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Gentil Lopes - Artigo DOIS ERROS GRAVES COMETIDOS PELOS MATEMÁTICOS

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Dois Erros Graves Cometidos Pelos Matema´ticos
Gentil, o iconoclasta∗
15 de dezembro de 2018
A matema´tica esta´ longe de ser esta´tica e perfeita; ela esta´ cons-
tantemente evoluindo, mudando a todo instante e plasmando-se em no-
vas formas. Novos conceitos continuamente transformam a matema´tica
e criam novos campos, novos pontos de vista, novas eˆnfases e novas
questo˜es para serem respondidas. (Gregory Chaitin/Metamat!)
Resumo
Este artigo tem por objetivo apontar − e corrigir − dois erros
graves cometidos pelos matema´ticos ha´ se´culos. Este e´ o que podemos
denominar de um artigo acachapante.
Introduc¸a˜o:
No nosso entendimento existem dois equ´ıvocos que veˆm sendo cometi-
dos pelos matema´ticos ha´ se´culos, quais sejam:
1o ) Ambiguidades nas Representac¸o˜es Decimais;
2o ) Representac¸o˜es decimais de nu´meros reais sa˜o nu´meros reais.
Nota: No Google e no YouTube o leitor encontrara´ dezenas e dezenas de
artigos e v´ıdeos sobre estes temas. Por exemplo, digite
0, 999 . . . = 1
Em se tratando de um tema delicado, “abstrato”, estaremos delibera-
damente escrevendo um longo e detalhado artigo, para que “qualquer crianc¸a
do Ensino Fundamental” entenda onde reside o erro crasso dos matema´ticos
− ja´ que os pro´prios se recusam a enxergar. Ou na˜o se coloca vinho novo
em odres velhos?.
Nota: Este artigo foi escrito para a palestra anunciada a seguir.
∗gentil.iconoclasta@gmail.com / Mestre em matema´tica / Professor do Departamento
de Matema´tica da UFRR. (65 pa´ginas)/Download: www.goo.gl/DVWQxz
1
CICLO DE PALESTRAS DO DEPARTAMENTO DE
MATEMA´TICA DA UFRR 2018
T´ITULO: DOIS ERROS GRAVES COMETIDOS PELOS MATEMA´TICOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA
CENTRO DE CIEˆNCIAS E TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE MATEMA´TICA
CICLO DE PALESTRAS 2018
Prof. Me. Gentil, o iconoclasta
Contato: gentil.iconoclasta@gmail.com
Resumo: Existem dois erros de interpretac¸a˜o que os ma-
tema´ticos veˆm cometendo ha´ se´culos, quais sejam:
1 o ) Ambiguidades nas Representac¸o˜es Decimais;
2 o ) Representac¸o˜es Decimais sa˜o nu´meros reais.
No livro “Meu Professor de Matema´tica” (5 a Edic¸a˜o)
o Prof. Elon Lages Lima trata das representac¸o˜es decimais.
O leitor Sun Hsien Ming lhe dirige a seguinte pergunta:
“O fato de a mesma frac¸a˜o ordina´ria poder ter duas
representac¸o˜es decimais distintas, por exemplo
2
5
= 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
na˜o apresenta inconveniente nem origina paradoxos?”
Vamos argumentar no sentido de provar por que a res-
posta do Prof. Elon esta´ errada. Ademais, uma outra
“igualdade” que o Prof. Elon, e (quase) todos os outros
matema´ticos, na˜o entenderam e´ esta
0, 999 . . . = 1
Sugesta˜o: Na˜o perca esta palestra a final de contas na˜o e´
todo se´culo que se tem a oportunidade de apontar dois er-
ros grav´ıssimos (de matema´tica elementar) cometidos pelos
matema´ticos − de todo o mundo.
Local: UFRR/Audito´rio do CCT/Anexo Bloco 5
Data e hora´rio: 29/11/2018 a`s 15hs
Adendo: As origens deste artigo
As origens deste artigo remontam ha´ cerca de 15 anos atra´s. Na ocasia˜o
eu estudava a construc¸a˜o da Curva de Peano (Ver p. 50 deste pdf)
p
0
1
1
2
s
χ
p p
p
p
0 11
3
2
3
1
3
2
3
1
s
A Curva de Peano pertence
a um ramo da matema´tica
conhecido como Topologia
e tem aplicac¸o˜es em com-
pressa˜o de imagens digitais.
pelo livro de Espac¸os Me´tricos do Prof. Elon Lages Lima, no qual se ler:
“a representac¸a˜o decimal de um nu´mero real x ∈ [ 0, 1 ] e´ u´nica, exceto por
ambigu¨idades do tipo 0, 47999 . . . = 0, 48000 . . . ” (p. 231)
Para contornar as supostas ambiguidades o Prof. Elon lanc¸a ma˜o de
alguns artif´ıcios, como por exemplo, o conjunto de Cantor e a representac¸a˜o
de um nu´mero em base 3; pois bem, achei que a referida construc¸a˜o po-
deria ser consideravelmente simplificada se as supostas ambiguidades na˜o
existissem, fossem apenas um mito. Na e´poca consegui formular alguns ar-
gumentos contra as ambiguidades, cheguei ate´ a trocar alguns email´s com
um matema´tico do IMPA (Gugu/ver p. 62) colega do Prof. Elon. Meus
argumentos de 15 anos atra´s na˜o foram suficientemente claros para me fazer
entender. Deixei de lado a questa˜o (neste ı´nterim escrevi alguns livros, em
um deles de fato consegui simplificar a construc¸a˜o da Curva de Peano, e fui
mais longe), mais recentemente retomei os argumentos contra as ambigui-
dades e agora consegui lapidar a pedra outrora bruta, transformando-a em
um diamante cristalino (este artigo), agora creio que “qualquer crianc¸a do
Ensino Fundamental” e´ capaz de entender meus argumentos.
Ademais, tive a oportunidade de constatar que alguns matema´ticos
(falo de doutores) chegam ate´ a desdenhar do tema representac¸o˜es decimais
por tratar-se de “matema´tica elementar”, isto na˜o e´ digno de suas atenc¸o˜es,
seria perda de tempo. Farei treˆs observac¸o˜es. Primeira: eles teˆm raza˜o
trata-se de matema´tica elementar, contudo, esquecem que esta “matema´tica
elementar” reverbera em a´reas importantes da matema´tica, como a Topolo-
gia, por exemplo. Segunda: mesmo doutores tropec¸am nesta “matema´tica
elementar”, como estaremos provando neste artigo. A terceira observac¸a˜o
fundamenta-se nesta citac¸a˜o:
E´ poss´ıvel que os mitos matema´ticos sejam fonte do que Bachelard
chama de “obsta´culos epistemolo´gicos”, pois aqueles, na sua condic¸a˜o de
“verdades” matema´ticas consolidadas, seriam obsta´culos para o surgimento
de outras verdades (interpretac¸o˜es) que as substituam. ([2])
Os dois erros graves objeto deste artigo sa˜o exemplos de mitos ma-
tema´ticos que “sa˜o obsta´culos para o surgimento de outras verdades
(interpretac¸o˜es) que as substituam.” − Ver Gregory Chaitin, p. 1.
3
1 Geˆnios tambe´m cometem erros elementares
Dissemos que (quase) todos os matema´ticos na˜o entenderam a equac¸a˜o
0, 999 . . . = 1
Parece mentira. Para atenuar um poss´ıvel cepticismo do leitor − quanto ao
t´ıtulo desta secc¸a˜o − afirmamos que isto ja´ aconteceu pelo ao menos uma
vez na histo´ria da matema´tica. Com efeito, na˜o foram poucos os geˆnios
da matema´tica que sucumbiram, intelectualmente falando, frente a` seguinte
“equac¸a˜o elementar”
(−1) · (−1) = 1
Dentre eles, destacamos:
− Leonhard Euler (1707-1783);
− Johann Carl Friedrich Gauss (1777-1855);
− Rene´ Descartes (1596-1650);
− Pierre Simon Laplace (1749-1827);
− Pierre Fermat (1601-1665);
− Gottfried Wilhelm von Leibniz (1646-1716);
− Isaac Newton (1643-1727).
Apenas para citar alguns dos mais eminentes. Reiteramos, nenhum
destes matema´ticos entendeu a equac¸a˜o acima − entendeu significa provou.
Processar s´ımbolos na˜o e´ o mesmo que processar significado
Veja bem, o fato de que eventualmente um aluno do ensino fundamental
saiba que (−1) · (−1) = 1 isto na˜o significa que ele compreenda o porqueˆ
deste produto. Dizemos que ele foi apenas programado para isto, tipo: “o
inimigo do meu inimigo e´ meu amigo”, etc.
Uma “simples” calculadora
como a HP Prime tambe´m “sabe”
que (−1) · (−1) = 1, perguntamos,
ela entende isto?. De igual modo
a grande maioria de estudantes foi
apenas programada para lidar com
a matema´tica, a efetiva compre-
ensa˜o na˜o e´ maior que a da calculadora. O ce´rebro humano e´ programa´vel.
4
Foi precisamente a possibilidade de dar diversas interpretac¸o˜es aos
nu´meros negativos que fez com que eles fossem aceitos aos poucos na co-
letividade matema´tica. Pore´m, desde seu aparecimento, esses nu´meros
suscitaram du´vidas quanto a` sua legitimidade. Em 1543 Stieffel ainda
os chamava de nu´meros absurdos, e Cardano, contemporaˆneo de Stieffel,
denominava-os soluc¸o˜es falsas de uma equac¸a˜o. ([5])
Descartes (1596 -1650) chamava de falsas as ra´ızes negativas de uma
equac¸a˜o; Viete (1540 -1603) era mais radical: simplesmente rejeitava os nega-
tivos − bem como D’Alembert(1767-1783).
Em um livro cla´ssico da matema´tica “O Que e´ Ma-
tema´tica?” (Richard Courant & Herbert Robbins)/Rio de
janeiro: Editora Cieˆncia Moderna., 2000.
Lemos: (p. 65/Grifo nosso)
Por exemplo, a regra
(3) (−1) (−1) = 1,
definida para a multiplicac¸a˜o de inteiros negativos, e´ uma consequ¨eˆncia do
nosso desejo de preservar a lei distributiva a (b + c) = a b + a c. Por que se
tive´ssemos determinado que (−1) (−1) = −1, enta˜o, ao definirmos a = −1,
b = 1, c = −1, dever´ıamos ter tido −1 (1 − 1) = −1 − 1 = −2, enquanto
que, por outro lado, temos efetivamente, −1 (1 − 1) = −1 · 0 = 0. Os
matema´ticos levaram muito tempo para compreender que a “regra
de sinais” (3), juntamente com todas as outras definic¸o˜es que se referem
aos inteiros negativos e frac¸o˜es na˜o pode ser “provada”. Elas sa˜o criadas por
no´s para alcanc¸armos liberdade nas operac¸o˜es, preservando ao mesmo tempo
as leis fundamentais da aritme´tica. O que pode − e deve − ser provado
e´ apenas que, com base nestas definic¸o˜es, as leis comutativa, associatiava
e distributiva da Aritme´tica sa˜o preservadas. Inclusive o grande Euler
lanc¸ou ma˜o de um racioc´ınio absolutamente na˜o convincente para
demonstrar que (−1) (−1) “deve” ser igual a +1. Isto porque, argumentava
ele, deve ser +1 ou −1, e na˜o pode ser −1, uma vez que −1 = (+1) (−1).
O malabarismo apresentado por Euler para justificar
a regra de sinais demonstra que ele na˜o tinha ainda co-
nhecimentos suficientes para esclarecer convincentemente
os pontos obscuros apresentados pelas regras de sinais. Na
mesma obra, segundo Glaeser (1981), Euler concebe o nu´mero nega-
tivo como sendo uma letra precedida com o sinal − (menos). Euler
na˜o consegue estabelecer uma ideia para a formac¸a˜o do conceito de
nu´mero negativo, nem muito menos concebeˆ-los como sendo quan-
tidades menores que zero. ([5])
5
1.1 Explicitando melhor o erro de Euler
O argumento ja´ admite como conhecido que (+1) (−1) = −1, ok. Euler
argumenta “Mas como (+1) (−1) vale −1, na˜o resta mais como u´nica pos-
sibilidade que (−1) × (−1) = +1”. Ou seja, Euler afirma que na˜o se pode
ter simultaneamente
(+1) (−1) = −1 e (−1)× (−1) = −1
o que e´ um erro assaz pueril uma vez que uma operac¸a˜o sobre um conjunto
E e´ uma aplicac¸a˜o (func¸a˜o)
f : E×E → E
e na˜o e´ obrigatoriamente injetiva. Por exemplo, seja E = {−1, 1 } e a
operac¸a˜o
∗ : E×E → E, dada por a ∗ b = ab
Por exemplo, temos
(+1) ∗ (−1) = (−1) (+1) = −1 e (−1) ∗ (−1) = (−1) (−1) = −1
1.2 Como se resolveu um impasse de 1600 anos?
Depois de 16 se´culos de lutas inglo´rias
na tentativa de se compreender os nu´meros
negativos e, em particular (−1) · (−1) = 1,
a questa˜o comec¸ou a se iluminar pela con-
tribuic¸a˜o majorita´ria de dois matema´ticos
Hermann Hankel (1839-1873) e George Pea-
cock (1791-1858).
Peacock inicialmente admite a possibilidade de que tenhamos
(−1) · (−1) = −1
se fosse este o caso vejamos no que daria: substituindo a = −1, b = 1,
c = −1 em a · (b+ c) = ab+ ac, temos
−1 · ( 1 + (−1) ) = −1 · 1 + (−1) · (−1)
Vamos substituir −1 · 1 = −1, logo (1 elemento neutro)
−1 · ( 1 + (−1) ) = −1 + (−1) = −2
Por outro lado, temos efetivamente
−1 · ( 1 + (−1) ) = −1 · ( 0 ) = 0
6
Numa ana´lise apressada poderiamos concluir que o argumento estabelece
a seguinte contradic¸a˜o: 0 = −2 e que, portanto, a hipo´tese inicial (−1) ·
(−1) = −1 so´ pode ser falsa, logo estaria provado que: (−1) · (−1) = 1.
Na verdade na˜o e´ isto o que acontece∗ , o que na realidade foi provado e´
Se a · (b+ c) = ab+ ac e (−1) · (−1) = −1 enta˜o 0 = −2
O contrapositivo deste teorema e´
Se 0 6= −2 enta˜o a · (b+ c) 6= ab+ ac ou (−1) · (−1) 6= −1
Certamente 0 6= −2, mas na˜o existe nada, logicamente falando, que nos
obrigue a escolher entre
a · (b+ c) 6= ab+ ac ou (−1) · (−1) 6= −1
No per´ıodo compreendido entre Diofanto e Hankel, muitos matema´ticos
se propuseram a construir uma demonstrac¸a˜o para a regra de sinais pautada
em exemplos pra´ticos. Pore´m, Hankel em 1867, demonstra que a u´nica
das regras poss´ıveis e´ aquela que preserva a distributividade a` esquerda e
a` direita, isso porque ele aborda a ideia de nu´mero relativo numa outra
dimensa˜o, que na˜o aquela procurada na natureza. Hankel, diferentemente
de Laplace, que acreditava na existeˆncia de uma explicac¸a˜o para a
multiplicac¸a˜o dos relativos na natureza, aborda a questa˜o numa outra
dimensa˜o, os nu´meros na˜o sa˜o descobertos, sa˜o imaginados e a regra de
sinais e´ pura invenc¸a˜o da mente humana, uma convenc¸a˜o. ([5])
Nota: Diofanto de Alexandria, matema´tico Grego nascido entre 201 e 214.
Temos, 1867− 214 = 1653 anos de tentativas para se provar (−1) (−1) = 1.
Observem a fundamental mudanc¸a de perspectiva: “Os nu´meros na˜o
sa˜o descobertos − como acreditava Laplace, e muitos outros −, sa˜o invenc¸o˜es
humanas”.
“Levou muito tempo para que os matema´ticos percebessem que a ‘regra
dos sinais’, junto com todas as outras definic¸o˜es governando os inteiros
negativos e frac¸o˜es na˜o podem ser ‘provadas’ ” (Hermann Hankel).
Sugesta˜o: O v´ıdeo Histo´ria da Matema´tica para Professores 16 - Nu´meros
negativos e Complexos
https://www.youtube.com/watch?v=xjG2Z5XgS4o
exibe uma tosca tentativa de provar que (−1) · (−1) = 1, efetuada pelo
matema´tico Jean-Robert Argand (1768-1822). Hoje a “prova” de Argand
pode ser enviada para a lixeira − na˜o tem nenhum valor matema´tico.
Nota: A quem interessar possa, na refereˆncia [5] damos outros detalhes
sobre este tema, inclusive citando a bibliografia consultada.
∗Lembre-se que a` e´poca de Peacock os inteiros ainda na˜o existiam, isto e´, na˜o possuiam
legitimidade matema´tica − Ou ainda, na˜o haviam sido construidos, operava-se com eles
de modo informal, intuitivamente, sem o necessa´rio rigor.
7
2 Meu Professor de Matema´tica
No livro “Meu Professor de Matema´tica”
(5 a Edic¸a˜o) o Prof. Elon Lages Lima, trata
das representac¸o˜es decimais. Na pa´gina 162,
consta:
7.Du´vidas sobre d´ızimas
A transformac¸a˜o de frac¸o˜es ordina´rias em decimais, dando origem ao fenoˆmeno
curioso das chamadas d´ızimas per´ıodicas, e´ sem du´vida um assunto que pro-
voca questo˜es, suscita controve´rsias e gera problemas. Alguns colegas teˆm
escrito com perguntas sobre o assunto.
Duas das mais interessantes entre essas perguntas foram feitas por Sun
Hsien Ming, de Sa˜o Paulo, SP.
Elas sa˜o:
1 a ) Existe alguma frac¸a˜o ordina´ria tal que, dividindo-se o numerador pelo
denominador, obtenha-se a d´ızima perio´dica 0, 999 . . .?
2 a ) O fato de a mesma frac¸a˜o ordina´ria poder ter duas representac¸o˜es de-
cimais distintas (como 2/5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .) na˜o apresenta incon-
veniente nem origina paradoxos?
De momento vamos considerar a segunda pergunta acima. Vamos nos
ater ao seguinte trecho da resposta do professor Elon: (p. 164)
“Seria bom que a correspondeˆncia entre nu´meros racionais e frac¸o˜es
decimais perio´dicas (d´ızimas) fosse biun´ıvoca. Mas na˜o e´. Caso insista-
mos muito em ter sua biunivocidade, vamos ter que fazer um sacrif´ıcio para
obteˆ-la. Um sacrif´ıcio poss´ıvel seria abster-se de considerar decimais ‘exa-
tas’, substituindo sempre todas as frac¸o˜es do tipo 5, 183 por 5, 182999 . . .
(por exemplo). O outro seria excluir as d´ızimas que terminam com uma fi-
leira de noves, substituindo-as sempre pela decimal exata obtida suprimindo
os nove e somando 1 ao u´ltimo algarismo que os precede; isto corresponde-
ria a escrever sempre 0, 7 em vez de 0, 6999 . . . Nenhuma dessas escolhas e´
muito natural. Por isso me parece mais razoa´vel que nos resignemos com a
falta de biunivocidade. Ha´ coisas piores no mundo.”
Segundo entendemos, ha´ um equ´ıvoco por parte do professor Elon, na
verdade na˜o existe falta de biunivocidade, pelo contra´rio, existe excesso −
como provaremos. Mas na˜o apenas isto . . .
“Nenhuma dessas escolhase´ muito natural.” Ao contra´rio, mostrare-
mos que qualquer uma das escolhas e´ muito natural, e deve ser feita.
8
Cuidado! . . . na matema´tica nem sempre uma “igualdade” e´
de fato uma igualdade
Antes fac¸amos mais um interregno necessa´rio. Vamos exemplificar no
sentido de mostrar que devemos ter muito cuidado ao interpretar certas
“igualdades matema´ticas”. Vejamos treˆs exemplos:
1 o ) Frac¸o˜es equivalentes. Ha´ muitos anos atra´s corrigimos o gabarito de
uma prova de cursinho. A questa˜o era:
Problema: Encontrar a frac¸a˜o
x
y
tal que a soma do numerador com o
denomindor seja 16 e o produto seja 48.
Soluc¸a˜o: 

x+ y = 16
x · y = 48
Alternativas:
a) 313 b)
5
11 c)
7
9
d) 13 e) NRA→
A resposta dada pelo gabarito foi a letra d). Acontece que a frac¸a˜o
1
3
na˜o satisfaz ao enunciado da questa˜o, isto e´, o sistema acima.
A resposta correta e´ dada pela frac¸a˜o
4
12
, veja:
x
y
=
4
12
=
1
3
Resumindo, frac¸o˜es equivalentes na˜o sa˜o frac¸o˜es iguais!
2 o ) Um resultado bizarro. Na secc¸a˜o 10 demonstramos a seguinte igualdade
(p. 43)
0, 999 . . . =
9
10
+
9
102
+
9
103
+ · · · = 0
3 o ) Ademais, pode ser provado que (p. 43)
0, 4999 . . . =
4
10
+
9
102
+
9
103
+ · · · = 0
9
Na˜o raro, na matema´tica uma “igualdade” na˜o e´ uma igualdade abso-
luta, mas relativa, isto e´, deve ser interpretada dentro de um certo contexto.
Ou ainda: e´ o contexto que legitima a igualdade. E´ precisamente o que
acontece com a “igualdade”
0, 999 . . . = 1
ou com a dupla “igualdade”:
2
5
= 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
A nossa tese, reiteramos, e´ que os matema´ticos na˜o esta˜o sabendo in-
terpretar adequadamente estas “igualdades”. A dupla igualdade acima e´
um exemplo do que os matema´ticos denominam de “ambiguidades nas re-
presentac¸o˜es decimais ”.
Pra comec¸ar, ha´ um sentido em que esta dupla igualdade e´ verdadeira
e ha´ um sentido em que ela e´ falsa. Ela e´ verdadeira no sentido de con-
vergeˆncia de se´ries, assim:
2
5
=
4
10
+
0
102
+
0
103
+
0
104
+ · · · = 3
10
+
9
102
+
9
103
+
9
104
+ · · ·
Ela e´ falsa no sentido de representac¸o˜es decimais (como veremos).
Fui programado para detectar
fissura nas estruturas.
(o iconoclasta)
No livro A Matema´tica do Ensino Me´dio (Vol.
1) 9 a edic¸a˜o, pa´gina 67, o professor Elon escreve:
“Uma expressa˜o decimal e´ um s´ımbolo da forma
α = a0 , a1 a2 . . . an . . . ,
onde a0 e´ um nu´mero inteiro ≥ 0 e a1 , a2 , . . . , an , . . . , sa˜o d´ıgitos, isto e´,
nu´meros inteiros tais que 0 ≤ an ≤ 9. Para cada n ∈ N, tem-se um d´ıgito
an , chamado o n-e´simo digito da expressa˜o decimal de α. O nu´mero natural
a0 chama-se parte inteira de α.
Exemplo 1. α = 13, 42800 . . ., β = 25, 121212 . . ., pi = 3, 14159265 . . . sa˜o
expresso˜es decimais.”
10
Resumindo: uma expressa˜o decimal e´ uma sequeˆncia, dada assim:
α = a0 , a1 a2 . . . an . . .
Por exemplo, vamos obter a representac¸a˜o decimal do nu´mero real
α = 47200
Isto e´, vamos obter a sequeˆncia denotada por
.a1 a2 a3 . . .
o ponto antes dos a
i
’ s e´ para lembrar que estaremos considerando apenas a
representac¸a˜o decimal de nu´meros do intervalo [ 0, 1 [ − a parte inteira e´ 0.
Para que “qualquer crianc¸a do Ensino Fundamental” entenda onde
reside o erro dos matema´ticos faremos um tratamento geome´trico das repre-
sentac¸o˜es decimais.
Primeiramente vamos situar α geometricamente no intervalo unita´rio:
0 1
t
α
Para obter o primeiro termo da sequeˆncia, a1 , dividamos o intervalo
unita´rio em dez partes iguais, assim:
0 1
s
α
1
10
2
10
3
10
4
10
5
10
6
10
7
10
8
10
9
10
a1 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p
Os subintervalos em sucessivas diviso˜es a serem efetuadas sera˜o sempre
numerados de 0 a 9, como acima.
Como na primeira divisa˜o α caiu no subintervalo de nu´mero 2 este e´ o
valor de a1 , portanto, ate´ o momento, podemos escrever
47
200 = .2 a2 a3 . . .
Vamos dividir o (sub)intervalo ao qual α pertence novamente em dez
partes iguais, assim:
11
0 1
s
α
1
10
2
10
3
10
4
10
5
10
6
10
7
10
8
10
9
10
a1 = 2 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p
0 1
s
α
1
10
2
10
3
10
4
10
5
10
6
10
7
10
8
10
9
10
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p
Vamos aplicar um zoom nesta figura, assim:
0 1
s
α
1
10
2
10
3
10
4
10
5
10
6
10
7
10
8
10
9
10
a2 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p
s
α
20
100
21
100
22
100
23
100
24
100
25
100
26
100
27
100
28
100
29
100
30
100
a2 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
Como na segunda divisa˜o α caiu no subintervalo de nu´mero 3 este e´ o
valor de a2 , portanto, ate´ o momento, podemos escrever
47
200
= .2 3 a3 . . .
Dividamos novamente em dez partes o subintervalo ao qual α pertence
s
α
20
100
21
100
22
100
23
100
24
100
25
100
26
100
27
100
28
100
29
100
30
100
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
12
Vamos aplicar um zoom nesta figura, assim:
s
α
20
100
21
100
22
100
23
100
24
100
25
100
26
100
27
100
28
100
29
100
30
100
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
t
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
Como se veˆ, α caiu exatamente em uma das diviso˜es, qual o valor de a3?:
47
200
= .2 3 a3 . . .
Atenc¸a˜o!: Precisamente neste ponto surge o que os matema´ticos acreditam
ser uma “ambiguidade”, mas na˜o e´ assim, como veremos.
Prosseguindo, temos duas alternativas a considerar: ou conside-
ramos α fazendo parte do extremo esquerdo do subintervalo 5, ou conside-
ramos α fazendo parte do extremo direito do subintervalo 4, assim:
− Primeira alternativa: Devemos abrir o extremo direito e fechar o extremo
esquerdo de cada subintervalo, veja:
s
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
−→
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
t
Nesta alternativa teremos
47
200
= .2 3 a3 . . .⇒
47
200
= .2 3 5 . . .⇒ 47
200
= .2 3 5 0 0 0 . . .
13
− Segunda alternativa: Devemos abrir o extremo esquerdo e fechar o ex-
tremo direito de cada subintervalo, veja:
s
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
−→
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p pt
Nesta alternativa teremos
47
200
= .2 3 a3 . . .⇒
47
200
= .2 3 4 . . .⇒ 47
200
= .2 3 4 9 9 9 . . .
Resumindo, trata-se de uma escolha, uma vez feita a escolha, como
deve ser feita, as supostas ambiguidades desaparecem! Na˜o existem!
47
200
.235000 . . .
.234999 . . .
2
5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
(Sun Hsien Ming)
2
5
.4000 . . .
.3999 . . .
O asno de BuridanO Asno de Buridan e´ um pa-
radoxo (paro´dia) em filosofia sobre o
conceito de livre arb´ıtrio. O Asno de-
cidiu tomar apenas deciso˜es estrita-
mente racionais.Como estava exata-
mente a` mesma distaˆncia de dois montes de feno ideˆnticos, ele na˜o tinha
justificativa racional para escolher entre os dois . . . morreu de fome.
Exatamente como o asno de Buridan procedem os matema´ticos que
defendem as ambiguidades nas representac¸o˜es decimais: “Nenhuma dessas
escolhas e´ muito natural. Por isso me parece mais razoa´vel que nos resigne-
mos com a falta de biunivocidade. Ha´ coisas piores no mundo.”
14
Nota: Oportunamente veremos de uma outra perspectiva por que a es-
colha deve obrigatoriamente ser feita − as “ambiguidades” conduzem a
contradic¸o˜es.
Preferimos chamar as representac¸o˜es decimais de nu´meros reais de co-
dificac¸a˜o de nu´meros reais, e´ algo ana´logo a` codificac¸a˜o de um caracter
do teclado do computador (ou celular). Neste caso temos muitas alternati-
vas para codificar um caracter, escolhendo uma na˜o existem “ambiguidades”.
De outro modo: dentre 28 = 256 alternativas para se codificar um carac-
ter, os fabricantes de computador fixaram (concordaram em) uma delas,
sendo assim onde fica a “ambiguidade”? − o mesmo deveria ser feito pelos
matema´ticos!
E´ poss´ıvel que os mitos matema´ticos sejam fonte do que Bachelard chama
de “obsta´culos epistemolo´gicos”, pois aqueles, na sua condic¸a˜o de “verda-
des” matema´ticas consolidadas, seriam obsta´culos para o surgimento de ou-
tras verdades (interpretac¸o˜es) que as substituam. O conceito de “ruptura
epistemolo´gica” tambe´m foi introduzido por Bachelard. Faz-se necessa´ria
uma ana´lise mais aprofundada desses conceitos. Os mitos matema´ticos,
enta˜o, sa˜o mitos no interior da pro´pria matema´tica e fazem parte do conhe-
cimento matema´tico sistematizado. ([2])
Nota: Citamos como exemplos de mitos matema´ticos os dois erros graves
tratados neste artigo, por exemplo:
2
5
= 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
e
0, 999 . . . = 1
Enfatizamos:
E´ poss´ıvel que os mitos matema´ticos sejam fonte do que Bachelard
chama de “obsta´culos epistemolo´gicos”, pois aqueles, na sua condic¸a˜o de
“verdades” matema´ticas consolidadas, seriam obsta´culos para o surgi-
mento de outras verdades (interpretac¸o˜es) que as substituam.
15
Tabela de Co´digos (ASCII)
Caracter Co´digo Caracter Co´digo
< 00111100
> 00111110
! 00100001
∑
11100100
# 00100011
$ 00100100
% 00100101
& 00100110
( 00101000
) 00101001
∗ 00101010
[ 01011011
] 01011101
+ 00101011
− 00101101
/ 00101111
0 00110000
1 00110001
2 00110010
3 00110011
4 00110100
5 00110101
6 00110110
7 00110111
8 00111000
9 00111001
A 01000001
B 01000010
C 01000011
D 00100100
E 01000101
F 01000110
G 01000111
H 01001000
I 01001001
J 01001010
K 01001011
L 01001100
M 01001101
N 01001110
O 01001111
P 01010000
Q 01010001
R 01010010
S 01010011
T 01010100
U 01010101
V 01010110
W 01010111
X 01011000
Y 01011001
Z 01011010
28 =256
O co´digo alfanume´rico mais comumente usado em sistemas de micro-
computador e´ o
AMERICAN STANDARD Code for Information Interchange
(Co´digo Americano Padra˜o para Troca de Informac¸o˜es)
Por exemplo, segundo este co´digo, temos
A = 01000001, 9 = 00111001,
∑
= 11100100
Nota: Obviamente que estas “igualdades” na˜o sa˜o absolutas, devem ser
interpretadas dentro de um contexto.
Enfatizamos: De modo ana´logo os nu´meros reais sa˜o codificados por
sequeˆncias decimais.
16
3 O Professor Djairo Guedes corrobora nossa tese
Em seu livro Ana´lise
I (2 a Edic¸a˜o) o profes-
sor Djairo trata das repre-
sentac¸o˜es decimais.
Inicialmente ele considera o conjunto (p. 41)
{ 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }∞ = D
de todas as decimais. Em seguida define a func¸a˜o
f : D → R, dada por f(.a1 a2 a3 . . .) =
∞∑
n=1
an
10n
Em seguida observa que f esta´ bem definida mas que na˜o e´ injetiva, pois
f
(
.a1 . . . aj−1 (aj − 1) 9 9 . . .
)
= f(.a1 . . . aj 0 0 . . .)
Por exemplo, considerando
2/5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
temos
f(0, 3999 . . .) = f(0, 4000 . . .) =
2
5
pois
f(0, 3999 . . .) =
3
10
+
9
102
+
9
103
+
9
104
+ · · · = 2
5
e
f(0, 4000 . . .) =
4
10
+
0
102
+
0
103
+
0
104
+ · · · = 2
5
∗ ∗ ∗
Adendo: Na pa´gina 42 do seu livro Ana´lise I o Prof. Djairo escreve:
“De modo mais rigoroso, podemos proceder assim. Uma decimal e´ uma
func¸a˜o
f : N→ { 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }”
Ou seja, segundo o Prof. Djairo, “de modo mais rigoroso” uma decimal e´
uma sequeˆncia. Para o propo´sito que temos em mente isto e´ muito impor-
tante! − Esta definic¸a˜o coincide com a do Prof. Elon, p. 10.
17
Mais a` frente o professor Djairo escreve: (p. 42)
“Se definirmos D∗ como o subconjunto de D formado por decimais que
na˜o teˆm todos os elementos iguais a 9, a partir de uma certa ordem, enta˜o
a func¸a˜o f , definida acima, restrita a D∗ e´ injetiva. Mostraremos agora que
f e´ sobre [ 0, 1 [ e, portanto, temos a seguinte correspondeˆncia biun´ıvoca”
D∗ ↔ [ 0, 1 [
.a1 a2 . . .↔
∞∑
n=1
an
10
n
Considerando nossos dois exemplos vistos
47
200
.235000 . . .
.234999 . . . X
ւ
2
5
.4000 . . .
.3999 . . . X
ւ
− O Professor Djairo escolheu as representac¸o˜es indicadas pelas setas
Lembrando a resposta do Prof. Elon a` pergunta de Sun Hsien Ming:
“Seria bom que a correspondeˆncia entre nu´meros racionais e frac¸o˜es
decimais perio´dicas (d´ızimas) fosse biun´ıvoca. Mas na˜o e´. Caso insista-
mos muito em ter sua biunivocidade, vamos ter que fazer um sacrif´ıcio para
obteˆ-la. Um sacrif´ıcio poss´ıvel seria abster-se de considerar decimais ‘exa-
tas’, substituindo sempre todas as frac¸o˜es do tipo 5, 183 por 5, 182999 . . .
(por exemplo). O outro seria excluir as d´ızimas que terminam com uma fi-
leira de noves, substituindo-as sempre pela decimal exata obtida suprimindo
os nove e somando 1 ao u´ltimo algarismo que os precede; isto corresponde-
ria a escrever sempre 0, 7 em vez de 0, 6999 . . . Nenhuma dessas escolhas e´
muito natural. Por isso me parece mais razoa´vel que nos resignemos com a
falta de biunivocidade. Ha´ coisas piores no mundo.”
O que o professor Djairo fez acima foi fazer “naturalmente” uma escolha,
como o Prof. Elon afirma: “Nenhuma dessas escolhas e´ muito natural.” ?
Ainda destacamos mais dois erros na resposta do Prof. Elon, veja:
“Por isso me parece mais razoa´vel que nos resignemos com a falta de
biunivocidade. Ha´ coisas piores no mundo.”
18
1 o ) Na˜o existe “falta de biunivocidade”, pelo contra´rio, existe “excesso de
biunivocidade”, posto que existem duas aplicac¸o˜es biu´nivocas. Com efeito,
existe a escolhida pelo Prof. Djairo, ou seja:
f : D∗ → [ 0, 1 [
.a1 a2 . . .→
∞∑
n=1
an
10
n
Em conformidade com a primeira das alternativas da pa´gina 13
s
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
−→
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p p
t
e existe esta outra:
f˜ : D˜ → ] 0, 1 ]
.a1 a2 . . .→
∞∑
n=1
an
10n
(O asno de Buridan)
onde D˜ e´ o subconjunto de
D = { 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }∞
formado por decimais que na˜o teˆm todos os elementos iguais a 0, a partir
de uma certa ordem. Em conformidade com a segunda das alternativas da
pa´gina 13
α
230
1000
231
1000
232
1000
233
1000
234
1000
235
1000
236
1000
237
1000
238
1000
239
1000
240
1000
a3 → 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
p p p p p p p p p p pt
19
Temos aqui um exemplo do
cla´ssico “copo meio cheio ou meiova-
zio”. O pessimista ver o copo meio va-
zio: “Por isso me parece mais razoa´vel
que nos resignemos com a falta de
biunivocidade. Ha´ coisas piores no
mundo.” O otimista ver o mesmo copo meio cheio: “na˜o existe falta de
biunivocidade, pelo contra´rio, existe excesso”.
2 o ) O Prof. Elon acredita no mito das ambiguidades, ou seja, que a
dupla igualdade
2
5
= 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
e´ verdadeira sob o ponto de vista das representac¸o˜es decimais. Vamos mos-
trar que e´ falsa, inconsistente, na˜o se sustenta. Com efeito, segundo a de-
finic¸a˜o do pro´prio Prof. Elon (p. 10), e do Prof. Djairo (p. 17), uma
representac¸a˜o decimal e´ uma sequeˆncia do conjunto
{ 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }∞ = D
lembrando da definic¸a˜o de igualdade de sequeˆncias:
(a1 , a2 , . . . , an , . . .) = (b1 , b2 , . . . , bn , . . .) ⇐⇒ ai = bi , ∀ i ∈ N
temos a seguinte contradic¸a˜o:
2
5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
4 = 3
↓
A = 01000001 = 00111001
1 = 0
− Co´digo ASCII
Se um caracter fosse codificado
de dois modos distintos →←
Lembramos a pergunta de Sun Hsien Ming:
O fato de a mesma frac¸a˜o ordina´ria poder ter duas representac¸o˜es de-
cimais distintas (como 2/5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .) na˜o apresenta incon-
veniente nem origina paradoxos?
Como vimos, a resposta deve ser: sim, mais que inconveniente e para-
doxo gera contradic¸o˜es. O correto e´: (Adendo, p. 65)
2/5 = 0, 4000 . . . , se escolhermos D∗
ou
2/5 = 0, 3999 . . . , se escolhermos D˜.
20
Mais um autor corrobora nossa tese
No livro a seguir
Nu´meros Reais/Jorge Aragona. − Sa˜o Paulo: Editora
Livraria da F´ısica, 2010.
o autor constro´i a representac¸a˜o decimal para todos os reais, ele − tal como
o professor Djairo − tambe´m faz uma escolha: exclui as decimais que conte´m
9 a partir de uma certa ordem.
Vamos reproduzir aqui a definic¸a˜o do Aragona: (p. 92)
Definic¸a˜o 1.6.10
“Chama-se desenvolvimento decimal ilimitado a qualquer s´ımbolo do tipo
β0 , β1 β2 . . . , βm . . . (1.6.10.1)
determinado por uma sequeˆncia (βm)m∈N em Z tal que 0 ≤ βm ≤ 9 para
cada m ∈ N∗, e, neste caso, para cada m ∈ N∗, βm e´ chamado m-e´sima
casa decimal de (1.6.10.1). O desenvolvimento decimal ilimitado (1.6.10.1)
e´ dito pro´prio se conte´m uma infinidade de casas decimais βm diferentes de
9 (ou equivalentemente, se na˜o existe ν ∈ N tal que a sequeˆncia truncada
(βm)m>ν seja constante e igual a 9). Indicamos com o s´ımbolo
D
o conjunto de todos os decimais ilimitados pro´prios.” (Grifo nosso)
Sendo assim, Aragona naturalmente faz uma escolha − “o conjunto
de todos os decimais ilimitados pro´prios” −, por sinal coincidindo com a
escolha do Prof. Djairo, como o Prof. Elon afirma “Nenhuma dessas escolhas
e´ muito natural ” ?
Ademais, Aragona corrobora nossa afirmac¸a˜o de que uma representac¸a˜o
decimal e´ u´nica (sem ambiguidades), vejamos:
(Aragona, p. 92/(Grifo nosso))
A expressa˜o “nu´mero decimal” tambe´m e´ frequentemente utilizado
para indicar um desenvolvimento decimal ilimitado (pro´prio ou na˜o). Ja´
observamos, [. . . ], que e´ poss´ıvel associar a cada α ∈ R o seu desenvolvi-
mento decimal ilimitado
J(α) := α0 , α1 α2 . . . αm . . .
que e´ determinado por α (isto e´, cada α ∈ R tem um u´nico desenvolvi-
mento decimal ilimitado).
21
4 Adendo: Uma escolha hipernatural
O Prof. Elon afirmou “Nenhuma dessas escolhas e´ muito natural”, no´s
afirmamos “Qualquer uma das escolhas e´ muito natural”. Pensando melhor,
vamos mostrar que existe uma escolha que e´ hipernatural e que de certo modo
se impo˜e. Essa escolha esta´ fundamentada em um teorema que encontramos
no livro∗: (p. 60)
Teorema 7. Dados inteiros a e b com a ≥ 0 e b > 1, existem inteiros
c0 , c1 , . . . , cn , . . ., univocamente determinados pelas seguintes condic¸o˜es:
(i) Existe um natural m tal que cn = 0 para todo n ≥ m;
(ii) Para todo n, temos que 0 ≤ cn < b;
(iii) a = c0 + c1 · b+ · · ·+ cn · bn + · · ·
Mais a` frente: (p. 61)
A expressa˜o a = c0+c1 ·b+ · · ·+cn ·bn com 0 ≤ ci < b para i = 0, . . . , n,
e´ chamada de expansa˜o b−a´dica do inteiro a.
Um pouco mais a` frente: (p. 62)
O sistema de numerac¸a˜o de base b > 1 obte´m-se escolhendo um con-
junto com b s´ımbolos
S = { s0 , . . . , sb−1 }
com s0 = 0, que representam os inteiros de 0 a b− 1 e representando um
inteiro na˜o negativo s como
s = xnxn−1 . . . x0 ,
com x
i
∈ S, i = 0, . . . , n.
Ainda nesta mesma pa´gina:
A justificativa da validade da representac¸a˜o acima se apoia no Teo-
rema 7 que nos garante ser uma bijec¸a˜o a func¸a˜o
Z+b −→ Z+
xn . . . x0 −→ c0 + · · · + cn · bn
onde Z+b e´ o conjunto dos elementos da forma xn . . . x0 , com xn 6= 0 se n > 1
e onde para cada i, tem-se que c
i
e´ o inteiro correspondente ao s´ımbolo x
i
.
Por exemplo vamos ver qual a escolha hipernatural para a representac¸a˜o
decimal da frac¸a˜o 47200 . Inicialmente obtemos a expansa˜o de 47, assim:
47 = 4 · 101 + 7 · 100
Pelo teorema 7 esta expansa˜o e´ u´nica. Agora dividamos a equac¸a˜o anterior
por 200, veja
47
200
=
4 · 101 + 7 · 100
2 · 102
∗Hefez, Abramo. Curso de A´lgebra, Volume 1. Rio de Janeiro: IMPA - CNPq, 1993.
22
Vamos reescrever esta equac¸a˜o em conformidade com a se´rie
D∗ ↔ [ 0, 1 [
.a1 a2 . . .↔
∞∑
n=1
an
10n
Enta˜o
47
200
=
4 · 101
2 · 102 +
7 · 100
2 · 102
Logo
47
200
=
2
10
+
6
2 · 102 +
1
2 · 102 ·
5
5
Finalmente
47
200
=
2
10
+
3
102
+
5
103
⇒ 47
200
= .235
Que coincide com a escolha do Prof. Djairo. Portanto, podemos con-
cluir que o Teorema 7 nos fornece uma escolha natural, ao contra´rio do
que o Prof. Elon afirma. Ademais, podemos concluir pelo teorema 7 que
esta representac¸a˜o e´ u´nica, o que depo˜e contra as supostas ambiguidades.
No caso da frac¸a˜o do Sun Hsien Ming
2
5
= 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .
temos
2 = 2 · 100
Pelo teorema 7 esta expansa˜o e´ u´nica. Agora dividamos a equac¸a˜o anterior
por 5, veja
2
5
=
2 · 100
5
Enta˜o
2
5
=
2 · 100
5
· 2
2
=
4
101
⇒ 2
5
=
4
101
= .4
E esta representac¸a˜o e´ u´nica. Podemos denominar de “unicidade induzida”.
Vejamos um fenoˆmeno interessante. Considere a “ambiguidade”:
2
10
+
3
102
+
5
103
=
47
200
=
2
10
+
3
102
+
4
103
+
9
104
+
9
105
+
9
106
+ · · ·
23
Multiplicando estas igualdades por 200, temos
2 · 102
( 2
10
+
3
102
+
5
103
)
= 200 · 47
200
(1)
Logo
4 · 10 + 6 + 1 = 200 ⇒ 47 = 4 · 10 + 7
Por outro lado
200 · 47
200
= 2 · 102
( 2
10
+
3
102
+
4
103
+
9
104
+
9
105
+
9
106
+ · · ·
)
resulta
47 = 4 · 10 + 6 + 8
101
+
18
102
+
18
103
+
18
104
+ · · ·
No primeiro caso − equac¸a˜o (1) − voltamos “naturalmente” para a
expansa˜o do inteiro 47, por isso dizemos que
2
10
+
3
102
+
5
103
=
47
200
⇒ 47
200
= .235
e´ uma escolha natural. Como se veˆ, fundamentados no teorema 7 podemos
exorcizar para sempre o fantasma das ambiguidades.
Ademais, observe que a representac¸a˜o (codificac¸a˜o) de um inteiro esta´
fundamentada em uma bijec¸a˜o entre dois conjuntos
Z+b −→ Z+
xn . . . x0 −→ c0 + · · · + cn · bn
o conjunto dos inteiros e um conjunto de sequeˆncias, neste caso finitas. No
caso dos nu´meros reais deve acontecer o mesmo, isto e´, a representac¸a˜o
(codificac¸a˜o) deve estar fundamentada em uma bijec¸a˜o, e´ o que o Prof.
Djairo faz. E´ para obter esta bijec¸a˜o que na figura da pa´gina 13 a escolha
deve ser feita. Ao contra´rio da representac¸a˜o de um inteiro, no caso da
representac¸a˜o de um nu´mero real temos duas alternativas.
Nota Importante: Observe que a sequeˆncia xn . . . x0 e´ a representac¸a˜ode um nu´mero inteiro, e na˜o um nu´mero inteiro.
24
5 O Segundo Erro Grave
E que nossas perspectivas, mesmo nas questo˜es de matema´tica ba´sica
e mais aprofundada, se desloca, amiu´de, de maneira surpreendente e
inesperada. (Gregory Chaitin/Metamat!)
X
←
1 o ) Ambiguidades nas Representac¸o˜es Decimais;
2 o ) Representac¸o˜es decimais sa˜o nu´meros reais.
No livro A Matema´tica do Ensino
Me´dio (Vol. 1) 9a edic¸a˜o, pa´gina 69, o
professor Elon escreve: (Grifo nosso)
“Comecemos com o caso mais simples, que e´ tambe´m o mais intrigante.
Trata-se da expressa˜o decimal, ou seja, do nu´mero real
α = 0, 999 . . . =
9
10
+
9
100
+
9
1000
+ · · ·
Afirmamos que α = 1.”
Mais a` frente lemos: (p. 70/Grifo nosso)
“A igualdade que 1 = 0, 999 . . . costuma causar perplexidade aos menos
experientes. A u´nica maneira de dirimir o aparente aparadoxo e´ esclarecer
que o s´ımbolo 0, 999 . . . na realidade significa o nu´mero cujos valores
aproximados sa˜o 0, 9, 0, 99, 0, 999 etc. E, como vimos acima, esse e´ o
nu´mero 1.
Ademais, na refereˆncia∗ lemos:
“[· · · ] voceˆ deve ter concluido que 0, 999 . . . = 1. Esse sinal de igual e´
igual mesmo! Na˜o se trata de aproximac¸a˜o: 0, 999 . . . e 1 sa˜o duas formas
diferentes de representar o mesmo nu´mero”. (grifo nosso)
Segundo entendo, os matema´ticos esta˜o considerando 0, 999 . . . igual ao
nu´mero 1 (mesmo!). Ademais, existe um lo´gico (Prof. Adonai Sant’Anna/
UFPR) que tambe´m defende o mesmo, diz ele concordando com o Prof. Elon:
“Lima tem raza˜o. A d´ızima 0, 999 . . . e´ apenas outra forma para representar
o nu´mero real 1”.
Precisamente neste ponto discordamos do prof. Elon e de (quase) to-
dos os outros matema´ticos. Sendo mais expl´ıcito: ate´ prova em contra´rio,
afirmamos que 0, 999 . . . na˜o e´ um nu´mero real. (p. 64)
∗Brolezzi, Antonio Carlos/Monteiro, Martha Salerno, Matema´tica: Nu´meros para queˆ?
Universidade de Sa˜o Paulo, Publicac¸a˜o eletroˆnica.
25
Ora, como vimos, 0, 999 . . . e´ uma sequeˆncia e, a princ´ıpio, uma sequeˆncia
na˜o e´ igual a um nu´mero. Sa˜o objetos de naturezas distintas. Observe onde
cada um destes objetos mora:
f˜ : D˜ → ] 0, 1 ]
.a1 a2 . . .→
∞∑
n=1
an
10n
↓
0, 999 . . .
↓
1 Desde este ponto de vista, so´ acrescentaremos
que, quando se perde ta˜o completamente o sentido de
uma notac¸a˜o, e´ muito fa´cil passar do uso leg´ıtimo e
va´lido desta a um uso ileg´ıtimo, que ja´ na˜o corresponde
efetivamente a nada, e que a`s vezes pode ser inclusive
completamente ilo´gico; isto pode parecer bastante ex-
traordina´rio quando se trata de uma cieˆncia como as
matema´ticas, que deveria ter com a lo´gica lac¸os parti-
cularmente estreitos, e, no entanto, e´ muito certo que se podem assinalar mu´ltiplos
ilogismos nas noc¸o˜es matema´ticas tais como se consideram comumente em nossa
e´poca. (Rene´ Gue´non (1886-1951)/Princ´ıpios do Ca´lculo Infinitesimal)
onde D˜ e´ o subconjunto de
D = { 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }∞
formado por decimais que na˜o teˆm todos os elementos iguais a 0, a partir
de uma certa ordem.
O verdadeiro sentido da “igualdade” 0, 999 . . . = 1 e´ este:
f˜(0, 999 . . .) =
9
10
+
9
100
+
9
1000
+ · · · = 1
0, 999 . . . = 1 e´ uma identidade oriunda desta bijec¸a˜o. Neste momento po-
der´ıamos dar o assunto por encerrado, no entanto vamos continuar argu-
mentando com o objetivo de lanc¸ar mais luz sobre a questa˜o, observa´-la de
outras perspectivas.
Uma representac¸a˜o decimal e´ uma codificac¸a˜o dos nu´meros reais por
sequeˆncias − e´ o que nos diz a bijec¸a˜o f˜ −, segundo entendemos, tomar a
identidade 0, 999 . . . = 1 como sendo literal e´ o mesmo que na Tabela ASCII
(p. 16) tomar as codificac¸o˜es
A = 01000001, 9 = 00111001,
∑
= 11100100
como sendo absolutas, o que e´, evidentemente, absurdo: uma letra e´ uma
letra, uma sequeˆncia bina´ria e´ uma sequeˆncia bina´ria.
Nota: Temos conscieˆncia de que os matema´ticos sabem do que estamos fa-
lando, eles apenas “perderam ta˜o completamente o sentido de uma notac¸a˜o”, em
consequeˆncia “e´ muito certo que se podem assinalar mu´ltiplos ilogismos nas
noc¸o˜es matema´ticas tais como se consideram comumente em nossa e´poca”.
26
6 Adendo: Existe um pol´ıgono de infinitos lados?
Operac¸o˜es no dom´ınio finito, quando estendidas ‘ate´ o infinito’ se
esboroam. (O iconoclasta)
Na refereˆncia [2] lemos: PA=princ´ıpio de Arquimedes. Ademais
(e) a sequeˆncia {1/n} (onde n e´ um inteiro) tende a zero para n tendendo a
∞;
Do ponto de vista intuitivo, a versa˜o (e) do PA reflete a ideia de que
a sequeˆncia {1/n}, pensada como uma colec¸a˜o discreta de pontos da reta,
pode “pular” para zero no infinito.
Elaborei a seguinte versa˜o ana´loga: considere a sequeˆncia (αn) dada por
αn = 1−
1
10n
por exemplo:
α1 = 0, 9; α2 = 0, 99; α3 = 0, 999 ; . . . ; αn = 0, 999 . . . 9
Temos
lim
n→∞
αn = 1 (2)
Do ponto de vista intuitivo o limite (2) reflete a ideia de que a sequeˆncia
(αn), pensada como uma colec¸a˜o discreta de pontos pode “pular” para 1 no
infinito. Escrever o limite (2) da seguinte forma
α
∞
= 0, 999 . . . = 1
e´ apenas, e ta˜o somente, uma notac¸a˜o. Para fins dida´ticos, fac¸amos uma
analogia geome´trica (“visual”). Considere a sequeˆncia (pn) de pol´ıgonos
. . . →
. . . →p3 p4 p5 . . . p11. . . σ
{pn} converge para o c´ırculo σ, isto e´, limn→∞ pn = σ. Observe a analogia

lim
n→∞
pn = σ
lim
n→∞
αn = 1
⇒


p
∞
= pol´ıgono de infinitos lados = σ
α
∞
= 0, 999 . . . = 1
Acontece que um pol´ıgono de infinitos lados na˜o faz sentido. Na˜o e´ rigoroso.
Observe que n =∞ na˜o e´ um nu´mero natural.
Considerar 0, 999 . . . (ou
√
2 = 1, 41421356237 . . .) como um nu´mero
real e´ ta˜o “rigoroso” quanto um pol´ıgono de infinitos lados. Por opor-
tuno, algum matema´tico consegue me provar que uma decimal infinita e´ um
nu´mero real?
27
6.1 E´ meramente uma estenografia matema´tica
No livro∗ lemos (p. 76): Vamos dividir o intervalo unita´rio em duas
metades, a segunda metade novamente em duas partes iguais, a segunda
metade destas em duas outras partes iguais, e assim por diante, ate´ que os
menores intervalos assim obtidos tenham um comprimento de 2−n, onde n
e´ escolhido arbitrariamente grande, por exemplo, n = 100, n = 100.000, ou
qualquer nu´mero que quisermos. Enta˜o, adicionando os comprimentos de
todos os intervalos exceto o u´ltimo, obtemos um comprimento igual a
(3) sn =
1
2
+
1
4
+
1
8
+
1
16
+ · · · + 1
2n
.
Observamos que sn difere de 1 por (
1
2)
n, e que esta diferenc¸a torna-se ar-
bitrariamente pequena, ou “tende a zero” a` medida que n aumenta inde-
finidamente. Na˜o faz qualquer sentido afirmar que a diferenc¸a e´ zero se n
for infinito. O infinito entra somente no procedimento sem fim e na˜o como
uma quantidade efetiva. Descrevemos o comportamento de sn dizendo que
a soma sn aproxima-se do limite 1 a` medida que n tende para o infinito,
escrevendo
(4) 1 =
1
2
+
1
22
+
1
23
+
1
24
+ . . . ,
onde temos, a` direita, uma se´rie infinita. Esta “igualdade” na˜o significa
que tenhamos efetivamente de adicionar infinitos termos; trata-se apenas de
uma expressa˜o abreviada para o fato de que 1 e´ o limite da soma finita
sn a` medida que n tende para o infinito (de forma alguma e´ infinito). As-
sim, a igualdade (4) com seu s´ımbolo incompleto “+ . . .” e´ meramente uma
estenografia matema´tica para a afirmac¸a˜o precisa
1 = limite a` medida que n tende para o infinito da quantidade
(5) 1 =
1
2
+
1
22
+
1
23
+ · · · + 1
2n
.
Adaptando ao nosso contexto: Temos
1 = 0, 999 . . . =
9
10
+
9
100
+
9
1000
+ · · · (3)
Esta “igualdade” na˜o significa que tenhamos efetivamente de adicionarinfinitos termos; trata-se apenas de uma expressa˜o abreviada para o fato de
que 1 e´ o limite da soma finita αn = 1 − 110n a` medida que n tende para o
infinito (de forma alguma e´ infinito). Assim, a igualdade (3) com seu s´ımbolo
incompleto “+ . . .” e´ meramente uma estenografia matema´tica . . .
Nota: A afirmac¸a˜o de Brolezzi (0, 999 . . . = 1, igual mesmo!, p. 25) contra-
diz Courant. Aqui continua valendo a nota da pa´gina 26.
∗O Que e´ Matema´tica? (Richard Courant & Herbert Robbins), p. 5.
28
7 Salto arquimediano e ruptura epistemolo´gica
Retomemos novamente as afirmac¸o˜es: (p. 25)
“Comecemos com o caso mais simples, que e´ tambe´m o mais intri-
gante. Trata-se da expressa˜o decimal, ou seja, do nu´mero real
α = 0, 999 . . . =
9
10
+
9
100
+
9
1000
+ · · ·
Afirmamos que α = 1.” Ademais, de um outro autor:
“[· · · ] voceˆ deve ter concluido que 0, 999 . . . = 1. Esse sinal de igual e´
igual mesmo! Na˜o se trata de aproximac¸a˜o: 0, 999 . . . e 1 sa˜o duas formas
diferentes de representar o mesmo nu´mero”.
Nosso objetivo nesta sec¸a˜o sera´ visualizarmos geometricamente as im-
plicac¸o˜es por por tra´s destas afirmac¸o˜es.
Consideremos a sequeˆncia (αn) dada por αn = 1− 110n , veja:
α1 = 0, 9; α2 = 0, 99; α3 = 0, 999 ; . . . ; αn = 0, 999 . . . 9
Aqui temos a velha questa˜o da passagem do infinito potencial ao infinito
atual, veja: (n → ∞ significa n arbitrariamente grande)
αn = 0, 999 . . . 9→
− Infinito potencial
(n→∞)
α
∞
= 0, 999 . . . − Infinito atual
(n = ∞)
Lembramos Richard Courant (p. 28): a igualdade α
∞
= 0, 999 . . . com
seu s´ımbolo incompleto “. . . ” e´ meramente uma estenografia matema´tica.
Adendo: Insisto: algum matema´tico conseguiria me provar que as repre-
sentac¸o˜es decimais infinitas, tais como 0, 999 . . . ou
√
2 = 1, 41421356237 . . .,
sa˜o nu´meros reais?
Sugesta˜o: Pra comec¸ar defina multiplicac¸a˜o de decimais infinitas em se-
guida prove que
1, 41421356237 . . . × 1, 41421356237 . . . = 2
Posso ser um pouco mais enfa´tico (acachapante): representac¸o˜es decimais
infinitas na˜o sa˜o nu´meros reais e de nenhuma outra espe´cie. Com efeito,
como vai-se considerar nu´meros s´ımbolos que sequer podem ser multiplica-
dos? Ademais, veja cr´ıtica de Dedekind pa´gina 54.
29
Vamos plotar no intervalo [ 0, 1 ] alguns termos da sequeˆncia (αn)
αn = 1−
1
10n
∴ α1 = 0, 9; α2 = 0, 99; α3 = 0, 999 ; . . .
0 1
s
α1
s
α2
s
→
y
p1
2
− Salto arquimediano e ruptura epistemolo´gica
Do ponto de vista intuitivo o limite
lim
n→∞
αn = 1 ⇒ α∞ = 0, 999 . . . = 1
reflete a ideia de que a sequeˆncia (αn), pensada como uma colec¸a˜o discreta
de pontos pode “pular” para 1 no infinito. Substituindo n =∞ em
αn = 1−
1
10n
⇒ α
∞
= 1− 1
10∞
⇒ 1
10∞
= 0
Ou seja, realizamos algumas operac¸o˜es espu´rias∗ (proibidas) com o objetivo
de mostrar a ilegitimidade de se considerar 0, 999 . . . = 1 (mesmo!).
Nota: O sentido de 10∞ e´ o mesmo que comparece na se´rie:
∞∑
n=1
an
10n
=
a1
101
+
a2
102
+
a3
103
+ · · ·+ a∞
10∞
Ver p. 17, ver Rene´ Gue´non 26, ver Courant p. 28, ver Gauss p. 31.
Salto arquimediano se refere a` passagem
do infinito potencial ao infinito atual, quando
enta˜o ocorre uma “ruptura espistemolo´gica” −
em nosso contexto significa algo que a rigor e´
falso; de outro modo, se aplicarmos um “zoom
lo´gico” encontraremos fissuras.
αn = 0, 999 . . . 9→
− Infinito potencial
(n→∞)
α
∞
= 0, 999 . . . = 1− 1
10∞
− Infinito atual
(n = ∞)
∗Pra comec¸ar n = ∞ na˜o e´ um nu´mero natural. Na˜o pode ser substitu´ıdo em α
n
.
Lembramos Courant: n tende para o infinito (de forma alguma e´ infinito), p. 28.
30
7.1 Mais um exemplo de ruptura epistemolo´gica
A propo´sito, atrave´s da conhecida identidade
1
12
+
1
22
+
1
32
+
1
42
+
1
52
+
1
62
+ · · · = pi
2
6
(4)
podemos exibir mais um exemplo de salto arquimediano e consequente ruptura
epistemolo´gica. Com efeito, uma leitura apressada desta identidade afirma
que a soma de infinitos racionais produz um irracional. Seja
sn =
1
12
+
1
22
+
1
32
+ · · ·+ 1
n2
Temos
s1 =
1
12
s2 =
1
12
+ 1
22
s3 =
1
12 +
1
22 +
1
32
· · · · · · · · · · · · · · · · · ·
Como um exemplo de ruptura epistemolo´gica afirmamos: o “u´ltimo ra-
cional desta sequeˆncia e´ um nu´mero irracional”, isto e´:
s
∞
=
∞∑
n=1
1
n2
=
1
12
+
1
22
+
1
32
+
1
42
+
1
52
+ · · · + 1∞2 =
pi2
6
Esta´ certo isto?. Na˜o foi sem raza˜o que o matema´tico Gauss afirmou∗
“Eu contesto o uso de um objeto infinito como um todo com-
pleto; em matema´tica, essa operac¸a˜o e´ proibida; o infinito e´ so´ um
modo de dizer”.
O que concorda com Richard Courant: (para´frase)
“Assim, a igualdade (4) com seu s´ımbolo incompleto “+ . . .” e´ mera-
mente uma estenografia matema´tica . . . ”
Escrevemos: “Operac¸o˜es no dom´ınio finito, quando estendidas ‘ate´ o infi-
nito’ se esboroam.”, entram em colapso; isto equivale a` ruptura epistemolo´gica
de Bachelard. Na identidade (4) e´ como se consegu´ıssemos atingir o transcen-
dente por ‘passos racionais’, simplesmente ilo´gico. Infelizmente a perspicaz
e acachapante observac¸a˜o de Rene´ Guenon (p. 26) ainda continua verdadeira
em nossos dias . . . E´ precisamente isto que ocorre quando consideramos de-
cimais infinitas (p. ex., 0, 999 . . . ou 0, 4999 . . . ou
√
2 = 1, 41421356237 . . .)
como nu´meros reais e tentamos operar com elas . . . E´ proibido!
∗Scientific American, Edic¸a˜o Especial, No 15. As diferentes faces do infinito, 2006.
31
8 Os matema´ticos na˜o sabem o que e´ um nu´mero
Vimos anteriormente que os matema´ticos levaram mais de 1600 anos
para compreenderem os nu´meros negativos, para compreenderem os nu´meros
complexos precisaram de bem menos tempo, “apenas” cerca de treˆs ou
quatro se´culos.
Novamente Euler
Ja´ chamamos a atenc¸a˜o para o fato de que uma coisa e´ processar
s´ımbolos, outra bem distinta e´ processar significado. Na citac¸a˜o a seguir
temos mais uma comprovac¸a˜o da veracidade deste fato∗
A ambivaleˆncia dos matema´ticos do Se´culo XVIII em relac¸a˜o aos
nu´meros complexos pode mais uma vez ser evidenciada em Euler. Apesar
de seus trabalhos em que ensinava a operar com eles, afirma
“Como todos os nu´meros conceb´ıveis sa˜o maiores ou menores do que
zero ou iguais a zero, fica enta˜o claro que as ra´ızes quadradas de nu´meros
negativos na˜o podem ser inclu´ıdas entre os nu´meros poss´ıveis [nu´meros
reais]. E esta circunstaˆncia nos conduz ao conceito de tais nu´meros,
os quais, por sua pro´pria natureza, sa˜o imposs´ıveis, e que sa˜o geral-
mente chamados de nu´meros imagina´rios, pois existem somente na ima-
ginac¸a˜o.”
Observe que, na mente de Euler, “todos os nu´meros conceb´ıveis sa˜o
maiores ou menores do que zero ou iguais a zero”; o que prova que Euler
e, por extensa˜o os demais matema´ticos, na˜o havia ainda atinado com uma
compreensa˜o necessa´ria (satisfato´ria) do conceito de nu´mero. O que e´ con-
firmado pela citac¸a˜o a seguir
Na˜o constituira´ enta˜o uma vergonha para a
Cieˆncia estar ta˜o pouco elucidada acerca do seu ob-
jeto mais pro´ximo, o qual deveria, aparentemente, ser
ta˜o simples? Menos prova´vel ainda e´ que se seja capaz
de dizer o que o nu´mero e´. Se um conceito que esta´ na
base de uma grande cieˆncia oferece dificuldades, inves-
tiga´-lo com mais precisa˜o com vista a ultrapassar essas
dificuldades e´ bem uma tarefa inescapa´vel.
(Frege/Os Fundamentos da Aritme´tica)
Friedrich Ludwig Gottlob Frege (1848-1925) foi um matema´tico, lo´gico
e filo´sofo alema˜o. Trabalhando na fronteira entre a filosofia e a matema´tica,
Frege foi um dos principais criadores da lo´gica matema´ticamoderna.
∗Fonte: Carmo, Manfredo Perdiga˜o do, et alii, Trigonometria/Nu´meros complexos. Rio
de Janeiro − IMPA/VITAE, 1992.
32
Mas Frege faleceu em 1925, e hoje, os matema´ticos sabem o que e´ um
nu´mero?
No artigo O que e´ um nu´mero? do Professor Adonai Sant’Anna (UFPR)
ele escreve:
“Na˜o existe, em matema´tica, uma definic¸a˜o universalmente aceita para
esclarecer o que e´, afinal, um nu´mero.”
Isto implica dizer que os matema´ticos ainda hoje na˜o sabem o que e´
nu´mero. Em particular o professor Elon na˜o sabe o que e´ um nu´mero.
A propo´sito, os bio´logos tambe´m na˜o sabem o que e´ vida − se e´ que
isto serve de algum consolo.
8.1 Com vista a ultrapassar essas dificuldades . . .
Pouco a pouco, procuro liberar suavemente o
esp´ırito dos alunos de seu apego a imagens privi-
legiadas. Eu os encaminho para as vias da abs-
trac¸a˜o, esforc¸ando-me para despertar o gosto pela
abstrac¸a˜o.
(Gaston Bachelard/A formac¸a˜o do esp´ırito cient´ıfico)
Com vista a ultrapassar essas dificuldades a respeito do que seja um
nu´mero vamos contribuir com algumas informac¸o˜es.
Primeiro, um nu´mero na˜o e´ um objeto que se encontre na natureza −
como grandes matema´ticos pensaram por se´culos∗ −, e tambe´m na˜o e´ ape-
nas um s´ımbolo (“imagens privilegiadas”), tais como N = { 0, 1, 2, 3, . . . }.
A inerente tendeˆncia humana a apegar-se ao “concreto”, conforme
exemplificado pelos nu´meros naturais, foi responsa´vel por esta lentida˜o em
dar um passo inevita´vel. Somente na esfera do abstrato um sistema satis-
fato´rio de aritme´tica pode ser criado. (Richard Courant)
“concreto”, por exemplo, veja Laplace, p. 7.
Observe que o que caracte-
riza (define) o jogo de xadrez na˜o
sa˜o as pec¸as propriamente, mas
sim as regras − o “software”, con-
junto de instruc¸o˜es.
∗Como, por exemplo, Laplace, ver p. 7.
33
Suponhamos que desejamos jogar xadrez mas na˜o dispomos das pec¸as,
apenas do tabuleiro. Na˜o ha´ o menor problema podemos substituir as pec¸as
por cereais.
feija˜o → Rei
arroz → peo˜es
milho → torres
...
...
...
Por exemplo, um caroc¸o de feija˜o fara´ o papel de rei, os peo˜es sera˜o substi-
tuidos por gra˜os de arroz, as torres por caroc¸os de milho, etc.
Observe que e´ a estrutura (jogo, regras) que confere a identidade de um
elemento: um mero caroc¸o de feija˜o de repente veˆ-se promovido a “rei” ao
participar da estrutura xadrez.
≡ (equivalentes)
...
...
≡
Adendo: Estive refletindo melhor . . . afirmo − ate´ prova em contra´rio −
que apenas a afirmac¸a˜o do Prof. Djairo (p. 17), qual seja: “De modo mais
rigoroso, podemos proceder assim. Uma decimal e´ uma func¸a˜o [sequeˆncia]
f : N→ { 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }”
e´ suficiente para refutar os “dois erros graves”. Enfatizamos: qualquer
definic¸a˜o de representac¸a˜o decimal que comporte o mito das ambigbuidades
esta´ errada, por ser inconsistente com essa definic¸a˜o do Prof. Djairo.
34
Retomando, de modo ana´logo acontece com o “jogo” nu´meros; por exem-
plo, podemos “jogar o jogo dos naturais N” com estes s´ımbolos
N = { 0, 1, 2, 3, 4, . . . }
ou ate´ com os ideogramas chineses
{
{
N=
...
{
0
...
{
1
...
{
2
...
{
3
...
{
4
, , , , , . . .
o que chamamos de nu´meros naturais vermelhos.
A questa˜o e´: por que os ideogramas chineses sa˜o nu´meros naturais? A
resposta e´: na˜o eram, entretanto, em 2015 publicamos um livro ([4]) no qual
tornamos estes s´ımbolos nu´meros naturais, agora sa˜o. Os nu´meros naturais
sa˜o caracterizados (definidos) pelo seguinte conjunto de regras:
A1 ) (a+ b) + c = a+ (b+ c)
A2 ) ∃ 0 ∈ N : a+ 0 = 0 + a = a
A3 ) a+ b = b+ a
M1 ) (a · b) · c = a · (b · c)
M2 ) ∃ 1 ∈ N : a · 1 = 1 · a = a
M3 ) a · b = b · a
D) a · (b+ c) = a · b+ a · c
• Ordenado
PBO) : Princ´ıpio da Boa Ordem.
(Manual Ba´sico)
N
Pois bem, para transformar os ideogramas chineses
{
{
N=
...
{
0
...
{
1
...
{
2
...
{
3
...
{
4
, , , , , . . .
em nu´meros naturais tivemos que definir, entre estes s´ımbolos, duas operac¸o˜es
− uma chamada de adic¸a˜o e outra de multiplicac¸a˜o − e provar todas as re-
gras que definem os naturais, constantes no quadro amarelo acima.
35
A propo´sito, atrave´s da seguinte identificac¸a˜o
1 yang
0 yin 0
1
os ideogramas chineses transformam-se em sequeˆncias bina´rias, assim:
0 0 0 0 0 0 0 0 . . . = 0
10 0 0 0 0 0 0 . . . = 1
01 0 0 0 0 0 0 . . . = 2
11 0 0 0 0 0 0 . . . = 3
00 1 0 0 0 0 0 . . . = 4
10 1 0 0 0 0 0 . . . = 5
· · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·
{
{
N=
...
{
0
...
{
1
...
{
2
...
{
3
...
{
4
, , , , , . . .
O que chamamos de nu´meros naturais azuis
N = { 0, 1, 2, 3, 4, . . . }
Portanto, sequeˆncias bina´rias agora sa˜o nu´meros naturais. Ao leitor
interessado na construc¸a˜o dos “nu´meros coloridos” consulte a refereˆncia [4].
Enfatizamos: Antes as sequeˆncias bina´rias eram consideradas apenas
representac¸o˜es dos nu´meros naturais em base 2 (p. 22); agora cons-
truimos sobre o conjunto das sequeˆncias bina´rias a estrutura de nu´meros
naturais (quadro amarelo, p. 35); portanto, sequeˆncias bina´rias tornaram-se
nu´meros naturais. Algo ana´logo deve acontecer com as expresso˜es decimais
para que elas se tornem nu´meros reais.
De passagem, observamos que com o modelo dos naturais azuis podemos
realizar operac¸o˜es que na˜o sa˜o poss´ıveis de se definir com os “velhos natu-
rais”. Por exemplo, dadas duas sequeˆncias bina´rias a operac¸a˜o de multi-
plexac¸a˜o consiste em entrelac¸ar seus bits, assim:
x1 x2 x3 x4 x5 x6 x7 x8 . . .
y1 y2 y3 y4 y5 y6 y7 y8 . . .
x1 y1 x2 y2 x3 y3 x4 y4 . . .
Nota: Uma sugesta˜o e´ utilizar a multiplexac¸a˜o em criptografia de dados.
Podemos multiplexar um nu´mero arbitra´rio de sequeˆncias.
36
9 Um desafio aos matema´ticos
Uma questa˜o que surge de imediato e´: se uma sequeˆncia bina´ria pode
ser um nu´mero natural por que uma sequeˆncia decimal na˜o poderia ser um
nu´mero real?
Veja so´: o que caracteriza (define) os nu´meros reais e´ o quadro a seguir
A1 ) (a+ b) + c = a+ (b+ c)
A2 ) ∃ 0 ∈ R : a+ 0 = 0 + a = a
A3 ) a+ b = b+ a
A4 ) ∀ a ∈ R, ∃ − a ∈ R : a+ (−a) = 0
M1 ) (a · b) · c = a · (b · c)
M2 ) ∃ 1 ∈ R : a · 1 = 1 · a = a
M3 ) a · b = b · a
M4 ) ∀ a ∈ R∗, ∃ a−1 ∈ R : a · a−1 = 1
D) a · (b+ c) = a · b+ a · c
• Ordenado
• Completo
R
Qualquer objeto (s´ımbolo) que possa ser manipulado segundo as regras
desta estrutura, sera´ um nu´mero real!
Em analogia com o xadrez dizemos que este e´ o “Manual Ba´sico” dos
nu´meros reais. Pois bem, para que os s´ımbolos do professor Elon
α = a0 , a1 a2 . . . an . . .
se tornem nu´meros reais, ele deve definir entre os mesmos duas operac¸o˜es −
uma chamada de adic¸a˜o e a outra de multiplicac¸a˜o − e provar que valem as
propriedades do quadro acima. Ou ainda, implementar o quadro acima.
≡ • Afirmar que 0, 999 . . . = 1 (como nu´meros)e´ o mesmo que afirmar que um caroc¸o de feija˜o
e´ um rei. Perguntamos, isso e´ verdade?
0, 999 . . . 1
37
9.1 Construc¸o˜es dos nu´meros reais
“Euler concebe o nu´mero negativo como sendo uma letra precedida com o
sinal − (menos)” .
“Ora, isso na˜o faz sentido . . .Na˜o se estabelece um conceito a partir de uma
notac¸a˜o”.
(
Prof. Adonai Sant’Anna (UFPR)
)
Na˜o e´ suficiente defininir o que seja
uma sereia. Para que uma definic¸a˜o seja de
alguma utilidade em matema´tica e´ necessa´rio
exibirmos pelo ao memos um exemplar da
coisa definida. Da´ı a necessidade da cons-
truc¸a˜o dos sistemas nume´ricos, em particular
dos nu´meros reais. (ver Brouwer, p. 42)
Assumindo a existeˆncia dos nu´meros racionais (Q) existem duas cons-
truc¸o˜es cla´ssicas dos nu´meros reais, a dos Cortes de Dedekind e a das Classesde Equivaleˆncias de Sequeˆncias de Cauchy, por Georg Cantor; os objetos
(s´ımbolos, nu´meros reais) em cada uma dessas construc¸o˜es sa˜o distintos.
Na construc¸a˜o de Dedekindo os nu´meros reais sa˜o certos subconjuntos de
nu´meros racionais, chamados cortes.
A t´ıtulo de curiosidade enfatizamos o fato de que
√
2 e´ apenas uma
notac¸a˜o para o nu´mero real x que tem a propriedade de que x2 = 2. En-
tretanto, a bem da verdade, o s´ımbolo da “verdadeira” raiz quadrada de 2
difere do s´ımbolo
√
2, tanto quanto um caroc¸o de feija˜o difere de um rei.
≡ (equivalentes no xadrez)
Por exemplo, na construc¸a˜o do modelo dos reais pelo me´todo de Dede-
kind (cortes de Dedekind), observe a “cara” da raiz quadrada de 2.
√
2 =
{
x ∈ Q : x < 0 ou x2 < 2}
Geometricamente temos
p0 p1
− 1
2
1
2
− 5
2
p2 p3 p4 . . . Qp−1p−2p−3p−4. . .
p0 p1
− 1
2
1
2
− 5
2 ← √2p−1p−2p−3p−4. . .
38
Por exemplo, apenas por curiosidade, o triaˆngulo retaˆngulo com catetos
unita´rios
− Pita´goras na˜o sabia quanto media
a diagonal de um quadrado unita´rio.
d =?
1
1
Os dia´logos de Plata˜o mostram que (...) a comunidade ma-
tema´tica grega fora assombrada por uma descoberta que praticamente
demolia a base da fe´ pitago´rica nos inteiros. Tratava-se da descoberta
que na pro´pria geometria os inteiros e suas razo˜es eram insuficientes
para descrever mesmo simples propriedades ba´sicas.
(BOYER)
na construc¸a˜o de Dedekind fica assim:
{ x ∈
Q
: x
<
0
ou
x
2 <
2
}
{x ∈ Q : x < 1 }
{
x∈
Q
:
x
<
1}
− Dedekind mediu a diagonal
de um quadrado unita´rio.
Nota 1: Dedekind atrave´s de sua construc¸a˜o dos cortes conseguiu provar
todas as propriedades dos reais, isto e´, implementou o quadro amarelo da
pa´gina 37. O mesmo acontecendo com a construc¸a˜o de Georg Cantor. O
que estamos insinuando e´: para que os s´ımbolos (expresso˜es decimais) do
Prof. Elon sejam considerados nu´meros reais ele deve fazer o mesmo.
Em resumo: construir sobre D uma estrutura de Corpo, ordenado, completo.
Nota 2: Mais precisamente deve-se tomar D como definido por Aragona na
pa´gina 21.
39
Pois bem, afirmamos que enquanto o “triaˆngulo de Dedekind” e´ va´lido
matematicamente falando, por outro lado, o “triaˆngulo de Elon”
− O triaˆngulo do Prof. Elon na˜o tem
validade matema´tica, e´ espu´rio.
1,
41
42
13
56
23
7 .
. .
1
1
na˜o tem validade matema´tica, uma vez que a representac¸a˜o decimal da raiz
quadrada de dois na˜o e´ um nu´mero real.
√
2 = 1, 41421356237 . . ..
Por exemplo, Dedekind consegue demonstrar que o seu triaˆngulo sa-
tisfaz ao teorema de Pita´goras, o Prof. Elon conseguiria o mesmo? − sem
praticar o “salto arquimediano”, ruptura epistemolo´gica. (p. 30)
Nota: Estamos apenas tomando o Prof. Elon como um representante da
classe de equivaleˆncia formada pelos matema´ticos que defendem que as re-
presentac¸o˜es decimais sa˜o nu´meros reais − ou seja, quase todos os ma-
tema´ticos.
Resumindo, o Desafio que deixamos a todos os matema´ticos da classe
de equivaleˆncia a que pertence o Prof. Elon e´: Construir os nu´meros reais
a partir de sequeˆncias do conjunto das representac¸o˜es decimais D. Mais
precisamente, definir sobre D duas operac¸o˜es − adic¸a˜o e multiplicac¸a˜o − e
implementar o quadro amarelo que consta na pa´gina 37.
Lembramos que na pa´gina 24 observamos que a representac¸a˜o de um
nu´mero inteiro na˜o e´ um nu´mero inteiro. Por que a representac¸a˜o de um
nu´mero real deveria ser um nu´mero real? − a menos que se prove, claro.
Nota 1: Procuramos na internet a construc¸a˜o dos reais via representac¸o˜es
decimais, na˜o encontramos − apenas promessas. Caso algum leitor conhec¸a
essa construc¸a˜o me envie por favor, se isto acontecer metade deste artigo
tera´ que ir para a lixeira. Enquanto isto na˜o acontecer meus argumentos
estara˜o de pe´. Em resumo: representac¸o˜es decimais na˜o sa˜o nu´meros reais.
Nota 2: No livro do Aragona lemos: (p. 83/Grifo nosso)
“Neste para´grafo vamos introduzir os nu´meros decimais que va˜o se cons-
tituir na melhor aproximac¸a˜o, para fins pra´ticos, dos nu´meros reais.”
Achamos a denominac¸a˜o “nu´meros decimais” apropriada, pois nos per-
mite diferencia´-los de “nu´meros reais”. Ver Desafio.
40
9.2 Mais um exemplo de ruptura epistemolo´gica
A propo´sito, em igualdades tais como
√
2 = 1, 41421356237 . . . (5)
temos exemplos de saltos arquimedianos e rupturas epistemolo´gicas. Por opor-
tuno em um outro trabalho do Prof. Jose´ Carlos Cifuentes lemos∗
Ainda, no caso das sequeˆncias, a aceitac¸a˜o da “existeˆncia” de uma
sequeˆncia infinita como coisa terminada, e´ tambe´m resultado de um re-
curso de simplicidade como o e´ a aceitac¸a˜o do infinito em ato. O esta-
tuto ontolo´gico dos nu´meros irracionais baseia-se nisso, por exemplo, o
nu´mero irracional
√
2 so´ existe na medida em que sua expressa˜o decimal
for admitida completa e terminada na sua infinitude. (p. 13)
Vale a pena lembrar Gauss novamente:
“Eu contesto o uso de um objeto infinito como um todo com-
pleto; em matema´tica, essa operac¸a˜o e´ proibida; o infinito e´ so´ um
modo de dizer”. O que concorda com Richard Courant:
“Assim, a igualdade (5) com seu s´ımbolo incompleto “. . .” e´ meramente
uma estenografia matema´tica . . . ”
√
2 =
( 2 · 2
1 · 3
)( 6 · 6
5 · 7
)( 10 · 10
9 · 11
)
· · ·
− No triaˆngulo do Prof. Elon na˜o se
demonstra o teorema de Pita´goras.
1,
41
42
13
56
23
7 .
. .
1
1
∗O MITO DA ANA´LISE REAL: CONTRIBUIC¸O˜ES PARA A FORMAC¸A˜O CON-
CEITUAL DO PROFESSOR DE MATEMA´TICA SOBRE OS NU´MEROS REAIS E A
ANA´LISE MATEMA´TICA
41
Para finalizar, uma observac¸a˜o: na˜o obstante as pec¸as do xadrez serem
arbitra´rias
...
...
≡
na˜o dizemos que existem diversos jogos de xadrez, na˜o, existe apenas um;
de modo ana´logo na˜o dizemos que existem va´rios conjuntos de nu´meros
reais (ou naturais, etc.), na˜o, existe apenas um; embora as pec¸as possam
ser de diversos “formatos”. − Dizemos que todos os poss´ıveis modelos sa˜o
Isomorfos, pois todos implementam o “manual ba´sico”.
Consideramos a citac¸a˜o a seguir uma das mais relevantes em matema´tica
Brouwer∗ tem como norma que toda definic¸a˜o seja construtiva,
isto e´, indique a maneira de obter os objetos definidos.
[. . . ] Deste modo o intuicionismo afirma-se como uma forma de
construtivismo de objetos matema´ticos, onde a existeˆncia destes somente
e´ poss´ıvel se for indicado um racioc´ınio mental que efetivamente nos
permita aceder a eles. Portanto, o intuicionismo e´ tambe´m uma forma
de anti-realismo. (Publicac¸a˜o eletroˆnica)
Na˜o e´ suficiente defininir o que seja
uma sereia. Para que uma definic¸a˜o seja de
alguma utilidade em matema´tica e´ necessa´rio
exibirmos pelo ao memos um exemplar da
coisa definida. Da´ı a necessidade da cons-
truc¸a˜o dos sistemas nume´ricos, em particular
dos nu´meros reais.
“Na˜o e´ dif´ıcil “definir” uma estrutura alge´brica por um conjunto de
axiomas de tal forma que na˜o exista nenhum exemplo da tal estrutura.”
(Jorge Aragona/Nu´meros Reais/p. 127)
∗L.E.J. Brouwer (1881-1966), matema´tico holandeˆs, um dos expoentes da escola de
pensamento intuicionista − uma derivac¸a˜o dos construtivistas, que defendem que os obje-
tos matema´ticos devem ser constru´ıdos, e na˜o meramente assumidos como existentes. Em
contraposic¸a˜o aos realistas.
42
10 A me´trica quaˆntica
Esta secc¸a˜o e´ para aqueles que ja´ estudaram a teoria dos espac¸os me´tricos
na graduac¸a˜o de matema´tica. Para quem e´ autodidata e pretende conhecer
esta teoria recomendamos o livro [3], e´ neste livro que encontra-se desenvol-
vido mais detalhadamente o tema desta secc¸a˜o. Enta˜o, provaremos que
0, 999 . . . = 0
na˜o, na˜o trata-se de um erro de digitac¸a˜o, e´ isto mesmo leitor!.
Consideremoso intervalo unita´rio [ 0, 1 [ e a seguinte aplicac¸a˜o
k : [ 0, 1 [× [ 0, 1 [−→ R
definida por: k(x, y) = min
{|x− y|, 1− |x− y|}.
Podemos provar (exerc´ıcio) que k e´ uma me´trica (distaˆncia) em [ 0, 1 [ .
Como funciona a me´trica quaˆntica? Funciona de modo bem simples,
na˜o e´ necessa´rio nenhum manual de instruc¸a˜o, veja: dados dois pontos x e y,
ambos no intervalo [ 0, 1 [, entre chaves obteremos dois valores, escolhemos
o menor deles como sendo a distaˆncia entre os pontos x e y. Por exemplo
k(0; 0, 4) = min
{|0− 0, 4|, 1− |0− 0, 4|} = min{0, 4; 0, 6} = 0, 4
k(0; 0, 6) = min
{|0− 0, 6|, 1− |0− 0, 6|} = min{0, 6; 0, 4} = 0, 4
k(0; 0, 8) = min
{|0− 0, 8|, 1− |0− 0, 8|} = min{0, 8; 0, 2} = 0, 2
Observe a localizac¸a˜o geome´trica destes pontos:
q
0 12
1
t t t
0, 4 0, 6 0, 8տ
Origem
Por oportuno, observe que
k (0; 0, 4) = k (0; 0, 6) > k (0; 0, 8).
E´ isto mesmo que o leitor testemunha!: os dois primeiros pontos (0, 4 e 0, 6)
esta˜o a uma mesma distaˆncia da origem, e, como se na˜o bastasse, o terceiro
ponto (0, 8) esta´ mais pro´ximo da origem que os dois primeiros . . . pasme´m!
Quando o esp´ırito se apresenta a` cultura
cient´ıfica, nunca e´ jovem. Alia´s e´ bem velho, porque
tem a idade de seus preconceitos. Aceder a` cieˆncia e´
rejuvenescer espiritualmente, e´ aceitar uma brus-
ca mutac¸a˜o que contradiz o passado.
(Gaston Bachelard/grifo nosso)
43
Pois bem, consideremos a sequeˆncia (αn) dada por
αn = 1−
1
10n
Por exemplo:
α1 = 0, 9; α2 = 0, 99; α3 = 0, 999 ; . . . ; αn = 0, 999 . . . 9
Provaremos que
lim
n→∞
αn = 0 (6)
Com efeito, utilizando
k(x, y) = min
{|x− y|, 1− |x− y|}
temos
k(αn , 0) = min
{|αn − 0|, 1− |αn − 0|}
isto e´
k(αn , 0) = min
{
1− 1
10n
, 1−
(
1− 1
10n
)}
logo
k(αn , 0) =
1
10n
→ 0
Isto prova (6). Observe que
lim
n→∞
αn = 0 ⇒ α∞ = 0, 999 . . . = 0
Utilizando os mesmos argumentos que Richard Courant, p. 28.
No livro do Prof. Elon citado na pa´gina 25 ele prova que
lim
n→∞
αn = 1 ⇒ α∞ = 0, 999 . . . = 1
E conclui que o nu´mero real 0, 999 . . . e´ igual a 1. Apenas pergunto:
das considerac¸o˜es acima por que na˜o posso concluir que “o nu´mero real”
0, 999 . . . e´ igual a 0 ?. Lembramos o outro autor (Brolezzi):
“[· · · ] voceˆ deve ter concluido que 0, 999 . . . = 1. Esse sinal de igual e´
igual mesmo! Na˜o se trata de aproximac¸a˜o: 0, 999 . . . e 1 sa˜o duas formas
diferentes de representar o mesmo nu´mero”.
Se fosse assim eu poderia afirmar:
“[· · · ] voceˆ deve ter concluido que 0, 999 . . . = 0. Esse sinal de igual e´
igual mesmo! Na˜o se trata de aproximac¸a˜o: 0, 999 . . . e 0 sa˜o duas formas
diferentes de representar o mesmo nu´mero”.
E agora? como estes matema´ticos resolveriam esse impasse?
44
10.1 Descubra onde se encontra o erro
“Na˜o ha´ mais, para os teoremas, verdade separada e, por assim dizer,
atoˆmica: sua verdade e´ apenas sua integrac¸a˜o no sistema; e e´ por isso
que teoremas incompat´ıveis entre si podem ser igualmente verdadeiros,
contanto que os relacionemos com sistemas diferentes.”
(Curso Moderno de Filosofia/Por Denis Huisman e Andre´ Vergez)
Inicialmente observe que em nosso universo [ 0, 1 [ na˜o esta˜o definidas
operac¸o˜es aritme´ticas − adic¸a˜o e multiplicac¸a˜o −, raza˜o porque na˜o pode-
mos sair operando a esmo. Entretanto, observando que se
0 ≤ x < 1 e 0 ≤ y < 1 ⇒ 0 ≤ x · y < 1
significa que a operac¸a˜o de multiplicac¸a˜o (usual):
· : [ 0, 1 [× [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [
em nosso universo e´ uma operac¸a˜o perfeitamente l´ıcita.
Consideremos a seguinte sequeˆncia de somas parciais
0, 1; 0, 11; 0, 111; . . . , βn , . . .
a expressa˜o de βn e´ dada por
βn =
1
9
· (1− 1
10n
)
Esta sequeˆncia converge para 1/9, tanto na me´trica usual quanto na
me´trica quaˆntica. Sendo assim, temos:
0, 111 . . . =
1
10
+
1
100
+
1
10n
+ · · · = 1
9
. (7)
Consideremos a identidade demonstrada anteriormente
0, 999 . . . = 0
Multiplicando esta equac¸a˜o por 1/9, resulta
1
9
· 0, 999 . . . = 1
9
· 0 ⇒ 0, 111 . . . = 0
Comparando com (7) concluimos que 19 = 0, donde 1 = 0.
Onde encontra-se o erro? − e´ o t´ıtulo desta (sub)secc¸a˜o.
45
10.2 Algumas patologias quaˆnticas
Tudo isso, que a` primeira vista
parece excesso de irraza˜o, na ver-
dade e´ o efeito da finura e da
extensa˜o do esp´ırito humano e o
me´todo para encontrar verdades
ate´ enta˜o desconhecidas.
(Voltaire)
Com a me´trica quaˆntica obtive alguns resultados bizarros∗ e interessantes
(relevantes), creio que ine´ditos na literatura matema´tica, raza˜o porque decidi
incluir aqui um resumo, para os detalhes − e outras aplicac¸o˜es − veja nosso
livro citado na refereˆncia [3].
Os resultados a seguir valem no Universo (espac¸o me´trico)
(
[ 0, 1 [, k
)
.
Ao mesmo tempo que deixamos como exerc´ıcio, a quem interessar possa.
1 o ) Seja M = [ 0, 1 [, seja X = [ 12 , 1 [⊂M e seja p = 0 ∈M . Veja
M
0 1
s
0 1
2
1
X
A distaˆncia do ponto p = 0 ao subconjunto X e´ zero.
2 o ) Seja M = [ 0, 1 [, considere X = [ 0, 13 ] e Y = [
2
3 , 1 [ .
M
0 1
0 1
3
2
3
1X Y
A distaˆncia de X a Y e´ zero.
3 o ) Mostre que a aplicac¸a˜o k : [ 0, 1/2 [× [ 0, 1/2 [ −→ R, dada por
k(x, y) = min
{ |x− y|, 1/2− |x− y|}
e´ uma me´trica sobre [ 0, 1/2 [ . Ademais, prove que: 0,4999. . . =0.
∗
Patologia na matema´tica tem sentido diferente da medicina, significa um resultado
contraintuitivo, que, na˜o raro, agride o senso comum.
46
Um objeto em va´rios lugares ao mesmo tempo
4 o ) Necessitaremos de uma definic¸a˜o:
Diremos que um objeto p (um ponto) encontra-se em uma regia˜o R con-
tida em um universo∗, se e so´ se sua distaˆncia para essa regia˜o for nula.
Consideremos no quadrado da esquerda
[ 0, 1 [ 2
0 1
1
0 1
3
2
3
1
1
3
2
3
1
s
R1 R2
R3R4
a origem juntamente com as quatro regio˜es em destaque na figura da direita.
Afirmamos que a origem encontra-se em todas essas quatro regio˜es.
E mais: a distaˆncia da origem para essas regio˜es e´ nula em qualquer das
me´tricas produto.
5 o ) Existe uma Curva de Peano no quadrado acima, com propriedades to-
polo´gicas totalmente distintas da curva original de Peano − Por exemplo,
veja o ı´tem 7 o ) a seguir. Creio que com essa curva o pro´prio Peano jamais
sonhou.
6 o ) Considere a seguinte sequeˆncia de pontos do intervalo [ 0, 1 [ :
(xn) =
( n
n+ 1
)
=
( 1
2
,
2
3
,
3
4
, . . .
)
s r r r r r r r rrr
0
r
11
2
2
3
3
4
4
5
. . . →
Essa sequeˆncia converge para zero. Em s´ımbolos
lim
n→∞
( 1
1 + 1n
)
= 0
7 o )
0, 999 . . . =
9
10
+
9
102
+
9
103
+ · · · = 0
∗Para os nossos propo´sitos sera´ suficiente considerar como universo o hipercubo [ 0, 1 [n.
Ou seja o cubo unita´rio em qualquer dimensa˜o: Intervalo, quadrado, cubo, etc.
47
8 o ) As quatro sequeˆncias dadas a seguir
xn =
(
1
n+1
, 1− 1
n+1
)
→
zn =
(
1
n+1
, 1
n+1
)
→
← tn =
(
1− 1
n+1
, 1− 1
n+1
)
← yn =
(
1− 1
n+1
, 1
n+1
)
0 1
1
r
r
r
r
r
x2
x3
r
r
r
r
y2
y3
r
r
r
r
z2
z3
r
r
r
r
t2
t3
pertencem todas a`s diagonais do quadrado unita´rio [ 0, 1 [×[ 0, 1 [. O centro
do quadrado
(
1
2 ,
1
2
)
e´ o primeiro termo de todas elas.
Estas quatro sequeˆncias convergem para a origem.
9 o ) A func¸a˜o f : ([ 0, 1 ], µ) −→ ([ 0, 1 [, k) dada por
f(x) =


1
6 (1− 2x), se 0 ≤ x ≤ 12 ;
1
6 (7− 2x), se 12 < x ≤ 1.
cujo gra´fico esta´ plotado a seguir
x
f(x)
p p
p
p
p
p
p
p
0 1
2
1
1
6
3
6
5
6
1 ◦
e´ cont´ınua em todos os pontos do seu domı´nio.
Nota: µ e´ a me´trica usual,

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