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INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

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1 
 
 
 
 
 
 
  
IINNSSUUFFIICCIIÊÊNNCCIIAA  CCAARRDDÍÍAACCAA  
 
 
 
Roteiro  elaborado  pelo  aluno  de 
mestrado  em  Fisiologia  e  Bioquímica 
Odair Alves da Silva, sob  supervisão 
do Prof. Dr. Carlos Peres da Costa. 
 
 
 
 
 
 
 
Recife 
2008 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
DEFINIÇÃO ......................................................................................................................................... 3 
ASPECTOS HISTÓRICOS ....................................................................................................................... 4 
CLASSIFICAÇÃO .................................................................................................................................. 7 
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA ANTERÓGRADA E RETRÓGADA .................................................................. 7 
DISFUNÇÃO SISTÓLICA E DIASTÓLICA ................................................................................................. 8 
DISFUNÇÃO ESQUERDA E DIREITA ...................................................................................................... 9 
MECANISMOS ADAPTATIVOS ............................................................................................................ 10 
INTERAÇÕES ENTRE O MECANISMO DE FRANK‐STALING E O SISTEMA NERVOSO ADRENÉRGICO ........ 11 
REDISTRIBUIÇÃO DO DÉBITO VENTRICULAR ESQUERDO ........................................................................................ 12 
DISFUNÇÃO ENDOTELIAL .............................................................................................................................. 12 
ALTERAÇÕES NA PAREDE VASCULAR ................................................................................................................ 12 
2,3‐DIFOSFOGLICERATO .............................................................................................................................. 12 
CONTRATILIDADE DO MIOCÁRDIO EM INSUFICIÊNCIA E HIPERTROFIADO ................................................................ 12 
HIPERTROFIA MIOCÁRDICA ............................................................................................................... 13 
FISIOPATOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA DIASTÓLICA .............................................................. 16 
ALTERAÇÕES NAS PROPRIEDADES DIASTÓLICAS ................................................................................ 16 
ALTERAÇÕES CRÔNICAS NAS RELAÇÕES PRESSÃO‐VOLUME DIASTÓLICAS VENTRICULARES ................ 16 
MECANISMOS CELULARES E MOLECULARES DE DISFUNÇÃO MIOCÁRDICA ......................................... 17 
ACOPLAMENTO EXCITAÇÃO‐CONTRAÇÃO E O PAPEL DO CÁLCIO ............................................................................ 17 
APARELHO CONTRÁTIL ................................................................................................................................. 18 
ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO ......................................................................................................................... 18 
AJUSTES NEURO‐HUMORAIS ............................................................................................................. 19 
SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO ....................................................................................................... 20 
RECEPTORES ADRENÉRGICOS ........................................................................................................................ 22 
FUNÇÃO PARASSIMPÁTICA NA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA .................................................................................... 23 
SISTEMA RENINA‐ANGIOTENSINA ...................................................................................................... 23 
VASOPRESSINA (ADH) ....................................................................................................................... 25 
PEPTÍDEOS NATRIURÉTICOS .............................................................................................................. 26 
ENDOTELINA ..................................................................................................................................... 26 
CITOCINAS ........................................................................................................................................ 27 
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 29 
3 
 
DEFINIÇÃO 
Definir  a  insuficiência do  coração não  constitui  uma  simples  tarefa. Ainda 
que  a  definição  usual  desta  síndrome  clínica  enfatize  a  ineficiência  do  coração 
como  bomba,  na  verdade,  existe  muito  mais  do  que  um  comprometimento  na 
transferência de sangue das veias para as artérias. Os principais achados clínicos 
incluem  freqüentemente  anormalidades  em  outros  órgãos,  como  por  exemplo,  o 
acúmulo  de  sangue  nos  pulmões,  levando  a  dificuldades  respiratórias.  Esta 
congestão pulmonar pode piorar por  conta da  retenção de  água  e  sal  pelos  rins, 
que é a resposta renal a um baixo débito cardíaco.  
Outro problema em definir a insuficiência cardíaca (IC) é que não se trata de 
uma  doença,  mas  de  uma  condição  resultante  de  desordens  que  danificam  o 
coração.  Estas  desordens  incluem  doenças  coronárias,  hipertensão,  desordens 
valvulares  e  diversos  tipos  de  cardiomiopatias.  Além disso,  falha  cardíaca  leva  a 
mais falha, originando um ciclo vicioso. 
De modo resumido, a insuficiência cardíaca pode ser conceituada como um 
desordenado  processo  bioquímico  e  biofísico  que  prejudica  a  contratilidade  e 
relaxamento miocárdico.  Algumas dessas anormalidades são deletérias, outras são 
compensatórias, mas a maioria é tanto um quanto outro. Por exemplo, a hipertrofia 
aumenta  a massa do  coração  insuficiente,  isso poderá  compensar  a  resistência  à 
ejeção  que  é  vista  na  hipertensão  arterial,  mas,  ao  mesmo  tempo,  impede  o 
relaxamento e encurta a vida dos miócitos.  
A  insuficiência cardíaca deve ser distinguida da  insuficiência circulatória, 
na qual há uma anormalidade de algum componente circulatório‐coração, volume 
sanguíneo,  concentração  de  hemoglobina  oxigenada  no  sangue  arterial  ou  leito 
vascular,  resultando  em  débito  cardíaco  inadequado.  Assim,  insuficiência 
miocárdica,  insuficiência  cardíaca  e  insuficiência  circulatória  não  são  sinônimos, 
mas  se  referem  mais  progressivamente  a  entidades  inclusivas.
4 
 
 
ASPECTOS HISTÓRICOS 
Edema, hidropisia, anasarca e dispnéia são mencionadas nos escritos atribuídos a 
Hipócrates  (460‐370,  A.C.),  mas  não  são  apontadas 
correlações  com  o  coração.  A  dispnéia  era  atribuída  por 
Hipócrates  como  resultante  de  muco  frio  que  descia  do 
cérebro para o coração e pulmões, isso causava resfriamento 
do sangue e aumentava a força de pulsação das veias nesses 
órgãos, causando palpitações e dificuldade de respirar (Secret 
disease IX).  
 
Hipócrates  aparenta  ter  encontrado  um  caso  de 
insuficiência  cardíaca  quando  relata  anasarca,  tosse  seca, 
ortopnéia, dispnéia e sufocação em uma paciente no segundo trimestre de gravidez 
e,  provavelmente,  portadora  de  doença  reumática  (Epidemics  VI).  Entretanto, 
apesar  dos  detalhes  ao  citar  os  sinais  e  sintomas  percebidos,  eram  raras  as 
correlações diretas com o coração por se entender muito pouco do funcionamento 
desse órgão. 
Galen  (130‐200,  D.C.),  organizou  o  conhecimento  médico  até  então, 
reconheceu  a  natureza  muscular  do  coração  e  reconheceu  que  a  contração  das 
fibras  desse músculo  causaria  a  ejeção  de  sangue  durante  a  sístole.  Ele  também 
descreveu a  “sucção”ventricular durante a diástole e  entendeu o  funcionamento 
das válvulas cardíacas. Entretanto, Galen falhou no estudo da circulação sanguínea, 
pois  descreveu  a  pulsação  arterial  como movimentos  produzidos  pelas  próprias 
artérias, e não pelo movimento do sangue nestes vasos. Para ele, o coração tinha a 
função de distribuir o espírito e levar calor ao corpo. Essa visão impediu qualquer 
entendimento  das  principais  conseqüências  da  insuficiência  do  coração  até  as 
descrições de Harvey sobre circulação sanguínea 1500 anos mais tarde. 
Willian Harvey  (1578‐1657) publicou,  em 1628, De Motu Cordis  (movimento do 
coração)  fornecendo  a  mais  clara  descrição  de  circulação 
sanguínea  em  um  documento  que  incluía  dados 
matemáticos.  Nas  próprias  palavras  de  Harvey,  traduzido 
para o inglês por Franklin (1957): 
“I  am  obliged  to  conclude  that  in  animals  the  blood  is  driven  round  a 
circuit with na unceasing, circular sort of movement, that this is na activity 
or function of the heart which it carries out by virtue of its pulsation, and 
5 
 
that in sum it constitues the sole reason for that heart’s pulsatile movement.” 
  As afirmações de Harvey derrubaram a visão de Galen, que afirmava que o 
coração tinha a principal função de aquecer o sangue.  
Harvey também atentou para o retorno venoso, afirmando que a obstrução 
do  retorno  venoso  causaria  edema.  Também  mostrou  a  função  das  válvulas 
venosas e reconheceu que determinada pressão causada por uma atadura poderia 
interromper  o  fluxo  venoso,  mas  dificilmente  o  arterial  (Figura  1).  Além  disso, 
parece ter reconhecido que a falha do coração poderia causar acúmulo de sangue 
nos pulmões e dificuldade respiratória. 
 
Figura 1  ­  Ilustração do  funcionamento  das  válvulas  venosas  elaborada  por  harvey  em De Motu 
Cordis. 
  O  acoplamento  da  fisiologia  de  Harvey  com  a  adiantada  examinação  por 
autópsia,  rapidamente  permitiu  um  entendimento  das  causas  do  acúmulo  de 
fluídos nas doenças do coração. Descrevendo um paciente que havia morrido em 
1946,  18  anos  após  a publicação de De Motu Cordis, Lazare Rivière  (1589‐1655) 
entendeu  as  conseqüências  de  um  fluxo  sanguíneo  prejudicado  pelos  pulmões 
resultante de uma endocardite infecciosa que envolveu a valva mitral. 
  A partir dos achados de Harvey, muito estudiosos  focaram suas pesquisas 
nas conseqüências de uma ejeção ventricular deficiente e as causas da dispnéia em 
pacientes  cardiopatas.  Entretanto,  a  discussão  mais  clara  sobre  o  tema  surgiu 
apenas  vários  anos  depois  das  publicações  de  Harvey  por 
Raymond  Vieussens  (1635‐1715).  Sua  longa  descrição  dos 
últimos anos de um homem jovem que morreu de estenose da 
valva mitral não se deteve apenas à história clínica e autópsia, 
mas  também,  explicou  corretamente  o  porquê  da  respiração 
rápida  e  o  porquê  do  grande  derrame  pleural  encontrado  na 
autópsia. 
6 
 
 
Na  autópsia  desse  paciente,  Vieussens  encontrou  derrame  pleural, 
cardiomegalia e estenose da valva mitral (Figura 2). 
 
Figura 2 ­ Ilustração de Vieussens da estenose mitral, vista inferior. Ilustra um formato de boca de 
peixe. 
O primeiro tratamento para a insuficiência cardíaca foi descoberto in 1783 
por Willian Withering que identificou os digitálicos como ativos ingredientes para 
aumentar  a  força  do  coração.  Na  seqüência,  foram  feitas  outras  importantes 
descobertas em relação à insuficiência cardíaca. Por exemplo, a diferenciação entre 
dilatação  e  hipertrofia  cardíaca  foi  atribuída  a  Lancisi  em  sua  publicação 
Aneurysmatibus  (1745)  e  a  descrição  da  natureza  adaptativa  da  hipertrofia 
induzida por sobrecarga, por Giovanni Battista Morgagni (1682‐1771). 
William  Osler  (1849‐1917),  na  primeira  edição  do  The  Principles  and 
Practice  of  Medicine,  demonstrou  uma  notável  visão  moderna  sobre  hipertrofia 
quando  dividiu  o  curso  da  hipertrofia  cardíaca  causada  por  sobrecarga  em  três 
estágios: 
a) O período de desenvolvimento, o qual varia com a natureza da lesão 
primária. 
b) O período de total compensação – estágio latente – durante o qual 
o vigor do coração satisfaz as necessidades circulatórias. 
c) O  período  de  quebra  da  compensação,  o  qual  pode  vir 
inesperadamente  durante  uma  excitação  severa.  A  morte  pode  ser 
resultante de dilatação. 
A  revisão  da  história  relacionada  à  insuficiência  cardíaca  mostra  que  a 
atribuição de causas tem mudado ao longo dos anos. Até o início do século 20, as 
causas  reumáticas  eram  tidas  como  principais  causadoras  de  insuficiência  do 
coração.  Com  o  advento  de  novas  tecnologias  e,  conseqüentemente,  maior 
habilidade no diagnóstico, o ranking das principais causas de insuficiência cardíaca 
7 
 
foi modificado. Ainda no início do século 20, anormalidades estruturais passaram a 
ser  as mais  importantes  causas  de  IC,  e  os  pacientes  com  este  tipo  de  alteração 
estavam  sujeitos  ao  desenvolvimento  natural  da  doença,  por  ainda  não  existir 
intervenções cirúrgicas que corrigissem ou diminuíssem a anormalidade. 
 
CLASSIFICAÇÃO 
Muitas  classificações  para  a  insuficiência  cardíaca  são  usadas  na  prática 
clínica.  A  ligação  entre  os  mecanismos  causais  e  muitas  destas  classificações  é 
extremamente complexa, podendo gerar confusões consideráveis. 
As principais classificações são: 
• Insuficiência anterógrada e retrógada 
• Disfunção sistólica e diastólica 
• Disfunção esquerda e direita 
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA ANTERÓGRADA E RETRÓGADA 
Como  já  notado,  as  anormalidades  hemodinâmicas  em  pacientes  com 
insuficiência cardíaca são simples de ser conceituadas porque, como uma bomba, o 
coração  apresenta  apenas  dois  caminhos  para  falhar:  com  um  esvaziamento 
inadequado de veias (podendo ser chamada de  insuficiência retrógrada) e ejeção 
de  sangue  com  baixa  pressão  para  aorta  e  artéria  pulmonar  (sendo,  por  isso, 
chamada  de  insuficiência  anterógrada).  Os  termos  “anterógrada”  e  “retrógrada” 
devem  ser  usados  com  cuidado,  pois  caracterizam  as mudanças  hemodinâmicas 
que ocorrem no coração insuficiente de maneira muito simplista.  
A maior  causa  de  insuficiência  cardíaca  anterógrada  no  lado  esquerdo  do 
coração  é,  sem  dúvidas,  a  estenose  da  valva  mitral.  Nesse  caso,  ocorre  menor 
passagem de sangue das veias pulmonares para o ventrículo esquerdo através do 
átrio  esquerdo.  Isso  terá  várias  repercussões  pulmonares  (como  ex:  congestão 
pulmonar),  repercussões  cardíacas  (como  ex:  diminuição  do  débito  cardíaco)  e 
repercussões  hemodinâmicas  (vasoconstricção).  A  queda  no  débito  cardíaco 
causada  pelo  menor  volume  diastólico  induz  a  ativação  de  mecanismos 
compensatórios,  como  ativação de  sistema  simpático  e  retenção de  água  e  sódio 
pelos  rins.  O  resultado  da  ativação  simpática,  principalmente,  será  a  indução  de 
hipertrofia miocárdica concêntrica, que ocorre graças a vários e complexos fatores 
que  serão  abordados  mais  adiante.  A  hipertrofia  miocárdica  concêntrica  causa 
obliteração  da  cavidade  ventricular  e  uma  maior  diminuição  do  enchimento 
diastólico nessa câmara. 
8 
 
A  insuficiência  cardíaca  anterógrada  no  lado  esquerdo  do  coração  pode 
ocorrer quando há obstrução que dificulte a ejeção do ventrículo esquerdo (como 
na estenose da aorta); quando danos no miocárdio reduzem a força de contração e, 
conseqüentemente,  o  volume  de  ejeção  (como  nas  miocardites);  ou  quando  o 
ventrículo se torna enrijecido após infarto de sua parede muscular. 
Mecanismos  similares  podem  acometer  o  ventrículo  direito,  entretanto,  a 
disfunçãoventricular  esquerda é, de  longe,  a  causa mais  comum de  insuficiência 
cardíaca. Isso se deve, principalmente, a maior pressão praticada nesse ventrículo 
e as características de resistência da aorta. 
A  escolha  da  terapia  correta  é  o  maior  determinante  da  extensão  da 
insuficiência  cardíaca  anterógrada  ou  retrógrada.  Os  vasodilatadores  auxiliam 
principalmente  na  insuficiência  anterógrada,  pois  diminuem  a  pós‐carga.  Os 
diuréticos diminuem a elevada pressão venosa vista em paciente com insuficiência 
retrógrada,  entretanto,  diminui  também  a  pré‐carga,  de  forma  que,  pela  lei  de 
Frank  Staling,  também  ocorrerá  diminuição  na  ejeção  e  piora  da  insuficiência 
anterógrada.  Por  essas  razões,  a  severidade  das  manifestações  da  insuficiência 
anterógrada  ou  retrógrada  fornece  poucas  informações  sobre  a  etiologia  ou  o 
estado bioquímico do miocárdio dos pacientes com insuficiência cardíaca. 
DISFUNÇÃO SISTÓLICA E DIASTÓLICA 
É  uma  classificação  mais  utilizada  que  a  anterior  e  se  refere  a  uma 
prejudicada ejeção (disfunção sistólica) ou um enchimento prejudicado (disfunção 
diastólica).  Estes  termos  apresentam  diferentes  significados  em  insuficiência 
crônica ou aguda. 
Em  insuficiência  cardíaca  aguda,  as  disfunções  sistólicas  e  diastólicas 
refletem  diferentes  anormalidades  no  miocárdio.  A  disfunção  sistólica  aguda 
prejudica  a  ejeção  e  é  observada  em  pacientes  com  miocardite  viral,  com 
anormalidades metabólicas e tóxicas, com intoxicação por álcool ou com anemias. 
Disfunção  diastólica  aguda  prejudica  o  enchimento  ventricular  e  é  visto  nas 
isquemias  miocárdicas,  como  ocorre  em  vasoespamos  coronarianos  ou 
angioplastia.  Visto  isso,  podemos  concluir  que  disfunções  sistólicas  e  diastólicas 
agudas  ocorrem  como  resultado  de  anormalidades  em  processos  bioquímicos 
responsáveis  pela  contração  e  relaxamento,  respectivamente.  Em  insuficiência 
cardíaca  crônica,  entretanto,  a  disfunção  diastólica  e  sistólica  ocorrem  como 
resultado de anormalidades na arquitetura ventricular. 
Disfunção  sistólica  pode  ser  tanto  difusa  como  regional.  A  disfunção 
sistólica  difusa  é  vista  em  condições  tais  como  em  cardiomiopatia  dilatada 
idiopática ou em miocardites, a qual enfraquece a contração em todo o miocárdio 
9 
 
ventricular.  Por  outro  lado,  a  disfunção  sistólica  regional  é  freqüentemente  vista 
após infarto do miocárdio (Quadro 1). 
Disfunção  diastólica  crônica  é  comumente  vista  em  pacientes  com 
hipertrofia  miocárdica  secundária  a  estenose  da  aorta  ou  hipertensão  sistólica 
inadequadamente tratada, que causa estreitamento da câmara cardíaca e redução 
do  volume  diastólico.  Entretanto,  é  difícil  caracterizar  uma  disfunção  sistólica  e 
diastólica, pois, um ventrículo que não esvazia normalmente não poderá se encher 
normalmente,  e  vice‐versa,  isso  dificulta  saber  qual  o  problema  primário,  se  é 
dificuldade  de  enchimento  ou  de  ejeção.  Além  do  mais,  terapia  diurética,  que 
deprime o volume vascular, prontamente converte uma dificuldade de enchimento 
(insuficiência  retrógrada)  em  uma  dificuldade  de  ejeção  (insuficiência 
anterógrada)  sem  alterar  diretamente  a  função  ventricular.  Por  estas  razões,  as 
disfunções  crônicas diastólicas  e  sistólicas não podem ser distinguidas umas das 
outras  a  partir  de  variáveis  hemodinâmicas  como  pressão  de  enchimento  ou 
volume de ejeção. Ao  invés disso, essa diferenciação requer que a arquitetura do 
ventrículo insuficiente seja determinada, por exemplo, através de ecocardiograma. 
Quadro 1 – Disfunção Sistólica e Diastólica 
Disfunção Sistólica  Disfunção Diastólica 
Ejeção prejudicada, contratilidade 
prejudicada 
Enchimento prejudicado, relaxamento 
prejudicado 
Tipos  Causas  Causas 
Global  Cardiomiopatias  dilatadas, 
miocardites virais ou tóxicas 
Cardiomiopatias hipertróficas 
Regional  Infarto do miocárdio  Hipertensão
 
DISFUNÇÃO ESQUERDA E DIREITA 
A diferenciação entre disfunção esquerda ou direita é especialmente usada 
em  pacientes  com  doenças  cardíacas  congênitas  ou  valvulares,  ou  em  pacientes 
com desvio intracardíaco. Em países desenvolvidos, onde a maior parte dos casos 
de insuficiência cardíaca são causados por doenças hipertensivas ou coronarianas, 
o coração esquerdo é o mais afetado por insuficiência (Quadro 2). A Insuficiência 
cardíaca direita é muito menos comum e ocorre mais freqüentemente em doenças 
cardíacas  congênitas  e  por  doenças  pulmonares  crônicas  ou  não.  Insuficiência 
esquerda pode vir a se assemelhar clinicamente com insuficiência direita quando 
ocorre um aumento na pressão atrial esquerda ou nas veias pulmonares levando a 
vasoconstricção  em  arteríolas  pulmonares  causando  hipertensão  pulmonar.  Essa 
vasoconstricção constitui um mecanismo de defesa contra congestão pulmonar. 
10 
 
Quadro 2 – Causas comuns de insuficiência cardíaca em Países desenvolvidos 
Etiologia 
Disfunção 
Esquerda/Direita 
Disfunção 
Sistólica/Diastólica 
Anormalidade 
Global/Regional 
Infarto do miocárdio  Esquerda Sistólica Regional 
Isquemia miocárdio  Esquerda Sistólica Geralmente 
regional 
Cardiomiopatia 
dilatada/miocardites 
Esquerda Sistólica Global 
Hipertensão  Esquerda Diastólica Global 
Cardiomiopatia 
Hipertrófica 
Esquerda Diastólica Geralmente 
regional 
Valvular/Congenital  Depende da 
estrutura afetada 
Depende da estrutura 
afetada 
Global 
Cor Pulmonale  Direita Ambas Global 
 
 
 
MECANISMOS ADAPTATIVOS 
Os distúrbios cardíacos exigem mecanismos adaptativos. Os mais importantes 
entre eles são: 
1) Mecanismo de Frank‐Staling; 
2) Hipertrofia miocárdica, com ou sem dilatação de câmara; 
3) Ativação de sistemas neuro‐hormonais . 
Na  insuficiência  cardíaca  aguda,  esses  mecanismos  adaptativos  podem  ser 
adequados para manter o desempenho mais geral de bombeamento do coração em 
níveis  relativamente  normais.  Entretanto,  a  capacidade  de  cada  um  desses 
mecanismos  para  sustentar  o  desempenho  cardíaco  em  face  de  sobrecarga 
hemodinâmica relativa à contratilidade miocárdica é finita e quando cronicamente 
mantida, torna‐se mal‐adaptativa (Figura 3). 
11 
 
 
FIGURA 3 – O baixo débito cardíaco pode acelerar a  freqüência da morte celular na  insuficiência 
cardíaca  através  da  estimulação  simpática  e  do  sistema  Renina‐Angiotensina,  resultando  em 
vasoconstricção  e  estimulação  cardíaca.  A  vasoconstricção  aumenta  a  pós‐carga,  reduzindo mais 
ainda o débito e acelerando a morte miocárdica. No coração, a estimulação adrenérgica resulta em 
aumento da concentração de AMPc e  inositol‐1,4,5‐trifosfato (InsP3) que aumenta a concentração 
de  íons cálcio,  resultando em aumento da  contratilidade  (efeito  compensatório). Entretanto,  esse 
cálcio poderá diminuir o relaxamento (efeito lusitrópico negativo), produzir arritmias e conduzir a 
morte  súbita.  A  estimulação  miocárdica  poderá  aumentar  a  freqüência  de  morte  das  células  do 
miocárdio  por  aumentar  o  consumo  celular.  Assim,  quando  as  respostas  adaptativas  a  um baixo 
débito cárdico crônico se  tornam sustentadas, estas podem ter efeitos deletérios em um paciente 
com IC.  
INTERAÇÕES ENTRE O MECANISMO DE FRANK­STALING E O 
SISTEMA NERVOSO ADRENÉRGICO 
No  mecanismo  de  Frank‐Staling,  o  aumento  da  pré‐carga  e, 
conseqüentemente,  o  aumento  do  estiramento  das  fibras  miocárdicas,  aumenta, 
até certo nível, a força de contração e o volume de ejeção. 
  Em  insuficiência  cardíaca  sistólica  moderadamente  severa,  o  débito 
cardíaco e o desempenho ventricular externo no repouso estão dentro de  limitesnormais, mas são mantidos nesses níveis apenas porque o comprimento das fibras 
diastólicas  finais  e  o  volume  diastólico  final  ventricular  (pré‐carga  ventricular) 
estão  elevados,  isto  é,  através  do  mecanismo  de  Frank‐Staling.  As  elevações  na 
pressão diastólica  esquerda  estão  associadas  com níveis  anormalmente  elevados 
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de  pressão  capilar  pulmonar,  contribuindo  para  a  dispnéia  experimentada  por 
pacientes com IC. 
  Como  dito  anteriormente,  o  baixo  débito  cardíaco  na  insuficiência  do 
coração causa estimulação dos mecanismos compensatórios, entre eles, o sistema 
nervoso  simpático.  Isso  irá  induzir  taquicardia,  retenção  de  sódio  e  água, 
vasoconstricção  e  liberação  de  renina.  Essas  respostas,  em  associação  a  outras, 
serão responsáveis por alterações sistêmicas, tais como: 
REDISTRIBUIÇÃO DO DÉBITO VENTRICULAR ESQUERDO 
A  vasoconstricção,  mediada  em  parte  pelo  sistema  nervoso  adrenérgico, 
desempenha importante papel nessa redistribuição de fluxo sanguíneo periférico. 
Conforme  o  desempenho  cardíaco  declina,  ocorre  a  redistribuição  do  débito 
ventricular esquerdo, mesmo em repouso. Essa redistribuição mantém a liberação 
de oxigênio para órgãos vitais como coração e cérebro, enquanto o fluxo sanguíneo 
para as áreas menos críticas, como pele, músculos esqueléticos e rins, é reduzido. 
Essa  subperfuzão  conduz  a  um metabolismo  anaeróbio,  excesso  de  ácido  lácteo, 
fadiga, fraqueza, retenção de sódio e produtos nitrogenados. 
DISFUNÇÃO ENDOTELIAL  
É  observada  uma  menor  resposta  vasodilatadora  nos  pacientes  com 
insuficiência  cardíaca.  Os  mecanismos  potencialmente  responsáveis  incluem 
prejuízo  na  função  receptora  de  células  endoteliais,  deficiência  de  substrato  L‐
arginina, expressão anormal de óxido nítrico. Em adição às anormalidades citadas, 
a liberação do vasoconstrictor endotelina está aumentada. 
ALTERAÇÕES NA PAREDE VASCULAR  
O aumento de sódio na parede vascular na insuficiência cardíaca contribui 
para a rigidez, espessamento e compressão das paredes dos vasos, que aumenta a 
resistência vascular e previne o relaxamento. 
2,3­DIFOSFOGLICERATO  
Ocorre também um declínio progressivo na afinidade da hemoglobina pelo 
oxigênio,  devido  a  um  aumento  no  2,3‐difosfoglicerato  (DFG)  em  insuficiência 
cardíaca. 
CONTRATILIDADE DO MIOCÁRDIO EM INSUFICIÊNCIA E HIPERTROFIADO 
A hipertrofia ocorre quando uma carga de pressão ou de volume é imposta 
sobre  o  ventrículo,  isso  constitui  um  mecanismo  adaptativo  e  permite  que  o 
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ventrículo  sustente  essa  carga.  Entretanto,  um  ventrículo  sujeito  a  uma  carga 
elevada por um longo período pode falhar para manter a compensação. 
Uma sobrecarga de volume pode ser  induzida através da abertura de uma 
fístula arteriovenosa grande. A sobrecarga de pressão sobre o miocárdio também 
pode ser produzida experimentalmente, e os resultados são semelhantes aos vistos 
nos  corações  com  insuficiência.  Por  exemplo,  os  músculos  papilares  ou 
trabeculares  cavernosos  removidos  do  ventrículo  esquerdo  dos  ratos  com 
hipertrofia ventricular esquerda secundária à constrição aórtica exibem depressão 
na  velocidade  de  encurtamento  isotônico  e  um  prolongamento  do  potencial  de 
ação. A força e a freqüência do desenvolvimento de força são também deprimidos 
em  miocárdio  isometricamente  contraível  obtido  de  corações  com  formas 
totalmente diferentes de insuficiência cardíaca, bem como em músculos papilares 
removidos  dos  ventrículos  esquerdos  de  pacientes  com  insuficiência  cardíaca 
devido à doença valvular crônica. 
Nos  miócitos  humanos  hipertrofiados  podem  ser  encontradas  alterações 
estruturais tais como padrões anormais na banda Z, discos intercalados múltiplos e 
proeminência de fibras colágenas conectando com células miocárdicas adjacentes. 
Os  núcleos  são  aumentados  e  lobulados,  contendo  nucléolos  bem  desenvolvidos 
(Figura  4);  há  abundância  de  ribossomos,  refletindo  aumento  na  síntese  de 
proteínas. 
HIPERTROFIA MIOCÁRDICA 
• Padrões  de  hipertrofia  ventricular  –  uma  das  alterações  iniciais  que 
ocorre após o estímulo para hipertrofia é a síntese de mitocôndrias. Isso irá 
aumentar  a  oferta  de  energia  para  as  células  hipertrofiadas.    Associado  a 
isto, ocorre expansão da massa miofibrilar (Figura 4).  
 
Figura 4 – Mudanças estruturais em miócitos hipertrofiados. a ‐ estágio inicial de hipertrofia; b e c 
– estágios intermediários; d – último estágio de hipertrofia. 
Existem  evidências  de  que  a  sobrecarga  hemodinâmica  reative  fatores  de 
crescimento presentes no coração embriônico e que estão inativos na fase adulta. 
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Esses fatores de crescimento reativos aceleram a síntese de proteínas.   Grossman 
e  cols.  examinaram os  estresses  sistólicos  e  diastólicos  em  indivíduos  normais  e 
com sobrecarga de pressão‐volume nos ventrículos esquerdos compensados e sem 
insuficiência cardíaca. Havia um aumento substancial na espessura da parede nos 
ventrículos com sobrecarga de pressão, mas apenas um aumento leve na espessura 
dos ventrículos com sobrecarga de volume. Nesse último caso ocorre aumento do 
raio  da  câmara  cardíaca.  Assim,  quando  o  estímulo  primário  é  sobrecarga  de 
pressão, o aumento agudo resultante no estresse da parede sistólica conduz a uma 
replicação  paralela  das  miofibrilas,  espessamento  dos  miócitos  individuais  e 
hipertrofia  concêntrica.  O  espessamento  da  parede  em  geral  é  suficiente  para 
manter  um  nível  normal  da  tensão  sistólica.  Quando  o  estímulo  primário  é 
sobrecarga  de  volume  ventricular,  o  aumento  na  tensão  da  parede  diastólica 
conduz a replicação de sarcômeros em série, alongamento de miócitos e dilatação 
ventricular  (Figura  5).  Isso  resulta  em um  aumento modesto  na  tensão  sistólica. 
Assim,  em  indivíduos  compensados,  a  sobrecarga  de  volume  e  pressão  altera  a 
geometria ventricular e a espessura da parede de forma que a tensão sistólica não 
altera muito. 
 
Figura 5 – Comparação entre o coração normal e os corações submetidos à sobrecarga de pressão e 
volume. Embora a massa seja similarmente aumentada nos grupos com sobrecarga de volume e 
pressão, o aumento é acompanhado primariamente por espessamento da parede no grupo com 
sobrecarga de pressão. 
O  treino  atlético  prolongado  causa  aumento  moderado  na  massa 
miocárdica.  O  exercício  isotônico,  como  corrida  de  longa  distância  ou  natação 
assemelha‐se  à  sobrecarga de volume e  causa um aumento no volume diastólico 
ventricular  esquerdo,  com  um  espessamento  apenas  leve  da  parede.  O  exercício 
isométrico,  como  levantamento de peso,  assemelha‐se à  sobrecarga de pressão e 
causa um aumento na espessura da parede. Nenhuma forma de hipertrofia parece 
ser deletéria na ausência de doença cardíaca e desaparece rapidamente quando o 
treino é interrompido. 
• Transição de Hipertrofia para  Insuficiência Cardíaca  –  imediatamente 
após  imposição  de  uma  grande  pressão,  o  aumento  no  trabalho  realizado 
pelo ventrículo excede o aumento da massa cardíaca e o coração dilata. Há 
proliferação  de mitocôndrias  e  as miofibrilas  se  dispõem  em paralelo  e  o 
15 
 
sarcômero em série, de  forma que o comprimento e o diâmetro da secção 
transversal dos miócitos são aumentados, também podem ser encontradas 
modificações  estruturais  na  arquitetura  das  fibras  que  alteram  a  sua 
sobrevida.  Posteriormente  ocorrem  algumas  alterações  na  organização 
celular: 
1. Ocorre a lise de miofibrilas; 
2. Os lisossomos aumentam em número; 
3. O retículo sarcoplasmático se torna distorcido; 
4. As densidades superficiais do sistema tubular‐chave são reduzidas;5. Tecido fibroso ocupa o lugar das cavidades cardíacas; 
6. Diminuição da densidade capilar e a reserva coronariana. 
 
• Necrose do Miócito – este é um componente importante da transição para 
insuficiência cardíaca. Pode ser  localizada, como em infarto, a qual afeta o 
ventrículo de maneira análoga à sobrecarga de volume. Também pode ser 
difusa como em lesões causadas por agentes tóxicos. Independente da causa 
da morte do miócito, a carga das células remanescentes aumenta e conduz a 
mais  hipertrofia,  provocando  um  ciclo  vicioso.  A  necrose  é  acelerada 
também por  conta do menor  fluxo  coronariano que é  resultante em parte 
pela hipertrofia e em parte pelo maior estresse na parede miocárdica, o que 
causa compressão dos vasos subendocárdicos e isquemia.  
 
Figura 6 – Relação normal (N) entre a espessura da parede VE (h) e o raio (r) da câmara (primeiro 
painel). Um aumento agudo na pressão sistólica  (carga aguda) causa um aumento no estresse da 
parede sistólica que pode ser aproximado pela equação P x r/h, onde P é a pressão sistólica VE. O 
estresse da parede diastólica  também é  aumentado quando há dilatação da  câmara ou quando a 
pressão  diastólica  é  elevada  (segundo painel).  Se  ocorrer  hipertrofia  compensatória  suficiente,  o 
aumento  na  espessura  da  parede  ventricular  pode  normalizar  o  estresse  da  parede  sistólica  e 
diastólica (terceiro painel). Entretanto, se ocorrer dilatação adicional da câmara ou se o aumento na 
espessura  da  parede  for  insuficiente,  os  estresses  da  parede  sistólica  e  diastólica  continuarão 
anormalmente  elevados.  Nessa  situação,  pode  ocorrer  uma  diltação  suplementar  da  câmara  em 
associação com a insuficiência hemodinâmica (quarto painel). 
 
16 
 
FISIOPATOLOGIA DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA 
DIASTÓLICA 
 
ALTERAÇÕES NAS PROPRIEDADES DIASTÓLICAS 
Também pode ser definida como congestão venosa pulmonar (ou sistêmica) 
e atinge 1/3 dos pacientes com insuficiência cardíaca.  
Foi  observado  que  com  o  aumento  na  pós‐carga  ventricular  ocorre  a 
lentificação  do  relaxamento  miocárdico.  O  miocárdio  isolado  de  pacientes  com 
miocardiopatia hipertrófica exibe um prolongamento do cálcio transitório, ou seja, 
uma  elevação  da  concentração  de  cálcio  no  mioplasma  e  um  retardo  em  sua 
recaptação. Isso provoca um prolongamento no decaimento da tensão. 
Enquanto a hipertrofia constitui o mecanismo compensatório principal para 
manter  o  esvaziamento  sistólico  do  ventrículo  sobrecarregado,  pode  interferir 
simultaneamente  com  as  propriedades  diastólicas  do  ventrículo  e  prejudicar  o 
relaxamento e,  conseqüentemente,  o  enchimento ventricular. Essa dificuldade de 
relaxamento  também  pode  ser  causado  por  um  aumento  na  rigidez  miocárdica 
intrínseca  (a  rigidez  de  uma  unidade  da  parede  cardíaca  independentemente  da 
massa total ou espessura do miocárdio), como ocorre com distúrbios nos quais há 
infiltração miocárdica (amiloidose, por exemplo) ou isquemia do miocárdio. 
  ALTERAÇÕES CRÔNICAS NAS RELAÇÕES PRESSÃO­VOLUME 
DIASTÓLICAS VENTRICULARES 
Hipertrofia  ventricular  esquerda  concêntrica,  como  ocorre  em  estenose 
aórtica,  hipertensão  e  miocardiopatia  hipertrófica,  causa  desvios  na  relação 
pressão‐volume do ventrículo para a esquerda de forma que para qualquer volume 
diastólico a pressão diastólica ventricular é anormalmente elevada.  
Na  presença  de  hipertrofia  ventricular  esquerda  concêntrica,  há  uma 
relação  inversa  entre  espessura da  parede posterior  do  ventrículo  e  seu  pico  de 
adelgaçamento durante o início da diástole, ou seja, uma pressão diastólica maior é 
requerida para encher o ventrículo hipertrofiado. 
A isquemia miocárdica aguda lentifica o relaxamento ventricular (Figura 7) 
e aumenta a rigidez da parede miocárdica por conta dos processos  inflamatórios 
que  ocorrem  no  local  de morte  celular.  Isto  também  irá  determinar  uma maior 
pressão diastólica para cada unidade de volume. A  isquemia submiocárdica, vista 
em miocárdios hipertrofiados, intensifica a dificuldade de relaxamento.  
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A menor duração da diástole  induz um aumento da  freqüência cardíaca e, 
conseqüentemente, aumento da isquemia e da pressão diastólica. O tratamento da 
isquemia melhora o relaxamento diastólico e diminui a pressão venosa pulmonar, 
o que reduz o desconforto respiratório.  
 
Figura 7 – Mecanismos que causam disfunção diastólica. Apenas metade inferior da alça pressão‐
volume é descrita. As linhas contínuas representam indivíduos normais; as linhas pontilhadas 
representam pacientes com disfunção diastólica. 
MECANISMOS CELULARES E MOLECULARES DE DISFUNÇÃO 
MIOCÁRDICA 
As evidências apontam que os eventos moleculares e  celulares envolvidos 
na disfunção miocárdica são secundários a forças mecânicas e a uma variedade de 
mediadores  neuronais,  endócrinos  e  autócrinos/parácrinos  que  atuam  no 
miocárdio. Algumas das respostas são adaptativas e sustentam a função cardíaca. 
Outras são mal‐adaptadas. 
ACOPLAMENTO EXCITAÇÃO­CONTRAÇÃO E O PAPEL DO CÁLCIO 
Observações  utilizando  o  indicador  de  Ca++  aequorino  no miocárdio  total 
têm  demonstrado  que  estas  alterações  nas  propriedades  contráteis  e  elétricas 
estão  associadas  com  uma  elevação  prolongada  do  Ca++  intracelular  transitório, 
durante o relaxamento. 
  A concentração intracelular de cálcio é regulada por várias enzimas e canais 
que estão localizadas no retículo sarcoplasmático (RS), sarcolema e mitocôndrias. 
Existem  evidências  de  que  a  expressão  e/ou  função  de  um  número  dessas 
proteínas pode ser alterada no miocárdio hipertrofiado e em insuficiência. 
18 
 
• Ca++ ATPase do RS – embora  as  observações  continuem controversas,  os 
relatos têm indicado que os níveis de Ca++ ATPase e RNAm fosfolamban são 
reduzidos  no  miocárdio  obtido  de  pacientes  em  estágio  final  de 
insuficiência  cardíaca.  Essas  observações  são  consistentes  com  vários 
estudos que têm demonstrado uma redução na captação de cálcio pelo RS 
de animais com insuficiência cardíaca. 
• Canais cálcio – No miocárdio humano com insuficiência cardíaca, os RNAm, 
tanto dos canais de liberação de cálcio quanto dos canais de cálcio voltagem 
dependentes, foram encontrados diminuídos. 
• Trocador Na+/Ca++  ‐ O RNAm e níveis de proteínas do  trocador Na+/Ca++ 
foram  descobertos  ser  aumentados  nos  miocárdios  obtidos  de  pacientes 
com  insuficiência  cardíaca  devido  a miocardiopatia  dilatada  isquêmica  ou 
idiopática.  Esse  aumento  na  atividade  de  troca  Na+/Ca++  pode  ser  uma 
resposta  compensatória  à  redução na  recaptação de Ca++  causada por  um 
decréscimo na bomba Ca++ ATPase. 
APARELHO CONTRÁTIL 
 Pacientes com insuficiência ventricular esquerda apresentam uma redução 
importante no volume celular ocupado por miofibrilas, sugerindo que esta redução 
na  quantidade  dos  dispositivos  contráteis  possa  desempenhar  um  papel  no 
desenvolvimento da descompensação cardíaca. 
Grande parte das alterações estruturais que ocorrem no aparelho contrátil é 
resultante da hipertrofia. Estudos em animais têm indicado que quando o coração 
adulto hipertrofia, formas neonatais e fetais de proteínas contráteis (denominadas 
isoformas)  e  outras  proteínas  (como  o  peptídeo  natriurético  atrial)  reaparecem 
significando a reexpressão de genes para essas isoformas neonatais e fetais. Assim, 
a  sobrecarga  hemodinâmica  conduz  a  um  aumento  global  da  síntese  protéica, 
causando  uma  alteração  qualitativa  nas  proteínas,  isto  é,  conduz  à  síntese  de 
isoformas protéicas que eram presentes durante a vida fetal e neonatal, quando a 
síntese de proteínas no coração também era rápida. 
A  expressão  da  troponina‐T,  um  componenteda  troponina  complexa  que 
regula a interação da miosina e actina, foi descoberta ser alterada em insuficiência 
do miocárdio humano. No miocárdio normal, a troponina‐T é expressa como uma 
única  isoforma (TI) que corresponde a aproximadamente 98 % da troponina T. No 
miocárdio  de  pacientes  com  estágio  final  de  insuficiência  cardíaca,  foi  expressa 
uma  segunda  isoforma  (T2)  em  níveis  aumentados,  e  seu  nível  de  expressão  foi 
relacionado com a severidade da insuficiência cardíaca. 
ENERGÉTICA DO MIOCÁRDIO 
Em investigações iniciais, medidas do fluxo sangüíneo coronário utilizando 
19 
 
cateterização de seios coronários em seres humanos e em cães com  insuficiência 
cardíaca  crônica,  mostraram  que  o  fluxo  sangüíneo  coronário  por  grama  de 
miocárdio  não  diferia  significativamente  do  normal.  Tem  sido  demonstrada 
através  de  vários  preparados  de  músculo  cardíaco  insuficiente  uma  exigência 
menor  de  oxigênio  que  nos  músculos  normais.  Isso  tem  relação  direta  com  a 
diminuição  na  contratilidade,  ou  seja,  a  menor  contratilidade  requer  menor 
demanda  de  oxigênio.  Essa  diminuição  nas  necessidades  energéticas  do  coração 
pode atuar como uma função protetora, reduzindo a probabilidade de exacerbação 
da  insuficiência  cardíaca  devido  a  um  desbalanceamento  entre  suprimento  e 
demanda energética. 
As mitocôndrias  obtidas  do músculo  cardíaco  humano  com  insuficiência 
têm  demonstrado  uma  redução  no  consumo  de  oxigênio  durante  a  fosforilação 
ativa  e  taxas  reduzidas de  atividade  respiratória  ligada ao NADH.  Essas  e outras 
observações  têm  conduzido  à  tese  de  que  a  insuficiência miocárdica  pode  estar 
relacionada à deficiência do sistema produzir energia. 
 
  AJUSTES NEURO‐HUMORAIS 
  Uma  série  complexa  de  alterações  neuro‐hormonais  ocorre 
conseqüentemente  a  duas  alterações  hemodinâmicas  principais  na  insuficiência 
cardíaca: redução do débito cardíaco e hipertensão atrial. Nos estágios iniciais 
da insuficiência sistólica aguda, ocorrem várias alterações que tentam compensar a 
disfunção e manter a perfusão para órgãos vitais, as principais delas são: atividade 
adrenérgica  aumentada,  ativação  do  eixo  renina‐angiotensina‐aldosterona  e 
aumento na liberação de vasopressina e endotelina. 
  Entretanto,  cada  um  desses  mecanismos  compensatórios  pode  ser 
pensado  como  uma  "faca  de  dois  gumes".  Conforme  a  insuficiência  cardíaca  se 
torna  crônica,  vários  desses  mecanismos  compensatórios  podem  causar  efeitos 
indesejáveis,  tais como vasoconstrição excessiva, aumento na pós‐carga, retenção 
excessiva  de  sal  e  água,  anormalidades  eletrolíticas  e  arritmias  (Figura  8).  Ao 
contrário, outras respostas, como a liberação de peptídeo natriurético atrial (PNA), 
em  resposta  à  distensão  atrial,  podem  fazer  oposição  a  estes  efeitos  adversos 
causando vasodilatação e aumento na excreção de sal e água. Além disso, muitos 
desses  mediadores  têm  efeitos  sobre  o  crescimento  do  tecido  cardiovascular  e 
assim  desempenha  um  papel  importante  na  "remodelação"  do  miocárdio  e 
vasculatura. 
20 
 
 
Figura  8  ­  Esquema  ilustrando  a  relação  proposta  entre  lesão  miocárdica  primária  e  eventos 
secundários  que  contribuem  para  a  síndrome  clínica  da  insuficiência  cardíaca  e  progressão  da 
doença miocárdica de base. De  acordo  com essa  tese,  as  conseqüências hemodinâmicas  e neuro‐
hormonais da lesão miocárdica inicial resultam em prejuízo agudo da função ventricular devido ao 
aumento  ventricular  da  pós‐carga  e  progressão  crônica  de  doença  devido  à  remodelação 
ventricular. 
SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO 
Durante  o  repouso,  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca  avançada,  a 
concentração de NE circulante é muito alta, geralmente duas a  três vezes o nível 
encontrado  em  indivíduos normais,  e  é  acompanhada por  elevação da dopamina 
circulante e algumas vezes pela epinefrina; a última reflete aumento na atividade 
adrenomedular.  Ocorre  também  um  aumento  significativo  de  NE  durante  o 
exercício em pacientes com falha cardíaca em relação a indivíduos normais. 
Drogas como o α2‐agonista guanabez  (que reduzem o  tráfego do  impulso 
nervoso adrenérgico) e bromoeriptina (um agonista pré‐sináptico da dopamina) 
reduzem  a  NE  plasmática,  indicando  que  o  controle  pré‐sináptico  da  atividade 
nervosa  adrenérgico  está  intacto  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca.  Tem 
sido sugerido que o tratamento com esses agentes pode ser útil na interrupção no 
círculo vicioso. 
A  extensão do aumento da  concentração de NE plasmática que ocorre em 
pacientes com insuficiência cardíaca se correlaciona diretamente com a severidade 
da disfunção ventricular esquerda,  como refletido na altura da pressão de  cunha 
capilar pulmonar, na depressão do  índice cardíaco e com a mortalidade cardíaca. 
Entretanto, não está claro se os níveis elevados de NE circulante em pacientes que 
vão  a  óbito  por  insuficiência  cardíaca  estão  causalmente  relacionados  à  morte 
21 
 
como uma conseqüência de suas ações vasoconstritora, arritmogênica ou outras. 
A  atividade  aumentada  do  sistema  nervoso  adrenérgico  conduz  à 
estimulação  de  receptores  α1‐adrenérgicos  miocárdicos  que  desencadeia  um 
efeito  inotrópico  positivo  modesto.  Estimulação  destes  receptores  miocárdicos 
pode  ser  responsável  por  hipertrofia  de  miócitos,  alterações  em  fenótipos 
caracterizadas  pela  reexpressão  de  um  programa  de  gene  fetal,  e  indução  de 
fatores de crescimento de peptídeo. 
Podem  ser  encontradas  outras  alterações  em  relação  ao  sistema  nervoso 
autônomo: 
• Controle  Barorreflexo  anormal  em  insuficiência  cardíaca  ‐  A 
atividade  adrenérgica  aumentada  na  insuficiência  cardíaca  é,  em 
parte,  devido  ao  controle  barorreflexo  anormal  do  fluxo  de  saída 
adrenérgico do  sistema nervoso  central. Um aumento  incompatível 
na freqüência cardíaca em seres humanos com insuficiência cardíaca 
foi  observado  quando  a  pressão  arterial  era  reduzida  através  da 
administração  de  vasodilatadores.  Essas  alterações  mostraram 
correlação  significativa  com  as  modificações  na  concentração  de 
norepinefrine  circulante  e  com  a  soma  da  NE  e  da  epinefríria 
circulantes,  ou  seja,  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca,  em 
quem os níveis de catecolaminas no repouso já estão aumentados, a 
aceleração cardíaca é moderada e a concentração de catecolaminas, 
normalmente,  aumenta  menos  que  em  pacientes  normais.  Alguns 
pacientes com insuficiência cardíaca exibem uma redução maior na 
pressão arterial durante a  inclinação, análoga àquela observada em 
hipotensão  ortostática  idiopática.  Nesses  pacientes,  não 
surpreendentemente,  a  capacidade  para  o  exercício  na  posição 
vertical é criticamente reduzida. 
• Receptores de estiramento ‐ Sob circunstâncias normais, a pressão 
atrial esquerda elevada estimula os receptores de estiramento atrial. 
O  aumento  na  atividade  de  fibras  aferentes  mielinizadas  e  não 
mielinizadas  (fibras‐C)  inibe  a  liberação  de  ADH,  aumentando  a 
excreção de água, que por sua vez reduz o volume plasmático e deve 
atuar  para  restaurar  a  pressão  atrial  ao  normal.  Além  disso,  o 
aumento  na  ativação  do  receptor  para  estiramento  atrial  esquerdo 
deprime  a  atividade  nervosa  simpática  eferente  renal  e  aumenta  o 
fluxo  sangüíneo  renal  e  a  taxa  de  filtração  glomerular.  Com  a 
estimulação contínua, como ocorre em insuficiência cardíaca, há uma 
dessensibilização  de  barorreceptores  atriais  (e  arteriais),  e  isto  é 
resultado da dilatação cardíaca e alterações na complacência atrial, 
sendoreversível após a melhora da insuficiência cardíaca. A resposta 
barorreflexa  anormal  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca 
22 
 
usualmente é corrigida por transplante cardíaco, indicando que esta 
é  uma  manifestação  secundária  (não  uma  causa)  de  insuficiência 
cardíaca. 
RECEPTORES ADRENÉRGICOS 
Ventrículos  obtidos  de  pacientes  com  insuficiência  cardíaca  demonstram 
uma  redução  crítica  na  densidade  de  receptores  β‐adrenérgicos  (Quadro  3). 
Acredita‐se geralmente que a regulação descendente de receptores β‐adrenérgícos 
é mediada pelo aumento nos níveis de NE nas vizinhanças do receptor. 
 
Quadro 3 ‐ Alterações nas vias de receptores β‐adrenérgicos em humano com insuficiência 
miocárdica. 
Respostas  Contráteis  a  vários  agonistas  (comparando  com  o  miocárdio 
normal) 
Cálcio   ↔
Forscolina  ↔
Agonista β2  ↔/↓
Agonista β1  ↓↓
Componentes da via β/adenilciclase (comparando com o miocárdio normal) 
Número de β1–AR/RNAm  ↓↓/↓↓
Número de β2–AR/RNAm  ↔/↔
Atividade de Gi/RNAm  ↑/↔
Atividade de Gs/RNAm  ↔/↔
Atividade de RNAm/BARK  ↑↑/↑↑
BARK = receptor β‐adrenérgico cinase (enzima que fosforila os receptores adrenérgicos ) 
↔ = sem alteração  
No miocárdio de pacientes com insuficiência cardíaca o nível de RNAm do 
receptor β1‐adrenérgico  é diminuído,  indicando que  a  regulação descendente de 
receptores β1 ‐adrenérgicos é mediada, pelo menos em parte, por um decréscimo 
na  síntese  de  receptores,  enquanto  o  nível  de  RNAm  dos  receptores  β2‐adre‐
nérgicos é inalterado. 
• Proteínas  G  ‐  A  insuficiência  cardíaca  causada  por  miocardiopatia 
dilatada está associada com um aumento na atividade de Gi que pode ser 
acompanhado  por  uma  redução  na  atividade  de  adenilatociclase.  O 
mecanismo  responsável  pelo  aumento  na  atividade  de  Gi  não  é  co‐
nhecido. O nível de Gi avaliado por "Western blotting" é aumentado no 
miocárdio de pacientes com miocardiopatia dilatada idiopática, mas não 
daqueles  com doença  cardíaca  isquêmica,  sugerindo que  alterações  na 
23 
 
função de proteína G estão relacionadas à causa de insuficiência cardíaca. 
As  conseqüências  funcionais  de  um  aumento  na  atividade  de  Gi 
permanecem por ser estabelecidas. 
• Suporte  adrenérgico  ao  coração  insuficiente  –  A  importância  do 
sistema  nervoso  adrenérgico  na  manutenção  da  contratilidade 
ventricular  quando  a  função  do  miocárdio  está  deprimida  em 
insuficiência  cardíaca  é  demonstrada  pelos  efeitos  de  bloqueio 
adrenérgico. A administração aguda de β‐bloqueadores a pacientes com 
insuficiência  cardíaca  resulta  em  reduções  na  função  miocárdica 
diastólica e sistólica associadas com quedas no débito cardíaco e pressão 
arterial, além do aumento na pressão de enchimento. Visto isso, deve ser 
exercida  precaução  na  utilização  desses  agentes,  particularmente  no 
início da terapia. Devido à depleção dos depósitos cardíacos de NE e às 
alterações na via pós‐sináptica de β‐adrenorreceptores, a capacidade do 
miocárdio para produzir AMP cíclico é diminuída. Como conseqüência, o 
coração insuficiente perde um mecanismo compensatório importante. 
• Efeitos  adversos  da  ativação  adrenérgica  ‐  Embora  o  aumento  na 
atividade  adrenérgica  possa  desempenhar  um  papel  compensatório  a 
curto  prazo,  a  ativação  adrenérgica  crônica  pode  ser  deletéria  por  um 
aumento  na  pós­carga,  precipitando  arritmias  cardíacas,  e  talvez  por 
exercer  efeitos  mediados  por  receptores  diretos  e  tóxicos  sobre  o 
miocárdio  em  insuficiência.  A  NE,  atuando  em  receptores  α1‐
adrenérgicos,  induz  o  crescimento  dos miócitos  cardíacos  e  células  de 
músculo liso vascular. Em miócitos cardíacos, este efeito está associado 
com  o  reaparecimento  de  genes  fetais  e  isoformas  fetais  de  proteínas 
envolvidas  no  desenvolvimento  da  forca  contrátil,  regulação  da 
energética do miocárdio e acoplamento excitação‐contração. 
FUNÇÃO PARASSIMPÁTICA NA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA 
O aumento cardíaco, com ou sem insuficiência cardíaca, está associado com 
distúrbios críticos da função simpática e parassimpática. A restrição parassimpática 
na  automaticidade  do  nó  sinoatrial  é  criticamente  reduzida  em  pacientes  com 
insuficiência cardíaca, os quais exibem um menor decréscimo na freqüência cardíaca 
para uma dada elevação da pressão arterial sistêmica do que os indivíduos normais. 
A  função  parassimpática  anormal  também  pode  estar  alterada  no  nível  do  nervo 
periférico e no receptor pós‐sináptico. 
SISTEMA RENINA­ANGIOTENSINA 
Em  estados  de  baixo  débito  cardíaco,  há  a  ativação  do  sistema  renina‐
angiotensina (RAS), que opera em conjunto com o sistema simpático para manter a 
pressão arterial. A atividade elevada de renina no plasma é um achado comum em 
24 
 
insuficiência cardíaca, isto ocorre principalmente por conta da liberação de renina 
ativada  pelo  sistema nervoso  simpático.    Entretanto,  os níveis  elevados de  renina 
não  são  encontrados  em  todos  pacientes  com  insuficiência  cardíaca,  mas, 
principalmente em pacientes sintomáticos. 
Níveis  elevados  de  renina  induzem  níveis  elevados  de  angiotensina  II,  esta 
última é uma potente vasoconstritora periférica e  também induz a  liberação de NE 
pelo  sistema nervoso  simpático  e  aldosterona pelo  córtex  adrenal.  Por  conta disto, 
não  há  de  ser  surpreendente  que  a  interrupção  do  eixo  renina‐angiotensina‐
aldosterona  através  de  um  inibidor  da  enzima  conversora  de  angiotensina  (IECA) 
reduza a resistência vascular sistêmica, diminua a pós‐carga e assim eleve o DC na 
insuficiência cardíaca. 
No miocárdio de animais com hipertrofia experimental do miocárdio ou insu‐
ficiência, há um aumento na expressão da ECA e angiotensinogênio, o substrato para 
a produção de angiotensina I pela renina (Figura 9).  
O  subtipo  de  receptor  de  angiotensina  predominante  na  vasculatura  é  o 
subtipo  angiotensina1.  No  miocárdio  humano,  parece  que  ambos  os  subtipos 
angiotensina1 e angiotensina2 estão presentes, e o receptor angiotensina2 predomina 
numa relação 2:1. O número de receptores de angiotensina1 e angiotensina2 é normal 
em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca  moderada,  mas  regulado  descenden­
temente  em  pacientes  com  estágio  final  de  insuficiência  cardíaca.  A  regulação 
descendente  dos  receptores  de  angiotensina  tem  sido  observada  no miocárdio  de 
pacientes  com miocardiopatia dilatada  isquêmica e  idiopática,  e  associada  com um 
decréscimo no nível de RNAm para estes receptores. 
Em  miócitos  e  fibroblastos  cardíacos  obtidos  de  ratos  neonatais,  a 
angiotensina  causava  a  hipertrofia  do  miócito  e  a  proliferação  de  fibroblastos 
associadas  com  a  indução  de RNAm por  várias  respostas  inicias  de  genes.  Como 
essas observações foram feitas em cultura de células, indicam que a angiotensina pode 
exercer  efeitos  importantes  no  crescimento  e  no  fenótipo  de  células  cardíacas, 
independente das alterações nas condições de carga do coração. 
25 
 
 
 
Figura 9 ­ Sistema Renina‐Angiotensina‐Aldosterona 
VASOPRESSINA (ADH) 
  A vasopressina é um hormônio pituitário que desempenha um papel central na 
regulação do "clearance" da água livre e da osmolalidade do plasma. Ela está elevada 
em  muitos  pacientes  com  insuficiência  cardíaca,  mesmo  após  a  correção  da 
osmolalidade  plasmática.  A  explicação  para  isso  parece  estar  em  um  controle  da 
concentração  de  vasopressina  circulante  anormal  em  pacientes  com  insuficiência 
cardíaca,  exibindo  falha  para  apresentar  uma  redução  normal  dos  níveis  de 
vasopressina com uma redução da osmolalidade. 
  O  decréscimo  na  sensibilidade  dosreceptores  para  estiramento  atrial,  que 
normalmente inibem a liberação de vasopressina com distensão atrial, pode contribuir 
para a elevação nos níveis circulantes deste hormônio. 
Foram identificados dois tipos de receptores para vasopressina (V1 e V2) numa 
variedade de  tecidos. O  "clearance" de água  livre é  regulado através do  receptor V2, 
enquanto o receptor V1 provoca vasoconstricção que, no caso de pacientes com IC, é 
potencializada pela ação das catecolaminas.  
26 
 
PEPTÍDEOS NATRIURÉTICOS 
Três peptídeos natriuréticos — peptídeo natriurético atrial (PNA), peptídeo 
natriurético cerebral (PNC) e peptídeo C natriurético (PCN) — foram identificados 
em seres humanos. O PNA é armazenado principalmente no átrio direito e  liberado 
em  resposta  a  um  aumento  na  pressão  de  distensão  atrial.  Esse  peptídeo  causa 
vasodilatação e natriurese, e contra‐ataca os efeitos de retenção hídrica dos sistemas 
adrenérgico, renina‐angiotensina e vasopressina. 
O PNC é armazenado principalmente no miocárdio ventricular cardíaco e 
pode ser responsivo — ainda que menos que o PNA – a alterações nas pressões de 
enchimento ventricular. O PNC  tem um nível  alto de  homologia  com o PNA no 
nível  estrutural  e,  como  o  PNA,  causa  natriurese  e  vasodilatação.  O  PCN  está 
localizado primariamente na vasculatura. 
Pelo menos  três  receptores para peptídeos natriuréticos (A, B e C)  foram 
identificados.  Os  receptores  A  e  B  mediam  os  efeitos  vasodilatadores  e 
natriuréticos dos peptídeos. O receptor de Tipo C parece agir primariamente como 
um  receptor  de  "clearance",  que,  junto  com  a  endopeptidase  neutra,  regula  os 
níveis disponíveis de peptídeos. 
Os  níveis  de  PNA  e  PNC  circulantes  são  elevados  no  plasma  de  pacientes 
com insuficiência cardíaca, enquanto que o conteúdo atrial de PNA é inalterado. 
A resposta hemodinâmica e natriurética a uma infusão de PNA é atenuada 
em  pacientes  e  animais  experimentais  com  insuficiência  cardíaca.  Entretanto, 
estudos utilizando um antagonista de receptores de PNA em cães com insuficiência 
cardíaca  induzida  por marca‐passo mostraram  que  a  despeito  da  hemodinâmica 
atenuada e dos efeitos renais, o peptídeo continua a exercer um efeito supressor 
importante sobre a atividade do RAS e dos níveis de NE. Além do efeito benéfico de 
peptídeos natriuréticos sobre neuro‐hormônios, função renal e hemodinâmica, há 
evidências  de  que  os  peptídeos  natriuréticos  podem  inibir  diretamente  a 
hipertrofia do músculo liso vascular e fibrose intersticial. 
ENDOTELINA 
Endotelina  é  um  potente  vasoconstritor  peptídeo  liberado  por  células 
endoteliais  através  da  circulação.  Foram  identificados  três  tipos  de  endotelina 
(endotelina ‐ 1, 2 e 3) e dois tipos de receptores (A e B). A liberação de endotelinas 
de células endoteliais in vitro pode ser aumentada por vários agentes vasoativos: 
• Norepinefrina 
• Angiotensina II 
• Trombina 
27 
 
• Citoquinas  
Vários  relatos  têm  documentado  um  aumento  nos  níveis  circulantes  de 
endotelina‐1 em pacientes com insuficiência cardíaca. Como resultado principal 
é  observado  aumento  da  pressão  arterial  sistêmica  e  pulmonar.  Isto  tem 
conduzido à sugestão de que a endotelina desempenha um papel fisiopatológico na 
mediação  de  hipertensão  pulmonar  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca.  Em 
cultura de miócitos cardíacos, a endotelina induz hipertrofia celular associada com 
a indução de genes fetais. 
Antagonistas  de  receptores  de  endotelinas  estão  disponíveis  e  têm  sido 
utilizados  para  demonstrar  os  efeitos  fisiológicos  de  endotelina.  Quando 
administrado  a  ratos  com  insuficiência  cardíaca  após  infarto  do  miocárdio,  o 
antagonista  de  endotelinas  bosentana,  que  bloqueia  os  receptores  de 
endotelinaA  e  endotelinaB,  diminuiu  significativamente  a  pressão  arterial.  Em 
ratos  com  hipertrofia  induzida  por  sobrecarga  de  pressão,  a  administração  do 
antagonista  do  receptor  de  endotelinaA  (BQ123)  inibiu  transitoriamente  a 
hipertrofia  de miócitos  e  preveniu  a  indução  de  genes  fetais.  Essas  observações 
sugerem que os  antagonistas de  receptores de  endotelinas podem ser úteis no 
tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca aguda e crônica. 
CITOCINAS 
Vários  mediadores  de  peptídeos,  incluindo  fatores  de  crescimento  de 
peptídeos  e  citocinas  inflamatórias  tem  sido  demonstrados  causar  hipertrofia 
associada  à  expressão  dos  genes  fetais.  Os  fatores  de  crescimento  de  peptídeos 
podem  ser  expressos  por  vários  tipos  celulares  no  coração,  incluindo  miócitos 
cardíacos e fibroblastos, e há um aumento na expressão de fatores de crescimento 
de peptídeos, em resposta à sobrecarga hemodinâmica e à NE. 
Os níveis circulantes de citocinas  inflamatórias, como o  fator α de necrose 
tumoral (FNT‐α), são aumentados em pacientes com insuficiência cardíaca. O FNT­
α pode induzir a disfunção imediata do miocárdio e tem sido demonstrado atenuar 
o trânsito do cálcio intracelular  in vitro.Tem sido demonstrado que a citocina 
inflamatória β1 interleucina induz hipertrofia do miócito in vitro, e pode induzir a 
expressão  de  óxido  nítrico  sintase  (ONS),  resultando  em  níveis  aumentados  de 
óxido nítrico, atenuando a resposta  inotrópica positiva a agonista β‐adrenérgicos 
em miócitos cardíacos. 
Citocinas  podem  exercer  efeitos  prolongados  na  remodelação  do  tecido 
miocárdico e vascular e assim contribuir para a fisiopatologia da insuficiência 
cardíaca  crônica (Figura 10). É de interesse que vesnarinona, um agente oral 
que  parece  melhorar  a  sobreviria  em  pacientes  com  insuficiência  cardíaca,  seja 
demonstrada diminuir os níveis plasmáticos de citocinas inflamatórias. 
28 
 
 
Figura 10 ‐ Papel central de interações célula a célula na remodelação miocárdica. Miócitos e não 
miócitos  (por  exemplo,  fibroblastos,  células  endoteliais,  células  de  músculo  liso  vascular)  no 
miocárdio produzem um número de mediadores intercelulares, muitos dos quais são citocinas, que 
podem atuar em células vizinhas de uma maneira autócrina ou parácrina, desempenhando um papel 
central  na  modulação  de  alterações  na  estrutura  e  função  do  miocárdio.
29 
 
 
REFERÊNCIAS 
GUYTON, A.C. Textbook of medical physiology. 11.ed. Elsevier Inc, 2006. 
KATZ,  A.M.  Heart  Failure:  Pathophysiology,  Molecular  Biology  and  Clinical 
Management. Lippincott Williams & Wilkins, 1999.

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