Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
APRESENTAÇÃO DO CASO Trata-se de habeas corpus, sem pedido de liminar, em que o Superior Tribunal de Justiça é apontado como autoridade coatora. Os autos estão suficientemente instruídos segundo o relator MIN. LUIZ FUX que dispensou a requisição de informações e deu vista ao Ministério Público Federal. RELATÓRIO Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Fábio Silva dos Santos, contra acórdão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao agravo regimental manejado contra a decisão que deu provimento ao Recurso Especial nº 1.215.698/MG, interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Narra a impetração, que o paciente foi condenado à pena de 4 (quatro) anos de reclusão, em regime semiaberto, pela prática do crime de roubo. A defesa interpôs recurso, ao qual o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais deu parcial provimento nos termos do acórdão assim ementado: “APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO – DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO - POSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE GRAVE AMEAÇA OU VIOLÊNCIA CONTRA A VÍTIMA – TENTATIVA - IMPOSSIBILIDADE - POSSE MANSA E DESVIGIADA DA RES - DELITO CONSUMADO - SUBSTITUIÇÃO DA PENA - VIABILIDADE - REQUISITOS SATISFEITOS – RECURSO PROVIDO EM PARTE. Na hipótese da denúncia do agente pela prática de crime de roubo, uma vez não verificada a utilização da grave ameaça e da violência para garantir a subtração da coisa, não havendo evidência de que o modus operandi do agente tenha reduzido a vítima à impossibilidade de resistência, a desclassificação para o delito de furto é medida que se impõe. Operada a desclassificação, afastando-se a hipótese do uso de grave ameaça ou violência do apelante na prática do crime, não sendo o agente reincidente em crime doloso, consideradas favoráveis as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP), não há óbice à substituição da pena, se satisfeito o requisito objetivo.” Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso especial requerendo a cassação do decisum, ao argumento de que configurado o crime de roubo, caracterizado pela grave ameaça praticada contra a vítima. A Ministra Relatora Alderita Ramos de Oliveira, Desembargadora Convocada do TJ/PE para o Superior Tribunal de Justiça, deu provimento ao apelo “para fixar a pena de Fábio Silva dos Santos em 4 anos de reclusão em regime aberto e 10 dias-multa pela prática do delito tipificado no art. 157 do Código Penal, mantida a pena-base no mínimo legal, deixo de considerar a atenuante da confissão em razão da Súmula 231/STJ, deixo, também, de substituir a pena por restritiva de direitos por ter sido o crime praticado com grave ameaça (...)” (documentos comprobatórios – e-STJ Fl. 236). Dessa decisão, a defesa interpôs agravo regimental, alegando que a decisão monocrática agravada procedeu ao reexame de prova, o que é vedado em sede de recurso especial, conforme estabelece a Súmula 7/STJ. A Sexta Turma do STJ negou provimento ao agravo regimental, em acórdão assim ementado: “PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO SIMPLES (ART. 157, CAPUT, DO CP), DESCRITO NA DENÚNCIA, FOI OBJETO DE CONDENAÇÃO, NA SENTENÇA. APELAÇÃO PROVIDA, COM DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA DO RÉU, AO ENTENDIMENTO DE QUE OS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA CONSTITUIRIAM CRIME DE FURTO (ART. 155, CAPUT, DO CP). PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL, COM RESTABELECIMENTO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. REVALORAÇÃO DO CONTEXTO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I. A decisão agravada, ao dar provimento ao Recurso Especial do Ministério Publico, não reexaminou os fatos – providência vedada, em sede de Recurso Especial, pela Súmula 07/STJ –, tendo realizado apenas a sua revaloração, tal como descritos na denúncia. II. A apreciação da conduta imputada ao réu, a fim de restabelecer a sentença que o havia condenado por roubo simples, limitou-se à análise jurídica dos atos praticados pelo ora recorrente e descritos pela denúncia, estes, não sujeitos a questionamentos, quanto à sua dinâmica. III. Como já decidido por esta Corte: "Não se trata, portanto, de reexame do conjunto probatório, que encontra óbice no enunciado nº 7 da Súmula desta Corte, mas, sim, de revaloração dos critérios jurídicos utilizados na apreciação dos fatos incontroversos" (STJ, AgRg no REsp 902.486/RS, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, DJe de 30/06/2008). IV. Agravo Regimental desprovido” (documentos comprobatórios – e-STJ Fl. 253) Nesta via, sustenta a impetração que para dar provimento do recurso especial, o STJ reexaminou o conjunto fático probatório, modificando, indevidamente, as premissas fáticas estabelecidas pela Corte Estadual, em violação expressa à Súmula nº 07/STJ, e ao art. 105, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal. Por tal motivo, requer a cassação do acórdão proferido pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, restabelecendo-se, assim, o acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. RELATÓRIO DE ACUSAÇÃO A súplica não merece acolhida. Diferentemente do que assevera a impetração, não houve incursão fática no julgado proferido em sede de recurso especial. É o que se depreende da leitura do seguinte trecho do decisum: “(...) Conheço do recurso especial pelas alíneas a e c do permissivo constitucional, porque tempestivo, regularmente proposto, prequestionado o tema recursal e adequadamente comprovado e demonstrado o dissídio jurisprudencial, não havendo falar, por fim, em reexame de provas, porquanto a questão federal a ser discutida está embasada no acórdão impugnado, sendo os fatos conhecidos conforme julgados na instância ordinária. Extrai-se do voto do e. Relator o seguinte excerto: "Analisando as razões defensivas, estou que razão em parte lhe assiste, data venia. É que para a tipificação da conduta do agente naquela prevista no art. 157 do CP, necessário se faz que ele tenha subtraído a res mediante o emprego de grave ameaça ou violência, sendo certo que a ocorrência dessas duas hipóteses não restou suficientemente evidenciada nos autos. Nas duas vezes em que a vítima foi ouvida ela relata que o apelante abordou-a gritando. Na fase policial ela assinala que o autor não a ameaçou, não usou qualquer tipo de arma ou agressão física para a prática do furto, conforme já anteriormente destacado. Em juízo, muito embora tenha afirmado que seu celular foi arrancado pelo apelante e que, quando ele entrou no carro sentiu-se intimidada, relata que não sofreu qualquer lesão. Ora, é natural a vítima sentir-se intimidada na hipótese dos autos, mormente quando um indivíduo estranho adentrou em seu veículo, aos gritos, exigindo-lhe que entregasse seus pertences. Entretanto, não vislumbro, neste caso concreto, a figura da grave ameaça. Não se extrai do evento que a vítima tenha sido reduzida à impossibilidade de resistência, até porque assinala que, antes mesmo que entregasse qualquer objeto ao meliante, este "arrancou-lhe" o celular e evadiu. Tal circunstância autoriza a desclassificação para a figura do furto." É esta a letra dos arts. 155 e 157 do Código Penal: Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Assim, o conceito de furto atrai a ideia da subtração pura e simples, o apossamento sem características de violência, enquanto o roubo abrange a grave ameaça ou a violência. Na hipótese em exame, a vítima estava no interior do seu veículo, quando o agente entrou gritando e determinando que ela entregasse tudo o que tinha em mãos. Diante desse quadro fático, constatado no acórdão, não é possível deixar de reconhecer a grave ameaça praticada contra a vítima. A grave ameaça é o prenúncio de um acontecimento desagradável, com força intimidativa, que facilite a consecução da empreitada criminosa. Ressalte-se que para a configuração da grave ameaça basta que os agentes imponham um real temor na vítima, perturbando-lhea liberdade e integridade psíquica” (documentos comprobatórios – e-STJ Fls. 232/237). Como se vê, não houve reapreciação fática, mas revaloração jurídica de dados explicitamente admitidos e delineados no decisório recorrido. Em verdade, a Corte Superior, ao examinar os elementos fático jurídicos considerados no julgamento anterior, apenas atribuiu nova valoração à conduta praticada pelo acusado. Observe-se que o próprio Tribunal de origem, embora tenha desclassificado o crime de roubo para o delito de furto reconheceu que a vítima “não sofreu nenhuma lesão em decorrência do ocorrido, mas que, quando o apelante entrou no carro sentiu-se intimidada (fl. 58).” (documentos comprobatórios e-STJ fl. 150 – g.n), e a Corte Superior de Justiça concluiu, acertadamente, que tal força intimidadora retirou qualquer pretensão de resistência da vítima, impondo lhe real temor e perturbando-lhe a integridade psíquica, de modo a configurar a grave ameaça que caracteriza o crime de roubo. Portanto, não há se falar em revolvimento de material probatório, quando, o Tribunal Superior, ao proceder à análise dos elementos constantes nos autos, chegou a conclusão diversa do Tribunal de Justiça. Este ponto de vista encontra eco na postura dessa Corte Máxima que, em casos que guardam perfeita sintonia com o presente, afastou a alegação de julgamento contrário à orientação contida na Súmula 07/STJ, reconhecendo que a Corte Superior de Justiça procedera à revaloração dos elementos admitidos pelo acórdão da Corte local. Eis os exemplos dessas decisões: “DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. REEXAME DE MATERIAL FÁTICOPROBATÓRIO. SUPOSTA NULIDADE DO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. VIA ESTREITA DO WRIT. HC PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, DENEGADO. 1. As questões de direito tratadas neste writ dizem respeito à possibilidade de reexame de prova para restabelecer a absolvição do paciente e à nulidade do acórdão do Superior Tribunal de Justiça que teria procedido à revaloração dos elementos de prova ao prover o recurso especial. 2. A respeito da primeira questão, o habeas corpus sequer merece ser conhecido neste particular. O remédio constitucional do habeas corpus não representa instrumento hábil e idôneo a ensejar o reexame dos elementos de prova produzidos durante a instrução processual. Neste sentido: HC n° 85.582/SP, rel. Min. Carlos Britto, DJ 16.03.2007; HC n° 85.958/SP, rel. Min. Eros Grau, DJ 03.03.2006. 3. O Superior Tribunal de Justiça, ao dar provimento ao recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de Rio Grande do Sul, atribuiu nova valoração dos elementos fático-jurídicos existentes nos autos, qualificando-os como caracterizadores do crime de tráfico de entorpecentes, razão pela qual não procedeu ao revolvimento de material probatório para divergir da conclusão alcançada pelo Tribunal de Justiça. 4. No caso em tela, não houve julgamento contrário à orientação contida na Súmula 07, do STJ, eis que apenas se procedeu à revaloração dos elementos admitidos pelo acórdão da Corte local, tratando-se de quaestio juris, e não de quaestio facti. Como já decidiu o STF, nova valoração de elementos fático-jurídicos não se confunde com reapreciação de matéria probatória (HC nº 82.219/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 19.12.2002). 5. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nesta parte, denegado” . À vista do exposto, opinamos pela denegação da ordem. Decisão A Turma concedeu a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. 1ª Turma, 22.10.2013. Obs.: Art. 45 do CP - A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade, pelo tempo da pena aplicada, quando: ((Redação dada pela Lei nº 7.209, de 1984) I - sobrevier condenação, por outro crime, a pena privativa de liberdade cuja execução não tenha sido suspensa; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 1984) Art. 46. Do CP- A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998) Art. 59 do CP: “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:” Súmula 231 STJ: A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. Art. 105 - O perdão do ofendido, nos crimes em que somente se procede mediante queixa, obsta ao prosseguimento da ação. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Súmula 7 STJ : A PRETENSÃO DE SIMPLES REEXAME DE PROVA NÃO ENSEJA RECURSO ESPECIAL.
Compartilhar