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UM FRAGMENTO DE UMA MEMÓRIA ENCONTRADA: UM ARTEFATO COLONIAL COMO FONTE PARA A EDUCAÇÃO ARQUEOLÓGICA BRASILEIRA

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UM FRAGMENTO DE UMA MEMÓRIA ENCONTRADA:
UM ARTEFATO COLONIAL COMO FONTE PARA A EDUCAÇÃO
ARQUEOLÓGICA BRASILEIRA
 Leonardo Lopes Villaça Klink
Graduando em História (UEMG)
Pesquisador na área de Arqueologia
Universidade do Estado de Minas Gerais, Unidade Campanha
 E-mail: leonardoklink@gmail.com
RESUMO
Este artigo ocupa-se em apresentar as possibilidades didáticas acerca da educação em arqueologia através de
um fragmento cerâmico, encontrado em uma lavanderia escrava erguida durante o século XVII; a qual
compõe os resquícios de um antigo engenho situado no Parque Henrique Lage, Rio de Janeiro. O artefato de
7,5 cm produzido em argila vermelha traz as mais diversas questões acerca desse território étnico e
conflituoso, ainda no contexto de um Brasil escravocrata com a passagem de milhares de africanos trazidos à
força durante a Diáspora Atlântica. Além de dissertar sobre as possibilidades do uso impregnadas no
fragmento, dividi o trabalho em capítulos com assuntos que contextualizam o objeto de pesquisa em questão,
tratando assim: a circunstância em que encontrei a cultura material alvo de minha problemática para o artigo,
o breve histórico do Parque Lage e sua ligação com sítios arqueológicos que o circundam em uma área de
poucos quilômetros; a Arqueologia Histórica como método de uma pesquisa iniciada do zero além da
importância e contribuição da cerâmica para a educação em nossa arqueologia nacional.
Palavras-chave: Arqueologia Colonial. Arqueologia Histórica. Cultura material. Educação arqueológica.
Fragmento cerâmico. 
1. INTRODUÇÃO 
Entre os dias 15 e 18 de maio ocorreu minha primeira ida ao Rio de Janeiro, com o intuito
de divulgar minha pesquisa “Um engenho e seu Potencial para Práticas Educativas em arquelogia”,
apresentando-a ao III Seminário Internacional em Memória Social, promovido pela Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Após a apresentação do trabalho citado, decidi ir ao
Parque Henrique Lage – grande área verde situada aos pés do Corcovado – antes de partir. Logo
depois de uma visita à Escola de Artes Visuais resolvi explorar mais um pouco o lugar, ainda mais
depois de saber da existência de um engenho de manufatura açucareira séculos atrás, fato não
mencionado e sinalizado em placas ao longo do parque.
Pouco atrás da Escola, me deparei com as ruínas de uma estrutura colonial provenientes do
século XVII ao XVIII, a tal lavanderia escrava. O local possui um fácil acesso, mas mediante o uso
de calçados adequados e uma boa iluminação “móvel”. Acompanhado de outras duas estudantes
com as lanternas de seus celulares conseguimos identificar alguns aspectos arquitetônicos materiais
e imateriais da lavanderia; a escuridão no local, o barulho dos pingos de água atrelados ao peso
histórico tornam a experiência única e totalmente fenomenológica; já desenvolvendo em mim um
fascínio a ponto de produzir cientificamente sobre.
Após uma boa observação na pequena construção, me deparei com um pequeno fragmento
brilhante ao iluminar um canal de água situado no chão. O “caco” logo de cara me pareceu antigo
pela forma bruta com que a argila constituiu o centro da cerâmica e pela presença de marcas de
dedos (digitais) durante o processo de molde estrutural da massa térrea. Sem pensar duas vezes – e
ainda prestes a partir para Minas Gerais – decidi recolher aquele pequeno resquício material – mas
com um grande potencial arqueológico – com a intenção de extrair o máximo de informações sobre
o determinado local partindo de uma cultura material, ligando-a anacronicamente ou não à
paisagem em que se encontrava.
Devido às dificuldades em se datar artefatos no Brasil em questão da grande lista de espera
nas universidades e também pela escassez e alto valor cobrado pelos laboratórios brasileiros que
utilizam a datação via Carbono 14 ou Radiocarbono; decidi me aprofundar utilizando-a
simplesmente como um fragmento do período colonial, ao contrário de situar sua produção –
tratando por exemplo a peça como proveniente do final do século XVIII ou XIX –; para uma
didática mais ligada ao factual, se tratando de disciplinas tão cronológicas como a Arqueologia e a
História.
2. O HISTÓRICO DO PARQUE
Situado no bairro Jardim Botânico, a história do Parque Henrique Lage – conhecido
previamente como as terras do Engenho d’El Rey – se desenvolve primeiramente com a presença
dos aborígenes Tupis dados como Tamoios no território do próprio parque até a Lagoa Rodrigo de
Freitas. O termo “Tamoio” – derivado da língua Tupi, expressado como anciões, avós ou velhos –
em si não é apresentado como uma etnia e/ou nomenclatura de uma tribo específica, mas sim de
uma união feita pelas tribos Tupinambá, Tupiniquins, Temiminós, Goitacás e Aimorés. Através de
fontes escritas, orais e materiais é possível detectar as formas de resistência à colonização e ao
lamentoso processo “civilizatório” imposto aos nativos pelos europeus; dessas diversas repressões
sistêmicas surgiram os motivos para a união dos ameríndios litorâneos – estabelecidos nas atuais
cidades de Bertioga (SP) ao Cabo Frio (RJ) – denominada posteriormente de Confederação dos
Tamoios (1554-1567).
O território foi composto por três engenhos de açúcar entre os séculos XVI e XIX. A
Lavanderia dos Escravos compõe atualmente as ruínas do que já foi antigamente o Engenho d’El
Rey, futuramente incorporado a mais terras titulando-o de Engenho Nossa Senhora da Conceição da
Lagoa (após 1660). Outro monumento que se manteve em pé durante todos esses anos para a
compreensão do movimento econômico do mercantilismo canavieiro é a Capela de Nossa Senhora
da Cabeça, construída próxima à casa grande e data da mesma década da lavanderia, confirmado
por via de prospecções e levantamentos arqueológicos na ermida e ao seu redor, o qual se encontrou
estilhaços de vidro e louças provenientes do período de funcionamento do engenho local.
Por esse caminho era escoada a produção de açúcar – o “ouro melado” – do Engenho D’el
Rey, situado na lagoa de Sacopenapã – atual Rodrigo de Freitas, mais precisamente onde
está o Parque Lage – até a Enseada de Botafogo. O engenho pertencia a Antonio Salema,
governador do Rio de Janeiro. Já naquele tempo, política e negócios se misturavam.
(BRITO, 2017)
O Engenho d’El Rey foi construído pelo Capitão-mor Cristovão de Barros, e passou a ser
administrado pelo governador português Antonio Salema entre 1575 e 1577. Para a fundação e
produção da cana-de-açúcar na região e a mando de Salema, roupas infectadas com varíola foram
deixadas por todo território da Lagoa Piraguá (Lagoa Rodrigo de Freitas) – local em que os
Tamoios em grande parte residiam –, infectando os nativos ao se aproximarem ou ao se vestirem
com as roupas contaminadas. Esse homicídio em massa serviu como método de expansão de terras,
agora não mais habitadas pelos indígenas – que após algumas tentativas, foram trocados pela mão
de obra africana no empreendimento –, mobilizando ainda mais economicamente o ciclo do açúcar
na Comarca. 
O engenho segue sob administração de Salema até 1577 e é vendido para o vereador Diogo
Amorim Soares; que expande o empreendimento e o anexa às terras da região, tornando-a uma
propriedade com um grande capital a qual transfigurando-se posteriormente em “Engenho Nossa
Senhora da Conceição da Lagoa”. Em 1808, o rei Dom João VI se apropria dessas terras e
empreende ali uma fábrica de pólvora, a Real Fábrica de Pólvora da Lagoa Rodrigo de Freitas, em
funcionamento até 1831.
São João da Lagoa – Ordenado o decreto de 13 de junho de 1808, ao Conselho da Fazenda,
que se incorporassem, nos próprios da Real Coroa, o Engenho e Terrassitas na Lagoa
Rodrigo de Freitas, por sua competente avaliação, para o estabelecimento de uma Fábrica
de Pólvora, e todas as demais que fossem necessárias para a fundição de peças de artilharia
e canos de espingarda, e realizada a incorporação, em conformidade com aquele decreto
[...] Daí teve origem o estabelecimento de uma nova Paróquia perpétua, com o título de S.
João da Lagoa, na Capela de N. Sra. da Conceição, que era do mesmo engenho, e fora
construída muito antes de 1732, enquanto se não edificava outra igreja própria. (PIZARRO,
1820, Apud: LAVÔR, 1983)
Figura 1. "Vista da Lagoa Rodrigo de Freitas tomada da 
Capelinha da Chácara do Tosta", FACCHINETTI, Nicola 
Antonio (1879). 
Fonte:http://historia.jbrj.gov.br/fotos/imagens.htm
Figura 2. Vista lateral da Capela de N. S. 
da Cabeça. 
Fonte:http://www0.rio.rj.gov.br/patrimonio
/proj_capela_nscabeca.shtm
2.1. A LAVANDERIA DOS ESCRAVOS E OS SÍTIOS QUE A CIRCUNDAM 
Além da “Real Fábrica de Pólvora” – onde atualmente se estabelece o Museu Sítio
Arqueológico Casa dos Pilões – e da ermida de Nossa Senhora da Cabeça, é possível encontrar
outro resquício de um engenho pela região do bairro Jardim Botânico; a Lavanderia dos Escravos,
situada no Parque Henrique Lage sob as seguintes coordenadas: 22º57’34” S 43º12’43” W. Antes de
adentrar nessa edificação carregada de valor histórico e emocional já é possível notar alguns
aspectos arquitetônicos coloniais, como as rochas que compõe seu chão e suas paredes; presentes na
formação de alguns engenhos de cana que datam desse mesmo período, século XVII.
A pequena lavanderia escrava é composta por um lavadouro logo na entrada e ao centro de
três blocos de pedras por lado, utilizadas pelos escravos para ensaboar, lavar, torcer e bater roupas;
um pequeno cômodo ao fundo no lado esquerdo e pela queda d’água na parte superior ao lavadouro,
acabada em tijolos de barro menores aos usados tipicamente nessas construções.
Uma das questões que permanece é sobre a possibilidade ou não de se considerar a
Lavanderia um sítio arqueológico. Definindo um sítio como uma área delimitada de ações,
experiências e convívios sociais pré-coloniais, históricos ou contemporâneos com suas respectivas
paisagens; é o local em que se encontram vestígios os quais os pesquisadores desfrutam de
informações particulares sobre cada um desses povos produtores de matéria. 
Com essa breve e sucinta definição, é possível compreender também que o número de
artefatos encontrados nesses sítios influenciam em sua definição, independente da nomenclatura do
período que datam, já que meia dúzia de peças podem estar ali sem o devido pertencimento
cronológico à paisagem. Entre os constituintes de um sítio histórico está o valor das estruturas, que
Figura 3. Antiga fábrica de pólvora do Rio de Janeiro, durante o
século XIX. Atualmente um museu. Fonte:
http://www.riodejaneiroaqui.com/portugues/casa-dos-piloes.html
são basicamente obras manuais humanas, ou seja; a elas em si são atribuídas o valor de sítio
arqueológico devido aos componentes que as alicerçam.
Quando é evidente a presença de artefactos, a decisão da existência de um sítio
arqueológico é mais problemática, uma vez que um simples artefacto pode ser insuficiente
para a delimitação da presença de sítio. Se um local tiver […] um só artefacto, deverá o
local ser documentado como sítio arqueológico ? A resposta é: depende do objectivo do
projecto. Assim, se o projecto for de carta arqueológica, é necessário localizar o achado,
mencionando explicitamente que se trata de um artefacto isolado. Do ponto de vista de
protecção ou de minimização, este local não tem interesse, pelo que não é relevante indicá-
lo como sítio arqueológico, sendo obrigatório […] indicar a presença de artefactos isolados
no local. (BICHO, 2012, p. 95) 
Vale ressaltar que a Capela de N. S. da Cabeça, a antiga Fábrica de Pólvora e as demais
edificações no Jardim Botânico se estabelecem em um mesmo plano histórico-identitário. A
presença de cultura material colonial terrosa na lavanderia, junto às outras em sítios arqueológicos
descobertos ou ainda desconhecidos só podem comprovar o movimento escravo pela região, os
quais deixaram involuntariamente e sem muito cuidado restos de seus simples objetos rotineiros,
que se tornarão futuros objetos de estudos cujos pesquisadores se dedicarão à descoberta de novos
rastros imateriais de suas passagens através da materialidade.
Seja no contexto de seus usos sociais e econômicos cotidianos, seja em seus usos rituais,
seja quando reclassificados como itens de coleções, peças de acervos museológicos ou
patrimônios culturais, os objetos materiais existem sempre, necessariamente, como partes
integrantes de sistemas classificatórios. Esta condição lhes assegura o poder não só de
tornar visíveis e estabilizar determinadas categorias socio-culturais, demarcando fronteiras
entre estas, como também o poder, não menos importante, de constituir sensivelmente
formas específicas de subjetividade individual e coletiva. (GONÇALVES, 2007, p. 8)
Figura 4. Vista do interior da 
lavanderia.
Figura 5. Queda d'água. Figura 6. Procura por mais 
fragmentos.
Pensando em um engenho como um local que funcionava à base de vidas “substituíveis”, é
fácil entender que um cemitério nas redondezas era necessário. Foi então que em 1979 durante uma
reforma de uma empresa que se estende até o Jardim Botânico, foi achado e demarcado o respectivo
cemitério da senzala do Engenho de Nossa Senhora da Conceição da Fazenda de Rodrigo de Freitas
(LAVÔR, 1983, p. 71).
Foi então que o pesquisador João Conrado Niemeyer solicitou ao Museu Nacional um teste
de carbono 14 nas ossadas encontradas, acondicionadas até 1981. Os resultados do exame
indicaram sua vivência em um período aproximado entre 200 e 300 anos atrás, não sendo
considerados contemporâneos. Com a reconstrução óssea foi identificado um homem com a estatura
média de 1,70 m, e pela arcada dentária e crânio foi relacionado com os escravos africanos.
Outro sítio que dialoga arqueologicamente e historicamente com o referenciado nas fotos
acima e com os já comentados no capítulo anterior – vide imagens 2, 3 e 4 –, é o Jardim das
Princesas localizado no Museu Nacional do Rio de Janeiro. Entre os materiais recolhidos no Jardim
estão 23 fragmentos de vasilhames cerâmicos vitrificados, tratados como supostos grés. Com
algumas sondagens e com uma trincheira de aproximadamente 90 centímetros de profundidade
encovada próxima aos locais de reparo hidráulico no jardim foram encontrados estilhaços de grés e
vidros, telhas em pedaços desproporcionais, botões, pregos e tijolos.
[...] o grès, tendo sido lavado em água corrente, tomando-se o cuidado necessário para não
esfregar em demasia as peças, a fim de não prejudicá-las. Foram colocadas para secar de
forma natural, efetuando-se, em seguida, a numeração individual e o devido
acondicionamento. As peças foram desenhadas, fotografadas e medidas. Com o material
preparado foi realizada uma tentativa de remontagem dos fragmentos existentes, visando a
possível reconstituição dos vasilhames e o posterior estudo dos mesmos, com a finalidade
Figura 7. Mapa em 3D demarcando (em uma linha amarela) a distância
entre os respectivos constituintes que compunham a área do engenho.
Fonte: Google Earth.
de contribuir para a compreensão dos aspectos sócio-econômicos e culturais de grupos
sociais não mais existentes. (MENDONÇA; BELTRÃO, 1996, p. 145)
O Jardim das Princesas, localizado no bairro São Cristóvão, foi um lugar de passagens de
portugueses, jesuítas, escravos, indígenas e da Família Imperial; racionalmente,um depósito de
objetos descartados sucessivamente em seus respectivos períodos.
3. ANÁLISE MORFOLÓGICA E AS POSSIBILIDADES DA CERÂMICA
Entre algumas das problemáticas em trabalhar com cultura material é possível ver durante o
processo de documentação e datação de peças, sendo dificultado pela exatidão procurada pelos
pesquisadores do ramo. Há resultados concretos quando as amostras mantêm em si a radiação
absorvida, com restos de alimentos ou qualquer presença orgânica em sua superfície, possibilitando
a estimativa de sua idade através de testes químicos, biológicos e radioativos. Um mal manejo de
objetos arqueológicos pode comprometer com a validez de alguns desses exames, que já não
apresentam com 100% de factualidade os resultados.
O teste via Radiocarbono é funcional em ossadas, cerâmicas, carvão preservado, madeira,
couro, etc. Em sua maioria é necessário a extração de uma pequena quantidade, variando de 20
miligramas – plantas, madeira, sementes, farelo cerâmico e fios de cabelo – à 10 gramas – ossos
cremados e sedimentos orgânicos –; no caso das arcadas dentárias (dentes) é crucial sua própria
presença.
Trabalhando com um período Histórico em que a porcentagem de letrados no Brasil
correspondia majoritariamente à elite, analisar e estudar objetos que estão ligados a povos sem o
advento da escrita ou que sua cultura foi diretamente coagida por uma etnia dominante que se
intitulava superior promovendo a segregação do “diferente”, é extremamente problemático.
Utilizando-me da Arqueologia Histórica pós-processualista como uma revitalizadora
material, lidei com as mais variadas formas de fontes primárias e secundárias; a escrita como a
busca de informações partindo de documentos, fontes arquitetônicas da própria lavanderia
comparando-a com a de engenhos remanescentes do século XVI e XVII, cartas da mesma época e
de documentações geradas por arqueólogos e historiadores, complementando minha bibliografia.
A peça com esmalte – vidrada – em seu interior e exterior, junto às demais informações
sobre os sítios históricos próximos ao Parque Henrique Lage, sugere algumas possibilidades acerca
de sua proveniência e utilização. Entre elas estão: o grés (stoneware) brasileiro ou europeu, as
peroleiras (olive jars) que compunham as caravelas e os galeões, telhas coloniais sem um padrão de
molde ou um jarro aguadeiro; todas as probabilidades com um limite cronológico, no caso o século
XIX. Seus usos enquanto uma peroleira ou grés intactos poderia ser tanto para conter água e
bebidas alcoólicas como cerveja e vinho assim como também para receptáculo de especiarias, tintas
e suprimentos os quais eram solicitados durante as longas viagens marítimas.
Figura 9. Fragmento de parede (face
interna) com marcas da produção
manual.
Figura 10. Lateral da cerâmica, há minerais visíveis em
sua composição.
Figura 8. Face exterior do fragmento. Nota-
se uma possível fratura de alça.
A intenção do artigo em si não é a de autenticar a peça como referente a tais séculos, mas
sim interligar alguns fatos locais à cultura material apresentando as alternativas para uma
legitimação ou não da lavanderia como sítio a partir da cerâmica fragmentada, sem uma
comprovação por exames químicos. Além da importância de levar às salas de aula os
questionamentos tratados no decorrer dessa pesquisa, independente do nível de formação dos
discentes, legitimando a aproximação entre comunidade e Arqueologia.
Entre as funções do arqueólogo como educador, está o dever de aproximar os feitos
humanos do passado ao interesse presente. A arqueologia deve caminhar com o público, e
não somente ser para o mesmo; o qual coloca o profissional como um selecionador e
separador de fatos que devem ser repassados às comunidades levando em conta o que
precisam ou não saber. Recapitulando, todos carregam histórias a serem contadas, de
diferentes pontos de vista ao do arqueólogo, com isso surge a importância do caminhar
entre educador e sociedade; o historiador como mediador de diálogos entre a história do
passado já tratada nos ambientes acadêmicos e os relatos do presente vindos pela
hereditariedade de fontes orais da população. (KLINK, 2018, p. 5)
4. ARQUEOLOGIA EM SALA DE AULA
A oficina “Um artefato colonial como fonte para a educação arqueológica brasileira” foi
apresentada por mim ao terceiro período do curso de História da Universidade do Estado de Minas
Gerais (UEMG) Unidade Campanha, no dia 09 de julho de 2018. A proposta inicial foi sensibilizá-
los, torná-los críticos e adverti-los sobre a importância e eficácia do trabalho arqueológico brasileiro
em sala de aula, com o apoio de métodos instrutivos.
Entre as alternativas metodológicas da apresentação utilizei-me de um vocabulário bem
didático e explicativo junto à introdução dos discentes à Arqueologia situando-os ao histórico do
Parque e ao artefatual. Os slides apresentaram um “educacional” bem imagético com as imagens
dos patrimônios apresentados em suma neste artigo além da reprodução de um vídeo encontrado na
plataforma audiovisual do YouTube para compreenderem estilisticamente o que realmente é a
Lavanderia dos Escravos, aproximando-os do lugar mesmo que remotamente.
O fragmento foi passado aos alunos junto de um pedaço de telha contemporânea à outra,
para perceberem as diferenças entre elas e relatarem em uma folha de papel suas opiniões para os
seguintes questionamentos: “Quais as características mais marcantes em ambas as peças que as
distingue?”, “Quando o objeto assumia sua forma intacta, qual sua possível aparência e utilização?”,
“Vocês acreditam que essa cerâmica esteve presente na rotina no Brasil Colonial? Se sim, em qual
século vocês a estimam?”. 
Enquanto foi iniciado ao lado esquerdo o repasse dos dois objetos e a folha para o
preenchimento, resolvi passar no outro lado gravuras ao final do livro “Introdução à Arqueologia
Brasileira”, do autor Angyone Costa. A intenção foi expor a riqueza cultural brasileira como
artefatos e cerâmicas marajoaras, mas previamente alertando-os que o mesmo é anacrônico à minha
apresentação.
Com o capítulo sobre as probabilidades acerca da peça como o grés europeu/brasileiro, a
peroleira, o jarro ou bacia de escravos aguadeiros e uma possível telha, os discentes contribuíram
com o seminário tanto com questionamentos quanto com suas respostas às perguntas feitas por mim
ou até mesmo entre eles. Um dos alunos até mesmo se arriscou a formular com um esboço a
cerâmica em seu período de utilização com um desenho a grafite, adotando para si o formato de
uma bacia ou jarro com alças.
A questão abordada foi sobre como é possível situar e entender quaisquer artefatos
arqueológicos somente com as probabilidades da paisagem em que estão inseridos, técnica presente
na pré-datação; ou seja, trabalhando a documentação com os levantamentos históricos regionais,
Figura 11. Relatando sobre os bens que compõe os antigos engenhos do bairro Jardim 
Botânico, RJ. Foto: Marcio Machado.
sendo eles pela oralidade de certas habitações presentes ali com os relatos ou pelos registros de
escrita mantidos em centros históricos ou secretarias de cultura.
 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cerâmicas vidradas como a do fragmento são geralmente encontradas em sítios históricos do
século XIX relacionados a ocupações escravas, como em engenhos e senzalas. A datação de uma
única peça ainda totalmente disforme e partida fica quase impossível, nesse caso houve
assimilações morfológicas com outras peças nesse mesmo contexto histórico para ao menos
conseguir supor acercade sua aparência e funcionalidade enquanto utensílio funcional.
A Arqueologia Histórica brasileira é mais do que uma ramificação da Arqueologia; uma área
voltada aos estudos dos subalternos e todos os que sofreram um silenciamento a partir dos
encontros europeus com os povos autóctones sul-americanos e de sua mão de obra materializada,
servindo como fontes para reconstruções históricas êmicas, conferindo-lhes seus referentes méritos
para a formação da atual sociedade brasileira. 
50,00%
8,33%
41,67%
Alunos que se arriscam 
em dizer que há valor 
histórico na peça em ce-
râmica
Alunos que não concor-
dam com o valor his-
tórico da peça
Alunos que não se arris-
cam em pré-determinar a 
autenticidade
Gráfico 1. Relação em porcentagem dos 12 alunos que responderam as 
perguntas propostas. Fonte: Prática em sala, 2018.
REFERÊNCIAS
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Livro III, Rio de Janeiro: Na Impressão Regia, 1820. 
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GONÇALVES, José Reginaldo Santos. Antropologia dos objetos: coleções, museus e patrimônios / José
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