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Geografia e Cartografia Sistema de Projeções Cartográficas Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Ms. Carlos Eduardo Martins Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites 5 Neste conteúdo, trataremos do sistema de projeções cartográficas por meio do qual será possível a você perceber a significância dos assuntos abordados na atividade profissional de Tecnologia em Gestão Ambiental. Explicar como a superfície curva da Terra pode ser convertida em mapas planos. Para tal, trataremos dos parâmetros geométricos do Sistema de Projeções Cartográficas utilizados internacionalmente para abordar as questões ligadas à forma e às proporções do terreno quando da sua representação nos mapas. Sistema de Projeções Cartográficas · Sistema de Projeções Cartográficas · Tipo de contato entre Superfície de Referência e Superfície de Projeção · Posição do Eixo da Projeção Cartográfica · Evolução das Projeções Cartográficas · Relativismo Cartográfico Pós-Peters 6 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Contextualização Projeção Equivalente de Hobo-Dyer (2002) Fonte: Thinkstock/Getty Images 7 Sistema de Projeções Cartográficas A cartografia enquanto técnica de representação gráfica de elementos geográficos apresenta desde a sua origem um problema inerente à sua própria finalidade: a inevitável deformação das superfícies planas representadas em relação à real superfície curva da Terra. A fim de mitigar tais deformações dos mapas, a Cartografia desenvolveu o Sistema de Projeções Cartográficas, um conjunto de procedimentos algébricos e geométricos que ajusta os mapas segundo as áreas que representam e segundo as finalidades para os quais são confeccionados. Ainda assim, as deformações serão tanto maiores quanto maior for a Superfície de Projeção, e quanto maior for a distância em relação ao ponto ou linha de contato, tangente ou secante, com a Superfície de Referência, na qual, em tese, a deformidade é nula. As ferramentas disponíveis no Sistema de Projeções Cartográficas consideram as adequações necessárias na transformação da Superfície de Referência para a Superfície de Projeção. Veremos aqui as características tanto das superfícies quanto das ferramentas disponíveis. Antes, contudo, é importante salientar desde já que o Sistema de Projeções Cartográficas não foi feito para “resolver” os “problemas” da Cartografia, mas para minimizá-los na medida da necessidade imposta pelas variações inerentes à forma, escala e aos ângulos representados. Superfície de Referência Na Cartografia, existem dois tipos de Superfície de Referência: a esfera, modelo que considera o planeta Terra como uma esfera perfeita; o Elipsoide de Revolução, surgido no final do século XVII, quando Newton elaborou um modelo, utilizado até os dias atuais, de representação da Terra a partir de uma figura elipsoidal. Superfícies de Projeção Projeção azimutal ou plana Este tipo de Superfície de Projeção é mais corriqueiramente empregado na confecção de mapas nos quais o objetivo é destacar um ponto específico da Terra em relação à superfície como um todo. 8 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas A imagem mais conhecida que utiliza uma projeção azimutal é a logomarca da ONU (Figura 1) Figura 1. Logotipo da ONU, representação feita a partir de uma projeção azimutal ou plana Wikimedia Commons Na logomarca da ONU, podemos observar que o ponto da tangente é o Polo Norte e a superfície de referência está espalhada ao seu redor, apresentando deformidades nas extensões e formas. Observando a imagem e o contexto no qual ela foi criada, você pode se perguntar se essa opção feita pela ONU em utilizar uma projeção como essa é ou não um ato isento de ideologia, tendo em vista que se trata de uma instituição supranacional. Independentemente desse aspecto salientado no parágrafo anterior, o fato é que, tecnicamente, as projeções cartográficas azimutais ou planas são, devido às suas particularidades geométricas de equidistância, as mais adequadas para representar a distância mais curta entre um local, em uma projeção azimutal oblíqua em relação ao ponto de contato com a Superfície de Referência, e qualquer outro lugar no mundo. Projeção cônica As superfícies de projeção cônica (Figura 2) são mais adequadas para a representação de áreas de médias latitudes, pois a borda da figura cônica toca a de referência em um ou mais de um paralelo, dando maior precisão à forma próxima a esse e deformando suas extremidades. Projeção cilíndrica Neste tipo de superfície de projeção (Figura 2), o cilindro de projeção toca um, ou mais de um, meridiano ou um, ou mais de um, paralelo, produzindo maior precisão ao longo da linha de toque e deformação nas duas extremidades – já que tanto paralelos quanto meridianos são convertidos em linhas paralelas que se cruzam, formando ângulos de 90°. Esse tipo de superfície de projeção é mais adequado para representações do tipo mapa- múndi, nos quais todos os continentes e oceanos devem ser visualizados ao mesmo tempo. 9 Projeção polissuperficial Neste tipo de superfície de projeção são utilizados mais de um método de projeção além dos anteriormente observados. Isso permite melhorar a precisão e diminuir a deformação devido ao aumento da área de contato entre superfície de referência e de projeção. Um aspecto de maior importância a ser mencionado é que a diferença entre as dimensões da Superfície de Referência e os correspondentes na Projeção Cartográfica é resultante dessa ser uma representação daquela, e não ela própria. Tipo de contato entre Superfície de Referência e Superfície de Projeção Quando um plano da Superfície de Projeção toca a Superfície de Referência em um único ponto ou em uma linha paralela ou meridiana, ele é denominado de Contato Tangente. A Figura 2 apresenta as diversas possibilidades de contato entre as superfícies. Figura 2. Fonte: Compilado por Carlos Eduardo Martins Quando um plano da Superfície de Projeção toca a Superfície de Referência em uma linha através deste (como é o caso da Projeção Azimutal ou Plana) ou em duas linhas (como nos casos das projeções Cilíndrica e Cônica), ele é denominado de Contato Secante. A Figura 3 mostra este tipo de contato entre as duas superfícies. Figura 3. Fonte: compilado por Carlos Eduardo Martins 10 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Posição do Eixo da Projeção Cartográfica Na definição da posição do eixo da Projeção Cartográfica, adotamos o eixo da rotação ou o eixo dos polos, que é o eixo da Superfície de Referência, como parâmetro. Já a simetria da Superfície de Projeção e do eixo de rotação da Superfície de Referência é definida pelo alinhamento de pontos, linhas e círculos. Nos casos em que os eixos de simetria e de rotação alinham-se em um ângulo de 0° (zero grau), denominamos a esses de normais. A Figura 4 mostra a normalidade nos três tipos de Superfície de Projeção. Figura 4. Fonte: compilado por Carlos Eduardo Martins Nos casos em que os eixos de simetria e de rotação alinham-se em um ângulo de 90° (noventa graus), denominamos a esses de transversos. A Figura 5 apresenta os três tipos de Superfície de Projeção vistos a partir da perspectiva transversa. Figura 5. Fonte: compilado por Carlos Eduardo Martins Nos casos em que os eixos de simetria e de rotação alinham-se em um ângulo entre 0 (zero) e 90° (noventa graus), denominamos a esses de oblíquos. A Figura 6 apresenta os casos de obliquidade nas várias Projeções Cartográficas. 11 Figura 6. Fonte: compilado por Carlos Eduardo Martins Propriedades geométricas aplicáveis às Projeções Cartográficas Aspecto de extrema importância na aplicação do Sistema de Projeções Cartográficas são as opções quanto às propriedades geométricas a seremlevadas em conta no mapa. As propriedades geométricas levam em conta duas variáveis: as proporções das áreas e os ângulos da combinação entre os eixos de coordenadas. A vantagem desse método é determinar no mapa, arbitrariamente, onde haverá a maior precisão e a maior deformidade dos ângulos e das proporções. Tratemos de analisar cada uma delas. Conformidade ou Projeção Conforme É o tipo de Projeção Cartográfica resultante da distribuição equitativa das deformidades por toda a área representada. Esse tipo é caracterizado pela manutenção dos ângulos entre os eixos de coordenadas. Equivalência ou Projeção Equivalente Neste tipo de Projeção Cartográfica, o objetivo é a equivalência da área representada na perspectiva do observador. Daí os ângulos ficam deformados e as formas e proporções são valorizadas. Equidistância ou Projeções Equidistantes Estas Projeções Cartográficas preservam as dimensões ou comprimentos entre pontos, mas deformam tanto as proporções quanto os ângulos. 12 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Projeções Afiláticas São aquelas Projeções Cartográficas que optam pela difusão das deformidades entre as formas, os comprimentos e ângulos, ou seja, é uma combinação entre as propriedades anteriores, mas, ao mesmo tempo, não privilegia nenhuma delas. À exceção das Projeções Afiláticas, a ocorrência de um dos atributos implica necessariamente na inexistência das outras, ou seja, quando uma projeção cartográfica tem o atributo conformidade, estarão ausentes a equivalência ou a equidistância. Os atributos das projeções cartográficas se excluem. Projeções em perspectiva As projeções em perspectiva são um método no qual, de forma arbitrária, objetivando a melhor condição de representação, são escolhidos pontos na superfície a partir dos quais as Superfícies de Projeção são definidas. São três as possibilidades de determinação de pontos de vista. Projeção Gnomônica A projeção gnomônica utiliza um plano tangente como Superfície de Projeção em relação à Superfície de Referência, o ponto de vista é o centro da Terra. A Figura 7 representa o esquema de projeção gnomônica. Figura 7. Projeção gnomônica Fonte: adaptado de Marinha do Brasil (2014) A projeção gnomônica contém todo tipo de deformação: não é equidistante; a escala só é mantida proporcional ao ponto de tangência, variando com o aumento da distância em relação ao ponto; não é conforme e nem equivalente. As deformações comprometem a forma, os comprimentos e as áreas na medida em que se afastam do contato de tangência. 13 A singularidade desse tipo de projeção é expressa pelos seguintes atributos: os círculos máximos que passam pelo ponto de tangência aparecem como linhas retas; os meridianos aparecem como linhas retas convergindo para o polo do hemisfério do ponto; e os paralelos, à exceção do Equador, são curvos. E ainda: os ângulos tirados a partir do ponto de contato com a Superfície de Referência não apresentam deformidades. Projeção Estereográfica A projeção estereográfica ou azimutal ortomorfa é aquela em que a Superfície de Projeção é estabelecida por meio de um plano que tangencia um ponto de contato determinado a partir de uma posição exatamente oposta na Superfície de Referência e em relação ao ângulo que se deseja que o mapa represente, como mostra a Figura 8. Figura 8. Projeção estereográfica Fonte: adaptado de Marinha do Brasil, 2014. Observe na Figura 6 que o ponto de vista (P) situado sobre o polo Norte do eixo de rotação (A) projeta em perspectiva a área a ser representada sobre a Superfície de Referência (R). Por sua vez, observamos a representação plana na Superfície de Projeção (Pr). Nesse tipo de projeção, os círculos máximos que atravessam o ponto da tangente são linhas retas. Por outro lado, assim como o modelo anterior, também ocorre a degradação da escala conforme a distância do ponto de tangência aumenta. Projeção Ortográfica A Projeção Ortográfica é o tipo de representação que tem como ponto de vista o espaço exterior à Terra. Assim, a tridimensionalidade do globo é convertida diretamente no plano. Esse tipo de projeção não pode ser considerado conforme, equivalente e nem equidistante. A Figura 9 representa o método de obtenção (a) e o produto de uma Projeção Ortográfica (b). 14 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Figura 9. Projeção ortográfica Fonte: adaptado de Marinha do Brasil, 2014. “Se o plano é tangente a um ponto do Equador, como normalmente ocorre, os paralelos (incluindo o Equador) aparecem como linhas retas e os meridianos como elipses, exceto o meridiano que passa pelo ponto de tangência, que aparece como uma linha reta, e o que está a 90º, que é representado por um círculo” (MARINHA DO BRASIL, 2014). Em síntese, as Projeções Cartográficas são caracterizadas por combinações de atributos. O reconhecimento ocorre por meio dos seguintes aspectos: → Classe da Superfície de Projeção: azimutal ou plana, cônica, cilíndrica e polissuperficial; → Posição, ou perspectiva do eixo em relação à linha dos polos: polar, transversa, normal; → Propriedade que conservam: conforme, equivalente, equidistante, afilática; → Posição do ponto de vista: ortográfica, estereográfica, gnomônica. Vejamos a partir de agora como esses atributos se comportam em cada tipo de Projeção Cartográfica. Evolução das Projeções Cartográficas Provavelmente a Projeção Cartográfica mais conhecida, estudada e reproduzida seja a que chamamos de Projeção de Mercator (Figura 10). 15 Figura 10. Projeção de Mercator (1569) Fonte: Wikimedia Commons Gerhard Kremer, ou Gerardus Mercator Rupelmundanus, foi um artista belga que, em 1569, produziu o primeiro mapa plano com todos os continentes e oceanos existentes na superfície terrestre. Seu mapa é convencionalmente visto como o primeiro mapa-múndi plano da recém- descoberta Terra redonda, chamado à época de “Nova et aucta orbis terrae descriptio ad usum navigantium emendate accommodata”. A princípio, seu mapa tinha finalidades comerciais e passou a ser utilizado nas viagens de circunavegação por portugueses e espanhóis. A Projeção de Mercator apresenta diversos aspectos até então muito vistos nos mapas da época, como, por exemplo, o uso do Norte como ponto cardeal de referência e a centralidade baseada na Europa. Esses dois atributos podem ser entendidos como elementos de caráter ideológico, que se tornaram hegemônicos, juntamente com toda a influência econômica, política e cultural que a Europa impôs ao Mundo a partir do Renascimento, tendo o comércio como vetor deste processo. Em termos técnicos, a Projeção de Mercator pode ser classificada como sendo do tipo: cilíndrica, tangente, normal e conforme. Como a linha de contato é o Equador, as formas e proporções das áreas continentais de baixas a médias latitudes são bem preservadas. À medida que nos afastamos em direção aos polos, as deformidades vão ficando cada vez maiores, ao ponto de tornar a Groenlândia, com seus 2.166.086 km², mais extensa do que a América do Sul, que tem uma extensão de 17.840.000 km². Sem contar a extensão da Antártica, que é um pouco menor em extensão que a América do Sul, com seus 14.000.000 km², mas que no mapa aparece bem mais extensa que essa. Ainda que carregada de deformidades, a Projeção de Mercator não pode ser considerada errônea e muito menos ilegítima, pelo contrário, lembremos que os mapas são apenas e tão somente representações que temos do mundo e essas mudam o tempo todo, refletindo-se na Cartografia. Antes mesmo da proposta de Mercator, o projeto de Bernardus Sylvanus, de 1511 (Figura 11), foi mais longe ainda na possibilidade de deformação da Terra, com sua representação pseudocônica cordiforme (em forma de coração). 16 Unidade: Sistema de Projeções CartográficasFigura 11. Projeto de Bernardus Sylvanus (1511) Fonte: Wikimedia Commons Após Mercator ter dado os primeiros passos na Cartografia da Terra redonda, diversos outros autores passaram a testar novas alternativas de representação, às quais passaremos a observar em seguida. O Projeto Senoidal de Sanson-Flamsteed, de 1600 (Figura 12), é um pseudocilíndro, equivalente. Figura 12. Projeto Senoidal de Sanson-Flamsteed (1600) Fonte: Wikimedia Commons No caso da projeção da Figura 12, são preservas as distâncias ao longo dos paralelos, mas só o meridiano central. Embora a faixa equatorial apresente pouca distorção, as zonas polares sofrem de má legibilidade, devido ao adensamento dos meridianos. A escala é parcialmente constante, sendo essa projeção adequada para continentes como a África e a América do Sul. A projeção pseudocilíndrica afilática de Mollweide, 1805 (Figura 13), é caracterizada por uma elipse. Os polos são pontos e o Equador tem o dobro do tamanho do meridiano central em linha reta. Os outros meridianos são arcos elípticos, e os paralelos são separados de forma desigual, a fim de preservar as áreas. 17 Figura 13. Projeção de Mollweide (1805) Fonte: Wikimedia Commons Em 1865, Collignon desenvolveu uma proposta de projeção cartográfica baseada em um pseudocilindro equivalente que forma um triângulo isósceles (Figura 14.). Figura 14. Projeção de Collignon (1865) Fonte: Wikimedia Commons A projeção cilíndrica, conforme e estereográfica de Gall, 1885 (Figura 15), recolocou as representações plano-retangulares no cenário da Cartografia. Novamente, podemos observar os paralelos e meridianos perfazendo ângulos de 90° entre si. Os polos são linhas que limitam os meridianos. Figura 15. Projeção de Gall (1885) Fonte: Wikimedia Commons 18 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Entretanto, geometricamente falando, as deformações não são tão contundentes como vimos em Mercator. É possível notar inclusive que a Groenlândia e a Antártica estão com suas áreas superdimensionadas, mas em valores inferiores a Mercator. A Figura 16, a seguir, é uma das várias propostas de projeção feitas por Max Eckert-Greifendorff (1906). Todas elas utilizando basicamente os mesmos parâmetros, variando em forma. Figura 16. Projeção II de Eckert (1906) Fonte: Wikimedia Commons A projeção de Eckert é um pseudocilíndro equivalente no qual a distância entre o Equador e os polos é a metade da distância do Equador. Os meridianos são linhas retas oblíquas ao Equador. O único meridiano perpendicular é o de Greenwich. A projeção de Eckert é hexagonal alongada. Em 1923, o cartógrafo e geógrafo estadunidense John Paul Goode produziu uma das Projeções Cartográficas de estética mais emblemática (Figura 17). Figura 17. Projeção de Goode (1923) Fonte: Wikimedia Commons A projeção de Goode é chamada de Projeção de Homolosina de Goode, pois seria o resultado da fusão entre a projeção de Mollweide, também chamada de “Projeção Homolográfica,” e as projeções senoidais, daí resultando no termo Homolosina. 19 O resultado do trabalho de Goode, apelidado de “Mapa Casca de Laranja”, é um pseudocilindro equivalente caracterizado por sua descontinuidade, ou pela interrupção da continuidade das áreas dos continentes. A torção das linhas meridianas permitiu a manutenção das formas e dimensões continentais em detrimento das formas e dimensões oceânicas. A busca por uma representação cartográfica mais adequada levou Arthur H. Robinson a criar, em 1963, a Projeção Robinson (Figura 18). Figura 18. Projeção Robinson (1963) Fonte: Wikimedia Commons Na Projeção Robinson, temos um pseudocilíndro conforme afilático, enquanto os meridianos são curvos em forma de elipses que se aproximam até a linha que representa os polos, e os paralelos são mantidos retos incluindo a linho dos polos. O fato de a Projeção de Robinson ser afilática, isto é, não preservar a forma e nem as áreas dos continentes, devido à anulação mutua entre as propriedades, acaba minimizando e distribuindo as deformações, o que a torna esteticamente aprazível. Esse aspecto foi decisivo para o fato da Projeção de Robinson, apesar de todos os problemas que carrega, ter se tornado a projeção mais utilizada em publicações didáticas e pseudocientíficas no mundo inteiro – por exemplo, nas publicações da National Geographic Society, editora da revista americana National Geographic, que até então utilizava em suas matérias a Projeção de Van der Grinten, de 1898, passou-se a adotar a projeção de Robinson, em 1988. De todas as propostas de projeções existentes, examinamos apenas algumas. Uma delas, contudo, é, provavelmente, aquela que tenha, após Mercator, gerado os debates mais acalorados das Ciências Humanas de modo geral – e na Geografia em especial –, é a projeção de Arno Peters, de 1973 (Figura 19). 20 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Figura 19. Projeção de Arno Peters ou Gall-Peters (1973) Fonte: Wikimedia Commons O mapa de 1973 é baseado na projeção ortográfica de Gall, de 1855. Peters optou por essa projeção dadas as suas características geométricas. A projeção de Peters é Cilíndrica e Equivalente, ou seja, todas as áreas do mapa têm a mesma medida, com paralelos e meridianos formando ângulos de 90 graus entre si. Nessa projeção, a área dos continentes é preservada. Note que entre a Groenlândia, América do Sul e Antártica as proporções parecem estar coerentes com as da Superfície de Referência, ao contrário do que ocorreu na Projeção de Mercator, na qual as desproporções eram absolutas. Entretanto, se por um lado a Projeção de Mercator comprometia as áreas e favorecia as formas, por outro, a projeção de Peters compromete as formas em favor das áreas. A proposta de Peters é bastante consciente de que o que define a visibilidade de uma área no mapa são os cálculos do autor do mapa, eles encolhem ou aumentam a área de um dado continente ou região do mundo de acordo com as suas convicções e, é claro, dentro de uma perspectiva logicamente matemática. Se compararmos as projeções de Mercator e Peters (Figura 20), vamos perceber que de fato as diferenças estéticas são visíveis. Figura 20. Projeção de Mercator (contorno mais espesso, sem fundo) e Projeção de Peters (contorno mais estreito, com fundo azul) Fonte: livelearnevolve.com 21 Note que os contornos são muito diferentes e as proporções entre as áreas de um e de outro mapa alteram-se visivelmente. Excetuando-se a questão da Groenlândia, América do Sul e Antártica, já discutida, a comparação entre a área ocupada pela China nas duas proporções revela uma grande desproporção nos mapas anteriores ao de Peters. Além do aspecto da maior representatividade da área do continente africano, deve-se ressaltar também a sua centralidade no mapa. A África na Projeção de Peters ocupa a zona central da representação, apesar da superioridade geográfica da Europa, garantida pela manutenção do Norte como ponto cardeal de referência. Apesar de a Projeção de Peters ter sido apelidada de “mapa para um mundo mais solidário”, é possível notar nela os resquícios do eurocentrismo anterior, ainda tão enraizado na cultural, na literatura e, inclusive, e principalmente, na representação do espaço geográfico em geral. Desde a sua origem, a projeção de Mercator foi diversas vezes modificada, tendo recebido tratamento cada vez mais técnico até chegar ao estágio atual, no qual transformou-se na Projeção Cilíndrica, Secante, Transversa, Conforme de Mercator, ou simplesmente Projeção UTM (Figura 21). Figura 21. Sistema Universal Transverso de Mercator - UTM Fonte: legallandconverter.com Outras projeções cartográficas decorreram de inovações nos cálculos geométricos e algébricos aplicados à confecção dos mapas e, mais recentemente,às inovações tecnológicas e nos métodos de coletas de dados. As aerofotos e o sensoriamento remoto têm contribuído bastante para o aperfeiçoamento da representação cartográfica sistemática. 22 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Relativismo Cartográfico Pós-Peters Nas últimas décadas, a Cartografia absorveu muito das tecnologias eletrônicas, digitais e aeroespaciais, tanto na coleta dos dados e informações cartografáveis quanto na confecção de mapas. Esse progresso técnico reflete-se, hoje, no fato de os próprios parâmetros cartográficos estarem dando lugar a formas de representação que se baseiam mais na mensagem direta, clara e objetiva, do que nos rigores metodológicos de até então. O fato é que temos mapas cada vez mais “estranhos” aos olhos daqueles que só conseguem admitir que os mapas só podem ter os atributos técnicos como pressupostos – o que, é claro, é necessário nas representações técnicas e científicas que exigem esses rigores –, mas, pensemos, para o público em geral, o que é mais importante de se visualizar? A resposta está nas inúmeras representações cartográficas que abrem mão dos rigores da técnica para valorizarem os aspectos semióticos e perceptivos do leitor. Vejamos alguns casos. Como mencionamos anteriormente, o impacto que a Projeção de Peters (1973) trouxe para o contexto da Cartografia foi enorme. De lá para cá, diversas propostas de mapas representativos das realidades locais ou regionais tomaram o lugar dos mapas “clássicos”, com a Europa no centro e o Norte “em cima”. A Figura 22 é daquelas que representam toda a carga de crítica sobre as visões mais tradicionais da Cartografia. Figura 22. Projeção de Peters invertida Fonte: Wikimedia Commons A Figura 22 é, na realidade, a Projeção de Peters invertida, isto é, com o Sul voltado “para cima” e o Norte “para baixo”. Esse tipo de representação tem sido apresentado, inclusive, aos alunos dos níveis básicos da educação como sendo, hoje, uma espécie de instrumento de libertação das ideologias coloniais, que marcaram muitas realidades latinas, africanas e asiáticas. Não é a toa que a Projeção de Peters é apelidada de “mapa terceiro-mundista”. 23 A Figura 23 é o que chamamos de anamorfose. Não se trata exatamente de uma projeção clássica, muito pelo contrário, é um tipo de afilatismo radical, no qual os atributos técnicos são completamente deixados de lado para valorizar a informação. Figura 23. Distribuição da População Absoluta da África do Sul Fonte: i5.minus.com O que se pretende nesse tipo de representação é que o leitor associe rapidamente as proporções das áreas ao tema representado. Trata-se então de um tipo de mapa que está entre a Cartografia Sistemática e a Temática, visto que o tipo de projeção está diretamente associado a um tema específico. O achatamento da maioria das unidades da federação, obtido por processamento digital dos dados representados, indica baixas taxas demográficas, indicando que a população sul-africana está bastante concentrada em apenas algumas unidades. Depreendemos de toda essa discussão que, definitivamente, não há mapas totalmente errados ou totalmente certos, cada um escolhe – entre proporções, dimensões e formas – aquilo que vai privilegiar em detrimento dos aspectos que foram deixados em segundo plano. Mais uma vez, para reforçar a nossa compreensão deste assunto: os mapas são visões de seus autores, contextualizadas segundo as demandas e culturas de suas épocas. Não nos cabe julgá-los a partir dos nossos valores, mas, ao contrário, analisá-los exatamente dentro dos seus devidos contextos. 24 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Material Complementar Noções básicas de Cartografia IBGE: • ftp://geoftp.ibge.gov.br/documentos/cartografia/nocoes_basicas_cartografia.pdf Princípios de Cartografia: • http://www.fcav.unesp.br/Home/departamentos/engenhariarural/TERESACRISTINATAR- LEPISSARRA/Cartografia-Basica.pdf Revista brasileira de Cartografia: • http://www.lsie.unb.br/rbc/index.php/rbc Base de dados digitais do IBGE: • http://downloads.ibge.gov.br/downloads_geociencias.htm • http://loja.ibge.gov.br/organizacao-do-territorio/regioes-de-influencia-das-cidades-2007.html • ftp://geoftp.ibge.gov.br/atlas/atlas_nacional_do_brasil_2010/2_territorio_e_meio_ ambiente/ • ftp://ftp.ibge.gov.br/Cartas_e_Mapas/Mapas_Tematicos Censo 2010: • ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Resultados_Gerais_da_Amostra/ resultados_gerais_amostra.pdf Site de Projeções Cartográficas da Universidade do Colorado – EUA: • http://www.colorado.edu/geography/gcraft/notes/mapproj/mapproj_f.html 25 Referências LIBAULT, A. Geocartografia. São Paulo: EDUSP, 1975. 26 Unidade: Sistema de Projeções Cartográficas Anotações
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