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de baixa viabilidade na zona de hibridação. A especiação parapátrica é, portanto, um processo de diferenciação que ocorre mesmo havendo fluxo gênico entre os grupos populacionais, já que não há barreira geográfica. No entanto, a diferenciação só começa a ocorrer porque os indivíduos da espécie ancestral não se acasalam aleatoriamente dentro dos limites geográficos de sua distribuição. Os indivíduos localizados nos extremos da área de distribuição da espécie se acasalarão mais frequentemente com aqueles que se encontram ao seu redor, e esse grupo populacional está sujeito a forças adaptativas diferentes daquelas às quais está sujeita a população situada no outro extremo geográfico da área. Atualmente, a espécie Anthoxanthum odoratum, uma gramínea europeia, passa por um processo de diversificação parapátrico. Houve contaminação de parte do solo da região por metais pesados, e apenas alguns indivíduos naturalmente resistentes se proliferaram no solo tóxico. De início, plantas resistentes e não resistentes se fertilizavam e originavam híbridos. Posteriormente, os dois grupos perderam parcialmente a sincronia no florescimento, o que levou a um isolamento reprodutivo parcial entre os dois subgrupos, uma vez que o fluxo gênico entre as populações está sendo interrompido, o que caracteriza o processo de especiação. 2.3 Especiação Simpátrica Esse tipo de especiação ocorre na área geográfica habitada originalmente pelo ancestral. Isso ocorre, por exemplo, quando insetos parasitas de plantas passam a infestar um novo tipo de hospedeiro. É o que ocorreu com a mosca Rhagoletis pomonella, que naturalmente se acasala e ovipõe em frutos de espinheiro (Crataegus sp.). Quando o fruto cai, as larvas se empupam no solo, de onde emergem os adultos. Essas moscas passaram a atacar frutos da macieira, planta introduzida na América do Norte há menos de 300 anos. Atualmente, as moscas dessa espécie se subdividem em dois grupos, o do espinheiro e o da macieira, que são diferentes quanto a aspectos bioquímicos e de desenvolvimento. Em conjunto, as diferenças entre esses grupos de moscas revelam que um processo de diversificação está em andamento. Em vegetais, há exemplos de especiação simpátrica por autopoliploidia e alopoliploidia. No primeiro caso, há duplicação do genoma de uma única espécie, de modo que o descendente poliploide se torna uma nova espécie. No segundo caso, há hibridação de espécies diferentes e, no híbrido, há duplicação dos dois genomas durante a formação de gametas. Esses gametas com genomas duplicados participam da autofecundação e originam os indivíduos de uma nova espécie (figura 10). Figura 10. Origem de nova espécie de Clarkia por hibridização seguida de duplicação cromossômica. Fonte: Mader, 2010. Um caso de alopoliploidia ocorreu com o trigo. O trigo cultivado atualmente (Triticum aestivum) é um hexaploide que contém genoma de três espécies diploides: T. monococcum (AA), T. searsii (BB) e T. tauschii (DD). Ou seja, o genoma do trigo atual é diploide para três genomas diferentes (AA BB DD). 3 Aspectos genéticos da evolução do isolamento reprodutivo A evolução dos mecanismos de isolamento reprodutivo entre as espécies está associada a eventos genéticos. Os processos genéticos por trás da evolução do isolamento pré-zigótico e do isolamento pós-zigótico são diferentes. O experimento com as drosófilas, mencionado anteriormente, permite concluir que o isolamento reprodutivo pré-zigótico se estabeleceu por efeito carona, ou seja, um loco que influencia no comportamento foi selecionado porque é vizinho daquele que codifica uma enzima digestória. Dessa forma, ao ocorrer seleção dos indivíduos cujo loco 1 possui um alelo responsável pela enzima que digere amido, foi selecionado também o alelo que influencia um comportamento X, presente no loco vizinho de cromossomo. Assim, as moscas que digerem amido levam “de brinde” o comportamento X, e aquelas selecionadas no meio com maltose, recebem “gratuitamente” o comportamento Y. O isolamento pré-zigótico também pode se estabelecer por pleiotropia, fenômeno em que a expressão de um certo gene afeta mais de uma característica do organismo. Assim, um gene cuja manifestação seja favorável a uma adaptação ecológica pode, ao mesmo tempo, estar influenciando no surgimento do isolamento pré-zigótico. Esse parece ser o caso do bico dos tentilhões de Darwin, nas ilhas Galápagos (figura 11). Já se sabe que o tamanho do bico nessas aves é uma característica que garante adaptação ao tipo de alimento. Bicos pequenos comem sementes pequenas, bicos grandes comem sementes grandes. Além disso, aves de bicos pequenos conseguem entoar um canto mais veloz que as aves de bicos grandes, ou seja, a velocidade do canto depende do tamanho do bico. Como a escolha de parceiros de acasalamento depende das características do canto, o tamanho do bico seria importante também para a reprodução dessas aves, não só para a alimentação. Portanto, os genes que atuam na determinação do tamanho do bico têm efeito pleiotrópico, pois influenciam tanto na alimentação quanto na reprodução. Figura 11. Espectogramas sonoros de quatro espécies de tentilhões de Darwin, mostrando o tempo (na horizontal) e a frequência (na vertical) da emissão dos sons característicos. Bicos maiores emitem sons mais lentos, enquanto os bicos menores, emitem sons rápidos. Fonte: Brooker et al., 2010. Com relação ao isolamento reprodutivo pós-zigótico, sua evolução depende da interação de múltiplos locos. Quando duas populações permanecem isoladas por certo tempo, novidades genéticas surgem e são selecionadas em cada uma delas. Estas novidades genéticas específicas de cada população estão bem integradas com os demais genes. No entanto, ao haver intercruzamento das duas populações, as novidades genéticas de cada população irão se encontrar no híbrido e podem interagir negativamente, reduzindo assim, a fecundidade e a viabilidade desse híbrido. CONSIDERAÇÕES FINAIS As mudanças microevolutivas podem resultar na origem de espécies diferentes, um fenômeno conhecido como especiação. Apesar de existirem diferentes conceitos de espécie, no processo de especiação se considera apenas o conceito biológico de espécie, o qual considera o isolamento reprodutivo pré ou pós-zigótico como critério para definição de espécie. A especiação pode ocorrer de modo alopátrico, parapátrico e simpátrico. A especiação alopátrica é caracterizada por interrupção do fluxo gênico entre subpopulações de uma espécie provocada por uma barreira geográfica. Permanecendo isoladas por muito tempo em condições ambientais diversas, as subpopulações passam por processos adaptativos diferentes e desenvolvem isolamento reprodutivo. A especiação parapátrica, por sua vez, não requer a existência de uma barreira geográfica, e é caracterizada pela existência de uma zona de hibridação. Já a especiação simpátrica é aquela que ocorre sem a necessidade de nenhum tipo de subdivisão populacional, e pode envolver poliploidização, dentre outros eventos genéticos. BIBLIOGRAFIA Brooker, R.; Widmaier, E.P.; Graham, L.E.; Stiling, P.D. Biology. 3 ed. McGraw-Hill, 2010. Campbell, N.A. et al. Biology. 5 ed. Benjamin/Cummings, 1999. Campbell, N., et al. Biologia. 8 ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. Freeman, S.; Herron, J.C. Análise evolutiva. 4 ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2009. Freeman, S.; Allison, L.; Quillin, K. Biological Science. Pearson, 2014. Futuyma, D.J. Evolução. 2 ed. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética,