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235 C A P Í T U L O 2 ORGANIZAÇÃO POLÍTICO- ADMINISTRATIVA BRASILEIRA: FEDERAÇÃO BRASILEIRA. UNIÃO. ESTADOS-MEMBROS. MUNICÍPIOS. DISTRITO FEDERAL. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS Sumario • 1. Federação brasileira: 1.1. Componentes; 1.2. Vedações constitucionais de natureza federativa; 1.3. Capital; 1.4. Idiomas e símbolos oficiais; 1.5. Posi- ção dos Territórios Federais; 1.6. Sistema de execução de serviços – 2. União: 2.1. Conceito; 2.2. Personalidade jurídica; 2.3. Bens da União; 2.4. Regiões de desenvolvi- mento – 3. Estados; 3.1. Formação; 3.2. Autonomia: 3.2.1. Auto-organização e autolegislação; 3.2.2. Autogoverno; 3.2.3. Autoadministração; 3.2.4. Regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões; 3.3. Bens dos Estados – 4. Municípios: 4.1. Formação; 4.2. Autonomia: 4.2.1. Auto-organização e legislação; 4.2.2. Autogoverno; 4.2.3. Autoadministração – 5. Distrito Federal: 5.1. Auto- nomia: 5.1.1. Auto-organização e autolegislação; 5.1.2. Autogoverno; 5.1.3. Autoadministração; 5.1.4. Regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões – 6. Repartição de competências: 6.1. Princípios gerais: 6.1.1. Princípio da predominância do interesse; 6.1.2. Princípio da subsidiariedade; 6.1.3. Princípio dos pode- res implícitos; 6.2. Técnicas de repartição: 6.2.1. Repar- tição horizontal; 6.2.2. Repartição vertical; 6.3. Sistema da Constituição de 1988; 6.4. Espécies de competências: 6.4.1. Quanto à forma; 6.4.2. Quanto à extensão; 6.4.3. Quanto à origem Juliano Taveira Bernardes e olavo augusTo vianna alves Ferreira 236 1. Federação brasileira 1.1. Componentes Conforme o caput do art. 1º e o art. 18, compõem a Federação brasileira: (a) a União; (b) os Estados; (c) o Distrito Federal; e (d) os Municípios. Sobre os Territórios, ver item 1.5 abaixo. 1.2. Vedações constitucionais de natureza federativa Trata-se das proibições concebidas pelo constituinte com a finalida- de específica de manter o equilíbrio federativo e de preservar a laici- dade da Federação brasileira. Constam dos incisos I a III do art. 19 da Constituição e se dirigem a todos os entes federados. Daí ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: a) Estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar- -lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público (inciso I); ► iMPorTaNTe: 1) O inciso I do art. 19 da Constituição evidencia a natureza laica do Estado brasileiro (princípio da laicidade estatal). 2) Embora laico, o Estado brasileiro é considerado teísta, porque assume a crença em alguma força criadora superior, como evidencia a referência à “proteção de Deus” contida no Preâmbulo da Constituição de 1988. 3) Em aparente contradição à natureza laica do Estado brasileiro, o § 1º do art. 210 da Constituição determina a inclusão do ensino religioso como disciplina normal nas escolas públicas de ensino fundamental, embora fa- cultativa a matrícula. b) recusar fé aos documentos públicos (inciso II); c) criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si (inciso III). 1.3. Capital A capital da República Federativa do Brasil é Brasília (§ 1º do art. 18), e não mais o Distrito Federal, como estava no art. 2º da Constituição anterior. 237 1.4. Idiomas e símbolos oficiais O art. 13 da Constituição estabelece a língua portuguesa como idio- ma oficial do Estado brasileiro (art. 13, caput). Todavia, o art. 231 garan- te às comunidades indígenas o uso das línguas que lhes são próprias. ► Como o sTF já decidiu a questão: O Plenário do STF não admitiu habeas corpus redigido em língua espanhola, ainda que o órgão julgador dominasse o idioma estrangeiro. Entendeu o STF que o conteúdo da peça processual “deve ser acessível a todos, sendo irrelevante, para esse efeito, que o juiz da causa conheça, eventualmente, o idioma estrangeiro utilizado pelo impetrante. A imprescindibilidade do uso do idioma nacional nos atos processuais, além de corresponder a uma exigência que decorre de razões vinculadas à própria soberania nacional, constitui projeção concretizadora da norma inscrita no art. 13, caput, da Carta Federal, que proclama ser a língua portuguesa ‘o idioma oficial da República Federativa do Brasil’” (QO no HC 72.391/DF). Por sua vez, são símbolos da República Federativa do Brasil: a ban- deira, o hino, as armas e o selo nacionais (§ 1º do art. 13). ► aTeNção: A regulamentação dos Símbolos Nacionais se deu com a Lei 5.700/71, cujas disposições exigem, por exemplo, o ensino obrigatório do “desenho e do significado da Bandeira Nacional, bem como do canto e da interpretação da letra do Hino Nacional em todos os estabelecimentos de ensino, públicos ou particulares, do primeiro e segundo graus” (art. 39), além da execução compulsória do Hino Nacional, uma vez por semana, nos estabelecimentos públicos e privados de ensino fundamental (art. 39, parágrafo único, com redação da Lei 12.031/2009). Curioso notar que legislador previu, ainda, que ninguém “poderá ser admitido no serviço público sem que demonstre conhecimento do Hino Nacional” (art. 40). Os Estados-membros, o DF e os Municípios também podem adotar símbolos próprios (§ 2º do art. 13). 1.5. Posição dos Territórios Federais Territórios Federais são pessoas jurídicas de direito público interno que integram a estrutura descentralizada da União (§ 2º do art. 18). ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA BRASILEIRA: FEDERAÇÃO BRASILEIRA... Juliano Taveira Bernardes e olavo augusTo vianna alves Ferreira 238 Embora atualmente não exista nenhum, poderão ser criados por meio de lei complementar (art. 18, § 2º). ► aTeNção: Ao contrário do ocorre com o DF, é possível que um Território Federal seja dividido em Municípios (art. 33, § 1º). Não possuem capacidade política, mas apenas capacidades admi- nistrativas, daí por que são considerados entidades autárquicas (autar- quias territoriais) cujo regime jurídico deve ser regulado pela legislação federal infraconstitucional (caput do art. 33). ► aTeNção: É o Congresso Nacional quem exerce a função legislativa primária acerca dos assuntos dos Territórios Federais. Todavia, a Constituição prevê a edi- ção de lei a regulamentar as eleições e a competência deliberativa das Câmaras Territoriais (art. 33, § 3º). Sobre a iniciativa legislativa presidencial a respeito, v. item 9.2.1.1.B do Capítulo 7. Conforme a Constituição Federal, o Poder Executivo dos Territórios Federais deverá ser exercido por Governador nomeado pelo Presiden- te (art. 84, XIV), após sabatina do Senado (art. 52, III, “c”). Já a prestação de contas do Governo dos Territórios Federais é feita perante o Con- gresso Nacional, com o auxílio do TCU (art. 33, § 2º). Nos Territórios com mais de 100 mil habitantes, além do Governa- dor, haverá órgãos judiciários de primeiro e segundo graus, bem como membros do MP e defensores públicos federais. Contudo, todos esses órgãos são mantidos e organizados pela própria União (art. 21, XIII). ► aTeNção: A) A despeito da alteração promovida pela EC 19/98 no inciso XIV do art. 21 da Constituição, a União segue competente para organizar e manter tanto as polícias civil e militar quanto o Corpo de Bombeiros militar dos Territórios. B) A menos que o Território possua mais de 100 mil habitantes e daí dispo- nha de tribunal próprio, compete ao TJDFT o julgamento do Governador de Território Federal em caso de crimes comuns e de responsabilidade (art. 8º, I, da Lei 11.697/2008). 239 1.6. sistema de execução de serviços No Federalismo, são conhecidos os seguintes tipos de sistema de execução de serviços públicos: a) sistema da execução imediata: pelo qual cada ente federal mantém corpopróprio de servidores públicos para a execução dos serviços respectivos, mas pode haver cooperação entre eles. Ex.: EUA, Ar- gentina, México; b) sistema de execução mediata: serviços federais prestados por ser- vidores estaduais, havendo pequeno número de servidores fede- rais incumbidos da fiscalização e da vigilância dos serviços presta- dos. Ex.: Índia e Alemanha; c) sistema de execução mista: permite-se a execução de serviços fe- derais por funcionários estaduais e vice-versa. Ex.: Suíça e Áustria; A Constituição de 1988 adotou o sistema de execução imediata, mas admitiu a cooperação entre os entes federais (art. 23, parágrafo úni- co, com redação da EC 53/2006). Nesse sentido, por exemplo, ver a LC 140/2011, que traz normas sobre a cooperação específica entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora. 2. UNião 2.1. Conceito É a entidade federal autônoma, formada pela reunião das partes componentes, a quem cabe exercer as prerrogativas da soberania do Estado brasileiro (JOSÉ AFONSO DA SILVA). 2.2. Personalidade jurídica a) direito público externo (direito internacional): São os órgãos da União que representam, nas relações internacionais, o Estado bra- sileiro. Nessa linha, o Presidente da República age, a um só tempo, como chefe do Poder Executivo da União e chefe do Estado nacional (República Federativa do Brasil). ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA BRASILEIRA: FEDERAÇÃO BRASILEIRA... Juliano Taveira Bernardes e olavo augusTo vianna alves Ferreira 240 Contudo, não é a União quem aparece nos atos internacionais, mas a República Federativa do Brasil, já que aquela se traduz como simples entidade pertencente a esta. Os demais membros da Federação não têm representação nem competência de direito internacional, o que os torna meras pessoas jurídicas de direito público interno. Assim, ainda que possam cele- brar vínculos jurídicos com pessoas jurídicas estrangeiras (particula- res ou governamentais), não há nisso automático comprometimento da vontade ou da responsabilidade da Estado brasileiro (CELSO RI- BEIRO BASTOS). ► Como o sTF já decidiu a questão: No RE 229.096/RS, o STF considerou constitucional tratado internacional que instituíra isenção de tributos de competência dos Estados-membros, a des- peito da vedação constante no inciso III do art. 151 da CF/88. Segundo o entendeu a Corte, essa vedação limita apenas a União no âmbito de sua competência interna federal, mas não se aplica às hipóteses em que a União atua como sujeito de direito na ordem internacional. b) direito público interno: A União, como ente federal, possui per- sonalidade jurídica de direito público interno (Código Civil, art. 41, I). E, nessa qualidade, é titular de direitos e obrigações, além de responsável pelos atos de seus agentes (art. 37, § 6º, da Constituição). ► Como esse assunto foi cobrado em concurso? O Concurso para Promotor de Justiça do MPDFT (2003) considerou correta a seguinte alternativa: “Na Federação Brasileira, o Congresso Nacional, de- pendendo da matéria legislada, atua como legislativo nacional (ordem total kelseniana) ou como legislativo federal (ordem parcial central kelseniana).” 2.3. bens da União Conforme art. 20 da CF/88, cujo inciso IV foi alterado pela EC 46/2005, são bens da União: I – os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II – as terras devolutas indispensáveis à de- fesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III – os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu 241 domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele prove- nham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; V – os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VI – o mar territorial; VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII – os potenciais de energia hidráulica; IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X – as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos; XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. ► aTeNção: Esses bens são objeto de estudo do direito administrativo, daí por que não merecerão detalhamento neste estudo. Ressalte-se, apenas, que gra- ves questões fundiárias, relacionadas ao problema da impossibilidade de usucapir bens públicos (art. 183, § 3º), levaram o constituinte derivado a reformar a Constituição, para excluir dos bens da União as ilhas costeiras que contenham “sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal” (inciso IV do art. 20 com redação da EC 46/2005). ► Como esse assunto foi cobrado em concurso? O Concurso para Magistratura Estadual do TJSC (2003), ao questionar sobre os bens pertencentes à União, considerou correta a alternativa com a se- guinte redação: “os recursos minerais, inclusive do subsolo, e os potenciais de energia elétrica.” 2.4. regiões de desenvolvimento Com fins administrativos e com objetivo de reduzir desigualdades regionais (cf. arts. 3º, III; 151, I; e 170, VII), a CF/88 possibilita à União a criação de regiões de desenvolvimento, permitindo a concessão de benefícios, tais como juros favorecedores, isenções e prioridades (art. 43 e seus §§). ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA BRASILEIRA: FEDERAÇÃO BRASILEIRA... Juliano Taveira Bernardes e olavo augusTo vianna alves Ferreira 242 ► Como esse assunto foi cobrado em concurso? O Concurso para Promotor de Justiça do MPDFT (2009) considerou errada a seguinte alternativa: “No sistema constitucional brasileiro, a União é sobe- rana e sobrepõe as suas competências às das demais entidades federadas por representar o interesse público nacional.” Na mesma questão, foi con- siderada correta a seguinte alternativa: “No sistema constitucional brasilei- ro, os entes federados – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – são igualmente autônomos politicamente.” 3. esTados São as entidades-componentes que dão estrutura a um Estado fe- deral. Sem Estados-membros não há Federalismo. 3.1. Formação A CF/88 permite aos Estados-membros a incorporação entre si, a fusão, a subdivisão, desmembramento ou formação de novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada (plebiscito) e do Congresso Nacional (lei complementar) – art. 18, § 3º. ► aTeNção: A Lei 9.709/98 (art. 4º) determina que o Congresso Nacional, antes de editar a lei complementar de que trata o § 3º do art. 18, ouça as Assembleias Legislativas de cada Estado-membro envolvido, as quais fornecerão deta- lhamentos técnicos concernentes aos aspectos administrativos, financeiros, sociais e econômicos da área geopolítica afetada. ► iMPorTaNTe: a) Fusão: reunião de dois ou mais Estados-membros num só, extinguindo- -se os Estados originários. b) incorporação: fenômeno pelo qual um Estado-membro agrega-se a ou- tro, com extinção somente do Estado agregado. Exemplo: a incorporação do Estado da Guanabara pelo Estado do Rio de Janeiro (LC 20/74). c) subdivisão: fracionamento de um Estado-membro em dois ou mais Esta- dos distintos, extinguindo-se o Estado originário. d) desmembramento: fracionamentode um Estado-membro em dois ou mais Estados distintos, mantendo-se o Estado originário. Exemplo: a criação do Estado do Tocantins (art. 13 do ADCT). 243 ► Como o sTF já decidiu a questão: Ao apreciar a ADIn 2.650/DF, o Plenário da Corte entendeu que, a despeito da nova redação dada pela EC 15/96 ao § 4º do art. 18 da Constituição, o desmembramento de um Estado-membro pressupõe consulta, mediante plebiscito, da população de todo o Estado, e não somente da área que se pretende destacar. 3.2. autonomia Envolve a capacidade de auto-organização, autolegislação (nor- matização), autogoverno e autoadministração (arts. 18 e 25-28 da Constituição). 3.2.1. Auto-organização e autolegislação Os Estados auto-organizam-se por meio de constituições estaduais e após, num nível normativo inferior, mediante a legislação baixada pelas respectivas Assembleias Legislativas. a) limites ao poder dos estados-membros: Como os Estados-mem- bros são autônomos, e não soberanos, a autonomia estadual é restringida pela Constituição Federal. Assim, mesmo o poder constituinte dos Estados-membros deve curvar-se aos já mencio- nados: (a) princípios constitucionais sensíveis; (b) princípios consti- tucionais estabelecidos; e (c) princípios constitucionais extensíveis. (Sobre tais princípios, veja-se item 6.5.2.2.B e C do Capítulo 2 da Parte I do Tomo I). b) interpretação dos limites constitucionais à autonomia: Conforme doutrina majoritária, a interpretação dos limites constitucionais à autonomia dos Estados-membros deve ser feita restritivamente, sob pena de violação do princípio federalista e da cláusula pétrea inse- rida no art. 60, § 4º, inciso I. 3.2.2. Autogoverno Trata-se da capacidade de formação e constituição autônoma de Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário próprios, sem a interferência federal. ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA BRASILEIRA: FEDERAÇÃO BRASILEIRA...
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