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1 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Análise Teórica dos Direitos e Garantias Fundamentais Quanto à existência de direitos fundamentais ao longo da história: Desde os primórdios das civilizações, na antiguidade, há referências a existência a direitos fundamentais, como por exemplo, no Egito, na Mesopotâmia, no terceiro milênio a.C., o Código de Hamurabi de 1690 a.C., Buda em 500 a.C., falava na igualdade entre homens, a Lei das XII Tábuas no direito romano, o Cristianismo, ou seja, há uma longa história com referências a direitos fundamentais. Já depois do Cristianismo, encontramos grandes referências a direitos fundamentais na Idade Média, sendo a mais famosa dessas referências, a Magna Carta de 1915, da Inglaterra, e vários outros atos da própria Inglaterra, dos Estados Unidos, vão dando, então, essa evolução histórica dos direitos fundamentais. Aspectos mais importantes a serem frisados na evolução histórica: Embora sempre tenhamos falado em direitos fundamentais desde o início das civilizações, houve uma ampliação material dos direitos fundamentais, o que significa que o significado do que é fundamental incorpou. Na antiguidade falamos, certamente, em igualdade e tudo mais, hoje juntamente com igualdade, nós falamos em novos direitos, como por exemplo, o meio ambiente, então, houve uma ampliação material dos direitos fundamentais. Essa ampliação decorre de vários fatores: 1. Consciência da existência de direitos: acaba-se com a escravidão, por exemplo, pensa-se em uma visão ampliada da igualdade; 2. A evolução tecnológica: a partir de novos dados, de novos equipamentos, passa-se a conhecer a complexidade do mundo, do nosso universo cultural, e consequentemente passa-se a pensar em coisas que não eram pensadas antes, por exemplo, no meio ambiente. Houve também uma ampliação pessoal dos direitos. Durante parte da história da humanidade, as mulheres foram privadas de muitos direitos, no entanto, com a evolução dos tempos, as mulheres foram alcançando direitos, em muitas carreiras profissionais as mulheres têm um nível importante de competitividade com os homens. Também aqui a escravidão se manifesta como uma ampliação pessoal dos direitos fundamentais. Há outras razões, como a ampliação do direito de voto, enfim, houve uma ampliação da titularidade dos direitos. Em síntese, durante grande parte da história da humanidade, embora certos direitos tenham existido, houve uma ampliação da titularidade deles, de outro lado, esta mesma história mostra uma ampliação material dos direitos fundamentais. Alguns documentos mais recentes, importantes na evolução histórica dos direitos fundamentais: Magna Carta de 1215, da Inglaterra; Declaração da Virgínia de 1776 (no contexto da revolução americana); Declaração de Independência dos Estados Unidos de 1787; 2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO A Constituição Americana e suas emendas que trouxeram direitos fundamentais; Declaração de direitos da Revolução Francesa de 1789; Constituição Mexicana de 1917 (às vezes esquecida, porque a protagonista desse momento, no início do século XX é a Constituição Alemã de Weimar de 1919; Doutrina social da Igreja que começa no final do século XIX, com a encíclica Rerum Novarum de 1891; Declarações de Direitos da ONU (Declaração de 1948 e os Pactos de 1966, que renovam a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948); Mais recentemente: Tratados de Estocolmo de 1972; Eco 92 no Rio de Janeiro; Rio + 20, que vai procurar a marcha pela afirmação dos direitos fundamentais em matéria ambiental. Há uma sobrevalorização atual dos direitos fundamentais, há um estudo mais científico, entretanto, há muito de ocidentalização nessa sobrevalorização, ou seja, há uma internacionalização dos direitos fundamentais, mas há muita divisão ocidental nos direitos fundamentais. O modo de vida, os valores que vêm por trás dos direitos e garantias fundamentais positivados nos textos constitucionais, estão relacionados a um modo ocidental de vida, e há muitos países com suas culturas absolutamente enraizadas. Crítica: um dos grandes conflitos na atualidade, não é só o conflito econômico, mas essencialmente um conflito cultural, quando, então, algumas civilizações muito antigas se vêem acuadas, porque um grupo de países querem impor esse modo ocidental aos seus nacionais, como por exemplo, esse modo ocidentalizado, vem sendo imposto a países da África, do Oriente Médio, enfim, o que causa algum conflito justificável, porque ainda que isso possa ser legítimo, essa tentativa de colocar padrões mundiais comuns de comportamento, tem de ser feito com cuidado, porque é necessário o devido respeito aos modos originários de vida e de convivência, especialmente a estes enraizados à milênios. Essa internacionalização tem muito de positivo, mas ela tem também, alguns cuidados a serem adotados para evitar conflitos, que podem até ser inevitáveis, mas que pelo menos, sejam na medida do possível, controláveis. Conceito de Direitos Fundamentais: São direitos subjetivos, públicos ou privados, indispensáveis à realização da natureza humana e a vida em sociedade, e por isso são concedidos ou assegurados por ato próprio do interessado, por seu grupo familiar, pela sociedade, pelo estado nacional e subsidiariamente, pela ordem internacional. 1) Direitos Subjetivos: Significa que quando a pessoa é titular de um direito subjetivo, este direito pode ser oposto à terceiros. Um direito subjetivo é uma prerrogativa que tem o indivíduo de poder impor seu direito a terceiros, podendo inclusive, pedir a tutela estatal para proteção desse direito subjetivo. Quando falamos que determinada matéria é direito subjetivo, isso é muito importante, 3 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO por exemplo, a moradia é um direito fundamental? Até quando você consegue fazer valer a moradia? Consegue, pois quando se fala em moradia, não é necessariamente casa própria, é um abrigo, no mínimo, num albergue do poder público. O importante é, uma vez que se define que se trata de um direito subjetivo, deve-se usar esse conceito para tudo aquilo que se irá chamar de direito fundamental. Então, direito fundamental é um direito subjetivo? Sim, é um direito subjetivo. Mas é um direito subjetivo público ou um direito subjetivo privado? Na idade moderna, especialmente a partir do século XVIII e até a atualidade, ainda a muito de uma referência que os direitos fundamentais são direitos subjetivos públicos, porque eles aparecem especialmente, repita-se, a partir do século XVIII, como uma limitação dos direitos individuais, ou uma proteção dos direitos individuais contra os abusos do Estado. A grande preocupação na idade moderna, a partir do século XVIII, ao contemplar nos textos constitucionais direitos fundamentais, foi de proteger o indivíduo do estado leviatã, contra o estado que vai invadir a esfera de liberdade individual, propriedade, etc. Os direitos fundamentais aparecem tipicamente relacionados a uma proteção do indivíduo contra o Estado. Interessante é que essa preocupação até hoje ainda aparece, por exemplo, na discussão se o Mandado de Segurança pode ser impetrado pelo próprio poder público em face de outro ente estatal, porque historicamente o Mandado de Segurança era uma garantia do indivíduo contra o ato ilegal ou abusivo do Estado. Perceba que, o Mandado de Segurança é apenas um dos exemplos que marca essa ideia de que os direitos fundamentais eram proteção do indivíduocontra atos do Estado. Isso ainda ocorre? É claro que os direitos fundamentais são direitos subjetivos que se referem à relação entre o indivíduo e o Estado. A questão que se põe, no entanto, é que houve no mínimo uma ampliação de alcance, para não dizer que sempre existiu, também à aplicação dos direitos fundamentais as relações privadas, ou seja, os direitos fundamentais são direitos subjetivos públicos mas também são aplicáveis as relações privadas, então é um direito que não se refere apenas a relação indivíduo-Estado, ele se refere a relação indivíduo-indivíduo. O que tem isso de novidade? A novidade ocorre, por exemplo, num julgamento relativamente recente do STF, no qual foi considerada inválida a expulsão de um sócio de uma associação privada de músicos, e esse sócio foi expulso sem a ele ter sido dado o devido direito de defesa, que como todo mundo sabe, a ampla defesa e o contraditório são cláusulas relevantes do devido processo legal do artigo 5º, inciso LV, da Constituição.1 Então, notamos que nesta situação, os direitos fundamentais não são apenas aplicados as relações entre indivíduo-Estado, são também aplicados às relações privadas. Essa aplicação às relações privadas vem sendo chamada de horizontalização dos direitos fundamentais, quando o indivíduo e o Estado estão litigando, é colocada uma noção de verticalidade, o Estado em cima e o indivíduo, portanto, subordinado a ele, uma relação de inferioridade, daí a ideia vertical. De outro lado, quando estamos falando de indivíduo e indivíduo, há uma relação horizontal, daí a relação 1Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; 4 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO entre indivíduo e indivíduo, na perspectiva dos direitos fundamentais vem sendo chamada de horizontalização dos direitos fundamentais. Hoje os direitos fundamentais, categoricamente são aplicáveis as relações privadas. Isso não tem nada de complicado, o problema é a extensão disto, por exemplo, se eu vou demitir um funcionário, eu posso ocultar a causa pela qual faço a demissão? Claro, é a demissão sem justa causa, eu apenas notifico que estou demitindo, pago os direitos trabalhistas e tudo bem. Mas já há uma discussão relevante a esse respeito, considerada a importância do trabalho para a dignidade humana, princípio que consta do art.1º, IV da Constituição2, mais do que o sustento, o trabalho torna a pessoa completa, dignificada por ser parte produtiva de um meio, poder sustentar os filhos e ver neles mais que o reconhecimento pela comida que está levando para casa, mas aquela sensação de que o pai é uma pessoa útil. Enfim, por tudo isso o trabalho é muito importante, e aí se demite uma pessoa sem dar a ela a razão da demissão? Isso pode inclusive estar ocultando uma discriminação qualquer, discriminação por cor, por opção sexual, etc. Ainda, teríamos duas categorias de demissão, uma demissão que se paga mais direitos, uma demissão que se paga menos direitos, mas o importante é que nas duas demissões tem de dar o motivo, porque a pessoa que está sendo demitida tem o direito de saber e tem o direito de eventualmente se defender sobre uma causa de demissão, que supostamente não se quis revelar. Então, deve-se aplicar o devido processo legal às demissões de empregados? É muito complicada a horizontalização dos direitos fundamentais, é fácil falar que os direitos fundamentais se aplicam as relações privadas, a questão é a extensão disto, até que ponto eu vou ter essa horizontalização. Isso pode entrar também no tema do poder familiar, da relação entre pais e filhos. A questão é bem interessante porque envolve a colisão de diversos direitos, com o tempo, naturalmente, a jurisprudência e a própria doutrina irão amadurecer esse tema e as coisas poderão ficar melhores. De qualquer forma, o importante por hora é: os direitos fundamentais são direitos subjetivos, aplicáveis às relações entre o indivíduo-Estado, mas também aplicáveis nas relações entre indivíduo e outro indivíduo, portanto, nessa perspectiva de horizontalização ao qual fizemos referência. 2) Direitos indispensáveis a realização da natureza humana e a vida em sociedade: Imaginem uma grande área, que envolve muitos direitos que são conferidos pelos sistemas jurídicos a uma pessoa. Dentro dessa grande área, há alguns direitos que são considerados fundamentais. Então quando se fala em direitos fundamentais, nós já pensamos, primeiro numa restrição de alcance, e essa restrição é determinada pela importância dos direitos. O direito fundamental não é qualquer direito, é um direito FUNDAMENTAL, como o próprio nome sugere. Para começarmos a delimitar o que é fundamental, vamos dizer que ele é indispensável à vida em sociedade ou a realização da natureza humana. Há muitos direitos, alguns são fundamentais, os indispensáveis, mas mesmo dentro dos direitos fundamentais, há um núcleo ainda mais importante. Fazendo-se um estudo científico e analítico do conceito de direitos fundamentais, podemos até categorizar os direitos fundamentais a partir da importância deles, por exemplo, o ensino, seja ele de primeiro grau, de segundo grau, ou de terceiro grau, traduzindo o 2Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; 5 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO ensino fundamental, o ensino de 2º grau e a universidade, tudo isso é direito fundamental e não há dúvida. Agora se tivermos que pensar qual é o mais importante? Alguns dizem que é a universidade, porque faz faculdade e passa a ganhar mais. Não é. O mais importante é o ensino fundamental, porque uma pessoa que não domina a língua portuguesa, que não se expressa bem, ela se sente insegura, essa é a verdade. Em regra, uma pessoa que não se expressa bem, está sujeito a uma dominação pelo grupo que se expressa bem, pelo grupo que, enfim, tem mais desenvoltura. Percebe-se que dominar a língua portuguesa, falar bem, saber ler e escrever, não é só uma questão de funcionalidade da vida cotidiana, pegar um ônibus, fazer uma leitura de alguma coisa para poder assinar um contrato, não é só essa questão de funcionalidade, é uma questão de respeito próprio, uma questão de dignidade humana, isso é muito importante. E é exatamente por conta disto, que é possível categorizar dentro dos direitos fundamentais à educação, o acesso ao ensino fundamental é mais importante do que os outros, tanto é assim, por exemplo, que você pode exigir do poder público uma vaga numa escola de 1 grau. Numa cidade grande como no caso de São Paulo, por exemplo, há uma vaga em uma escola pública muito longe, 2 horas do local de moradia da criança, a mãe ou pai, pode judicializar a matéria e exigir que o poder público forneça uma vaga próxima a moradia e se não houver vaga no ensino público, o poder público deverá custear o ensino privado, viabilizando, portanto, o acesso ao ensino fundamental. A mesma coisa não acontece com o colegial (2º grau), com a faculdade, porque embora sejam importantes, dentrodos direitos fundamentais, há um núcleo ainda mais importante que recebe vários nomes, um deles é mínimo existencial, não é núcleo essencial, todo direito tem um núcleo essencial, o mínimo existencial é aquilo que dentro dos direitos fundamentais é considerado mais importante do que os outros. É o que acontece, por exemplo, com o ensino fundamental, com a saúde básica (nada estético, mas coisa relacionada com a dor e a vida) e, também a assistência social a população carente. São três temas relacionados a esse mínimo existencial: 1. ensino fundamental; 2. saúde básica; 3. assistência social a população carente. Temos aí a ideia mais reduzida dos direitos fundamentais. Mas ainda há um problema, porque definimos um grupo de direitos, os direitos fundamentais como uma restrição, e o mínimo existencial como algo que extraio dos próprios direitos fundamentais, com um grau ainda maior de importância. E os direitos fundamentais, o que são? Porque quando se fala que são indispensáveis, isso varia muito. Podemos perguntar para um jogador de futebol, destes que tem salário milionário, o que ele acha indispensável, e para ele indispensável é ter um carro importado, porque ganha tantos milhões por mês e tal. E pergunta-se para um pai ou mãe de família, que trabalha das oito às vinte horas todos os dias, o que é fundamental? Então o conceito de indispensável, é extremamente difícil de mensurar. Nós nos reconfortamos, vamos dizer assim, nós nos protegemos com a noção dada pela própria Constituição de 1988, no Título II, que traz ali uma vasta positivação de direitos fundamentais, mas quando temos de pensar em direitos fora desse título II, é o caso da discussão, se a imputabilidade penal apenas a partir dos 18 anos é uma garantia fundamental ou não, enfim, essa discussão exige que nós passemos para um conceito de indispensável, o que de fato, é indispensável. Registro que essa questão da imputabilidade a partir dos 18 anos é bastante polêmica, há posições para todos os gostos, inclusive a minha, de que não é um direito 6 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO indispensável, é uma opção política do constituinte, poderia ser 16, 14, ou poderia ser 2 anos de idade, ficaria aí dentro de uma margem discricionária do constituinte. De qualquer modo, esse conceito de indispensável, ele de certo modo torna vulnerável o conceito de direitos fundamentais. Somente um estudo de caso, realmente uma análise na situação concreta envolvendo o texto normativo, o contexto socioeconômico irá permitir uma afirmação segura do que é indispensável ao ser humano ou à vida em sociedade. Há alguns trabalhos interessantes, como do alemão chamado Robert Alexi, traduzido já para o português, tem uma obra importante sobre direitos fundamentais. O professor Alexi tenta dar pontos objetivos para que a partir daí seja possível uma espécie de delimitação conceitual dos direitos fundamental. De qualquer modo, o importante é você ter noção de que não é simples, e dentro dessa tarefa, eu sugiro como caminho de solução, pense sempre no que o próprio texto constitucional estabelece no Título II, dando uma definição jurídico-normativa para o que é fundamental, ou seja, está no Título II, é direito fundamental, então começa por aí a solução. Fora do Título II, você terá de trabalhar pensando em alguma coisa de fato essencial, que porventura dê certo para você encaixar o mínimo existencial. Varia no tempo e no espaço, o que é de fato indispensável ao ser humano ou a vida ao ser humano. Os direitos fundamentais não dizem apenas respeito ao indivíduo, não estamos falando só do direito à vida, diz respeito as relações interpessoais, das pessoas nas relações contratuais e assim por diante. Então a segurança jurídica é um direito fundamental necessário, portanto, a vida em sociedade, além da vida propriamente dita, da liberdade de pensamento, relações mais tidas com o ser humano em si. Seguindo nosso conceito, os direitos fundamentais podem ser: Concedidos ou Assegurados: Os verbos “conceder” e “assegurar” têm sentidos diferentes, porque de fato há direitos que já nascem com o ser humano. A vida, por exemplo, é chamada como um direito originário, porque já nasce com o ser humano. No entanto, há direitos que a pessoa tem de adquirir. Perceba aqui uma distinção entre direito originário, que nasce com o ser humano e o direito adquirido, um direito que surge a partir do implemento de certos requisitos que a legislação estabelece. Os dois podem ser importantes, podem ser fundamentais, os direitos originários normalmente são fundamentais, alguns direitos adquiridos são fundamentais, então veja, a seguridade social tem dentro dela a previdência que concede aposentadorias. A aposentadoria com certeza é um direito fundamental, o direito a se aposentar é um direito fundamental, há várias aposentadorias, há aposentadoria que abriga a velhice, portanto, a pessoa numa situação de vulnerabilidade, igualmente a aposentadoria por invalidez, então, se percebe nestas situações direito fundamentais, só que não são direitos que surgem com o ser humano, ele tem de adquirir esse direito, mediante contribuições, mediante tempo de trabalho, uma série de requisitos então, que a legislação estabelece. Dentro dessa noção de direito originário e direito adquirido, percebe-se que quando o direito é originário, cabe ao responsável apenas assegurar a existência desse direito, a vida no sentido biológico, você vai assegurar a manutenção da vida, entre outros aspectos alimentação, saúde, etc. Outros direitos, você tem obrigatoriamente de conceder. Esses direitos que se concede, eles são muitas vezes prestacionais, em prestações 7 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO pecuniárias, então, a Previdência, a aposentadoria por invalidez, o Estado concede mediante o pagamento de um montante mensal. Note que é distinta a postura dos responsáveis, uma hora, ele só assegura, querendo ou não, o sujeito exerce a liberdade de manifestação, por exemplo, noutra situação o responsável faz uma prestação, portanto, entrega uma quantia em dinheiro. Isso é interessante entender porque muitas vezes encontramos referências, especialmente quando falamos das classificações das denominadas gerações ou dimensões dos direitos fundamentais e, aí então, nós vemos lá, os direitos de primeira dimensão ou primeira geração, são caracterizados por prestações negativas, por um não fazer, esse um não fazer, define exatamente a ideia de um direito que deve ser apenas assegurado pelo responsável. De outro lado, quando nós estamos na segunda dimensão ou segunda geração dos direitos, nós encontramos, então, as expressões fazer, prestações positivas, significa então, nesse momento que o responsável no caso, o Estado, em matéria de Previdência, ele vai e faz um pagamento, uma prestação pecuniária mensal entregue, ou feita ao titular de um benefício previdenciário. Então, assegurado e concedido, têm conceitos diferentes. Na última parte do nosso conceito, aparece a responsabilidade pelos direitos fundamentais. Quem é o responsável pelos direitos fundamentais? Aqui se faz uma advertência que serve a todas as pessoas de bem. Quem é o primeiro e principal responsável pela realização dos direitos fundamentais? Nós mesmos. Ex: as gerações antigas até podem reclamar de terem sido enganadas pela indústria tabagista porque antigamente fumar era algo glamuroso, charmoso, etc. A Constituição de 1988 exige, portanto, a mais de 20 anos, que os maços de cigarro contenham advertências de que o tabaco, o cigarro faz mal a saúde, ou seja, até com fotos sobre os malefícios do tabagismo e o sujeito,ainda assim, vai e fuma, e depois quer processar a indústria de tabaco. Como? Exceto se a indústria ainda omitiu um mal maior, aí é até possível processar, porque se sabia que fazia, mas ainda é pior, aí é possível questionar, fora isso não, pois se sabia que fazia mal e mesmo assim usou. Neste sentido, o primeiro e o principal responsável pela realização dos direitos fundamentais é o próprio indivíduo. Não tem de ficar pedindo para o Estado uma coisa que cabe a você fazer. O lixo na rua é responsabilidade do Estado, a partir do momento que alguma “criatura” pouco civilizada atirou no chão o lixo. Agora começa por responsabilizar o cidadão. E perceba que a legislação, especialmente a privada, ela marcha neste sentido, porque antes de você reclamar eventualmente do Estado, do poder público, você reclama do próprio indivíduo, uma ação e a reação, uma ação e a consequência, ou na sua família. Aqui veja, primeiro responsável é o indivíduo, e o segundo, o seu núcleo mais próximo. Quem deve alimentar uma criança? Ora os pais. É a família, portanto, no seu núcleo mais próximo, o responsável pela educação do filho e tudo mais, é claro, que o Estado tem um papel também paralelo importante, mas é a família, tanto que o Estatuto da Criança e do Adolescente pune severamente, até com tipos penais, os pais que não tem os devidos cuidados com os filhos. Então o primeiro responsável pelos direitos fundamentais é próprio indivíduo e, logo vem a família, o seu núcleo mais próximo, conceito de família que pode ser dado num sentido mais restrito, num sentido um pouco mais amplo, avô, avó, mais é a família. E é claro, também o Estado. Mas e a sociedade, no conceito fala-se em sociedade. Há um princípio de convivência pouco trabalhado na doutrina brasileira, que é o princípio da solidariedade. A sociedade deve ser engajada, ela é nossa, quem é povo, quem são os atores do contexto social? Somos todos nós. 8 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO Evidente que há um ator principal, há os coadjuvantes, e há os figurantes, mas todos fazem parte do espetáculo, todos fazem parte da construção do processo social. A sociedade tem a sua parcela de responsabilidade, no entanto, a solidariedade no direito brasileiro, vem mais por estímulos, por exemplo, o art. 150, VI da Constituição3, prevê imunidades, dentre as imunidades, imunidades para instituição de educação e assistência social. Então se desonera a tributação de pessoas que colaboram com o poder público, por exemplo, fazendo assistência social, aí a solidariedade aparece numa perspectiva de estímulo. Há raros casos nos quais a solidariedade é cobrada, e quando ela é cobrada, em sentido estrito (ela é imposta), normalmente é via Estado, o Estado, por exemplo, cobra uma tributação para financiar a Seguridade Social, como a aposentadoria, por exemplo, o sujeito trabalha a vida inteira, ele paga o próprio benefício e paga também o benefício para aqueles que não conseguiram trabalhar. Daí se fala, mas é injusto, ele paga o dele e daquele que não consegue trabalhar, pois é paga, é que aquele que não consegue trabalhar, podia ser exatamente aquele que está pagando. Traduzindo, o sujeito começa a trabalhar e no primeiro dia ele se acidenta e fica inválido, alguém vai contribuir por ele; esse alguém que está contribuindo por ele podia ser a pessoa que no primeiro de trabalho se acidentou e outros iriam contribuir por ele. Então é um sistema de solidariedade, só que essa solidariedade normalmente passa pelo Estado. Repetindo: Quem é o responsável pelos direitos fundamentais? 1) O próprio indivíduo; 2) A família; 3) A sociedade. Mas aí há uma mistura entre sociedade e Estado Nacional, não há dúvida, o Estado Nacional é um dos principais responsáveis pela realização dos direitos fundamentais. Mas também há um último responsável, porque houve, especialmente a partir de meados do século XX, a conscientização de que os problemas de um país podem não se restringir apenas aquele país, eles podem se propagar pela ordem internacional e afetar todas as sociedades naquele determinado momento histórico. Exemplo prático que podemos dar é o seguinte: quando uma pessoa te rouba, você pede ajuda para o Estado, na polícia e etc., e consequentemente tem o abrigo na medida do possível. Agora, e quando é o Estado que viola os seus direitos, para quem você pede ajuda? Quando então, aquele que deveria proteger é aquele que lesa, você tem de buscar outras formas de defesa. E foi isso que o mundo compreendeu, a partir de meados do século XX, quando então, vivendo a experiência dramática da 2ª Guerra Mundial, foi visto que os nazistas, por exemplo, maltratavam os judeus, mas os judeus tinham nacionalidade, que eram exatamente nacionais da própria Alemanha, da própria Polônia anexada, e assim por diante. 3 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. 9 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO Resultado prático: Quando o poder público que deve proteger, o Estado Nacional que deve proteger os direitos fundamentais, é ele esse poder público o violador, surge a perspectiva de uma proteção no âmbito internacional. Importante destacar no conceito dado que essa proteção na ordem internacional é subsidiária, você não pode simplesmente ir direto pra ordem internacional e nem essa ordem internacional é um grau recursal das instâncias nacionais. Se você estiver discutindo uma questão do judiciário brasileiro de violação aos direitos fundamentais, você não vai levar para a ordem internacional, por exemplo, para a Corte de São José da Costa Rica, qualquer problema que você tiver aqui na ordem Nacional, ou seja, a decisão do judiciário brasileiro não terá um recurso para a Corte de São José da Costa Rica, porque a Corte de São José da Costa Rica não é instância recursal da justiça brasileira, ela é um sistema de proteção quando a justiça brasileira é que viola o seu direito, a sua garantia fundamental, quando ela nega a jurisdição, portanto não julga, e isso tem de ser alguma coisa gritante, não só a trágica morosidade do judiciário, mas quando a justiça então nega a jurisdição, ou quando dá uma decisão absolutamente contrária ao que está nos autos e, isso claro, relacionado a direitos e garantias fundamentais. Então a Ordem Internacional surge como um sistema de proteção, quando o Estado é o violador. E isso pode acontecer inclusive quando o Estado Nacional viola até direitos de pessoas localizadas em outros países, pessoas físicas, ou jurídicas localizadas em outros países, porque os direitos fundamentais são aplicáveis a pessoas físicas, jurídicas, universalidades e tudo mais. Um caso interessante aconteceu quando o Estado Brasileiro, o Governo Federal, concedeu incentivos fiscais à empresa Embraer (que produz aviões no Estado de São Paulo, em São José dos Campos), e essa concessão de isenção para produção de aviões interferiu no comércio internacional, e uma concorrente canadense chamada Bombardier reclamou num organismo de proteção da liberdade de comércio internacional, a OMC (Organização Mundial de Comércio), reclamou que oGoverno Brasileiro havia dado esse incentivo e o Governo Brasileiro foi obrigado por uma decisão da OMC a retirar esse incentivo fiscal para a Embraer. Perceba que o sistema de proteção a direitos fundamentais ele encontra, sim, hoje subsidiariamente, na Ordem Internacional um sistema de proteção: o nacional, cujo seu direito foi violado e eventualmente até o estrangeiro que tem de se socorrer das violações praticadas por um país. Então, os direitos fundamentais, nesse conceito que demos, têm de cara, todos estes aspectos: 1. direitos subjetivos aplicados as relações públicas ou relações privadas, 2. indispensável ao ser humano ou a vida em sociedade e 3. sendo concedidos ou assegurados pelo próprio indivíduo, pela sua família, pela sociedade, pelo Estado Nacional e subsidiariamente pela Ordem Internacional. Aula 2: Recapitulando: Conceito de Direitos Fundamentais: Direitos Fundamentais são direitos subjetivos aplicáveis às relações entre o Poder Público e o indivíduo, e entre os indivíduos, indispensáveis ao 10 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO ser humano ou a vida em sociedade, sendo concedidos ou assegurados por ato do próprio indivíduo, de sua família, da sociedade, do Estado Nacional e subsidiariamente pela Ordem Internacional. Agora, ainda relacionado ao conceito de direitos fundamentais, iremos trabalhar com algumas diferenciações ou sinônimos de direitos fundamentais e há várias nomenclaturas a esse respeito. Fala-se em direitos humanos, direitos da humanidade, direitos humanitários, liberdades públicas, direitos de personalidade, enfim, há um conjunto de expressões que ora são sinônimos, ora tem algumas particularidades. Existe distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais? Muita gente trata como sinônimo, há inclusive alguns livros cujos títulos são Direitos Humanos Fundamentais, há muito de igualdade, de sobreposição de ideias, quando se fala em direitos fundamentais e em direitos humanos. No entanto, há quem os diferenciem, há um autor conhecido nessa área, chamado Fábio Konder Comparato, que usa a expressão direitos humanos num sentido superior aos direitos fundamentais, para ele os direitos humanos transcendem a ordem normativa e são, portanto, superiores aos direitos fundamentais. Os direitos fundamentais seriam os direitos humanos positivados na ordem jurídica. Essa relação hierárquica, de transcendência dos direitos humanos, para o Fábio Comparato, confere inclusive, aos direitos humanos uma força superior ao próprio poder constituinte originário. Quando se estuda direito constitucional, especialmente o poder constituinte, encontramos no constituinte originário características como a inicialidade, eles são ilimitados quanto a matéria, incondicionados quanto a forma. Quando se fala que eles são ilimitados quanto a matéria, o Fábio Comparato diz não, os direitos humanos transcendem a ordem normativa, portanto, o constituinte originário é limitado, de modo que há sim entre os autores, uma distinção entre os direitos humanos e direitos fundamentais. É também possível dizer que a expressão direitos humanos é consagrada na ordem internacional, os documentos recentes que falam sobre direitos indispensáveis ao ser humano ou a vida em sociedade, (esses documentos internacionais normalmente se referem a direitos humanos, enquanto a expressão direitos fundamentais é aplicada a legislação interna). De outro lado é até possível diferenciar direitos humanos de direitos fundamentais dizendo que os direitos humanos são direitos relacionados à pessoa humana. O sujeito fala, mas haveria uma pessoa que não é humana? Sim, a pessoa jurídica é uma ficção, universalidades como associações sem personalidade jurídica e assim por diante. Tem-se, nestas situações, uma distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais, os direitos fundamentais abrigariam inequivocamente, também, as pessoas jurídicas, universalidades e assim por diante. Particularmente reconheço a existência da expressão direitos dos homens, é bastante antiga, mas, no entanto, hoje me parece até politicamente incorreta, uma vez que, evidente as mulheres, enfim, as pessoas com heterogeneidade na sexualidade, todas elas são titulares de direitos. A expressão “liberdades públicas” também aparece nesse contexto. Liberdades públicas representam direitos fundamentais, são diferentes, como é isso? 11 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO Alguns países utilizaram inicialmente a expressão “liberdades públicas” quando se referiam a direitos fundamentais, o que aconteceu, por exemplo, com a França, que trabalhou inicialmente com a expressão “liberdades públicas”, para se referir as liberdades do indivíduo em face do Estado, portanto, áreas nas quais o Estado não poderia invadir a liberdade do indivíduo. ***Atenção: liberdade pública pode levar a um equívoco. Liberdade pública não é liberdade que o poder público tem, mas a liberdade que o indivíduo tem, e não pode essa liberdade ser invadida pelo poder público. Essa é a ideia de liberdades públicas na sua origem, especialmente na França em 1789. Hoje ainda, um ou outro autor, se refere à expressão “liberdade pública” como sinônimo de direitos fundamentais, mas normalmente ela ficou restrita a esse histórico na França e, às vezes, até aparece a expressão liberdades públicas associada aos denominados direitos de 1ª Geração ou 1ª Dimensão, que é basicamente a liberdade de expressão, a liberdade de religião, e assim por diante, esses direitos que não dependem de uma contraprestação estatal, não dependem, portanto, de uma concessão de um ato positivo, de um prestação positiva feita pelo Estado. Então a expressão liberdades públicas está em desuso, e quando utilizada ela ou identifica esses direitos no processo histórico da revolução francesa, ou os direitos de primeira dimensão. Diferente é o conceito de direitos humanitários, que representam uma parte dos direitos fundamentais, então não são sinônimos, os direitos humanos são bem mais amplos do que os direitos humanitários. O que significam direitos humanitários? Estão relacionados a conflitos, como por exemplo, as guerras entre países, guerras civis, etc., há, portanto, cuidados que são obrigatórios com presos, refugiados, exilados, com tratamento de feridos dos conflitos. Os direitos humanitários estão associados a conflitos e também a tragédias, como por exemplo, uma grande seca, uma grande epidemia. Quando se fala em direitos humanitários, nós estamos associando a ideia, normalmente, a flagelados, a pessoas que foram presas num conflito, feridas, fugiram de conflitos, se exilaram e, assim por diante. É um conceito claro e inserido na ideia de direitos fundamentais, daí porque não são sinônimos, os direitos fundamentais abrangem os direitos humanitários, mas não são sinônimos. Também existe o conceito de direito da humanidade. Uma coisa são os direitos humanitários, outra coisa são os direitos da humanidade. Direitos da humanidade: Significa que existem alguns direitos que não próprios de um povo, não são de um país, mas são de toda a humanidade. De quem é a Amazônia? É claro que é território brasileiro, está dentro do nosso espaço de soberania. No entanto, a biodiversidade e a importância que a região amazônica, especialmente 12 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO a parte da floresta amazônica tem para o ecossistema, sistema de águas, além da própria floresta, essa importânciatranscende a ordem interna do país e alcança o status de direito da humanidade, embora, evidente esteja relacionada/afetada a políticas públicas, ao governo brasileiro. A mesma coisa se coloca até com acervos de museus, como por exemplo, o Código de Hamurabi, de quem é o Código de Hamurabi? É teoricamente do povo da Mesopotâmia, que hoje está no Iraque uma parte do espaço que era a antiga Mesopotâmia, outra está espalhada pelo mundo, está aqui no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. Então de quem é o Código de Hamurabi? Esses itens são do histórico da humanidade e, portanto, direitos da humanidade. Repito: direitos humanos, direitos humanitários, direitos da humanidade, liberdades públicas, direitos fundamentais, vão sendo ora considerados como sinônimos, ora como parte. O direito da humanidade não é exatamente um sinônimo de direito fundamental, quando muito, no caso da floresta amazônica, você vai afirmar que se trata claramente de uma parte dos direitos fundamentais, exatamente pela questão do equilíbrio ecológico, do meio ambiente como direito fundamental. Há outros conceitos que vem sendo utilizados: um deles é os direitos de personalidade (direito relacionado a nome, a vida privada, a intimidade, a imagem), no entanto, reconheço a existência de elementos que permitiriam ampliar esse conceito, especialmente os autores de direito privado, direito civil, darão uma visão um pouco mais elástica ao conceito de direito de personalidade. Importante destacar que esses conceitos são bastante úteis numa prova dissertativa, quando você pode e deve colocar a existência de várias posições (não fugir do tema, mas de forma discreta exibir conhecimento). Dentro ainda das questões conceituais há um elemento muito importante, que é interessante frisar a distinção entre direitos fundamentais e garantias fundamentais. Uma coisa são os direitos, outra coisa são as garantias. Qual é o primeiro elemento distintivo? O direito é a prerrogativa indispensável ao ser humano e a vida em sociedade. A garantia é um instrumento de proteção dos direitos. Portanto, o direito é o indispensável, a garantia é um mecanismo, um instrumento, uma forma, um meio de proteção dos direitos. Exemplos: 1. A vedação a pena de morte é um direito ou uma garantia? É uma garantia ao direito a vida. 2. O mandado de segurança é um direito ou uma garantia? Evidente que é uma garantia, é um remédio, um instrumento processual que é utilizado para defesa de vários direitos fundamentais, quando não abrigados por habeas corpus, ou mandado de injunção. Classificação das garantias: Quanto ao âmbito e ao alcance, temos duas espécies de garantias: 13 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO Garantias internas ou nacionais: 1) garantias gerais: são sistemas de proteção que não se dirigem apenas aos direitos fundamentais, podem se dirigir a várias outras ideias, a várias outras noções relevantes para a vida social e não apenas aos direitos fundamentais. Ex: a própria constituição rígida, a rigidez constitucional protege a estabilidade do texto, uma vez que exige 2 turnos para mudança, a legitimidade das mudanças, uma vez que exige 3/5 para aprovação. Portanto, a rigidez constitucional protege todo o sistema constitucional, mas também protegem os direitos fundamentais, ao menos os direitos individuais são cláusulas pétreas. Note pela redação do art. 60, § 4º, inciso IV, da Constituição4, que a nomenclatura ali é direitos individuais, o que pode gerar um problema, dizendo, e os direitos coletivos não são pétreos? E os direitos sociais, quando então, a classificação não é quanto ao sujeito, mas quanto à matéria, não são pétreos? Isso é um grande problema, haverá um momento quando estudarmos na segunda parte do nosso curso “Os Direitos na Constituição de 88”, trataremos deste problema. Os direitos são prerrogativas indispensáveis, as garantias são instrumentos de proteção, as garantias nacionais ou internas, têm nas garantias gerais a sua primeira definição, a Constituição é uma delas, as cláusulas pétreas representariam também uma manifestação dessa garantia geral. A separação de poderes é também uma garantia geral. A primeira e principal da separação dos poderes é evitar o abuso do poder. Tanto que a expressão “separação de poderes” vem associada a frases como: o nome de Sistemas e Contrapesos, check and balance, e assim por diante. Resultado, então, a separação de poderes também é um sistema de garantia a direitos fundamentais. Cortes Constitucionais, o STF no seu papel de Corte Constitucional, fazendo a proteção da Constituição, também são considerados uma garantia geral, ou seja, as garantias gerais se dirigem não só aos direitos fundamentais, mas a todo um sistema, especialmente o sistema constitucional, a consequência prática, então, abrange também os direitos fundamentais. 2) garantias específicas: são proteções a um ou a alguns direitos fundamentais. Por exemplo, a vida é o direito fundamental, a vedação a pena de morte (admitida à pena de morte apenas no estado de guerra declarada, previsão do art. 5º, inciso XLVII, alínea a, da Constituição5) é uma proteção a vida, é uma garantia direta e específica para a vida. Da mesma maneira as cláusulas da irretroatividade prejudicial ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e coisa julgada, representam uma garantia específica à segurança jurídica. A segurança jurídica é um direito fundamental e a irretroatividade é uma garantia específica. Existem algumas garantias um pouco mais abrangentes, é o caso, por exemplo, da legalidade ou da reserva da lei. Qual é o direito protegido pela legalidade ou pela reserva da lei? Pode-se falar qualquer direito, basta o tema da lei tratar desse ou daquele assunto, mas pode-se falar que é a impessoalidade, porque a lei é um preceito normativo aplicável a todos, é impessoal, e há quem diga que é a segurança jurídica, porque pela lei, eu sei o que eu posso e não posso fazer. Consequência prática, a lei de fato, ou a reserva legal, ou a estrita legalidade ou mesmo a legalidade relativa, a reserva legal relativa, permite uma classificação um pouco mais ampla, 4 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais. 5 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; 14 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO poderia até ser classificada como garantia geral? Cremos que não, ela também não chegaria a esse ponto, mas é uma garantia específica porque defende alguns direitos. 3) remédios constitucionais: são instrumentos processuais dirigidos para a proteção dos direitos fundamentais, instrumentos processuais. O processo pode ser judicial, que é a regra, mas também pode ser administrativo, há remédios constitucionais relacionados a processos administrativos e, há remédio constitucional, relacionado a processo administrativo. Quais são esses instrumentos processuais? Os habeas corpus, habeas data, os mandados de segurança e de injunção, a ação popular e o direito de petição. Os cinco primeiros são processuais, judiciais e o último, é um instrumento administrativo de proteção de direitos na via administrativa.Note a distinção entre garantias específicas e remédios. Os remédios são sempre instrumentos processuais. Garantias externas ou internacionais: 1) garantias globais ou internacionais: em sentido estrito, é o caso, por exemplo, da ONU e de seus vários sistemas de proteção, da OMC, e assim por diante, são garantias globais. 2) garantias regionais: que envolvem grupos de países, normalmente continentes ou partes de continentes, de região, nós temos como no caso brasileiro, o MERCOSUL na Europa, a União Européia, são dois exemplos de garantias regionais. Então as garantias, elas tem essa abrangência, a nacional e a internacional interna ou externa. Com isso encerramos a parte de conceito de direitos e de garantias fundamentais. Agora vamos estudar as fontes, fundamentos dos direitos fundamentais. Fontes dos direitos fundamentais: A primeira fonte dos direitos fundamentais são os valores éticos morais de uma sociedade. Há inclusive uma teoria chamada teoria moralista de Perelman, que fala que os direitos fundamentais encontram a sua fonte na experiência e na consciência moral de um determinado povo. Então a primeira fonte é o que nós pensamos como certo ou como errado, independentemente das leis. Existem outras fontes, ou outros fundamentos. Existe a lógica do direito natural, que vai sustentar que independentemente do preceito normativo, “A” ou “B”, dizer isso ou aquilo, os direitos são naturais por fatores lógicos racionais, porque o indivíduo nasce com determinada prerrogativa, porque é indispensável na consciência e no senso natural da vida contemporânea, que a pessoa tenha direito a isso ou aquilo, ou seja, é da ordem natural das coisas, aí vem a ideias do direito natural, independentemente de uma positivação nessa ou naquela lei. Evidente que até hoje existe um fortíssimo fundamento que é a do direito positivo, nós reconhecemos como direito aquilo que está escrito num texto normativo reconhecido como válido. Esse texto normativo, positivado, representaria então, a fonte primordial dos direitos fundamentais. 15 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROF: JOSÉ CARLOS FRANCISCO Ainda vivemos num mundo jurídico essencialmente vinculado ao positivismo, o que está escrito é extremamente importante. Lembre-se que o texto normativo é o primeiro passo do processo interpretativo, o texto tem de ser contextualizado, então, temos o texto e o contexto, o contexto é a realidade no tempo e no local no qual a questão se coloca, logo texto e realidade, texto e contexto, os dois devem ser integrados para que então, você resolva um problema concreto. Muita gente hoje fala que a Constituição é viva, ela não se esgota na produção do texto, ela tem uma mudança formal, com as emendas, etc., mas tem também uma mudança informal, chamada de mutação constitucional, que vai exatamente permitir que as transformações nos valores da sociedade sejam refletivas no processo interpretativo. Então se estou analisando em 2012 um fato que aconteceu em 2012, pego o texto da Constituição de 1988 e analiso à luz dos valores de 2012. O inverso, se estou analisando hoje em 2012 um fato que aconteceu em 1989, pego o texto da Constituição de 88 e hoje em 2012, eu analiso o fato de 89 à luz dos valores de 89, quem se comportou em 89, se comportou com base no texto e no contexto que se admitia naquele momento. Resultado prático então, a Constituição é viva, conceito que vem com uma expressão americana “living constitution”, ou seja, o texto constitucional não é o único referencial da fonte normativa, texto e contexto se integram. Também é muito importante nesse processo, a identificação dentro das fontes normativas do Direito Nacional e do Direito Internacional. É fundamental identificar que os direitos fundamentais estão muito atrelados a uma normatização nacional, mas também a uma normatização internacional. O Direito Internacional tem tido um papel extremamente importante na proteção dos direitos fundamentais, ao papel subsidiário, ao qual nos referimos, e na maioria das vezes ele acaba sendo absorvido pela própria legislação interna, caso, por exemplo, o artigo 5º, §§ 2º e 3º, da Constituição de 886, admite que tratados internacionais sejam hoje convalidados, aprovados pela ordem interna, como emenda constitucional é o que aconteceu com o Tratado de Nova York de 2009, que aprovado tal como emendas (3/5, 2 turnos em cada casa, etc.) hoje faz parte da Constituição, então o texto da Constituição é o texto positivado por permanente, por transitório, suas emendas e, também tratados internacionais, formando uma noção conhecida como BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE. Então os fundamentos normativos são internos e internacionais. Não confunda Direito Internacional com Direito Comparado e nem com Direito Estrangeiro: Direito Comparado: é uma análise de funcionalidade entre o direito de um país e o direito de outro; Direito estrangeiro: é o direito só de outro país, o direito internacional tem uma fonte diferente, ele vem normalmente de organismos internacionais dos quais o Brasil, por exemplo, faz parte. É o Direito Internacional a grande fonte dos direitos fundamentais junto com o Direito Interno. 6Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
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