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T Ec o n o m ia R e gi o n al e U rb an a: t ex to s se le ci o n ad o s F áb io C o st a & A n d e rs o n C o st a 2 0 1 4 Fábio Heleno Mourão da Costa: Possui Graduação em Ciências Econômicas e Mestrado em Desenvolvimento Regional. Atualmente é Professor Assistente I do Departamento de Economia e Análise da Universidade Federal do Amazonas. Tem experiência na área de Economia Regional e Urbana e Métodos Quantitativos em Economia, atuando principalmente nos seguintes temas: concentração espacial, crescimento e dinamismo regional. Anderson Litaiff Feitosa da Costa: Possui graduação em Filosofia – Licenciatura (2005), graduação em Ciências Econômicas e mestrado em Desenvolvimento Regional (2009), todos pela Universidade Federal do Amazonas. Atualmente é Professor Assistente I da Universidade Federal do Amazonas. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Métodos Quantitativos em Economia. Nota dos professores: Este material foi desenvolvido a partir da seleção de vários textos e/ou parte destes, na grande maioria das vezes, utilizando na íntegra o texto original. Com isto, os autores deste material, não possuem nenhuma pretensão de originalidade acerca do conteúdo que expõem nas próximas páginas deste trabalho. O objetivo foi, tão somente, disponibilizar aquilo que há de melhor em termos didáticos sobre o assunto tratado aqui. Esperamos que os alunos possam tirar o máximo proveito deste material e que possam sugerir o aperfeiçoamento do mesmo. As referências dos textos originais encontram-se no plano de ensino, próxima página. Abraços, Prof. Fábio Costa e Prof. Anderson Costa Plano de Ensino I. IDENTIFICAÇÃO CURSO: Ciências Econômicas PERÍODO: 8° DISCIPLINA: Economia Regional e Urbana SIGLA: CARGA HORÁRIA: 60h Nº DE CRÉDITOS: 04 PROFESSORES: Fábio Heleno Mourão da Costa Anderson Litaiff Feitosa da Costa II. EMENTA Economia regional no contexto da ciência econômica e da ciência regional. Configuração do espaço e conceituação de região. Desigualdades regionais: teorias sobre a origem das desigualdades regionais. Teorias e modelos de crescimento regional e urbano. A questão regional no Brasil. Teoria da localização e sua aplicação nos estudos regionais e urbanos. Os primórdios da urbanização brasileira. Teorias contemporâneas de urbanização. Redes Urbanas. Análise intra- urbana. Funções urbanas. Crescimento das cidades: custos e controle. Crescimento das cidades: custos e controle. Planejamento Urbano. Globalização e Desenvolvimento Regional. III. OBJETIVOS Apresentar os principais aspectos teóricos da economia regional regional e urbana; Apresentar os principais métodos de análise regional; Avaliar dados econômicos regionais a partir de softwares estatísticos livres (GretL, IpeaGeo, bem como a planilha eletrônica Excel). IV. METODOLOGIA As aulas serão realizadas pelo Sistema Presencial Mediado, no qual o conteúdo programático será desenvolvido com apoio de equipamentos de multimídia. No que diz estratégia de ensino serão aplicados exercícios conceituais ao longo das dinâmicas locais, enquanto que exercícios teóricos e questões de revisão serão aplicados na aula de revisão a partir de um banco de dados de questões respondidas que estarão disponíveis com a apostila. Além disso, os discentes se depararão com as principais bases de microdados existentes no Brasil, para que os mesmos possam manipular e desenvolver trabalhos científicos. V. AVALIAÇÃO Avaliação Parcial 1 e 2: Avaliação Formal Individual (8,0 pontos) DL (Dinâmica Local). Compreende atividades diversas, tais como realização de Seminários, trabalhos individuais ou em grupo, dentre outros. (2,0 pontos) Avaliação Final: artigo científico baseado nos aspecto teóricos e, principalmente, métodos de análise regionais aplicados à realidade dos 15 municípios participantes do curso. O artigo deverá ser entregue na forma escrita, bem como apresentado aos professores locais. (10,0 pontos). As normas do artigo será explicado em aula. VI. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO I. Economia regional no contexto da ciência econômica e da ciência regional: Evolução da análise econômica regional; II. Configuração do espaço e conceituação de região: Espaço, regiões e economia regional; III. Desigualdades regionais - teorias sobre a origem das desigualdades regionais: Desigualdades regionais no processo de desenvolvimento; IV. A questão regional no Brasil: Questão regional no Brasil; V. Teorias e modelos de crescimento regional e urbano: Crescimento econômico, convergência de renda e elementos espaciais; VI. Teoria da localização e sua aplicação nos estudos regionais e urbanos: i) Localização da atividade econômica; e, ii) Métodos de análise regional. VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COSTA, A. L. F & SÁ, M. T. V. Educação e Desenvolvimento Regional: evidências para a região Norte. Manaus: CBE, 2013. COSTA, A. L. F. & SÁ, M. T. V. Crescimento Econômico e Educação: explorando análises cross-section para as unidades da federação e municípios amazonenses. Manaus: CBE, 2013. COSTA, F. H. M. & COSTA, A. L. F. Apostila de Economia Regional e Urbana: Textos Selecionados. 2014. COSTA, F. H. M. Concentração, Especialização e Dinamismo da Indústria Petroquímica Brasileira no período de 1995 a 2005. Dissertação de mestrado: UFAM, 2009. CRUZ, Bruno de Oliveita et al. (Orgs.). Economia regional e urbana: teorias e métodos com ênfase no Brasil. Brasília: Ipea, 2011. GUJARATI, Damodar N.; PORTER, Dawn C. Econometria Básica. Tradução Denise Durante, Mônica Rosemberg, Maria Lúcia G. L. Rosa. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2011. HADDAD, Paulo Roberto (Org.). Economia regional: teorias e métodos de análise. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 1989. SOUZA, Nali de Jesus de. Desenvolvimento regional. São Paulo: Atlas, 2009. Sumário Capítulo 1 Economia regional no contexto da ciência econômica e da ciência regional ................................................................................................................................................ 7 EVOLUÇÃO DA ANÁLISE ECONÔMICA REGIONAL .................................................................. 8 ELEMENTOS REGIONAIS NA TEORIA ECONÔMICA TRADICIONAL ............................................. 9 Os precursores e os clássicos .......................................................................................................................... 10 Alfred Marshall e as economias externas ................................................................................................... 13 CRISE URBANA E DESEQUILÍBRIOS REGIONAIS ............................................................................. 15 Problemas regionais na Europa ..................................................................................................................... 17 Surgimento de novas teorias ........................................................................................................................... 19 NOÇÕES DE ESPAÇO E DE REGIÃO ....................................................................................................... 21 Noção de espaço ................................................................................................................................................... 22 Diferentes concepções de região ...................................................................................................................24 Dificuldades do conceito de região ............................................................................................................... 25 Hierarquia e tamanho dos centros urbanos .............................................................................................. 27 Visão de Walter Isard ......................................................................................................................................... 28 Noções de região e o desenvolvimento regional ..................................................................................... 30 QUESTÕES PARA REFLEXÃO E DISCUSSÃO ...................................................................................... 31 LEITURAS SUGERIDAS ............................................................................................................................. 32 Capítulo 2 Configuração do espaço e conceituação de região .................................................. 33 ESPAÇO, REGIÕES E ECONOMIA REGIONAL .......................................................................... 34 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 34 CONCEITOS .................................................................................................................................................. 36 Economia Espacial ............................................................................................................................................... 36 Economia Regional .............................................................................................................................................. 37 Região ........................................................................................................................................................................ 38 O DESCASO PELO FENÔMENO ESPACIAL .......................................................................................... 43 AS DESIGUALDADES DA DISTRIBUIÇÃO DAS ATIVIDADES ........................................................ 48 O Fenômeno da Concentração ........................................................................................................................ 48 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................... 52 Capítulo 3 Desigualdades regionais: teorias sobre a origem das desigualdades regionais ........................................................................................................................................... 55 DESIGUALDADES REGIONAIS NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO ................................... 56 VISÕES DAS DESIGUALDADES REGIONAIS ....................................................................................... 56 Origem das desigualdades na troca desigual ............................................................................................ 57 Causação circular e acumulativa .................................................................................................................... 61 Hipótese de Kuznets-Williamson .................................................................................................................. 67 MOBILIDADE ESPACIAL DOS FATORES DE PRODUÇÃO .............................................................. 71 Migração da mão de obra .................................................................................................................................. 73 Mobilidade do capital ......................................................................................................................................... 75 Difusão espacial das inovações e divisão do trabalho .......................................................................... 77 QUESTÕES PARA REFLEXÃO E DISCUSSÃO ...................................................................................... 79 LEITURAS SUGERIDAS ............................................................................................................................. 79 Capítulo 4 Teorias e modelos de crescimento regional e urbano ................................ 81 CRESCIMENTO ECONÔMICO, CONVERGÊNCIA DE RENDA E ELEMENTOS ESPACIAIS ........... 82 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 82 0 legado .................................................................................................................................................................... 83 ALGUNS MODELOS DE CRESCIMENTO ECONÔMICO ..................................................................... 88 Modelo neoclássico .............................................................................................................................................. 88 Nova teoria do crescimento econômico ...................................................................................................... 92 CONVERGÊNCIA DE RENDA: MÉTODO E MENSURAÇÃO .............................................................. 95 Abordagem por modelos de regressão ....................................................................................................... 96 Abordagem com uso da função de distribuição de probabilidade das rendas ........................... 99 Qualificações de Durlauf, Johnson e Temple (2005) .......................................................................... 100 ALGUMAS ANÁLISES EMPÍRICAS ...................................................................................................... 105 Estudos aplicados com ênfase no caso brasileiro ................................................................................ 105 EFEITOS ESPACIAIS E CONVERGÊNCIA DE RENDA ..................................................................... 108 Efeito do movimento de fatores .................................................................................................................. 108 Dependência espacial ...................................................................................................................................... 109 MODELOS DE CRESCIMENTO COM EXPLICITAÇÃO DE ELEMENTOS ESPACIAIS .............. 111 Modelo de Ramsey-Cass-Koopmans espacial ........................................................................................ 112 Modelo de crescimento endógeno espacial ............................................................................................ 115 Modelo de Solow-Romer espacial .............................................................................................................. 115 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................................... 117 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 118 EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: EVIDÊNCIAS PARA A REGIÃO NORTE ............................................................................................................................................................ 127 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 128 EDUCAÇÃO E CRESCIMENTO ECONÔMICO REGIONAL: EXPLORANDO ANÁLISES DE REGRESSÃO COM DADOS DE PAINEL .............................................................................................. 130 Método de análise ............................................................................................................................................... 131 Resultados e Discussão ...........................................................................................................................135 CONCLUSÃO.............................................................................................................................................. 143 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 145 CRESCIMENTO ECONÔMICO E EDUCAÇÃO: EXPLORANDO ANÁLISES CROSS- SECTION PARA AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO E MUNICÍPIOS AMAZONENSES ..... 147 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 148 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS ...................................................................................................................... 149 METODOLOGIA ....................................................................................................................................... 152 Especificação dos modelos ............................................................................................................................ 152 Especificação da metodologia econométrica ......................................................................................... 154 Especificação das variáveis e base de dados .......................................................................................... 154 RESULTADOS E DISCUSSÃO: O COMPORTAMENTO DO PRODUTO E RENDA E OS FATORES DE CRESCIMENTO............................................................................................................... 156 Os modelos para as Unidades da Federação .......................................................................................... 156 Os modelos para os municípios amazonenses ...................................................................................... 160 CONCLUSÃO.............................................................................................................................................. 162 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 165 Capítulo 5 A questão regional no Brasil ...................................................................................... 167 QUESTÃO REGIONAL NO BRASIL .................................................................................................. 168 TENDÊNCIA À CONCENTRAÇÃO ECONÔMICA NO BRASIL ........................................................ 168 Origens do crescimento polarizado no Brasil........................................................................................ 169 Positivismo no Rio Grande do Sul .............................................................................................................. 172 Situação das desigualdades regionais no Brasil ................................................................................... 174 POLÍTICAS REGIONAIS NO BRASIL: O CASO DO NORDESTE .................................................... 185 Montagem do quadro institucional para o Nordeste.......................................................................... 186 Polos de crescimento no Nordeste ............................................................................................................. 194 TENDÊNCIAS DO CRESCIMENTO REGIONAL NO BRASIL .......................................................... 197 QUESTÕES PARA REFLEXÃO E DISCUSSÃO ................................................................................... 199 LEITURAS SUGERIDAS .......................................................................................................................... 200 Capítulo 6 Teoria da localização e sua aplicação nos estudos regionais e urbanos ............ 201 LOCALIZAÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA ............................................................................... 202 VON THÜNEN E A CONCORRÊNCIA PELO USO DA TERRA ........................................................ 203 Derivação das áreas de cultivo .................................................................................................................... 204 Aplicação do modelo de Von Thünen ........................................................................................................ 209 ALFRED WEBER E A LOCALIZAÇÃO ÓTIMA DA EMPRESA INDUSTRIAL ............................. 211 Minimização dos custos de transporte ..................................................................................................... 212 Minimização dos custos de produção ....................................................................................................... 217 OUTRAS CONTRIBUIÇÕES À TEORIA DA LOCALIZAÇÃO .......................................................... 220 Christaller, Lösch e seguidores .................................................................................................................... 220 Predöhl, Hotelling e Palander ...................................................................................................................... 227 Tendências modernas da análise locacional .......................................................................................... 233 QUESTÕES PARA REFLEXÃO E DISCUSSÃO ................................................................................... 239 LEITURAS SUGERIDAS .......................................................................................................................... 239 MÉTODOS DE ANÁLISE REGIONAL ......................................................................................... 241 MEDIDAS DE ESPECIALIZAÇÃO E CONCENTRAÇÃO ................................................................... 241 Quociente locacional e a curva de localização ....................................................................................... 242 Índice de concentração normalizado (ICn) ............................................................................................. 244 Método estrutural-diferencial .......................................................................................................... 245 Formulação original do método .................................................................................................................. 246 Reformulações de Stilwell ............................................................................................................................. 249 O efeito alocação de Esteban-Marquillas e Herzog & Olsen ............................................................ 249 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 251 7 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 7 Fábio Costa e Anderson Costa Capítulo 1 Economia regional no contexto da ciência econômica e da ciência regional 8 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 8 Fábio Costa e Anderson Costa EVOLUÇÃO DA ANÁLISE ECONÔMICA REGIONAL Nali de Jesus de Souza1 Neste capítulo, estuda-se a evolução da análise econômica regional e suas relações com a teoria econômica tradicional. Em seguida, arrolam-se os principais eventos responsáveis pelo surgimento dos estudos regionais; e, finalmente, apresentam-se as noções de espaço e de região. Tradicionalmente, o elemento espaço não tem recebido muita atenção na teoria econômica, sendo relegado a um plano secundário. As disciplinas Economia Regional e Economia Urbana somente emergiram no final dos anos de 1940, tendo como origem teórica os postulados da teoria da localização, desenvolvida desde o século XIX pelos pioneiros Von Thünen, Weber, Christaller e Lôsch2. A série de artigos publicados por Richard Andrews na revista Land Economics, entre 1953 e 1956, contribuiupara a sistematização da disciplina Desenvolvimento Regional ao tratar dos postulados da base econômica urbana, aplicados, mais tarde, à Economia Regional. Em 1960, Walter Isard publicou o seu livro Métodos de análise regional, fornecendo os principais instrumentos do Planejamento Regional: projeções demográficas, estimativa de migrações, renda regional e fluxos inter-regionais, multiplicadores, localização, modelos gravitacionais e de insumo-produto. Ele abordou também a análise dos complexos industriais, programação linear, além de técnicas de projeções demográficas e econômicas (ISARD, 1972). Ainda em 1960, surgiu a obra Regiões, recursos e crescimento econômico, de autoria de Perloff, Dunn, Lampard e Muth. O livro trata do crescimento regional dos EUA, entre 1870 e 1950, da distribuição regional das atividades econômicas nesse país e das variações regionais da taxa de crescimento econômico e da renda per capita entre os Estados norte-americanos (PERLOFF et al., 1960). Como abordagem teórica, enfoca os fatores internos e externos da expansão regional, a teoria da base exportação, a teoria do crescimento regional por etapas, os fatores locacionais e multiplicadores de emprego3. 1 Extraído de: SOUZA, Nali de Jesus.de. Desenvolvimento Regional. São Paulo: Atlas, 2009. (Capítulo 1). 2 As disciplinas Economia Regional, Economia Urbana, Desenvolvimento Local, Planejamento Regional serão sintetizadas em uma única, que iremos denominar Desenvolvimento Regional. 3 Foi nesse capítulo que Harvey Perloff desenvolveu um instrumental de análise, denominado método estrutural-diferencial, que passou a ser muito utilizado na análise regional e que será estudado no Capítulo 5 deste livro. 9 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 9 Fábio Costa e Anderson Costa Outra obra clássica foi Desenvolvimento regional e planejamento: uma leitura, de Friedmann e Alonso. Nessa obra, eles salientam que, sem considerar o território, a análise econômica seria incompleta e que a decisão de onde localizar um novo projeto é tão importante quanto o próprio projeto; que as questões relativas à distribuição dos frutos do crescimento econômico são tão relevantes do ponto de vista regional como entre as classes sociais (FRIEDMANN; ALONSO, 1964, p. 1). Essa coletânea contém uma seleção de artigos sobre: localização, organização do território, crescimento regional, papel da cidade na formação das regiões, migrações, políticas de industrialização de áreas atrasadas e planejamento regional. Ela forneceu elementos para a sistematização do pensamento econômico, em relação ao desenvolvimento regional, até então dispersos na literatura especializada. A demora do Desenvolvimento Regional se constituir como especialidade independente do conhecimento econômico se deve ao predomínio dos postulados neoclássicos na teoria econômica. Essa abordagem sempre concedeu lugar de destaque ao fator tempo na análise, por suas relações com a História e porque se presta melhor à análise matemática rigorosa (RICHARDSON, 1975, p.16). Ademais, as suposições da análise neoclássica ficam "de difícil aplicação aos fenômenos econômicos espaciais e, além do mais, a hipótese de concorrência perfeita se mostra insustentável" (FERREIRA, in HADDAD et al., 1989, p. 54). O fator espaço implica em descontinuidades e em elementos de monopólio, o que perturba a análise neoclássica. Apesar disso, considerações regionais são bastante antigas na análise econômica e são anteriores aos próprios economistas clássicos. ELEMENTOS REGIONAIS NA TEORIA ECONÔMICA TRADICIONAL As atividades econômicas não se encontram em todas as partes do território. A concentração econômica, as descontinuidades espaciais e as desigualdades regionais são inevitáveis, pelo menos nas fases iniciais do processo de crescimento e de ocupação do território regional. Apesar disso, os custos da mobilidade espacial têm sido negligenciados. A não consideração do elemento espaço na análise econômica se deve muito à influência inglesa na formulação da teoria econômica. A Inglaterra situa-se em uma ilha relativamente pequena, com acesso fácil e barato por todos os lados, 10 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 10 Fábio Costa e Anderson Costa particularmente ao se considerar a via costeira. Desse modo, é natural que pouca importância tenha sido atribuída à variável distância (SMOLKA, 1983, p. 705). Os precursores e os clássicos Apesar da negligência do elemento espaço na análise econômica tradicional, referências à questão espacial nos textos econômicos são bastante antigas, remontando à época mercantilista (1450/1750). Nessa escola, a preocupação com balança comercial favorável levou à formulação de políticas econômicas intervencionistas e protecionistas. A obstinação em conquistar novos mercados externos implicava a consideração do fator distância e dos mecanismos da circulação de bens e serviços entre dois espaços: a metrópole e a colônia. Superávits comerciais necessitavam da expansão das exportações e da substituição de importações, via desenvolvimento do setor de mercado interno. Isso levava os mercantilistas a defenderem o crescimento demográfico interno, a expansão das cidades e a proteção à indústria e ao comércio, setores considerados superiores à agricultura. O inglês William Petty (1623-1687), precursor da escola clássica, enfatizou o papel da divisão do trabalho na geração da riqueza um século antes de Adam Smith. Com esse objetivo, via com bons olhos o desenvolvimento das grandes cidades e o crescimento demográfico, uma vez que expande os mercados e facilita a divisão do trabalho (AYDALOT, 1985, p. 10). Além disso, afirmava que uma distribuição espacial mais racional das paróquias no Reino Unido, em função da densidade demo gráfica, além de melhorar o atendimento da população, reduziria o número de templos, padres e bispos. Isso representaria economia de tempo e de recursos (PETTY, 1996, p. 40). No mesmo sentido, afirmava que os rendimentos são decrescentes, não em função da redução da fertilidade do solo, como iria supor mais tarde Ricardo (RICARDO, 1982), mas em razão da situação locacional das terras em relação aos mercados. A renda de situação tornava- se um elemento crucial e mais relevante do que uma possível renda de diferenciais de produtividade do solo. Petty considerava também que: (a) salários altos estimulam a indolência; (b) excesso de moeda em circulação eleva os preços; (c) seria preferível queimar o excesso da produção de tecidos não exportados, para não gerar desemprego; (d) população numerosa gera riqueza para a nação. Segundo ele, o "Estado, ao matar; mutilar e 11 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 11 Fábio Costa e Anderson Costa aprisionar seus membros pune também a si próprio, razão pela qual tais punições deveriam, tanto quanto possível, serem evitadas e comutadas por penas pecuniárias, que fariam crescer o trabalho e a riqueza pública" (PETTY, 1996, p. 84)4. Para o francês Richard Cantillon (1680-1734), o problema do território consiste na articulação entre as cidades e o campo, no estudo das grandes cidades e de suas vantagens. Segundo ele, a terra é a única fonte de riqueza, por produzir um excedente acima dos custos de produção, sendo o trabalho a força geradora dessa riqueza. Rendas criadas no meio rural são gastas nas cidades, onde residem os proprietários e onde se formam os grandes mercados (AYDALOT, 1985, p. 10). Ele desenvolveu uma teoria sobre a origem das aldeias e das divisões administrativas. Elas derivam de mercados periódicos e, depois, de mercados permanentes.Posteriormente, transformam-se em cidades e em capitais regionais, exercendo uma influência sobre centros urbanos menores, dentro de determinado raio de ação (SCHUMPETER, 1964, v. 1, p. 273). Na análise de Cantillon, a organização espacial efetua-se em função de centros urbanos hierarquizáveis com suas respectivas áreas de influência. Assim, tem-se um centro maior, a metrópole regional, descendo-se na hierarquia para centros de tamanho médio e pequeno. O número de centros aumenta em direção da periferia (área rural). "As áreas de influência dos centros menores ficam contidas nas áreas de influência dos de ordem mais elevada" (LOPES, 1979, v. 1, p. 159). Existem fluxos de bens e serviços hierarquizados no território na ordem ascendente, campo-aldeia-cidade-metrópole, bem como no sentido descendente, metrópole-cidade- aldeia-campo. A riqueza de uma cidade reside na pujança de seu interior, da disponibilidade de terras férteis, recursos naturais, rios navegáveis, portos e infraestrutura de base, facilitando a circulação de bens e serviços no território. Adam Smith (1723-1790) levou em conta, explicitamente, o fator espaço em sua obra capital, A riqueza das nações (1776), ao afirmar que a extensão dos mercados proporciona maior divisão do trabalho, aumentando a produtividade e a riqueza nacional, e que várias ocupações só podem ser executadas em grandes cidades (SMITH, 1983, v. 1, capo 3). O crescimento econômico concentra as atividades em função da 4 Como meio de aumentar a riqueza nacional, ele defendia o livre comércio, a construção de estradas, pontes e aterros, assim como o desenvolvimento da navegação fluvial e marítima (PETTY, 1996, p. 45). 12 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 12 Fábio Costa e Anderson Costa localização da mão de obra e dos consumidores. O isolamento do produtor dificulta a divisão do trabalho e a especialização. A pequena dimensão do mercado local impede a produção em larga escala, o que eleva os custos médios. O produtor precisa escoar sua produção para áreas mais distantes, o que exige meios de transporte baratos e eficientes. A agricultura e a indústria surgiram próximas dos transportes fluviais ou marítimos, porque eles reduzem os custos de comercialização e ampliam os mercados. As populações e as atividades econômicas tendem a surgir nas margens dos rios navegáveis ou junto aos portos marítimos. Pelo contrário, no interior das regiões, longe das vias naturais de transporte e de penetração, sem a presença de jazidas minerais ou outras fontes de riqueza, a população tende a ser rarefeita, os mercados estreitos, resultando, por conseguinte, em pouco ou nenhum desenvolvimento. Smith evoca a prosperidade da bacia do Nilo, no Egito, e do Ganges, na Índia, contrapondo a pobreza no interior da África (SMITH, 1983, p. 55). ° desenvolvimento da Inglaterra, do Canadá e dos EUA foi impulsionado pela abertura de canais e construção de ferrovias interligando mercados em diversas regiões de cada um desses países (SOUZA, 2005, cap. 2). David Ricardo (1772-1823), em seus Princípios (1817), refere-se ao elemento espaço indiretamente ao analisar a renda da terra. As melhores terras são ocupadas em primeiro lugar; a seguir, pelo crescimento demográfico, os agricultores vão se deslocando para áreas com fertilidade decrescente e mais distantes dos mercados. Esse deslocamento será rápido na ausência de importações e de progresso técnico que aumente a produção nas áreas tradicionais e mais próximas dos mercados. As rendas surgem em terras melhores, em função da ocupação de terras piores e do diferencial de produtividade. Se as terras fossem "abundantes e uniformes em qualidade, seu uso nada custaria, a não ser que possuíssem particulares vantagens locacionais", ou proximidade dos mercados (RICARDO, 1982, p. 66). Os produtores que se localizam mais próximos do mercado auferem uma renda locacional, ou renda de situação, uma vez que os preços são determinados nas terras piores e mais distantes dos centros urbanos (ver adiante, seção 2.1, Figura 2.1). Ao discorrer sobre a teoria das vantagens comparativas do comércio exterior, Ricardo reduz as diferentes nações a pontos, abstraindo o elemento espaço ao desconsiderar os 13 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 13 Fábio Costa e Anderson Costa custos de transporte. Toda a ênfase de sua análise recai sobre o custo do fator trabalho. Cada país importa o produto que produziria internamente com o maior custo de trabalho, exportando aquele de menor custo, independentemente da distância a ser percorrida e dos custos de transferência dos produtos entre os países envolvidos no comércio internacional (RICARD0, 1982, p. 104). Para os economistas clássicos, a mão de obra constitui o fator de produção mais importante, junto com o capital. Desse modo, sua localização e a variação espacial dos salários afetam a localização ótima da empresa. John Stuart Mill (1806-1873) reconheceu, em 1848, que o custo total de produção fica acrescido dos custos de transporte, que variam com a distância aos mercados. Ao custo de produção, disse ele, "se devem acrescentar os salários dos transportadores, que transportam quaisquer objetos e utensílios de produção ao local em que tinham que ser utilizados, e o próprio produto ao local em que este deve ser vendido" (MILL, 1983, v. 2, p. 23). No caso da transformação de produtos minerais, ou da pesca, o custo total dependerá do rendimento da pior mina, ou do pior pesqueiro, e de sua localização (MILL, 1983, v. 2, p. 37). Alfred Marshall e as economias externas Alfred Marshall (1842-1924) deu grande destaque ao elemento espaço na análise econômica. Lembrou que, historicamente, a atividade econômica tende a se localizar em alguns sítios e que as civilizações se desenvolvem com a produção para a exportação para os mais distantes centros consumidores: Ele cunhou o termo economias externas para designar os benefícios que se originam da concentração da atividade econômica em alguns centros (MARSHALL, 1982, v. 1, cap. 10). Diferenciou economias externas de economias internas. Estas, sendo as mais típicas as economias de escala, decorrem do aumento das quantidades produzidas, da melhoria da eficiência produtiva, da melhor organização da produção no nível da empresa. As economias externas dependem do desenvolvimento geral da indústria, da concentração de empresas interdependentes em uma dada localização. Elas surgem fora da empresa e independem de sua ação; constituem vantagens gratuitas que atraem outras atividades, promovendo crescimento diferencial em relação a outras localidades (MARSHALL, 1982, 14 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 14 Fábio Costa e Anderson Costa V. 1, p. 231). Essas vantagens podem ser a proximidade de porto ou rio navegável, jazidas minerais, terras férteis, disponibilidade de alguma matéria-prima. Scitovski (1969) distinguiu as economias externas tecnológicas, que decorrem da interdependência entre as atividades econômicas, e as economias externas pecuniárias, constituídas por fatores gratuitos e internalizadas pela empresa i. Elas se originam da existência prévia de concentração demo gráfica e econômica, representando maior disponibilidade de insumos e mão de obra especializada, assim como por infraestrutura, podendo levar à concentração industrial. A dimensão do mercado local é importante, mas não crucial, quando as economias externas são importantes e se o custo de transporte não tiver peso significativo no preço final do produto. As indústrias se concentram em torno de vantagens físicas (comoclima, solo, minas, pedreiras, portos), acesso à mão de obra e aos mercados. No passado, algumas aldeias se especializaram na produção de rodas para carroças, carrocerias, tecidos de lã ou linho, sabão etc. Os flamengos levaram a indústria para a Inglaterra e os ofícios originaram-se da Arábia e do Egito. A concentração das empresas facilita a difusão do conhecimento técnico e a concentração da mão de obra atrai atividades interligadas. A diversificação industrial reduz o custo da mão de obra e eleva a renda familiar pelo aumento do emprego e dos salários. Deseconomias externas podem surgir pela elevação dos salários e dos aluguéis nas aglomerações urbanas. A expansão da demanda de terrenos para habitação, por parte dos trabalhadores, leva as fábricas a se instalarem nos "subúrbios das grandes cidades, ou em seus distritos industriais, e nunca nas próprias cidades" (MARSHALL, 1982, v. 1, p. 235). A concentração das indústrias atrai a mão de obra, além das empresas. As pessoas encontram maior flexibilidade de emprego em áreas densamente industrializadas. Maior oferta de trabalhadores reduz os salários médios. Porém, à medida que sua demanda aumenta, ocorre o contrário. A presença de sindicatos fortes eleva os salários e as empresas tendem a procurar áreas novas, não congestionadas, para se implantarem. A concorrência entre as empresas também eleva o custo da terra e do trabalho. Há concorrência também entre demandantes de terrenos para construção de moradia para a classe média e instalação de fábricas e casas comerciais. 15 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 15 Fábio Costa e Anderson Costa As pessoas e as atividades econômicas são induzidas a emigrar para as periferias urbanas ou para distritos industriais planejados. O crescimento tende a difundir-se no território pelo surgimento de deseconomias nas grandes cidades ou por restrições criadas pela legislação antipoluição, que elevam os custos e criam barreiras ao crescimento da empresa nos antigos sítios. O desenvolvimento dos meios de comunicação e de transporte altera as forças aglomerativas. A abertura de canais e a construção de ferrovias, o barateamento dos fretes e a redução do preço de matérias- primas importadas têm modificado substancialmente as vantagens locacionais nas diferentes regiões. Novas tecnologias, ao baratear os custos de transporte, alteram os padrões locacionais e a distribuição geográfica das atividades econômicas (MARSHALL, 1982, p. 236). Tarifas alfandegárias mais brandas de matérias-primas e componentes industrializados estimulam a produção industrial em regiões exportadoras. Porém, a liberalização abrupta de importações pode arruinar a produção agrícola e industrial de muitas áreas e destruir rapidamente o artesanato e atividades mais tradicionais, embora possa estimular a modernização da indústria5." Inovações repentinas destroem precocemente parte da economia de regiões em desenvolvimento. O desaparecimento de indústrias e a redução do nível de emprego, afetando as diferentes regiões e agravando as disparidades regionais, têm estimulado os estudos regionais. CRISE URBANA E DESEQUILÍBRIOS REGIONAIS A partir da década de 1920, multiplicaram-se, nos EUA, trabalhos teóricos e empíricos enfatizando o elemento espaço na análise econômica. A razão foi o rápido crescimento econômico daquela década e a crise econômica da década seguinte. Os problemas se manifestaram de diferentes maneiras, tendo em vista a grande dimensão territorial desse país e a rápida expansão da área de influência das grandes indústrias, que trazia a necessidade de integração dos mercados. As populações se deslocaram do Leste para o Oeste, em direção do Oceano Pacífico, em busca de novas terras para serem colonizadas. O desemprego das grandes cidades, a busca do ouro e o espírito aventureiro determinaram a ocupação do Oeste americano. As produções agrícolas demandavam 5 No final do século XIX, a política livre-cambista inglesa levou a importações crescentes de alimentos e matérias-primas mais baratas, que afetaram a produção agrícola das áreas menos férteis e menos desenvolvidas, liberando mão de obra para as cidades e as colônias britânicas, o que alterou os padrões locacionais e a distribuição geográfica das indústrias em toda a Inglaterra. 16 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 16 Fábio Costa e Anderson Costa escoamento para os mercados e grandes distâncias precisavam ser vencidas. O espírito capitalista e o estoque de conhecimentos determinavam o que produzir; a tecnologia ensinava como produzir, mas onde produzir dependia tanto das oportunidades oferecidas, como de estudos regionais específicos. Porém, as questões o que produzir, como produzir e onde produzir estão intimamente associadas e, portanto, ligadas a uma dada localização, ao estoque de recursos produtivos e aos custos de produção e de comercialização. Uma atividade pode ter sucesso em uma região, mas não em outras. Conhecer as razões que levam uma atividade ao sucesso ou ao fracasso em determinada área é fundamental para a elaboração de políticas regionais de desenvolvimento. Foi o que estimulou as pesquisas regionais nos EUA. Em 1927, publicou-se amplo diagnóstico econômico sobre a região de New York, no qual um tipo de emprego seria básico (mais tarde identificado como setor exportador), por exercer efeito multiplicador sobre o emprego não básico (setor de mercado interno) (LANE, 1977, p. 242). Em 1944, realizou-se, novamente amplo estudo sobre as condições econômicas da região metropolitana de New York. Algumas técnicas de análise regional foram desenvolvidas, sobretudo para sanar as dificuldades de obtenção de dados, como o quociente de localização (QL), de Homer Hoyt. O QL foi utilizado para estimar as exportações regionais por setor. O método consiste em supor que, do ponto de vista da demanda local, a participação do emprego da indústria i, no conjunto da indústria regional ( / )i ie e , é a mesma em relação ao emprego da mesma indústria i do país, no conjunto da indústria nacional ( / )i iE E . Se a primeira relação for superior à segunda, a região será especializada na produção do bem i. O que exceder a relação nacional é considerado emprego do setor de exportação. Por exemplo, se [ ( / )i ie e / ( / )i iE E ] = 1.2, 20% do emprego da indústria i regional está alocado no seu setor exportador; se a relação for inferior [ ( / )i ie e < ( / )i iE E ], a região será importadora do produto i (ANDREWS, 1953). A série de 12 artigos publicados por Richard Andrews na revista Land Economics foi uma importante resenha dos trabalhos efetuados até então no domínio do desenvolvimento regional, sobretudo nos EUA. Nesse país, os problemas raciais e a 17 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 17 Fábio Costa e Anderson Costa marginalidade urbana levaram à expansão dos estudos regionais e urbanos por órgãos da administração pública e por diferentes universidades. Observou-se que o centro urbano das grandes cidades se deteriorava à medida que as pessoas de mais alta renda e as atividades econômicas deslocavam-se para as periferias urbanas, em busca de mais espaço e de aluguel mais barato. Expandia-se a demanda por meios de transporte mais eficientes (automóveis, grandes estradas de fácil acesso) e por construções residenciais em novas áreas. Centros comerciais e de serviços foram construídos nessas periferias, contribuindo para o declínio do centro tradicional de negócios (CBD - Central Business District). Enquanto isso, a população pobre, sobretudo a negra, emigravapara esse centro, aumentando os gastos públicos nessas áreas. Ao mesmo tempo, o declínio da arrecadação pública no CBD degradava ainda mais a situação econômica e o meio ambiente em tais centros. A necessidade de reestruturação das cidades norte-americanas gerou novos estudos de natureza espacial, desta vez relacionados com a Economia Urbana. Problemas regionais na Europa Na Europa, o problema colocava-se de maneira diferente, no sentido da reconstrução urbana e industrial das cidades e regiões devastadas pela Segunda Guerra Mundial. Isso constituiu um marco importante para o desenvolvimento dos estudos regionais. No contexto do Plano Marshall para a reconstrução e o desenvolvimento, emergiram planos e estudos sobre desenvolvimento regional. Citam-se os de Rosenstein-Rodan, de 1943, para o Sul da Europa, de François Perroux e Jacques Boudeville para a França, de Davin e Paelinck para a Bélgica etc (ver SOUZA, 2005)6. Em 1950, alguns países europeus ainda permaneciam subdesenvolvidos, como Espanha, Portugal, Itália e Grécia. A França caracterizava-se por uma dualidade espacial importante, a ponto de surgir, em 1958, o livro Paris e o deserto francês, de J. F. Gravier. Detendo 20% da população nacional e a maior parte da atividade industrial, a concentração econômica e demográfica em Paris acelerou-se desde a época napoleônica, que promoveu a centralização administrativa e política na França (MONOD; CASTELBAJAC, 1973, p. 28). 6 Sobre a experiência internacional de planejamento regional, veja CEDEPLAR (2009). 18 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 18 Fábio Costa e Anderson Costa Do mesmo modo, toda a malha rodoviária e ferroviária francesa converge para Paris, fato que contribuiu para o gigantismo da região parisiense, com o debilitamento das demais regiões. Ao mesmo tempo, após os anos de 1960, havia na França o desejo de tornar Paris a capital do Mercado Comum Europeu, o que contribuiu para acelerar a concentração demográfica e econômica na capital. Ainda na França, até os anos de 1950, havia problemas típicos de subdesenvolvimento, como fraca industrialização e subemprego em algumas regiões, como na Bretanha (oeste). Essa debilidade econômica resultava, em parte, da pobreza energética e mineral do subsolo e do distanciamento e isolamento em relação à metrópole nacional. Exceto Rennes, com alguma industrialização junto ao complexo portuário, as demais cidades da Bretanha com mais de 30 mil habitantes até há pouco tempo ainda viviam da pesca, da cultura de trigo e da pecuária extensiva. Na Alemanha, o vale do Ruhr, com sua rica bacia carbonifera, que gerou um dos maiores polos industriais do mundo, apresentava, nos anos de 1950 um desenvolvimento bastante superior ao das demais regiões do país, como de toda a Europa. Na Itália, a pobreza do Mezzogiorno (sul) demandava uma ação efetiva das autoridades governamentais para reduzir o desemprego. Em 1951, o Mezzogiorno tinha uma renda per capita de US$ 200, contra US$ 500 para o nordeste, sendo US$ 320 a média nacional italiana. Sua economia era composta, basicamente, por uma agricultura de baixa produtividade e uma indústria incipiente e atrasada (têxtil, metalurgia, papel e minerais não metálicos) (CHENERY, 1969, p. 671). Em função disso, foi criada, em 1950 a Cassa per il Mezzogiomo, que, durante o Plano Vanoni (1955/65), gastou US$ 6,5 bilhões para criar novos empregos na região, tanto na agricultura (aquedutos, irrigação, drenagem) e infraestrutura (estradas, petróleo, gás, energia elétrica), como em indústrias modernas (petroquímica, através de incentivos fiscais), educação e turismo (MONOD; CASTELBAJAC, 1973, p. 8). Para os economistas e planejadores regionais europeus, estava bem viva a experiência norte-americana bem-sucedida de planejamento regional no vale do rio Tennessee, através da Tennessee Valley Authority (TVA). Essa agência foi criada após a crise de 1929, com o fim específico de desenvolver a região. Em 1933, sua tarefa consistia em aproveitar melhor os recursos hidráulicos do rio Tennessee e atender melhor a 19 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 19 Fábio Costa e Anderson Costa população de suas margens. Foram implantados grandes projetos de irrigação e de combate à erosão do solo; novas indústrias surgiram em todo o vale do rio Tennessee, utilizando a energia hidráulica gerada na própria região (MCKINLEY, 1969, p. 555). Surgimento de novas teorias A concentração industrial em Paris e no vale do Ruhr e o aumento das desigualdades regionais inspiravam os economistas. Em um artigo de 1955, François Perroux mostrou que o crescimento econômico não aparece em toda a parte ao mesmo tempo, mas surge em alguns pontos ou polos de crescimento, para difundir-se posteriormente por toda a economia. A partir dessa interpretação espacial do crescimento econômico, surgiram inúmeros trabalhos na França e na Bélgica sobre estratégias de industrialização de regiões. A abordagem teórica subjacente é a do modelo de relações intersetoriais de Leontief, que fornece a noção derivada de polarização técnica, onde predomina uma indústria motriz, exercendo relações de dominação em relação às atividades satélites ou subcontratadas. A aplicação dos investimentos nas indústrias-chave maximiza os efeitos de encadeamento do crescimento em toda a economia; eles se difundem no território sobre outras indústrias através das relações interindustriais. Desse modo, o crescimento do mercado no interior de um país ocorre por concentração econômica em pontos de crescimento, de onde se irradiam fluxos de bens e serviços em todo o território nacional (PERROUX, 1977, p. 155). Boudeville (1972) e Paelinck, entre outros, seguiram essa linha de pesquisa, estudando particularmente as regiões da França e da Bélgica. A região belga de Liege, área de antiga industrialização, baseada no carvão e na metalurgia, prestou-se ao desenvolvimento da teoria dos polos de crescimento por apresentar problemas de debilidade estrutural de longo prazo. Ela precisou ser reconvertida à medida que surgiam indústrias mais modernas em outras regiões (PAELINCK, 1977, p. 159). Nos EUA, destacaram-se, ainda, os trabalhos de Walter Isard relacionados com a economia dos transportes, a análise inter-regional de insumo-produto e os estudos do impacto regional da indústria siderúrgica (HOOVER, 1955, p. 239). Em sua obra Localização e espaço econômico, Isard segue a tradição weberiana que enfatiza a importância dos custos de transporte na localização industrial. Sua contribuição foi ter 20 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 20 Fábio Costa e Anderson Costa considerado o transporte como um insumo, definido "como o movimento de uma unidade de peso por unidade de distância" (ISARD, 1956a, p. 79). Embora tenham sido criadas agências de desenvolvimento regional, como a Tennessee Valley Authority, nos EUA, a Cassa per il Mezzogiorno, na Itália, e a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) no Brasil, com a concessão de incentivos fiscais para a implantação de novas atividades nas regiões deprimidas respectivas, além dos investimentos diretos efetuados pelos governos nessas áreas, o crescimento regional ainda continua efetuando-se de forma desigual, persistindo, portanto, os desequilíbrios regionais da renda per capita, com fortes fluxos migratórios para as regiões mais ricas. Apesar das análises de grandes economistas como Adam Smith e Marshall, como de economistas da linha espacial, como Von Thünen, Weber e Lôsch, a análise econômica tradicional, de modo geral, prescindiudo fator espaço. Os modelos econômicos têm sido elaborados a partir de suposições como localização ótima da população e da atividade econômica, custos de transporte negligenciáveis e distâncias nulas. A região é considerada como um ponto abstrato e só existe o mercado nacional. As nações comercializam entre si e no interior de cada uma delas somente há um mercado onde interagem a oferta e a demanda, determinando o preço de equilíbrio para um produto específico, o qual irá competir no mercado internacional com os preços dos mesmos produtos, formados no contexto de outras economias nacionais, igualmente consideradas como pontos. A análise territorial começou a ganhar espaço com o agravamento dos desequilíbrios regionais. As crises produzem efeitos diferenciados no território. Em algumas regiões, o desemprego pode ser muito maior do que em outras, demandando intervenção governamental diferenciada. Na Grã-Bretanha, nos anos de 1930, o desemprego foi de 32% nas regiões de Liverpool e de Manchester e de 38% nas de Newcastle e de Glasgow. Após a recuperação, o crescimento do emprego industrial foi bastante desigual, com alguns centros se consolidando como polos, enquanto, em outras regiões, a indústria tornava-se obsoleta, necessitando de reconversão. Entre 1931 e 1951, o emprego industrial se expandiu 15% na região de Birmingham e 40% na Região Metropolitana de Londres (PERRIN, 1974, p. 128). 21 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 21 Fábio Costa e Anderson Costa O desenvolvimento dos meios de transporte e de comunicações e da informática, assim como a descoberta de novos materiais, tem tornado a localização industrial mais livre. A globalização da economia tem levado à industrialização de novos países e de regiões no interior das nações em desenvolvimento. Em regiões tradicionalmente mais pobres, como o Nordeste brasileiro, a expansão das atividades turísticas, da fruticultura, da agricultura irrigada e de agroindústrias tem lançado novas esperanças no sentido de melhorar as condições de vida das populações dessas áreas. Intensos fluxos migratórios ainda persistem em direção do Sudeste do Brasil. Diferenciais de salários e melhores condições de vida nessa região, assim como as secas frequentes e o desemprego no Nordeste, explicam essa mobilidade inter-regional do fator trabalho. A emergência de novos centros dinâmicos de crescimento no interior das regiões brasileiras tem aumentado o interesse pela análise regional no Brasil. NOÇÕES DE ESPAÇO E DE REGIÃO Uma região forma uma identidade, apresentando características semelhantes; ela se apresenta como um campo de forças, atraindo unidades econômicas e organizando todo o território à sua proximidade. Definida provisoriamente como um subespaço do território nacional, a região se relaciona com outras regiões, incluindo o exterior do país em que está inserida. Existem forças internas explicando a dinâmica regional e forças externas, tais como afluxos de renda provenientes de suas exportações, investimentos do exterior, gastos do governo central, dispêndios de turistas etc. Segundo Isard (1956b), a região não pode ser estudada apenas do ponto de vista econômico; é preciso englobarem também aspectos demográficos, sociais e tecnológicos. Ele propõe abordar a região sob um enfoque multidisciplinar (pela Ciência Regional) e por sua base espacial, onde interagem vários elementos. Para ele, cada região tem "essência própria"; para ser apreendida, necessita-se de abordagem eclética. Ela não pode ser definida isoladamente, mas levando-se em conta sua inserção no país e no mundo, além de sua estrutura interna. Fica implícita a ideia de hierarquia, polarização, funcionalidade e dinâmica: as fronteiras regionais mudam com o tempo, ao se alterarem a estrutura interna e a ordem hierárquica. O conceito de região é o mais flexível possível, dentro de dois extremos. De um lado, a noção de região desaparece, para ceder lugar à noção de organização espacial; e, de 22 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 22 Fábio Costa e Anderson Costa outro, a região fica definida em termos de um problema específico a ser tratado, em um dado momento. Como os problemas estão interligados, a análise precisa considerar o conjunto de regiões, voltando-se à ideia de hierarquia e de funcionalidade (ISARD, 1956b, p. 21). Noção de espaço A ideia de espaço se diferencia da noção de região pela restrição de contiguidade. A região, necessariamente, precisa ser constituída por um território contínuo, delimitado por uma fronteira. O espaço econômico pode ter descontinuidades. O espaço econômico de um centro urbano-industrial, por exemplo, ultrapassa as fronteiras político- administrativas daquilo que se poderia denominar de região do referido centro. Da mesma forma, o espaço econômico da metrópole paulistana ultrapassa as fronteiras do Estado de São Paulo, atingindo outras regiões e países. Esse território apresenta-se descontínuo porque intercala a área de influência de outros polos urbano-industriais, como os do Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou Curitiba. O espaço pode ser visto através de três noções: geográfico, matemático e econômico (BOUDEVILLE, 1972, p. 15). O espaço geográfico diz respeito às condições naturais de solo, clima e de acessibilidade aos homens, sem considerações técnicas ou econômicas. O espaço matemático compreende as relações técnicas de variáveis econômicas, independentes de considerações geográficas. Constituem exemplos as relações técnicas entre indústrias, no interior de uma matriz de insumo-produto. Elas formam complexos interligados, direta e indiretamente, com uma ou mais indústrias intermediárias, compradoras ou vendedoras, como se observa na Figura 1. Figura 1 Figura 1 Matriz de acessibilidade técnica e o dígrafo associado. 23 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 23 Fábio Costa e Anderson Costa Nessa figura, tem-se um dígrafo associado a uma matriz de acessibilidade técnica entre seis setores de atividade. O algarismo 1 indica a existência de ligação ou acessibilidade técnica entre os dois setores envolvidos. Nessa matriz, o setor A mantém relações de insumo-produto com os setores B e C, tanto pelas compras de insumos (ligação em coluna, ou para trás), como pelas vendas (ligação em linha, ou para frente). Por definição, todo setor é acessível a si próprio (a diagonal principal é unitária). O zero indica que os setores não possuem ligações significativas (acima de um valor considerado mínimo), ou nenhum relacionamento de insumo-produto. O espaço econômico, por seu turno, diz respeito à localização de tais relações técnicas em uma área geográfica, compreendendo também as relações de comportamento de produtores e consumidores (BOUDEVILLE, 1972, p. 17). Na Figura 1, a matriz de acessibilidade técnica, constituindo um espaço matemático, informa apenas a possibilidade de existirem relações entre os setores, sem qualquer referência a uma área geográfica. Haverá espaço econômico quando tais relações de insumo-produto forem concretizadas em um dado espaço geográfico. Do ponto de vista geográfico, "o espaço é percebido como uma distância, logo, como um elemento de custo" (MORAN, in PONSARD, 1966, p. 63). O espaço como distância tem sido tratado no quadro da teoria da localização da atividade econômica. No Desenvolvimento Regional, o elemento espaço vem sendo considerado mais como superfície do que como distância, porque sua abordagem ultrapassa o aporte da teoria da localização. A superfície espacial nem sempre se apresenta de forma homogênea e contínua. Seus elementos constitutivos possuem descontinuidades(terra/água, zona agrícola/zona imprópria para a agricultura, área urbana/área rural). Desse modo, o território pode ser concebido também como um conjunto de lugares, ou pontos, como centros de produção diferenciados, onde se materializam custos e preços. Como resultado, cada lugar apresentará vantagens locacionais específicas para determinada atividade. O progresso técnico, a legislação e modificações no estoque de recursos podem alterar as localizações ótimas em cada ponto do território (MORAN, in PONSARD, 1966, p. 69). 24 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 24 Fábio Costa e Anderson Costa Diferentes concepções de região Os economistas não chegaram a uma definição precisa de região, mas a noções, centradas na restrição de contiguidade e na existência de um espaço geográfico básico, que é o território nacional. Boudeville (1972, p. 30) estabeleceu as noções de região homogênea, região polarizada e de região-plano. A região homogênea caracteriza-se pela semelhança de suas unidades componentes, como topografia, relevo, tipo de solo, clima ou características econômicas, como uniformidade da renda per capita ou tipo de atividade econômica predominante. Sua delimitação centra-se também na questão do tamanho desejado para a unidade de análise. O território nacional pode, portanto, ser decomposto em uma ou muitas regiões, segundo sua homogeneidade. A região polarizada determina-se a partir de um polo urbano-industrial que organiza sua área de influência. Está implícita a noção de hierarquia entre o polo principal, sede da região, e os centros ou polos secundários subordinados, de dimensões variadas. Ela constitui "um espaço heterogêneo, cujas diversas partes possuem um caráter complementar e mantém de maneira principal, com um polo dominante, volume maior de trocas do que com qualquer outro polo de mesma ordem dominando uma região vizinha" (BOUDEVILLE, 1972, p. 31). Um tipo particular de região polarizada é o de região metropolitana, com características e problemas específicos. As atividades industriais tendem a emigrar para a periferia da região urbana e os serviços especializados concentram-se no centro urbano tradicional7. A acessibilidade declina do centro para a periferia, assim como o valor dos aluguéis e o preço dos terrenos. Exceções ficam por conta da degradação do centro urbano tradicional de negócios e do surgimento de centros secundários de atividades (shopping centers) e de zonas residenciais com elevada densidade demográfica em determinados bairros. A região metropolitana pode ser formada, portanto, por núcleos demográficos e econômicos secundários, definindo subáreas de influência8. A região-plano pode ser homogênea ou polarizada e está afetada a um problema específico, como secas ou nível de pobreza. Como exemplo, têm-se as regiões: Nordeste, 7 Na literatura, CBD (Central Business District), onde são máximos os aluguéis e os preços dos terrenos, bem como a acessibilidade aos bens, serviços e empregos por parte dos consumidores, empresas e trabalhadores. 8 Os problemas específicos do interior da região-cidade, como localização das atividades econômicas, localização residencial, renovação urbana etc., são tratados pela Economia Urbana. A Economia Regional ocupa-se das relações entre os centros urbanos- industriais, com sua área de influência, e as demais regiões do sistema nacional. 25 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 25 Fábio Costa e Anderson Costa no Brasil, vale do Tennessee, nos EUA, Bretanha, no oeste da França, e Mezzogiorno, no sul da Itália. A característica fundamental da região-plano é ser objeto de políticas regionais de desenvolvimento, visando reduzir a disparidade de sua renda em relação a outras regiões do país, criar novos empregos, aproveitar melhor a disponibilidade local de recursos naturais, melhorar os indicadores sociais, atacar diretamente bolsões de pobreza etc. Para atingir esses objetivos, no conjunto do país, o governo pode estabelecer uma política de regionalização do gasto público, conceder incentivos fiscais e criar mecanismos de planejamento, financiamento e execução de programas regionais de desenvolvimento. Dificuldades do conceito de região A primeira dificuldade do conceito de região reside na delimitação precisa das fronteiras regionais, que não coincidem, necessariamente, com as fronteiras administrativas adotadas pelo setor público. Independentemente disso, uma ambiguidade importante em relação à delimitação de uma região decorre do fato de seu tamanho ser variável de uma zona com um pequeno núcleo populacional, incluindo sua área de influência, a um vasto território envolvendo vários países no interior de um mesmo continente. Como exemplo, tem-se a região amazônica (homogênea por suas características), que engloba vários países, e a região de Palomas, em Livramento, no Rio Grande do Sul, caracterizada por um microclima europeu, propício à produção de vinhos finos. Fica claro, em muitos casos, que o conceito de região depende da escala e do tipo de questão a ser estudada. De outra parte, o tamanho da região, no interior de um país, vai definir o número de regiões de estudo ou de planejamento. Conforme o objetivo, pode ser mais conveniente trabalhar com um número limitado de regiões; em outros casos, há necessidade de diminuir a área, o que implica o aumento do número de regiões. No Brasil, utilizam-se os conceitos de macrorregião (Sudeste, Nordeste, Norte, Sul e Centro- Oeste), mesorregião e microrregião, esta composta por certo número de Municípios. Uma mesorregião se constitui por um conjunto de microrregiões, definidas segundo sua homogeneidade ou estrutura produtiva. Entre as mesorregiões e as macrorregiões, têm- se as Unidades da Federação, que são os Estados brasileiros. Uma segunda dificuldade do conceito de região é a restrição da contiguidade: o território regional deve ser contínuo e não intercalado pelo território de outras regiões. Desse 26 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 26 Fábio Costa e Anderson Costa modo, seguindo determinadas características homogêneas ou de subordinação, uma área será alo cada a uma dada região desde que seu território seja contíguo a tal região. Uma terceira dificuldade na determinação das fronteiras regionais diz respeito à sua dinâmica. As rendas per capita das regiões mudam; cada território geralmente apresenta crescimento diferenciado; a estrutura urbana e os meios de transporte modificam-se no processo de desenvolvimento, enfraquecendo a importância do conceito de região. Por causa dessas dificuldades, a noção de região vem perdendo importância na literatura; os autores têm preferido a noção mais neutra de espaço. O espaço econômico de um determinado polo urbano-industrial normalmente ultrapassa as fronteiras regionais, constituindo, portanto, uma noção com uma conotação dinâmica. O território polarizado por determinado polo varia de extensão em função de sua taxa de crescimento econômico e nível de desenvolvimento. A redução das distâncias pelo desenvolvimento dos meios de transporte e de comunicações tende a expandir o espaço econômico das regiões. O aumento da área de influência do polo urbano-industrial uniformiza os espaços no longo prazo, quando se reduzem as disparidades regionais. Uma força de expansão regional é a base exportadora que aumenta a integração entre áreas, pelas trocas inter-regionais. Nesse sentido, a região pode ser definida em função de sua base de exportação, ou estrutura produtiva característica, que introduz um elemento de uniformidade para a área em questão. Isso foi propostopor Vining (1949, p. 90), pois "uma comunidade parece ser organizada em torno de sua indústria de exportação". Ele sugere que as indústrias exportadoras determinam tanto a estrutura econômica e demo gráfica, como o crescimento regional. A ênfase nessas indústrias baseia-se nas ligações interindustriais no território, que afetam as estruturas econômicas e as concentrações demográficas. A economia nacional integra-se espacialmente por intermédio de um conjunto de empresas interdependentes, que movimentam bens e serviços no território. Em suma, toda a região organiza-se em torno de um ou mais artigos que produz e "exporta" para outras regiões do sistema nacional e para o exterior. Com a renda gerada, a população gastará suas rendas nos centros urbanos, gerando emprego e renda nas atividades de mercado local, comércio e serviços. Na ausência de um produto dinâmico 27 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 27 Fábio Costa e Anderson Costa de "exportação", a região será sem dinamismo e vitalidade, apresentando um marasmo vegetativo secular. Hierarquia e tamanho dos centros urbanos Não se pode falar de região sem considerar os centros urbanos, sua população e atividades econômicas vinculadas a uma dada localização. No que diz respeito aos diferentes centros urbanos de um dado país, haveria uma relação empírica, segundo a qual o tamanho de uma dada cidade guardaria uma relação com o tamanho da maior cidade do país, de sorte que: 1 / n rr P P , Onde: r seria a ordem da cidade na hierarquia urbana, P1 a população da principal cidade do país, Pr a população da cidade de classe r e n uma constante. Para os Estados Unidos, a constante n calculada aproxima-se de 1, de sorte que a população da segunda cidade (Chicago, r = 2) aproxima-se da metade da população de New York, a maior cidade; a terceira cidade (Los Angeles), a um terço; a quarta (Filadélfia), a um quarto; a quinta (Detroit), a um quinto; a sexta (Boston), a um sexto e assim por diante. A cidade da classe m da hierarquia urbana teria uma população correspondente a 1/m da população da maior cidade do país, de sorte que a população urbana nacional total (Pu) seria igual a (DERICKE, 1970, p. 70): 1 1 1 1( / 2) ( / 3) ... ( / )uP P P P P m O tamanho de uma dada cidade não é inteiramente independente da rede urbana total e cada região engloba uma cidade ou um grupo de cidades, com suas respectivas áreas rurais de influência. A noção de região aparece vinculada à noção de fluxos comerciais no território. Os habitantes das áreas rurais depositam suas rendas nos bancos localizados na cidade próxima, os quais distribuem os depósitos junto às matrizes localizadas nos centros urbanos superiores da hierarquia urbana. Da mesma forma, as pessoas das áreas rurais e das pequenas cidades do interior gastam suas rendas na aquisição de bens e serviços seguindo a hierarquia urbana: bens de primeira necessidade, ferramentas e máquinas agrícolas junto ao povoado; bens de consumo duráveis nas cidades maiores e assim por diante. 28 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 28 Fábio Costa e Anderson Costa Visão de Walter Isard Os fatores que levam as pessoas e as atividades econômicas a se concentrarem em determinados lugares ou a se dispersarem com o tempo são variados, englobando disponibilidade de recursos naturais, mudanças no meio ambiente, como erosão dos solos, crescimento demográfico e fatos econômicos provocados por flutuações de demanda e inovações tecnológicas. Segundo Isard (1956a, cap. 1), a sociedade estaria em um processo contínuo de ajustamento, procurando chegar a uma condição de ótimo global. Os núcleos urbanos crescem por forças centrípetas, gerando retornos crescentes à escala, pelas economias de aglomeração; no longo prazo, surgem forças centrífugas, retornos decrescentes no uso da terra e deseconomias externas. Esses deslocamentos de populações e das atividades econômicas ocorrem segundo os meios de transporte, a dotação de recursos naturais e a distribuição da população já existente nas áreas periféricas. Quando se torna econômica a exploração de recursos, como uma mina de carvão, ou uma jazida de cobre, a infraestrutura de transportes procura se adaptar, com a abertura de novas estradas, construção de pontes, melhorias de portos etc. A estrutura regional então se altera, assim como os fatores locacionais, o que provocará novas mudanças no futuro próximo (ISARD, 1956a, cap. 1). Além desses processos básicos de desenvolvimento regional, Isard aponta algumas questões fundamentais da formação econômica de uma região. No início desse processo, a produção agrícola regional ocorre segundo o modelo de Thünen, isto é, por círculos concêntricos em relação ao mercado central e levando em conta a distância e os custos de transporte dos produtos agrícolas. A região exporta produtos agrícolas, minérios, recursos florestais e produtos da pesca; ao mesmo tempo, ela importa bens manufaturados. A conjugação de fatores naturais e de natureza cultural levam a região a iniciar um processo de industrialização, principalmente junto a portos ou centros de exportação. O processo se expande para outras áreas da região, segundo os meios de transporte, como hidrovias, ferrovias, rodovias e segundo a densidade demográfica existente (ISARD, 1956b, p. 9). O prosseguimento da industrialização e o atendimento das necessidades que ela cria engendram novos fatores locacionais, o que atrai novas indústrias para a área. A disponibilidade de mão de obra feminina e jovem atrai a indústria têxtil. 29 Economia Regional e Urbana: textos selecionados 29 Fábio Costa e Anderson Costa Posteriormente, inovações tecnológicas, como mecanização e desmembramento do processo produtivo, bem como economias e deseconomias externas, alteram o padrão locacional das indústrias. Surge o problema da relocalização da atividade econômica à medida que se altera a estrutura hierárquica dos centros urbanos regionais. Economias externas surgem em centros intermediários pela implantação de infraestrutura e crescimento demográfico, enquanto o centro urbano principal da região especializa-se em atividades comerciais e de prestação de serviços. Novas indústrias continuam concentrando-se no centro principal enquanto não emergirem as questões relativas a poluição, congestionamento e elevação dos preços dos terrenos e da mão de obra. Com o tempo, o surgimento de centros comerciais e de serviços nos núcleos menores da periferia tende a ser acompanhado por indústrias, gerando forças desaglomerativas em relação à área central. Nesse estágio, a região tende a apresentar um crescimento polinuclear e despolarizado. Nesse contexto, Isard salienta três abordagens teóricas possíveis de análise regional. A primeira envolve uma teoria mais geral dos estoques de recursos, onde a teoria de Von Thünen se enquadra em um primeiro estágio de desenvolvimento. Têm-se um mercado central e uma área rural circundante, de fertilidade uniforme, usando as mesmas técnicas, com fácil acesso em todas as direções, ligando as áreas produtoras agrícolas ao núcleo populacional (ISARD, 1956b, p. 15). A segunda abordagem segue as abstrações puras de Lösch. Podem ser relaxadas as hipóteses de dispersão uniforme da população, igualdade na distribuição espacial dos recursos e a existência de um número infinito de rotas de transporte. Havendo diferenças na distribuição da população e dos recursos, surgirão economias de escala e de aglomeração em algumas áreas. Uma terceira abordagem combinaria os esquemas de Thünen-Lösch-Weber. Para exemplificar, Isard (1956b, p. 16) imagina
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