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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Economia Modelo de Concessão Ferroviário: uma análise do impacto no desenvolvimento pós-desestatização Luiz Fernando de Figueiredo Talvik Campinas 2014 Luiz Fernando de Figueiredo Talvik Modelo de Concessão Ferroviário: uma análise do impacto no desenvolvimento pós-desestatização Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Graduação do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Bacharel em Ciências Econômicas, sob orientação do Prof. Dr. Ana Lucia Gonçalves da Silva. Campinas 2014 TALVIK, Luiz Fernando de Figueiredo. Modelo de Concessão Ferroviário: uma análise do impacto no desenvolvimento pós-desestastização. 2014. 51 páginas. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Instituto de Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014. RESUMO Este trabalho tem como objetivo analisar a evolução do sistema ferroviário após sua desestatização e qual foi a influência dos contratos e modelos de concessão em seu desenvolvimento. A desestatização, que se iniciou em 1996, levou a uma série de avanços econômicos no setor, mas por outro lado, é possível constatar uma série de distorções, como a baixa concorrência, abandono de alguns trechos da malha ferroviária e pela falta de integração entre eles. Por esses motivos, serão analisados o processo histórico que levou a desestatização, o modelo de concessão ferroviário, as principais concessionárias, artigos fundamentais do contrato de concessão e o desenvolvimento após a desestatização. Palavras-chave: Brasil. Sistema Ferroviário. Modelo de Concessão. ABSTRACT This work aims to analyze the evolution of the railway system after its privatization and what was the influence of contracts and concession models in their development. The privatization, which began in 1996, led to a series of economic advances in the industry, but on the other hand, there appears a series of distortions such as low competition, abandoning some parts of the railway network and the lack of integration between the rail network. For these reasons, the historical process will be analyzed which led to privatization, the rail concession model, the main concessionaires, fundamental articles of the concession contract and the development after privatization. SUMÁRIO CAPÍTULO 1 – A DESESTATIZAÇÃO DAS FERROVIAS BRASILEIRAS........3 1.1 1ntrodução.............................................................................................................................................3 1.2 A situação das ferrovias pré-desestatização.......................................................................................8 1.3 Motivos para a desestatização das malhas ferroviárias brasileiras................................................14 1.4 Modelos de concessão..........................................................................................................................17 1.5 O processo de desestatização........................................................................ ......................................21 1.6 ANTT, o órgão regulatório..................................................................................................................25 CAPÍTULO 2 – DESENVOLVIMENTO DO SETOR FERROVIARIO PÓS- DESESTATIZAÇÃO..................................................................................................27 2.1 Principais ferrovias e suas concessionárias.......................................................................................27 2.2 Contratos de concessão e metas.................................................................................. .......................31 2.3 Investimentos realizados pós-desestatização.....................................................................................36 2.4 Cenário ferroviário pós-desestatização..............................................................................................39 CONCLUSÃO..............................................................................................................43 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................46 3 1. A DESESTATIZAÇÃO DAS FERROVIAS NO BRASIL 1.1 Introdução No ano de 1852, o governo imperial concedeu ao Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, permissão para construir a primeira ferrovia do Brasil, que partia da cidade do Rio de Janeiro. Ela foi inaugurada em 30 de abril de 1954, ligando o Porto da Estrela até a Raiz da Serra, totalizando 14,5 km. Após a inauguração da Estrada de Ferro Petrópolis, outras companhias ferroviárias expandiram a malha ferroviária por 22 dos 26 estados atuais do país. Assim, em 1854 o Brasil, que detinha aproximados 14,15 km de ferrovias em 1870, saltou para 1.011,7 km de malha ferroviária, um crescimento expressivo em menos de duas décadas, sendo empresas inglesas as grandes responsáveis por este rápido crescimento. No ano de 1877 os trilhos da Estrada de Ferro São Paulo se uniram com os da Estrada de Ferro Dom Pedro II, fazendo a ligação Rio-São Paulo e unindo as duas cidades mais importantes do Brasil. O crescimento da malha ferroviária nacional continuou acelerado, sendo que em 1889 as ferrovias estavam com aproximados dez mil quilômetros. No início do século XX, o governo federal fica responsável por ampliar parte da malha e também assume outras malhas que antes pertenciam a empresas estrangeiras, chegando a aproximadamente 29 mil km em 1922 (ANTT). Mas é nessa década que o transporte ferroviário, antes o principal modal de transporte de cargas, começa a perder o seu lugar para o modal rodoviário. A década de 1950 trouxe o crescimento da indústria automobilística e rapidamente o modal rodoviário começa a ganhar expressão mediante as ferrovias. Com isso, as deficiências da rede ferroviária começam a aparecer e o governo, na tentativa de evitar falências, estatiza várias companhias. As ferrovias tinham grande extensão, sofriam forte regulação estatal e seu sistema 4 de tarifas baseava-se no valor das mercadorias transportadas. Em contrapartida, o modal rodoviário tinha pouca intervenção estatal, fretes baseados nos custos e possibilidade de transportar em uma escala menor, fatores estes relevantes na concorrência entre os modais. Em 1957, a Rede Ferroviária Federal S.A foi criada, uma empresa de economia mista que tinha como objetivo administrar as 18 malhas nacionais. Nos anos seguintes ela apresentou um resultado satisfatório, mas com o avanço do modal rodoviário, ocorreram substanciais quedas. Isso se deve à maior flexibilidade e aos custos artificialmente mais baixos da modal rodoviário em relação às ferrovias. As rodovias possuem menores custos de implantação e manutenção, o que a levaram a conquistar o mercado. Na década de 1970 e 1980 o Brasil passa por uma série de crises econômicas, agravadas pelo contexto internacional, pressão por recursos fiscais compensatórios e principalmente a crise do petróleo, o que levoua uma escassez de recursos para investir na malha ferroviária. “A drástica redução da poupança pública nos últimos quinze anos inibiu e inibirá ainda, no médio prazo, a capacidade de investimento público, o que levou o país a uma crescente deficiência da infraestrutura.” (MARQUES, 2006) Ademais, há problemas estruturais como dependência externa de investimento, falta de planejamento que considere a organização do território (a maior parte do investimento ferroviário foi voltado para atender as exportações) e prioridade dos interesses privados sobre o da coletividade (VENCOVSKY, 2006). Como consequência, ocorreu a degradação de algumas linhas e materiais rodantes e o setor passa então a apresentar dívidas. No final da década de 1980, a malha ferroviária havia se reduzido para 30 mil km. Diante dessa situação, o Governo Federal decide pela privatização das linhas férreas (IPEA, 2010). 5 "De 1980 a 1992, os sistemas ferroviários pertencentes à Rede Ferroviária Federal S.A. – RFFSA e à FEPASA – Ferrovia Paulista S.A., foram afetados de forma dramática, quando os investimentos reduziram-se substancialmente, atingindo, na RFFSA em 1989, apenas 19% do valor aplicado na década de 1980. Em 1984, a RFFSA, encontrava-se impossibilitada de gerar recursos suficientes à cobertura dos serviços da dívida contraída." (DNIT, 2009) O processo de privatização das estatais começou de uma forma inexpressiva durante a década de 1980, no governo Figueiredo, com a atuação do Ministério da Desburocratização, que tinha como objetivo reduzir o impacto da estrutura burocrática brasileira. Mas somente na década de 1990 esse movimento ganha força, impulsionado pela globalização e a influência do movimento liberal na política brasileira. "No Brasil, a globalização veio acompanhada de uma mudança no papel do Estado, que até então era o maior agente de mudanças. A partir dos anos 1990, com as políticas neoliberais e a abertura dos mercados, o papel do Estado não é mais o mesmo, compartilhando com outros agentes, do mercado e da sociedade civil organizada, a responsabilidade pelas principais decisões econômicas, políticas e sociais e, portanto, pelo ordenamento territorial". (VENCOVSKY, 2006) Devido à crise financeira, à divida e ao déficit na década de 1980, o Brasil aumentou sua dependência externa. Instituições financeiras como o FMI e o Banco Mundial, que são dominadas pela política norte-americana, passam a exercer influência na política brasileira, apresentando, como solução para os problemas econômicos, o neoliberalismo (MARTIN, 2002). 6 Essa resposta vem em um pacote de medidas políticas chamado Consenso de Washington, dirigido principalmente aos países da América Latina, que reúne um conjunto de regras que visavam promover o ajuste macroeconômico necessário. Redução dos gastos públicos, disciplina fiscal, abertura comercial e privatização das estatais eram os principais pontos. Essas medidas contribuíram para o investimento insuficiente no sistema ferroviário brasileiro, e consequentemente seu declínio, e apresentavam a privatização como o único caminho para a decadência ferroviária e desse modo atender às novas necessidades do momento e das empresas. "Os programas de estabilização do FMI e os programas de ajuste estrutural do Banco Mundial contribuíram para a inabilidade dos governos de investir o suficiente em ferrovias e em outras áreas dos serviços públicos, já que aquelas instituições insistiam que a despesa pública devia ser reduzida em vez de aumentada. As mesmas instituições insistiram na privatização como uma condição do seu apoio para organizar investimento para superar os problemas que elas mesmas tinham ajudado a criar”. (MARTIN, 2002) A privatização tinha como objetivo aumentar o investimento no sentido de recuperar, modernizar e ampliar a infraestrutura ferroviária, captar recursos privados a fim de alavancar o setor, desonerar o Estado dos gastos, de modo a melhor alocar seus recursos, e ainda melhorar a competitividade e eficiência do sistema. Desse modo se previa a capacitação da ferrovia para que pudesse adquirir um novo papel na matriz de transporte brasileira (CNT, 2009). A Lei n.º 8.031/90 instituiu o Programa Nacional de Desestatização - PND em 1990, sendo que com ela o setor ferroviário passou a integrar o programa em 1992 pelo Decreto n.º 473. O primeiro leilão ocorreu em 05/03/1996, sendo leiloada a malha da região oeste para a concessionária Ferrovia Novoeste S.A. e terminou em 1998 com o leilão da malha paulista, antes FEPASA. A antiga RFFSA se dividiu em 6 novas empresas privatizadas 7 por concessão de 30 anos, com possibilidade de prorrogação pelo mesmo período. A RFFSA ainda mantém o direito de propriedade da infraestrutura, mas agora as empresas privadas são responsáveis por administrar, renovar, operar e manter essa infraestrutura. No fim, o processo de privatização resultou em 11 malhas ferroviárias concedidas à iniciativa privada, que podem ser observadas no Mapa 1.1 MAPA 1 - Malhas ferroviárias operadas pela iniciativa privada Fonte: ANTF A RFFSA continuou existindo com o objetivo de gerir o patrimônio não- operacional (bens móveis e imóveis não arrendados às concessionárias), assim como os inúmeros processos judiciais cíveis e trabalhistas. Em 2007 ela deixou de existir como empresa. Atualmente há apenas alguns escritórios que são responsáveis pelo o inventário de seus bens. 8 1.2 A situação das ferrovias pré-desestatização Em 1981 o Brasil recorre ao FMI, passando então a praticar políticas ortodoxas com o objetivo de controlar a economia interna do país, a inflação galopante e o desequilíbrio interno. Com o empréstimo, o Brasil passa a seguir políticas ortodoxas do FMI, ocasionando uma grande redução dos gastos do Estado. Essa década é chamada por muitos economistas como a década perdida, na qual a economia sofreu uma grande retração da produção industrial e um baixo crescimento econômico. Com o objetivo de controlar a inflação, são lançados diversos planos sem sucesso, como o Plano Cruzado, Cruzado Novo, Bresser, Verão, Collor I e Collor II. Os problemas econômicos dessa época se arrastaram até o início da década de 1990 e afetando negativamente a estrutura do transporte nacional. Como é possível observar no Gráfico1, o corte no investimento ocorreu de forma brusca em 1982 e continuou caindo até 1995, quando ocorreu a desestatização. Gráfico 1 - Investimento Público em ferrovias (1980-1995) Fonte: IPEA – Reestruturação Financeira e Institucional do Sub-setor Ferroviário (2002) 9 Com a incapacidade do Estado de investir nas ferrovias estatais, elas passam a se deteriorarem e a ser depreciadas de forma significativa, afetando assim sua infraestrutura e a qualidade de seus serviços, gerando um sério desequilíbrio técnico-operacional. Já em 1984, a RFFSA passa a operar de forma deficitária, pois não era capaz de gerar recursos suficientes para cobrir os serviços da dívida contraída (DNIT, 2006). A extensão da malha da RFFSA era de aproximadamente 22 mil km, sendo sua maior parte com bitola de 1 metro e o restante de 1,60 metro. Já a FEPASA era composta de 4.186 km de trilhos com bitola de 1 metro, 1.463 km com bitola de 1,60 e 298 km de mista, totalizando 4.186 km. Os diferentes tamanhos de bitola adotados dificultavam a integração entre as ferrovias e elevavam os custos do transporte. Sua extensão abrange o estado de São Paulo, se integrando com a RFFSA e a EFVM pelo norte do estado (MG), o corredor Oeste-Leste. No oeste e sudoeste do estado, ela se conecta com o corredor de Paranaguá(MS) e o sistema hidroviário Tietê-Paraná (PR). No noroeste do estado, ela se conecta com as linhas FERRONORTE, o que permite acesso a Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Rondônia. TABELA 1 - Ferrovias: Tamanhos de bitola (1994) (em km) Empresa 0,6 0,76 1,00 1,35 1,60 Mista (1,0/1,6) Total RFFSA 0 13 20.286 0 1.770 0 22.069 FEPASA 0 0 2.508 0 1.463 298 4.186 Outras 33 0 995 194 2.354 0 3.576 Total 33 13 23.789 194 4.398 274 29.831 Fonte: ANTT - Adaptada Analisando a situação financeira apresentada na Tabela 2, pode-se observar que há uma redução das receitas da RFSSA de 42%, passando de 936,7 milhões de reais para 594,9 milhões. As despesas operacionais não acompanharam essa redução, passando de 961,4 para 755,5 milhões. Isso se deve ao fato de a maior parte dos gastos operacionais decorrer de gastos com funcionários. Em 1989, as despesas com pessoal representavam cerca de 70,6% do total das despesas operacionais. Nessa época, a RFFSA contava com cerca de 10 59 mil funcionários. Mesmo com uma redução no quadro de funcionários, passando para 45 mil em 1994, as despesas com pessoal continuaram em um patamar elevado, representando certa de 58% das despesas operacionais. TABELA 2 - RFFSA - Indicadores 1989 - 1994 Discriminação 1989 1990 1991 1992 1993 1994 Receitas operacionais (milhões R$) 936,7 686,4 681,7 748,8 666,9 594,9 Despesas operacionais (milhões R$) 961,4 780,2 738,0 729,4 842,7 755,5 Resultado Operacional - 24,7 - 93,8 - 56,3 19,4 - 175,8 - 160,6 Número de empregados 59.130 56.281 51.158 48.550 46.911 45.355 Desp. Pessoal / receita oper. (%) 72,5 74,3 64,9 63,6 81,5 73,8 Desp. Pessoal / despesa oper. (%) 70,6 65,3 60,0 60,1 64,5 58,1 Fonte : RFFSA elaborada Marques (1996) - Adaptada A situação da FEPASA, apesar de melhor, não é muito diferente da RFFSA. No mesmo período, a receita operacional recuou em 37,3%, passando de 282 milhões para 176,9 milhões de reais. Em 1991 as despesas operacionais passam a superar a receita, gerando assim um resultado negativo de 22,8 milhões. Também ocorreu uma redução no quadro de funcionários com objetivo de reduzir as despesas, passando de quase 17 mil funcionários para 15.570. Os gastos com pessoal representavam cerca de 60% das despesas operacionais. TABELA 3 - FEPASA - Indicadores 1989 - 1994 Discriminação 1989 1990 1991 1992 1993 1994 Receitas operacionais (milhões R$) 282,0 300,9 207,8 228,7 199,2 176,9 Despesas operacionais (milhões R$) 237,1 250,8 230,6 230,0 207,6 183,0 Resultado Operacional 44,9 50,1 - 22,8 - 1,3 - 8,4 - 6,1 Número de empregados 16.747 16.732 16.595 1.629 15.797 15.570 Desp. Pessoal / receita oper. (%) 50,6 47,1 62,3 62,1 66,9 62,2 Desp. Pessoal / despesa oper. (%) 60,2 56,5 56,1 61,7 64,2 60,1 Fonte : FEPASA elaborada Marques (1996) - Adaptada 11 A evolução do transporte de carga no período manteve-se estável no período que precede a desestatização. Em 1989 a RFFSA transportava cerca de 37.600 milhões de TKU, passando para 39.200, um aumento de 4,2%. No entanto, na FEPASA, mesmo com sua localização estratégica entre o norte, sul e o interior do país, se situando na região mais desenvolvida do país, com acesso para o mar e países do Mercosul, ocorreu uma redução. Em 1989, ela transportou 7.100 milhões de TKU e em 1994 6.400 milhões de TKU. TABELA 4 - Transporte Ferroviário de Cargas 1989 - 1994 (em milhões de TKU) RFFSA FEPASA Total 1989 37.600 7.100 44.700 1990 34.600 6.500 41.100 1991 36.400 6.300 42.700 1992 37.000 6.500 43.500 1993 39.500 7.000 46.500 1994 39.200 6.400 45.600 Fonte: Marques (1996) - Adaptada O transporte ferroviário compõe-se basicamente da movimentação de cinco grupos de produtos: minérios de ferro, granéis agrícolas para exportação, combustíveis, produtos siderúrgicos e cimento. Na maioria dos sistemas ferroviários dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, esses cinco grupos de produtos são os principais produtos transportados. No entanto, há uma concentração muito maior no sistema ferroviário brasileiro. Eles representam cerca de 90% do total transportado, sendo que nos outros países a média fica em torno de 70% (MARQUES, 1996). Os principais produtos transportados pela RFFSA eram minérios de ferro (43,2%), derivados de petróleo (11,9%), cimento (7,7%), farelos (6,5%) e produtos siderúrgicos (6,1%). O minério de ferro é um dos principais produtos exportados, representando 50% do transportado, é voltado principalmente para a exportação. Cerca 74% do minério total transportado pela RFFSA é destinado para a exportação. Essa concentração de produtos transportados também ocorre se analisarmos os clientes da RFFSA. 12 "A concentração do tráfego em poucos segmentos do mercado de transportes, ou em alguns fluxos desses segmentos, é salientada ainda pelo fato de apenas 20 clientes reunirem 70% da produção e 72% da receita da RFFSA." (MARQUES, 1996) TABELA 5 - RFFSA - Principais Mercadorias 1991 - 1996 (média) Mercadoria TKU (em milhões) Participação (%) TU (em milhões) Participação (%) Minério de ferro 16446,5 43,2% 38,7 38,7% Derivados de petróleo 4545,7 11,9% 9,6 9,6% Cimento 2944,8 7,7% 5,9 5,9% Farelos 2476,4 6,5% 6,1 6,1% Produtos siderúrgicos 2308,1 6,1% 8,6 8,6% Soja 1546,4 4,1% 3,3 3,3% Álcoois 1327,3 3,5% 2,0 2,0% Adubos 1041,1 2,7% 3,0 3,0% Calcários 928,3 2,4% 5,0 5,0% Trigo 649,7 1,7% 2,0 2,0% Minérios diversos 625,7 1,6% 1,5 1,5% Carvão mineral 411,7 1,1% 4,6 4,6% Outros 2797,6 7,4% 9,7 9,7% Total 38049,2 100,0% 100,0 100,0% Fonte : RFFSA elaborada Marques (1996) Assim como a RFFSA, a FEPASA é uma ferrovia predominantemente de cargas, o transporte de cargas representa cerca de 95% do faturamento total da empresa. Como é possível observar na Tabela 6, também ocorre uma concentração dos produtos transportados: cerca de 85% do total transportado vem de um pequeno número de produtos. Os derivados de petróleo e o álcool automotivo têm uma participação de 39,5%, os produtos agrícolas 24%, minérios 18% e cimento 4,7%. 13 É importante destacar que ocorre uma concentração dos clientes da FEPASA: "A concentração apontada é ainda salientada pelo fato de apenas 26 clientes reunirem 80% da produção e 84% da receita de transporte da FEPASA em 1993. Desses clientes, sete são ligados à distribuição de derivados de petróleo e representam 38% do total do transporte de cargas." (MARQUES, 1996). TABELA 6 - FEPASA - Principais Mercadorias 1991 - 1996 (média) Mercadoria TKU (em milhões) Participação (%) TU (em milhões) Participação (%) Derivados de petróleo 1850,5 28,1% 4,5 24,2% Álcool 746,9 11,4% 3,3 17,7% Fosfato 694,410,6% 1,1 5,9% Soja 599,2 9,1% 1,0 5,4% Farelos 509,2 7,7% 1,1 5,9% Bauxita 342,7 5,2% 1,3 7,0% Cimento 306,3 4,7% 1,5 8,1% Açúcar 244,3 3,7% 0,5 2,7% Trigo 227,1 3,5% 0,7 3,8% Calcário 157,0 2,4% 0,7 3,8% Adubos 126,6 1,9% 0,3 1,6% Outros 772,9 11,8% 2,6 14,0% Total 6577,1 100,0% 18,6 100,0% Fonte : FEPASA elaborada Marques (1996) 14 1.3 Motivos para a desestatização das malhas ferroviárias brasileiras Assim como os outros processos de desestatização, a ferrovia teve as diligências do BNDES, mas, devido ao grande volume de pendências e restrições técnicas e jurídicas, foi necessário contratar dois trabalhos: o primeiro, com o objetivo de propor o modelo de desestatização; e o segundo sendo responsável pela avaliação econômico-financeira. Os principais motivos apontados no artigo “O Processo de Desestatização da RFFSA: Principais Aspectos e Primeiros Resultados” (SOUZA & PRATES, 1997) são: • As projeções preliminares de resultados indicavam que o potencial de geração de caixa dos ativos da RFFSA era reduzido em face do valor do investimento neles realizado, devido à carência de recursos para a sua manutenção e modernização, o que comprometia o desempenho operacional da empresa. • O valor econômico da RFFSA, em seu status quo, era negativo, pois as projeções de recursos gerados pela operação eram inferiores ao montante estimado da dívida, de aproximadamente R$ 3 bilhões, boa parte dela vencida ou a vencer em curto prazo e junto a entidades da administração direta e indireta do governo federal. • Não se vislumbrava a possibilidade de equacionamento dessa dívida a médio prazo, capaz de melhorar a estrutura de capital da empresa e viabilizar um valor econômico positivo para sua privatização. • Parte relevante desse endividamento, cerca de R$ 1 bilhão, correspondia a passivos trabalhistas, cuja comprovação era considerada difícil por auditoria. O acompanhamento de processos judiciais da RFFSA é descentralizado, pela própria estrutura da empresa, em todo o país. Com isso, muitas vezes ações com o mesmo fato gerador tinham decisões diferenciadas, tanto por serem julgadas por tribunais locais quanto pelo fato de a própria argumentação jurídica da empresa ser diferente. Além disso, o controle do andamento dos processos era precário, o que representava um fator 15 extremamente relevante, visto que a incerteza quanto ao potencial de valor dessa dívida certamente afastaria eventuais interessados na privatização, inviabilizando o processo. • O volume de ações judiciais contra a empresa acentuava-se diante do agravamento de suas dificuldades financeiras, prejudicando uma estimativa concreta do valor de seu endividamento em determinada data-base. • A RFFSA possui um volume de cerca de R$ 4 bilhões em ativos não- operacionais, basicamente estações ferroviárias desativadas, terrenos, hortos florestais e imóveis diversos. Esses ativos estão em praticamente todo o território nacional e sua avaliação provavelmente demoraria vários anos. A maior parte deles não tinha sua documentação regularizada, devido ao próprio processo de formação da RFFSA, fruto de uma fusão de ferrovias privadas, algumas existentes desde o século passado. Se o modelo de privatização fosse o tradicionalmente adotado no PND, esses ativos deveriam ser avaliados para serem incluídos no cálculo do preço mínimo, o que delongaria o processo por muito tempo. Além disso, os objetivos pretendidos de melhorar o serviço de transporte de carga seriam desvirtuados, uma vez que a maior parte do valor da empresa viria justamente dos ativos não-operacionais, atraindo um público mais interessado em administração de imóveis que em operar eficientemente o serviço. • A configuração operacional da malha ferroviária da RFFSA - estendendo-se por 22 mil quilômetros, do Maranhão até o Rio Grande do Sul -, por si só, dificultava uma administração eficiente e integrada, resultando em permanente conflito entre interesses e peculiaridades locais com os interesses da administração central da empresa. Ademais, o resultado da privatização poderia ser potencializado com a licitação independente de diversos trechos ferroviários, tanto para atrair os interessados apenas em determinados trechos quanto para melhorar sua atratividade comercial, explorando as sinergias existentes. • A malha da Rede Ferroviária Federal é interrompida no Estado de São Paulo, onde também opera a Fepasa. Apesar de a RFFSA ter firmado convênios de tráfego mútuo com essa empresa, o acesso às linhas de ambas não se dava 16 de maneira eficiente, o que causava insegurança aos potenciais interessados. • Existem duas bitolas (distância entre os eixos dos trilhos) na malha da RFFSA: a de 1 m, denominada bitola métrica, que constitui a maior parte da via, e a de 1,60 m, conhecida como bitola larga. Essa é uma dificuldade adicional para o intercâmbio de cargas, pois uma composição que circula numa bitola não pode circular em outra diferente. Uma operação de transbordo de cargas eficiente pode superar essa dificuldade, mas, de qualquer forma, ocorrem perdas na eficiência do transporte. • A RFFSA operava, em pequena escala, o transporte de passageiros de média distância. Em 1994, a receita apurada com esses serviços foi de cerca de 0,5% do faturamento total da empresa, sem contar o transporte urbano de passageiros, que foi transferido à CBTU, atualmente em processo de estadualização. Historicamente, o transporte ferroviário de passageiros é um serviço deficitário, de pouca atratividade para a iniciativa privada. • A RFFSA era estruturada em 12 superintendências regionais (SR) e a administração geral. Cada superintendência operava, na prática, como uma empresa independente, visto que tinha estruturas administrativa, comercial, operacional, jurídica e de manutenção próprias. Esses foram os principais pontos utilizados na elaboração do modelo de desestatização da ferrovia nacional. O modelo foi aprovado em 1993 pela Comissão Diretora do Programa Nacional de Desestatização e, por fim, ratificado pelo CND. Pretendia-se, dessa forma, melhorar a qualidade da qualidade do serviço público de transporte ferroviário de carga, de modo a otimizar a matriz de transportes do país, atualmente direcionada ao setor rodoviário. 17 1.4 Modelos de concessão Segundo Benini (2012), há três principais modelos em que a indústria ferroviária pode se organizar. O primeiro modelo, utilizado no caso brasileiro, seria o da estrada de ferro verticalmente integrada. Nesse caso uma firma controla a infraestrutura, a operação e a comercialização. As ferrovias podem ser tanto públicas quanto privadas, e também separadas por regiões. Esse modelo foi adotado nas ferrovias públicas da Europa, e também nas malhas separadas por região nos EUA, Brasil e Japão. “Os pontos positivos deste modelo são: permite um planejamento integrado das operações, facilita o planejamento dos investimentos de longo prazo e reduz os custos de transação. Já os pontos negativos são: falta de resposta às demandas de mercado, falta de incentivo para reduzir as ineficiências, o que gera resultados financeiros fracos.” (BENINI, 2012) O segundo modelo seria o da abordagem interna. Nesse modelo, as ferrovias são separadas em divisões de acordo com o tipo de produto e região onde irá atuar, portanto não há competição entre as divisões. Se uma divisão utiliza os ativos de outra divisão, ela deve remunerá-la. A desvantagem desse modelo seria a falta de competição na operação das malhas. O terceiro modelo é o da estrada de ferro verticalmente separada. Toda a infraestrutura é de responsabilidade de uma única firma, que pode ser pública ou privada. Osoperadores de transporte pagam uma taxa pela utilização da infraestrutura, de modo que diferentes empresas podem operar sobre uma mesma infraestrutura, gerando assim maior competitividade e eficiência para atender às necessidades de mercado. Como mencionado anteriormente, o modelo adotado na desestatização ferrovia brasileira foi o da estrada de ferro verticalmente integrada. Assim a inclusão da RFFSA no PND seguiu o modelo de concessão que foi indicado 18 pelo BNDES. As doze superintendências foram divididas em seis malhas: a malha Nordeste, Oeste, Centro-leste, Sudeste, Teresa Cristina e Sul. Elas foram leiloadas juntamente com os bens de pequeno valor para compradores pré-conhecidos, com um prazo de concessão de 30 anos, podendo ser prorrogado pelo mesmo período. Os editais de licitação das seis maiores malhas continham um novo conceito de obrigações e metas que deveriam ser cumpridas pelas concessionárias. Para atrair as empresas, o modelo não exigia nenhum investimento pré-definido. O objetivo era estimular o investimento pelas metas de desempenho. Desse modo, para que as metas fossem atendidas, as concessionárias eram livres para decidir como investir na malha sob sua administração. Isso parte do pressuposto que a iniciativa privada sabe identificar o melhor caminho para prestar o serviço com qualidade sem perder a rentabilidade (SOUZA & PRATES, 1997). Foram escolhidas duas metas de desempenho, que deveriam ser atendidas constantemente, para acompanhar a qualidade da prestação de serviço por parte das concessionárias. Foi determinado que as malhas ferroviárias deveriam aumentar o volume transportado e reduzir os acidente. Cada meta foi determinada de acordo com as especificidades de cada malha e de seu desempenho operacional projetado. Apesar de não haver nenhuma imposição formal de investimento, era esperado um grande volume de investimentos das concessionárias para a recuperação das malhas ferroviárias, melhorias e modernização dos ativos operacionais para o cumprimento das metas de desempenho e, principalmente, dar rentabilidade ao negócio. “O aumento previsto da participação da ferrovia na matriz de transporte do país trará reflexos diretos na economia de combustível, redução no número de acidentes e descongestionamento das rodovias. Além do mais, espera-se que uma ferrovia eficiente proporcione melhorias nas condições de infraestrutura e transporte, reduzindo o custo-Brasil. Com isso, 19 haverá um efeito multiplicador em diversos outros setores da economia, com a viabilização econômica de novos negócios e melhoria na rentabilidade dos demais setores ligados à ferrovia, gerando novos investimentos e empregos.“ (SOUZA & PRATES, 1997) Isso pode ser observado no art. 1° da Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990, que instituiu o PND: Art. 1° - É instituído o Programa Nacional de Desestatização, com os seguintes objetivos fundamentais: I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público; II - contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público; III - permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada; IV - contribuir para modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia; V - permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais; VI - contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa. 20 O modelo de concessão ferroviário foi feito por meio de leilão por licitação. As concessionárias assumiriam o serviço de transporte ferroviário, antes público, pelo período de 30 anos, também o arrendamento dos ativos operacionais e vendas dos bens de pequenos valores. Os bens de pequenos valores eram constituídos por bens mobiliários, veículos de apoio e linhas telefônicas. Esses bens foram vendidos por se tratarem de materiais cujo custo, caso fossem arrendados, seria maior que seu próprio valor. Além disso, eles seriam substituídos pelas concessionárias com o passar do tempo. Cada malha regional passou a constituir uma unidade de negócio independe e autossuficiente. O endividamento da empresa estatal não seria repassado à iniciativa privada, os ativos não-operacionais seriam administrados pela estatal, desse modo auferindo receita sobre eles e amortizando essa dívida. Também foi necessária a criação de uma entidade que ficaria encarregada de fiscalizar as concessionárias e resolver problemas de caráter administrativo entre elas, usuários e o Estado. Desse modo o licitante vencedor passaria a ser o titular do direito de prestar o serviço público, que é a concessão. 21 1.5 O processo de desestatização Na década de 1990, a Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) estava inserida em uma grave crise financeira, necessitando de grandes volumes de recursos para o adequado funcionamento das suas operações, a manutenção dos equipamentos e o pagamento das dívidas contraídas. Nesse contexto, ela foi incluída no Programa Nacional de Desestatização (PND), pelo decreto n.º 473, de 1992. Segundo Durço (2011), por ser o primeiro setor público a integrar o PND, o processo trazia diversas incertezas de ordem política e jurídica, principalmente sobre a repercussão que ocorreria em torno da redução do quadro de funcionários. A RFFSA possuía um quadro de empregados superdimensionado. Com a desestatização, deveria ser reduzido para torna-la rentável. Outro problema era a legislação sobre a concessão do serviço público. Ela estava apenas começando e os contratos eram de longos prazos, o que poderia ser um risco para as concessionárias. Esse risco foi afastado com as Leis 8.987 e 9.074 de 1995. Ambas tratavam sobre o regime de concessão e a permissão do serviço público. “A desestatização da RFFSA sofreu grande impulso após a nomeação, em abril de 1995, da atual diretoria, que se mostrou intensamente colaborativa e participativa. Na gestão dessa administração, foi elaborado um programa de desligamento de pessoal. A maior vantagem para as concessionárias é que foram reduzidos os gastos em incentivos à demissão no início da operação, o que melhorou substancialmente a atratividade do negócio. “ (SOUZA & PRATES, 1997) Essa mesma diretoria negociou um empréstimo com o Banco Mundial com o propósito de financiar um programa de reestruturação pré-privatização. Esse programa tinha como objetivo recuperar parte da malha ferroviária, para 22 torná-la mais atrativa ao setor privado. Devido ao longo processo de negociação, o financiamento só ocorreu depois que algumas ferrovias já tinham sido privatizadas. Como parte da malha já estava sobre administração privada, não havia a necessidade de utilizar o empréstimo nelas. O valor não utilizado pode ser aplicado na Malha Nordeste, que apresentava os ativos em pior estado de conservação e de atualização tecnológica, em uma região de menor densidade econômica. Esse fato criou a oportunidade para o desenvolvimento da malha. O Projeto Nordeste tinha como objetivo a recuperação do material de tração, modernização do sistema de telecomunicações e licenciamento e melhoria da via permanente. A RFFSA consistia uma única malha ferroviária que possuía 22 mil km de extensão. Ela foi dividida em seis malhas. Um dos fatores levado em conta para fazer essa separaçãofoi a existência da Fepasa. Ainda não era cogitada a sua privatização. Isso levou a divisão de trechos da RFFSA que se conectavam apenas pela Fepasa, sendo divididos conforme descritos a seguir. A malha sul foi composta pela SR-5 com sede em Curitiba, SR-6 em Porto alegre e SR-9 em Tubarão, sendo essa última parte da Estrada de Ferro Tereza Cristina, todas elas localizadas ao sul da FEPASA. A SR-10, localizada em Bauru, deu origem à malha Oeste na Região Noroeste da FEPASA. Já a malha Sudeste foi composta pelas SR-3 (Juiz de Fora) e SR-4 (São Paulo), presentes a nordeste da FEPASA. A malha Centro-Oeste foi composta pelas SR-2 (Belo Horizonte), SR-7 e SR-8 (Campos, no Rio de Janeiro) e a malha Nordeste formada pelas SR-1 (Recife), SR-11 (Fortaleza) e SR-12 (São Luis). 23 Tabela 7 – Malhas Regionais Fonte: BNDES Mapa 2 - Superintendências Regionais Fonte : ANTT 24 As seis malhas foram transferias para o setor privado por meio de leiloes públicos. A primeira malha leiloada foi a da malha oeste, o que ocorreu no dia 5 de março de 1995, e a última malha, Malha Nordesta da RFFSA, foi leiloada no dia 18 de julho de 1997. O total arrecadado foi de R$ 1,5 bilhão. E assim terminou o processo de desestatização da RFFSA, mas não do setor. Ainda havia a Ferrovia Paulista S.A. (Fepasa), empresa pertencente ao Estado de São Paulo, que se encontra em fase de federalização para posterior desestatização (BNDES). Tabela 8 - Malhas ferroviarias desestatizadas e valor apurado no leilão (em milhões de reais) Malhas regionais Data do leilão Extensão (km) Concessionária Valor apurado no leilão Oeste 05.03.96 1.621 Ferrovia Novoeste S.A. 62.360 Centro-Leste 14.06.96 7.080 Ferrovia Centro-Atlântica S.A. 316.900 Sudeste 20.09.96 1.674 MRS Logística S.A. 888.911 Tereza Cristina 26.11.96 164 Ferrovia Tereza Cristina S.A. 216.600 Sul 13.12.96 6.586 ALL 18.510 Nordeste 18.07.97 4.238 Companhia Ferroviária do Nordeste 15.800 Paulista 10.11.98 4.236 Ferrovias Bandeirantes S.A. 237.370 Total 25.599 1.756.451 Fonte: BNDES (1996) A Fepasa foi criada em 1971 e unificou as 5 ferrovias paulistas que totalizam 4,3 mil km. Em 1995 o governo paulista determinou um estudo com o objetivo de reestruturar a empresa para ser incluída no processo de desestatização. O processo foi finalizado em 1998, quando ela foi incorporada à RFFSA, sendo finalmente privatizada em 10 de novembro de 1998 (DURÇO, 2011). 25 1.6 ANTT, o órgão regulatório A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) é uma autarquia federal brasileira responsável pela regulação das atividades de exploração da infraestrutura ferroviária e rodoviária federal e da prestação de serviços de transporte terrestre. Em princípio, para apresentar os problemas decorrentes da privatização do setor ferroviário tem-se que apresentar o órgão regulatório e fiscal que acompanha esse modal e enfrenta os problemas que serão apresentados ao longo desse trabalho. A ANTT foi criada em 2001, por meio da Lei 10.233 do mesmo ano, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Seu papel consiste na regulação e fiscalização dos transportes no setor rodoviário, ferroviário, dutoviário e intermodalidade no Brasil. Segundo o artigo 21 da Lei, trata-se de uma entidade integrante da Administração Federal indireta, vinculada ao Ministério dos Transportes e submetida ao regime autárquico especial, caracterizado pela independência administrativa, autonomia financeira e funcional e mandato fixo de seus dirigentes. Ainda seguindo as diretrizes da Lei 10.233 de 2001, a Agência tem como objetivo programar, dentro do seu perímetro de atuação, as políticas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte e pelo Ministério dos Transportes, segundo os princípios e as diretrizes estabelecidos na citada lei, e junto a isso supervisionar, também dentro de seu perímetro de atuação, as atividades de prestação de serviço e de exploração da infraestrutura de transportes, resultando em: • Garantia de movimentações de pessoas, bens, cumprindo os padrões de eficiência, segurança, conforto, regularidade, pontualidade e modicidade nos fretes e tarifas. • Harmonia, prezando o interesse público, os objetivos dos usuários, das empresas concessionárias, permissionárias, autorizadas e arrendatários, e de 26 entidades delegadas, arbitrando conflitos de interesses e impedindo situações que configurem competição “imperfeita” ou infração de ordem econômica. Sabendo o papel da ANTT na mediação entre o poder concedente e as concessionárias, pode-se, agora, discutir os problemas que a Agência enfrenta perante esse relacionamento econômico entre as duas partes. 27 2. DESENVOLVIMENTO DO SETOR FERROVIÁRIO PÓS- DESESTATIZAÇÃO 2.1 Principais ferrovias e suas concessionárias Após a total desestatização da RFFSA, observam-se alguns problemas a respeito da regionalização das malhas, ou seja, desde a existência da RFFSA as malhas eram especializadas somente para a região de localização (nichos comerciais), reduzindo a integração entre as malhas e dando a responsabilidade do transporte de longas distâncias ao modal rodoviário. Com essa regionalização, os esforços das concessionárias são direcionados apenas a alguns trechos de movimentações de interesse para a empresa, cumprindo todas as suas metas estipuladas em contrato (redução de acidentes, investimentos, produção) de forma direcionada a esses fragmentos da malha, levando todo o resto da infraestrutura cedida em concessão pelo governo ao total abandono. Como fator resultante da regionalização, tem-se ainda o caso do usuário cativo, que fica à mercê dos preços estipulados pela concessionária responsável pela sua região; ou precisa aceitar as altas taxas impostas ou escolher o modal rodoviário como solução logística. Na Tabela 9, observa-se essa relação entre os principais acionistas de cada concessionária com o produto transportado. É possível destacar o caso da MRS Logística S.A, Seus principais acionistas são a CSN, Usiminas, MBR (Minerações Brasileiras Reunidas S.A.), Ferteco, Ultrafértil, Gerdau (Consigua). Todas ligadas ao ramo de mineração, com exceção da Ferteco, que é do ramo petroquímico. Como a própria concessionária era formada pelos principais clientes, há uma formação de um oligopólio privado, o que favoreceu a monofuncionalidade do sistema ferroviário, que tinha como objetivo atender às demandas e necessidades de seus controladores. 28 TABELA 9 - Relação entre Concessionária e principal produto transportado Empresa Original Concessionária Sócios Principal produto transportado Participação sobre total (%) RFFSA Malha Sul ALL - América Latina Logistica do Brasil S.A. Varbra, Railtex Intl Holding Inc., Ralph Partners, Jurori, Interférrea soja/farelo de soja/derivados de petróleo 21/10/9 RFFSA Malha Sudeste MRS Logistica S.A CSN, Usiminas, MBR, Ferteco, Cosígua, Ultrafértil, Celato minério de ferro/produtos siderurgicos 86/5 RFFSA Malha Tereza Cristina FTC - Ferrovia Tereza Cristina S.A. Banco Interfinance, Geemon, Santa Lúcia, Ago- Indústria e Com. carvão mineral 99 RFFSA MalhaNordeste CFN - Companhia Ferroviaria do Nordeste Taquari Participações,CVRD e CSN derivados de petróleo/cimento/ferro gusa 18/13/6 RFFSSA Malha Centro- Leste FCA - Ferrovia Centro- Atlântica S.A. Mineração Tacumã, Ralph Partners, Varbra, Judoria, Railtex Intl Holdin Inc., Tupinambaran, Interférrea, CSN farelo de soja/soja/calcário siderúrgico 17/13/13 RFFSA Malha Paulista Ferroban - Ferrovias Bandeirantes S.A. Funcef, Previ, CapMelissa, Chase, Shearer, Logística Bandeirantes Participações bauxita/derivado de petróleo/soja 5/39/17 RFFSA Malha Oeste Ferrovia Novoeste S.A. Noel Group, Brazil Railpartners, Western Rail Investors derivados de petróleo/soja/ minério de ferro 22/20/18 Fonte: BNDES e Vencovisk (2006) - Adaptada 29 "Após 15 anos do início da desestatização, o monopólio estatal foi substituído por um oligopólio privado, favorecendo a monofuncionalidade do sistema e o transporte de alto desempenho para atender, em grande parte, as necessidades dos controladores das ferrovias. No caso da Vale e da CSN, essa prática se verifica diretamente com a prioridade de transporte de minério de ferro e produtos siderúrgicos, respectivamente. No caso da ALL, que não tem produtos próprios para transportar, essa relação se estabelece por intermédio de contratos celebrados com as tradings agrícolas, a partir dos quais o transporte de produtos agrícolas para exportação se torna prioritário." (VENKOVSKY, 2011) Em 2011 se considerarmos a EFC - Estrada de ferro Carajás e a EFVM - Estrada de ferro Vitória Mina, a Vale tem controle de 57,7% do total transportado, em 9.096 km (31,7%) de ferrovia. A EFC transporta principalmente o minério de ferro. A movimentação de carga se dá quase que de forma exclusiva em um único sentido para os portos, podendo assim ser classificada como extrovertida e unidirecional. A EFC e a EFVM são consideradas de alto desempenho, podendo ser comparadas com as ferrovias mais modernas do mundo. A EFC foi inaugurada em 1985. Seu surgimento está ligado principalmente ao Projeto Grande Carajás, um projeto de exploração de minérios que se iniciou na década de 1980, na região entre o Pará, Tocantins e o Maranhão. A EFVM, criada em 1904, é utilizada pela Vale para transportar minérios provenientes do Quadrilátero Ferrífero. As duas representam cerca 6,1% do total da malha ferroviária com 1.790 km, transportando 53,09% do total. Por outro lado, as concessionárias controladas pela ALL - América Latina Logística possuem 12.955 km (45,2%), transportado apenas 11,56% do total nacional. 30 Tabela 10 - Empresas controladoras das concessionárias de ferrovias e sua participação no transporte de mercadoria Fonte: Vencovisk (2011) 31 2.2 Contratos de concessão e metas Para melhor compreender o desenvolvimento do setor ferroviário é necessário analisar os principais pontos do contrato de concessão e as obrigações impostas às concessionárias. Para cada malha foi estipulado um valor meta diferente, definido pelo governo em dois pontos principais: redução do índice de acidentes e aumento da produtividade. Quando o modelo de concessão das ferrovias foi elaborado, havia uma lógica política e econômica bem diferente da dos dias atuais. O objetivo principal da época era reduzir os gastos do Estado via transferências dos déficits das estatais para a iniciativa privada. Então, os contratos deveriam atrair o interesse privado e gerar os valores de arrendamento necessários para que o Estado conseguisse arrecadar o máximo possível (DURÇO, 2011). O texto seguinte, extraído do contrato de concessão da Malha Ferroviária Nordeste, ilustra como era a cláusula do aumento de produtividade e redução de acidentes. As metas no contrato eram estipuladas para os 5 anos seguintes à celebração do contrato, tendo as concessionárias a total liberdade de decidir como seria aplicado o investimento para atingi-las. Desse modo, há uma abertura para que as concessionárias investissem de uma forma que não era prevista no contrato. Fonte: Contrato de concessão Malha Nordeste 32 "Constata-se que o problema do risco moral também está presente nesse caso, pois vem induzindo as concessionárias a utilizarem apenas os trechos mais rentáveis da malha ferroviária, transportando majoritariamente a granel. Cumpre dizer que esse modelo não atende ao preceito de utilização de bem público para o qual a ferrovia foi concedida. Ainda nesse contexto, os mesmos contratos de concessão não estabelecem nenhum critério para fixação de metas, ou seja, não existe nenhuma qualificação do modo como essa meta é determinada". (DURÇO, 2011) A cláusula de redução de acidentes segue a mesma regra da anterior. É determinado um percentual de redução de acidentes para os 5 anos seguintes, sendo revisados os valores para os próximos períodos. A forma como esse valor seria revisado depois de 5 anos não é coberta pelo contrato, assim como a revisão das metas de produtividade. Fonte: Contrato de concessão Malha Nordeste Os contratos de concessão das ferrovias estabeleceram restrições mínimas e máximas das tarifas para a prestação do serviço de transporte ferroviário. Seu cálculo é feito sobre o volume e o tipo de produto, mas não há um detalhamento de como esse cálculo deve ser feito. Como os principais concessionários são os próprios usuários, é possível que a tarifa mínima tenha como objetivo impedir que se estabeleçam tarifas 33 muito baixas para si, e que, ao mesmo tempo, se mantenham tarifas elevadas para os outros usuários (DURÇO, 2011). Fonte: Contrato de concessão Malha Nordeste Outra cláusula importante no contrato que afeta diretamente o investimento realizado, é a décima-sexta cláusula, que trata do processo de reversão ao término do contrato. Ou seja, a concessionária fica impossibilitada de reaver os valores investidos. "Decorridos os primeiros quinze anos das concessões de ferrovias, parece haver pouco interesse da iniciativa privada na expansão da malha existente, uma vez que os investimentos realizados não são reversíveis ao final da concessão, válida por trinta anos e renovável por mais trinta anos. Além disso, os investimentos efetuados entre 1996 e 2010 concentraram-se na recuperação da malha existente, na aquisição de equipamentos de material rodante e na contratação e capacitação de mão de obra especializada, de forma que, nesse caso, o tempo necessário para os projetos de infraestrutura ferroviária parece ser insuficiente, se a renovação dos contratos não se confirmar com antecedência." (DURÇO, 2011) 34 Fonte: Contrato de concessão Malha Nordeste Um ponto importante, que não aparece no contrato, é sobre o abandono de malhas ferroviárias menos rentáveis, e sobre como elas devem ser devolvidas. Alguns trechos hoje se encontram em situação inferior ao momento da privatização. Segundo a ANTT, há 5.554 km de ferrovia nessa situação, 48,25% correspondem a ferrovias operadas pela ALL, 29,27%, pela Transnordestina Logística e 22,47%, pela Ferrovia Centro-Atlântica (FCA). Por fim, um ponto importante previsto no contrato refere-se ao compartilhamento da infraestrutura e recursos operacionais entre as concessionárias, o trafego mútuo e o direito de passagem. O direito de passagem e o trafego mútuo são caracterizados como obrigações das concessionárias de serviço de transporte ferroviário de carga e temcomo objetivo maximizar a eficiência do sistema ferroviário (DURÇO, 2012). No trafego mútuo, o transporte da carga é feito por uma concessionária até o ponto final de sua malha e onde inicia outra malha. A partir de então deve ser feito o transbordo da carga para dar continuidade ao transporte. No direito de passagem, a concessionária, mediante ao pagamento de uma tarifa, tem permissão de adentrar na outra malha ferroviária com sua própria tração. Segundo Durço (2012), a primeira opção é realizar o trafego mútuo e, na impossibilidade do mesmo, se dá o direito de passagem. É importante destacar que o direito de passagem é praticamente inexistente, devido aos valores elevados que são cobrados na tarifa. 35 Fonte: Contrato de concessão Malha Nordeste 36 2.3 Investimentos realizados pós-desestatização A partir de 1997 as concessionárias passam a investir pesado na revitalização da malha ferroviária. Com base no Gráfico 2, percebe-se que a participação de investimentos privados vem evoluindo ao longo dos anos de forma crescente, e em sentido oposto, com os investimentos do Estado perdendo progressivamente sua participação no total investido em ferrovias brasileiras. Fonte: ANTT (2012) De 1997 até 2011 foram investidos R$ 29,97bilhões, sendo que desse total 95% foram feitos pelas concessionárias e 5% pelo poder público. Com o desenvolvimento do setor ferroviário, a indústria nacional de material ferroviário voltou a surgir no cenário, gerando emprego, renda e alavancando a economia do país. Um dos principais gastos foi com a expansão da frota, de acordo com os dados da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer). No período de 1997 a 2011 foram fabricados 39.358 vagões, 2.853 carros de passeio e 310 locomotivas. 412 386 538 617 766 668 1.089 1.958 3.114 2.221 2.597 4.173 2.499 2.924 4.901 162 113 45 56 58 56 35 8 44 72 140 225 123 112 143 0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 Gráfico 2 - Investimentos nas Malhas Existentes concedidas à Iniciativa Privada (R$ Milhões) Estado União 37 Tabela 11 – Produção de material ferroviário (1997-2011) Ano Carros de passageiros Vagões Locomotivas 2011 336 5616 113 2010 430 3261 68 2009 438 1022 22 2008 447 5118 29 2007 283 1327 30 2006 113 3668 14 2005 179 7597 6 2004 45 4740 0 2003 79 2399 0 2002 218 294 5 2001 79 748 4 2000 62 1283 1 1999 98 1297 7 1998 46 869 9 1997 0 119 2 Fonte: ABIFER Estima-se que em 2011 tenham sido investidos aproximadamente R$ 100 milhões, segundo a Abifer, na produção de cinco mil vagões, o que representa um crescimento de 53%, quando comparado aos investimentos realizados no ano anterior. Sobre a produção de novas linhas, no Brasil existem dezesseis fábricas de dormente. Embora o país seja autossuficiente na produção de dormentes, importa da Europa e da China a totalidade dos trilhos. Estima-se que sejam necessários investimentos da ordem de R$ 1,5 bilhão para colocar em funcionamento uma fábrica de trilhos no Brasil. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) produzia trilhos no país até 1996, mas cancelou essas operações pela falta de demanda. Outro foco do investimento é na eliminação dos gargalos logísticos. Esse tipo de investimento é feito por meio da parceria do governo com a iniciativa privada na busca de maiores investimentos para eliminar estes problemas, gerando benefícios sociais além de redução de custos para os concessionários. 38 De acordo com a CNT (2011), um dos principais problemas a ser equacionado no sistema ferroviário brasileiro é a invasão da faixa de domínio, que consiste em construções em áreas muito próximas aos trilhos, que obrigam as locomotivas a reduzirem bruscamente sua velocidade, além do risco de acidentes, há um maior desgaste do material. O segundo problema grave seriam as passagens de nível em situação crítica. Passagem em nível é o cruzamento de uma ou mais linhas com uma rodovia principal ou secundária, no mesmo nível. Por último, há os gargalos físicos e operacionais. Isso ocorre quando veículos, pedestres e composições ferroviárias usufruem de uma mesma via, podendo causar congestionamentos e acidentes. 39 2.4 Cenário ferroviário pós-desestatização Entre 1997 e 2011 a produção ferroviária passou de 136 bi de TKU para 292 bi de TKU, um aumento de 87,5%. Os principais produtos transportados são o minério de ferro e o carvão mineral. Apenas esses dois produtos representavam aproximadamente 75% do total em 1997 e vem se mantendo estável em 2011. Pode-se assim concluir que não ocorreu uma diversificação dos produtos transportados, apesar do aumento da produção. A tonelada por km útil é um dos pontos de meta estabelecidos pelos contratos de concessão. Apesar de a produção ter quase que dobrado no período, segundo a ANTT, algumas companhias não conseguiram cumprir as metas em alguns anos, como a Ferroeste S.A, ALL Malha Oeste S.A. e a Transnordestina Logística S.A. Fonte: ANTT (2012) Analisando o Gráfico 4, a tonelada útil aumentou de 253 milhões de toneladas em 2007 para 475 milhões, um aumento 219 milhões, uma variação percentual de 117%. O minério de ferro e o carvão mineral têm a participação de 76,7% do total em 2011, chegando a 360 milhões. 111 111 107 118 122 125 136 155 165 184 200 208 185 213 22326 31 32 36 40 43 45 47 56 49 58 63 58 65 68 0 50 100 150 200 250 300 350 Gráfico 3 - Produção Ferroviária (Bilhões de TKU) Minério de ferro e Carvão Mineral Carga Geral 40 Fonte: ANTT (2012) Comparando o crescimento do PIB com o crescimento do transporte ferroviário de carga, pode-se observar que crescimento foi mais que o dobro do aumento do PIB. Isso demonstra que os investimentos foram fundamentais para o aumento da produtividade, que conseguiu manter um crescimento elevado. Fonte: ANTT (2012) 190 190 185 210 201 221 241 272 275 304 332 341 296 345 360 63 70 71 78 91 94 96 97 12 101 113 109 99 125 115 0 100 200 300 400 500 Gráfico 4 - Movimentação de Carga Transportada pelas Ferrovias (em milhões de TU) Minério de ferro e Carvão Mineral Carga Geral 100103,1101,2 112,1 117,9 122,3 132,3 147,6 161,2 169,3 187,6 197,3 177,4 203 211,7 104,6106 108,8110 116,3 120 124,8 132,4 139,2139,5 149,9 154 Ín d ic e Gráfico 5 - Comparativo do Transporte Ferroviario de Carga x PIB (Índice base 100 em 1997) TKU PIB 41 O Gráfico 6 trata dos índices de acidentes. O índice de acidentes é a segunda meta necessária para cumprir as obrigações contratuais. É possível observar um declínio acentuado entre 1997 e 2006, passando de 75,5 para 14,7. A partir desse momento o número se estabiliza nesse patamar, mantendo-se praticamente inalterado. Segundo a ANTT, a ALL Malha Oeste S.A. e a Transnordestina Logística S.A. não conseguiram a redução necessária para cumprir as metas contratuais. Fonte: ANTT (2012) Apesar dos altos investimentos para aumentar a produtividade, eficiência e redução de acidentes, segundo dados do IBGE, entre o período de 1996 a 2007 ocorreu uma redução da malha ferroviária. Em 2007 a malha ferroviária possuía cerca de 28,6 mil km, dos quais 5 mil km inoperantes (ANTT). 75,5 69,3 64,9 53,1 39,4 35,5 33,6 30,4 32,9 14,7 14,4 14,7 15,63 16,1 14,22 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Gráfico 6 - Índice de acidentes (acidentes por milhão trens.km) 42 Fonte: IPEADATAPode-se concluir que os investimentos foram focados nos trechos que mais interessavam as concessionárias como usuários, não tendo ocorrido uma diversificação dos produtos transportados ou um aumento da malha ferroviária. As metas de produção e redução de acidentes foram cumpridas em apenas alguns trechos. Os outros trechos, de menor importância econômica para as concessionárias, foram abandonados. 28.000 28.400 28.800 29.200 29.600 30.000 1 9 9 6 1 9 9 7 1 9 9 8 1 9 9 9 2 0 0 0 2 0 0 1 2 0 0 2 2 0 0 3 2 0 0 4 2 0 0 5 2 0 0 6 2 0 0 7 Gráfico 7 - Extensão da rede ferroviária Km 43 CONCLUSÃO Em contexto de grande desorganização econômica da RFFSA e da FEPASA, ineficiências operacionais e a incapacidade do Estado de realizar os investimentos necessários, o setor ferroviário passou a ser foco de discussões se era necessário privatizar, o que ocorreu na segunda metade da década de 1990. O principal objetivo, no momento que o modelo de concessão foi elaborado, partiu da premissa que era necessário reduzir as despesas do Estado, transferindo para a iniciativa privada as atividades que eram exploradas de forma ineficiente pelo setor público. A desestatização foi feita de forma apressada devido à gravidade da situação financeira da ferrovia e da crise econômica do Estado brasileiro, e tinha também como objetivo reduzir a participação do Estado na economia. Assim foram excluídas quaisquer obrigações de investimentos específicos, objetivando aumentar a atratividade das ferrovias e conseguir arrecadar um maior valor no leilão. Após a privatização, as concessionárias eram formadas pelos principais usuários da própria ferrovia, ligados a extração de minérios e indústria petroquímica. Esses produtos geralmente envolvem um grande volume e baixo valor agregado, de modo que o transporte ferroviário assume para esses produtos extrema importância. Ao assumirem o controle das ferrovias, elas teriam como fazer os investimentos necessários para revitalizar a malha ferroviária e aumentar sua eficiência. O contrato celebrado estabelecia metas de produção e redução de acidentes, que seriam revistas a cada 5 anos, mas não havia exigência de como o investimento deveria ser feito. Desse modo, os investimentos foram focados apenas nos trechos de maior rentabilidade e que eram importantes 44 para o transporte de seus produtos. Diversos trechos foram abandonados e hoje se encontram em situação igual ou pior à etapa pré-desestatização. As metas de redução de acidentes e de aumento de produtividade foram cumpridas apenas para parte da malha. Para evitar que as empresas concessionárias praticassem valores menores para si mesmas, o contrato continha uma cláusula de preço de frete mínimo e máximo. O frete máximo impedia que elas praticassem um preço mais alto para os outros usuários. Outro ponto importante celebrado no contrato, para o desenvolvimento ferroviário, foi o direito de passagem e o tráfego mútuo. O modo como o contrato trata esses dois pontos acarretou uma série de ineficiências, principalmente em relação aos outros modais de transporte. Alguns problemas como o transbordo da carga de uma composição para outra, e elevação do custo do frete e a falta de eficiência energética teriam sido evitados, se o assunto fosse pensado com mais cautela. Não há dúvidas de que a desestatização implicou melhorias para a rede ferroviária nacional e o Estado. Nos últimos 15 anos a produção mais que dobrou e o Estado deixou de arcar com os déficits recorrentes, que já totalizavam mais de 2 bilhões de reais (RFFSA). As metas de redução de acidentes foram cumpridas e diversos gargalos logísticos foram resolvidos. Mas, por outro lado, surgiu uma espécie de oligopólio privado, o que de certa forma levou à perda da função pública e social da ferrovia. Somente as ferrovias sob o controle da Vale e da CSN são responsáveis por 87,5% do total transportado. A malha ferroviária não foi ampliada e alguns trechos foram abandonados. Após 15 anos, não ocorreu uma diversificação dos produtos transportados pelas ferrovias. A participação de cada grupo de produtos se mantém praticamente de forma inalterada. O minério de ferro e o carvão mineral, que representavam aproximadamente 74,8% do total em toneladas transportado em 1997, após 15 anos mantiveram praticamente inalterado esse número, em 2011. Os mesmos produtos passaram a responder por 75,7% do total transportado. 45 A impossibilidade de reversão dos investimentos feitos pelas concessionárias funciona como um entrave para o investimento, principalmente ao se aproximar do término do contrato e a incerteza de que eles serão renovados. Não há dúvidas que o modelo de concessão atingiu alguns dos objetivos do Estado na época, como desonerar os gastos do Estado, que era incapaz de investir na malha ferroviária. Mas o processo de privatização falhou em muitos outros pontos, como a ampliação da infraestrutura e melhoria da competitividade do setor. E isso se deve em parte pelos contratos de concessão, que não foram feitos com a devida cautela. Atualmente o Brasil encontra-se em um momento de forte investimento estatal e participação na economia, e a ferrovia é um sistema de transporte extramente estratégico para o seu desenvolvimento, principalmente devido à sua extensão territorial e às características de sua produção. Portanto, hoje, as ferrovias estão muito aquém das necessidades do Estado e por isso o modelo de concessão deve ser revisto para atingir os outros objetivos. A atual malha ferroviária é insuficiente para atender um país com proporções continentais. Os gargalos logísticos e as ineficiências estruturais geradas pelo modelo de concessão adotado reduzem a competitividade do setor, principalmente em relação ao modal rodoviário. 46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTT. 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