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Resenha Thomas J. Watson IBM e a Alemanha Nazista

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
Pós-graduação em Políticas e Gestão em Segurança Pública 
Resenha do Caso – Thomas J. Watson, IBM e a Alemanha Nazista
Juliano Vidolin da Silva
Mat. 201804252832
Trabalho da disciplina de Direitos Humanos na Segurança Pública
Tutor: Prof. Roberto Cavalcanti Vianna
Curitiba
2018
THOMAS J. WATSON, IBM E A ALEMANHA NAZISTA
Ao final do século XIX, o estatístico Herman Hollerith projetou uma máquina automatizada capaz de processar dados censitários com maior celeridade, fato este comprovado no censo dos Estados Unidos realizado em 1890. As tabulações foram finalizadas dois anos antes do previsto, gerando uma economia de US$ 5 milhões aos cofres do governo. 
Em 1896, Hollerith criou a Tabulating Machine Company (TMC), firmando posteriormente contratos com o governo russo e de diversos países europeus, além de computar novamente o censo do EUA em 1900 e empregar suas maquinas no governo estadual da Prússia (Alemanha) na virada do século. Buscando a expansão dos negócios, Hollerith fez acordos com novos empreendedores estrangeiros que buscavam oportunidades de licenciamento e com isso, em 1910, foi criada a Dehomag por Willy Heidinger, que pagava royalties a TMC pela importação das máquinas dos EUA e uma porcentagem sobre a receita dos aluguéis.
Em 1911, a TMC foi vendida para Charles Flint, que a fundiu com outras duas companhias, formando a Computing Tabulating Recording Co., conhecida apenas pela sigla CTR, onde Hollerith permaneceu como consultor. Três anos mais tarde, Thomas J. Watson assumiu o cargo de diretor-geral da CTR e, em 1915, tornou-se presidente da empresa, estabelecendo normas de trabalho absolutamente inovadoras para a época, renovando também a forma de negócio da corporação, introduzindo generosos incentivos de vendas com enfoque em serviço ao cliente. Os produtos ganhavam maior qualidade, surgiram novas máquinas e com elas novos escritórios de vendas e mais vendedores. Mesmo sendo uma empresa de porte moderado, em fevereiro de 1924 a CTR teve seu nome alterado para International Business Machines Corporation, pois Watson decidiu que o antigo nome do empreendimento não era compatível com o tamanho das ambições.
Em 1917, quando o EUA entrou na Primeira Guerra Mundial, os suprimentos para Dehomag foram cortados e as dívidas com a CTR aumentaram exponencialmente. Com a impossibilidade de cumprir suas obrigações, Watson negociou a troca das dívidas por 90% das ações da subsidiária. Heidinger continuou na administração da empresa, e foi autorizado a pôr Watson a investir no desenvolvimento de novos produtos. A Dehomag, ao comando de Heidinger, cresceu até ser responsável por mais da metade das vendas da IBM fora dos EUA.
Com a chegada de Hitler ao poder em 1933, diversos censos, que questionavam a religião e a língua nativa dos cidadãos prussianos, foram realizados e tinham de ser completados em apenas quatro meses. Para isso, o governo concedeu a Dehomag um contrato no valor de RM 1,35 milhão, afim de que esta missão fosse cumprida conforme exigido. Para celebrar tal contrato com o novo governo e presenciar o sistema em funcionamento, Watson viajou à Alemanha ainda em 1933, investindo RM 7 milhões para expandir as operações e aprovando também a construção de uma nova fábrica próximo à Berlim para produção de máquinas. 
Antes de ser eleito através de uma série de manobras políticas, Hitler já havia expressado seu nacionalismo extremo e aversão à vários grupos étnicos, políticos e religiosos, sobre tudo com membros da religião judaica. Judeus foram intimidados, perseguidos, violentados, expulsos dos cargos públicos e tiveram seu direito de cidadania suprimido através das Leis de Nuremberg, que proibia também relações sexuais entre “arianos” e “não-arianos” (além de judeus, grupo incluía ciganos, africanos e praticamente todos que não tinham origem no norte da Europa). Empresas estrangeiras foram coagidas a destituir judeus da administração de suas afiliadas alemãs: a Unilever transferiu alguns para Holanda; a Coca-Cola, após ser atacada pela concorrência por ter um membro do conselho judeu e as vendas caírem, promoveu seu produto em diversos grandes eventos alemães; o Harvard College implementou um novo sistema de admissão, reduzindo a porcentagem de judeus. 
Com o rearmamento em larga escala e a reintrodução do alistamento obrigatório, Hitler renegou as cláusulas do Tratado de Versalhes – tratado de paz assinado pelas potências europeias que encerrou oficialmente a Primeira Guerra Mundial, onde foram impostas severas sanções pecuniárias à Alemanha e seus aliados, comprometendo a sua economia, elevando a inflação a índices astronômicos –, desenvolveu novas marinhas e aeronáuticas, enviando, em 1936, suas tropas a Rhineland, declarada zona desmilitarizada no Tratado de Versalhes. Com o aumento nas despesas do governo, as vendas da Dehomag cresciam proporcionalmente.
Devido ao sucesso da Dehomag e outras afiliadas, o presidente da IBM, Watson, se tornou o executivo mais famoso dos EUA. Além de sucesso no mundo dos negócios, Watson desejava aconselhar presidentes e influenciar grandes eventos mundiais. Tornou-se assim o presidente da CCI (Câmara do Comercio Internacional), que pregava também a “paz mundial através do comercio mundial”. Em junho de 1937, o encontro bienal da CCI foi sediado em Berlim, decisão essa não aprovada por diversos empreendedores bem-sucedidos. Alguns desses empreendedores não compareceram ao evento como Edward Filere, afirmando que a situação na Alemanha era um crime contra a civilização.
Ainda assim, Watson e muitos líderes de negócio de todo mundo, incluindo 95 executivos estadunidenses, participaram do encontro, onde assistiram a discursos de notáveis políticos alemães. Neste evento, Watson recebeu a recém-criada medalha de honra Grã-Cruz da Ordem da Águia Alemã, que reconhecia os serviços estrangeiros “amigáveis” ao povo alemão, agradecendo publicamente a Hitler pelo prêmio.
No terceiro dia do congresso, Watson reuniu-se com Hitler e conversaram sobre negócios e questões mundiais. Watson saiu da reunião com boas impressões, acreditando ter persuadido Hitler a focar sua atenção na prosperidade econômica, após anos de tensão decorrente ao rearmamento alemão e perseguição a judeus e opositores do regime nazista. 
Como temos conhecimento, a Segunda Guerra Mundial foi deflagrada em 1939, após a invasão da Polônia pela Alemanha, terminando com a rendição alemã em maio de 1945 e do Japão em setembro do mesmo ano. Estima-se que a guerra deixou, entre civis e militares, 50 milhões de mortos e 35 milhões de feridos. Entre as consequências e impactos da guerra podemos destacar o julgamento de oficiais nazistas sob acusação de crimes contra a humanidade; a Guerra Fria (disputa estratégica e conflitos indiretos entre os Estados Unidos e a União Soviética); e, com o objetivo de mediar conflitos entre países a fim de evitar novas guerras, ainda em 1945, ocorreu a formação da Organização das Nações Unidas (ONU), que após três anos, instituiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), estabelecendo formalmente, pela primeira vez, a proteção universal dos direitos humanos.
A DUDH enfatizava que, entre outras coisas, o ser humano não é algo descartável, a necessidade de universalização e proteção dos direitos humanos e a idéia de que o ser humano, por sua natureza, é titular de direitos que devem ser observados independentemente dos regimes político-sociais aos quais esteja inserido. Neste sentido, Valério de Oliveira Mazzuoli (2012, p. 832) diz sobre a concretização desses direitos que:
Trata-se, do direito pós-guerra, nascido em decorrência dos horrores cometidos pelos nazistas durante este período (1939-1945), e que foi marcado por inúmeras violações de direitos humanos. (...) O legado do Holocausto para a internacionalização dos direitos humanos, portanto constituiu na preocupação que gerou na consciência coletiva mundial da falta de uma arquiteturainternacional de proteção desses direitos.
 
Somando-se 30 artigos, a Declaração formalizava questões sociais, econômicas e culturais, dando abertura para a criação de outros pactos internacionais sobre os Direitos Humanos: o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que foi aprovado em 1966 e entrou em vigor em 23 de março de 1976, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, aprovado em 1966 e entrou em vigor em 03 de janeiro de 1976.
Após a Declaração Universal dos Direitos Humanos e as diversas ações para a promoção desta, os Estados se organizaram com o intuito de inseri-las em suas constituições, seja por leis, emendas, estatutos ou outras maneiras de torna-las válidas. No Brasil, uma vez que a Constituição vigente é posterior a criação DUDH, foi inserida na própria Constituição Federal de 1988 os valores, direitos e obrigações do estado e da sociedade em promover esses direitos.
A Constituição Federal (CF) assegura vários direitos fundamentais. No art. 1°, a Constituição da República emprega o princípio da cidadania (inciso II), dignidade da pessoa humana (inciso III) e os valores sociais do trabalho (inciso IV). A cidadania “expressa um conjunto de direitos que dá a pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo”, conforme diz Dallari (2004, p. 22).
Pode-se mencionar além dos direitos citados no art. 1°, outros direitos, tais como o direito à vida, a privacidade, a igualdade, a liberdade (e aqui encontra-se uma série de direitos como a liberdade de expressão, a locomoção, a religião, a segurança pessoal, entre outras), à informação, à representação coletiva, à associação, a propriedade e seu uso social, à cultura, à educação, à saúde, ao meio ambiente equilibrado, ao asilo, ao devido processo legal, à presunção de inocência, entre outros. O art. 5° da Constituição Federal (1988) afirma que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, (...)”, além disto o art. 6º elenca como “(...) direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, (...)”. Cada país é responsável por garantir os direitos humanos dentro de seu território. Mas na fiscalização destes direitos, atuam também instituições de direitos humanos, organizações profissionais, instituições acadêmicas, grupos religiosos, organizações não governamentais, entre outros.
Em 2017, através de decreto presidencial, foi instituído o Ministério dos Direitos Humanos (MDH), responsável pelas políticas de promoção e proteção aos Direitos Humanos no Brasil. O decreto 9.122, de 9 de agosto de 2017 (Anexo1, Capitulo1, p.3), determina como competências do MDH:
I - formulação, coordenação e execução de políticas e diretrizes voltadas à promoção dos direitos humanos, incluídos:
a) direitos da cidadania;
b) direitos da criança e do adolescente;
c) direitos do idoso;
d) direitos da pessoa com deficiência;
e) direitos da população negra; e
f) direitos das minorias;
II - articulação de iniciativas e apoio a projetos voltados à proteção e à promoção dos direitos humanos;
III - promoção da integração social das pessoas com deficiência;
IV - exercício da função de ouvidoria nacional em assuntos relativos aos direitos humanos, da cidadania, da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa com deficiência, da população negra e das minorias;
V - formulação, coordenação, definição de diretrizes e articulação de políticas para a promoção da igualdade racial, com ênfase na população negra, afetados por discriminação racial e demais formas de intolerância;
VI - combate à discriminação racial e étnica; e
VII - coordenação da Política Nacional da Pessoa Idosa, prevista na Lei nº 8.842, de 4 de janeiro de 1994.
Mesmo com a criação de diversos programas e propostas para proteção dos Direitos Humanos, o Brasil enfrenta vários desafios nesta área. Um destes é a compreensão por parte da população brasileira da atuação dos Direitos Humanos, que acreditam que os beneficiados por este sistema são apenas pessoas que não o merecem, como criminosos e terroristas. Este resultado foi apontado pela pesquisa realizada pela “Human Rigths in 2018 – Global Advisor” do instituto Ipsos, obtidos pela BBC Brasil. De acordo com o levantamento, 74% dos entrevistados acreditam que algumas pessoas tiram vantagem injusta sobre direitos humanos. Além disso, para 66%, o governo brasileiro não garante integralmente os direitos humanos da população. 
Outros desafios que permeiam nossa sociedade estão ligados à segurança e a saúde. Na segurança, o sistema penitenciário é considerado falido há algum tempo. O procurador-geral de Justiça de Alagoas, Alfredo Gaspar de Mendonça, declarou que "O sistema prisional brasileiro está falido (...)”. A maioria das prisões estão lotadas e não oferecem as condições de higiene mínima adequada aos detentos. Estupro na prisão e espancamentos por agentes penitenciários não são um fato isolado. “Nós temos 360 mil vagas e quase 700 mil presos, uma superlotação. As condições dos presídios são péssimas”, afirmou o Ministro do STJ, Gilmar Mendes (2017). Além disso, existem mais de 13,4 mil adolescentes detidos em centros de detenção para menores, de acordo com o Ministério da Justiça.
Quanto a saúde, considerada como direito de todos e dever do Estado, o Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecido na Constituição Federal e posteriormente regulado pela Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990, deve atender, obrigatoriamente e de forma gratuita, qualquer cidadão. Contudo, com as deficiências do SUS – como longas filas para serem atendidos, indisponibilidade de medicamentos e recursos – a saúde acaba sendo mais financiada pelas famílias brasileiras do que pelo Estado. Conforme dados do IBGE (2017, p. 19), cada cidadão desembolsou, em média, R$ 1.538,79 por remédios e serviços médicos privados em 2015, enquanto o consumo per capita da União com os mesmos itens ficou em R$ 1.131,94. Proporcionalmente, as famílias gastam 35,9% a mais que o Estado pelo acesso a saúde.
Com todas essas informações, podemos dizer que os direitos humanos não são apenas um conjunto de princípios morais que devem informar a organização da sociedade e a criação do direito. Enumerados em diversos tratados internacionais e constituições, asseguram direitos aos indivíduos e estabelecem obrigações jurídicas concretas aos Estados. É preciso buscar uma verdadeira conscientização da sociedade, no sentido de que os direitos humanos devem ser resguardados, independentemente de raça, cor, religião ou orientação sexual, pois somos todos diferentes, não existe ninguém igual! E a essência do princípio da igualdade está exatamente em respeitar as diferenças existentes, dando a todos, sem distinção, tratamentos iguais, pois, antes de qualquer coisa, somos seres humanos!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>
BRASIL. Conta-satélite de saúde: Brasil: 2010-2015. Rio de Janeiro: IBGE, 2017. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101437.pdf>. Acesso em: 15 Agosto 2018.
BRASIL. Decreto nº 9.122, de 10 de agosto de 2017. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério dos Direitos Humanos, remaneja cargos em comissão e funções de confiança e substitui cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS por Funções Comissionadas do Poder Executivo -FCPE. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 ago. 2017. Seção 1, p. 2. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/156457147/dou-secao-1-10-08-2017-pg-3?ref=next_button>.Acesso em: 14 Agosto 2018.
BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos. Institucional. Brasília. Disponível em: <http://www.mdh.gov.br/informacao-ao-cidadao/institucional>. Acesso em: 14 Agosto 2018.
CARDOSO, Luisa Rita. Segunda Guerra Mundial. Disponível em: <https://www.infoescola.com/historia/segunda-guerra-mundial/>. Acesso em: 13 Agosto 2018.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos e cidadania. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2004.
G1. 'Sistema prisional está falido', diz procurador-geral de Justiça de AL. TV Gazeta Alagoas. Disponível em: <http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2017/01/sistema-prisional-esta-falido-diz-procurador-geral-de-justica-de-al.html>. Acesso em: 15 Agosto 2018.
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