Na busca das origens das diversas formas viventes não se deve 
esquecer o princípio fundamental: que não é lícito recorrer imediatamente à Primeira Causa 
quando é possível explicá-lo com causas naturais; somente quando tal explicação se mostra 
inadequada, é legítimo e necessário recorrer à Primeira Causa. Examinemos agora, em 
primeiro lugar a nível científico, o finalismo presente na natureza, e depois veremos a 
interpretação filosófica que dele se pode dar. 
b) O finalismo na natureza, do ponto de vista científico 
 1) A estrutura dos órgãos. Os viventes são diversos uns dos outros, mas todos têm 
órgãos e aparelhos aptos para a função que cumprem e o gênero de vida que levam. Os órgãos 
em particular e o organismo em seu conjunto manifestam uma estrutura muito complexa em 
que todos os componentes contribuem para realizar a função própria de cada órgão. Esta 
complexa estrutura, formada por diferentes elementos diversos que não têm necessidade de 
estarem juntos, manifesta uma atividade teleológica29, que para ser inteligível exige um 
agente racional nessa ordem. 
 2) O poder de adaptação. Os viventes e os órgãos apresentam variações de estrutura 
em relação com o ambiente no qual devem funcionar; esta adaptação morfológica está 
sustentada pela adaptação fisiológica. Dado que o órgão é para a função, modificando-se de 
algum modo sua estrutura, o organismo o readapta até conseguir novamente a função. Este 
poder de auto-regulação mostra uma finalidade intrínseca do organismo. 
 3) A existência de leis regulares. A organização do universo, o sistema astronômico e 
o desenvolvimento do indivíduo manifestam a existência de leis regulares que tendem para 
um fim. 
 4) O argumento por analogia. O raciocínio por analogia consiste em confrontar 
alguns órgãos dos viventes com os instrumentos construídos pelo gênio humano. Nestes 
instrumentos o finalismo é evidente, porque o homem atua intencionalmente; assim também 
na natureza se encontram órgãos muito similares aos instrumentos humanos, os quais 
requerem uma função similar. Ex. peixe-espada, pinças dos caranguejos... 
 
27 J.-B. Lamarck, Historia natural de los invertebrados, p. 192 
28 Seguimos a exposição do V. Marcozzi: La vita e l'uomo, Cea, Milano 1946; L'uomo nello spazio e nel 
tempo, Cea, Milano 19693; Le origini dell'uomo, Massimo, Milano 19838. 
29 Que busca um fim. (do grego telos = fim) 
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
38 
c) O finalismo do ponto de vista filosófico 
 Antes de confrontar o problema do finalismo, convém recordar o que se entende por 
“fim” ou “causa final”. Causa é aquilo que influi positivamente em dar o ser a outro. Causa 
final é aquilo pelo que algo se faz, quer dizer aquilo pelo que o agente opera: o carpinteiro 
trabalha o modo para fazer uma mesa. Que operação realiza? Primeiro se forma na mente uma 
idéia da mesa que quer construir; logo escolhe o material apropriado; depois trabalha e dispõe 
o material para o fim, que é realizar essa mesa que idealizou. A mesa que o carpinteiro quer 
construir e que, em um primeiro momento, existe somente em sua mente, é o fim ou a causa 
final; as operações que realiza são a causa eficiente; o material que utiliza é a causa material; 
a forma que tomará aquela matéria é a causa formal. A finalidade pode ser intrínseca, se o 
agente tender ao fim da operação segundo a forma natural, ou extrínseca, se tender a uma 
operação segundo a forma adquirida. A finalidade, seja intrínseca ou extrínseca, no exemplo 
proposto,a mesa ideal, influi realmente na elaboração da mesa enquanto que o material 
utilizado é organizado pela causa eficiente segundo o plano ideal. É evidente que não se pode 
falar de um fim se não houver uma mente que possa idealizar um plano de ação. Se a análise 
de um fenômeno da natureza manifesta a existência de um “plano”, precisamente por isso 
manifesta também a existência de uma mente que o idealizou. 
 Naturalmente, não é necessário que o operante, para pôr em prática o plano, intervenha 
diretamente na operação. É suficiente que disponha as forças na matéria, de maneira que se 
obtenha esse plano em vez de outro. No caso da evolução, o finalismo admite na natureza leis 
e planos que explicam a formação dos viventes com seus órgãos e estruturas; e estes planos, 
confirmados pelos argumentos científicos, requerem de uma Mente idealizadora. A produção 
e evolução dos viventes não foram casuais, mas finalistas. Quer dizer, idealizada e querida por 
uma Inteligência que atuou mediante as leis da natureza. 
 Por outra parte, examinando-se objetivamente a natureza, constata-se que a 
Inteligência que nela é manifestada com ela não se identifica. De fato, a natureza é o conjunto 
de elementos e de organismos que constituem o universo sensível, os quais revelam uma 
Inteligência criadora de ordem finalista, e ao mesmo tempo mostram que esta Inteligência não 
se identifica com eles. Por isso se deve concluir que a Mente ou Inteligência criadora está 
além da natureza. De fato, se a natureza e os organismos não são inteligentes (excluindo ao 
homem) e, por outra parte, cumprem ações que revelam uma inteligência superior, deve-se 
concluir que tal Inteligência está além deles, em Alguém que tem feito sua natureza. 
Estudiosos de nossos tempos tentaram dar um nome a este Alguém. Maxwell o chamou 
“gênio”; Eddington “antiacaso”. Jesus de Nazaré, observando a singela beleza de um lírio do 
campo, denominou-o “Deus”. Assim, Deus pode ser definido: Inteligência ou Mente, distinta 
da natureza, que criou a natureza. Como sabiamente escreve V. Marcozzi: “Quando se fala de 
causa final ou de fim em filosofia ou ciência, não se entende -como alguns acreditam- que 
queira substituir a causa final pela causa eficiente. Justamente o contrário! Admitir a causa 
final não exclui a busca da causa ou as causas eficientes. Trata-se de certificar-se, com a razão 
que observa um conjunto de sucessos, se a causa ou as causas eficientes estão orientadas ou 
dirigidas ao efeito que obtêm. Se for assim, deve-se admitir o finalismo; se não, nega-se e se 
admite somente a casualidade. Ser finalista (quer dizer, dar-nos conta de que algumas forças 
estão dirigidas a um fim) não impede o procurar as causas eficientes. De fato, os naturalistas 
maiores eram e são finalistas. Morgagni, fundador da anatomia patológica, era finalista; 
Pasteur, o maior, bacteriologista era finalista; também G. Mendel, fundador da genética; J. -B. 
de Lamarck, fundador do evolucionismo e outros.”30 
 
30 V. Marcozzi, Il darwinismo oggi, in Civiltà Cattolica 134 (1983) I, 136-137. 
 R. Lucas - Antropologia Filosófica Capítulo I 
 
39 
 
 
III. O EVOLUCIONISMO E O HOMEM 
 
 O evolucionismo, como vimos, não é plausível sem a intervenção de uma Mente 
organizadora que tenha dado à natureza as leis, e feito possível seu suceder. Tal intervenção 
se necessita também para explicar a aparição do homem sobre a Terra. Se admitirmos, no 
mundo físico e biológico, uma evolução natural, dinâmica, finalista e hierárquica, é necessário 
conceber ao homem como o vértice deste processo. Quer dizer, não já como o término efetivo 
de um processo cego de forças puramente mecânicas e de eventos casuais, mas sim como a 
meta de um finalismo intrínseco e dinâmico que dirige intencionalmente a evolução, sem o 
qual a evolução mesma careceria de significado e de valor. O homem, de fato, apresenta-se na 
natureza como a coroação e o fim imanente, e ao mesmo tempo transcendente, do esforço 
evolutivo do universo sob o impulso incessante e a providência universal do Criador, que 
sustenta no ser e move no agir cada uma das criaturas segundo a essência e a virtualidade 
própria. 
O problema da evolução a respeito do homem se pode sintetizar em cinco perguntas. 
1. O organismo biológico do homem (corpo), foi criado diretamente por Deus ou 
provém de outros viventes por evolução? (questão da hominização). 
2. O espírito humano (alma espiritual), provém dos pais ou é criado diretamente por 
Deus? 
3. Ao início do gênero humano, houve um só phylum, ou se devem admitir diversos 
phyla? (questão do monofiletismo ou polifiletismo). 
4. Se na origem da humanidade houve um só phylum, foi formado por vários indivíduos, 
e portanto por vários casais, ou se pode pensar que tenha existido um sozinho casal? 
(questão do poligenismo ou monogenismo). 
5. Os homens que constituem a humanidade atual, pertencem a uma só espécie? 
 
1. A hominização 
 Não cabe duvidar de que Deus poderia ter criado diretamente o organismo humano, 
mas no ambiente cientista e teológico se afirma cada vez mais a convicção de que Deus se 
serviu da matéria preexistente, de maneira que o corpo humano provenha de seres inferiores 
por evolução biológica. Se viermos a admitir a evolução dos viventes inferiores ao homem, é 
natural pensar que também para o homem tenha havido uma evolução. É verdade que o 
homem, especialmente por suas manifestações psíquicas intelectuais, diferencia-se 
nitidamente de qualquer animal, e isto requererá ulteriores elucidações, mas também é 
verdade que o organismo humano tem muitas propriedades em comum com o mundo vivente 
inferior. As afinidades mais estreitas, apresenta com relação ao grupo dos primatas 
(antropóides). 
 Não é fácil, entretanto, fazer um conceito adequado do processo de hominização. No 
campo científico se distinguem os pré-homínidos, os homínidos, e entre estes os homínidos 
infra-humanos e os homínidos humanos. Os mais antigos primatas se remotam a sessenta 
milhões de anos, ao início da era Terciária, no Paleoceno, e o fóssil mais antigo é do 
Oligoceno. Os primatas se desenvolveram durante toda a era Terciária, e puderam encontrar-
 Capítulo I R. Lucas - Antropologia Filosófica 
 
40 
se diversos fósseis que, procedendo no tempo, aproximam-se cada vez mais às formas 
humanas atuais. As formas principais são31: 
 
 O Parapithecus: faz 40.000.000 de anos e com 500 cm3 de volume cranial. 
 O Ramapithecus: faz 15.000.000 de anos e com 500 cm3 de volume cranial. 
 O Australopithecus: faz 3.000.000 de anos e com 600 cm3 de volume cranial. 
 O Homo habilis: faz 1.500.000 de anos e com 700 cm3 de volume cranial. 
 O Homo erectus: faz 1.000.000 de anos e com 800 cm3 de volume cranial. 
O Homo sapiens neanderthalensis: faz 200.000 anos e com 1.500 cm3 de volume 
 cranial32. 
 O Homo sapiens sapiens (Cro-magnu): faz 20.000 anos e com 1.300 cm3 de volume 
 cranial (atual). 
 
 Do ponto de vista científico, podemos definir o homem: um primata de pele nua, a 
posição completamente ereta, a mão capaz de qualquer tipo de operação, o cérebro muito 
volumoso e diferenciado, que permite manifestações intelectuais ou espirituais. Nem todos 
estes caracteres têm a mesma importância, e pode ser que não tenham aparecido 
contemporaneamente durante o processo evolutivo; mais ainda, teoricamente devem ter 
aparecido antes aqueles caracteres que servem de suporte a outros. O desenvolvimento e a 
transformação do cérebro devem ter aparecido ao final; embora o importante não é tanto o 
desenvolvimento do cérebro, mas a transformação qualitativa

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