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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA (UEPG) SETOR DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE MEDICINA ALISSON FERREIRA PUPULIM ALLAN CATARINO KISKA TORRANI CARLOS RORY PUCCI FILHO MAKI CAROLINE NAKAMURA USOS CLÍNICOS DA HEPARINA E VARFARINA NO TRATAMENTO DA TVP PONTA GROSSA-PR 2014 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA (UEPG) SETOR DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE MEDICINA ALISSON FERREIRA PUPULIM ALLAN CATARINO KISKA TORRANI CARLOS RORY PUCCI FILHO MAKI CAROLINE NAKAMURA USOS CLÍNICOS DA HEPARINA E VARFARINA NO TRATAMENTO DA TVP PONTA GROSSA-PR 2014 Trabalho apresentado como forma de obtenção de nota parcial na disciplina de Terapêutica Médica do curso de Medicina da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), sob a coordenação da Prof. Dr. Fabiana Postiglione Mansani e colaboração do Prof e Dr. Ricardo Zanetti Gomes. RESUMO A trombose venosa profunda (TVP) é uma afecção cuja característica é a obstrução do fluxo sanguíneo, sendo a embolia pulmonar (EP) a complicação mais grave. A profilaxia medicamentosa é usada conforme a necessidade do paciente, e visa intervir na cascata de coagulação, a fim de evitar possíveis complicações do quadro. Objetivo: Esclarecer dúvidas, surgidas após a realização da revisão literária, sobre os anticoagulantes heparina e varfarina no tratamento da trombose venosa profunda (TVP). Metodologia: Foi realizado busca na literatura médica por meio da qual selecionaram-se 6 livros do acervo da biblioteca da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), além de 12 artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais selecionados por meio dos banco de dados eletrônicos, cujos critérios de inclusão foram artigos que apresentavam informações diretas sobre tema deste trabalho e o de exclusão foram textos não disponibilizados gratuitamente. Foram elaboradas questões referentes as dúvidas da equipe, sendo realizadas para o Dr. e Prof. Ricardo Zanetti Gomes no dia 7/11/2014 as 17h06min no bloco M do campus de Uvaranas da Universidade. A conversa foi gravada, com o consentimento de todos os envolvidos, usando um iPhone 4. Discussão: A heparina e a varfarina são os medicamentos de escolha na profilaxia da TVP. A heparina atua potencializando a ação da antitrombina e a varfarina interrompe o ciclo da vitamina K. Baseados em conhecimentos clínicos a varfarina se mostra mais eficiente na profilaxia do que a heparina. Quando comparado a heparina não fracionada (HNF) com a de baixo peso molecular (HBPM), estas são mais usadas devido a possibilidade de administração via subcutânea e apenas duas vezes ao dia, sendo de melhor adesão do paciente. Em todos os casos, deve- se sempre avaliar o efeito anticoagulatório dos fármacos e o estado do paciente, a fim de evitar possíveis complicações. Conclusão: A profilaxia da TVP é realizada utilizando principalmente a heparina e a varfarina. A primeira é usada tratamentos de curta duração e a segunda para tratamentos mais longos. Apesar disso, a varfarina apresenta muitas interações medicamentosas e em um primeiro momento é pró- coagulante. Os exames para o controle das doses dos dois fármacos são diferentes, para a heparina usa-se o kPTTa e para a varfarina o TAP. A escolha do melhor fármaco depende do estado do paciente. Sumário RESUMO ....................................................................................................................................3 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................5 2. OBJETIVO .........................................................................................................................6 3. METODOLOGIA ................................................................................................................6 4. REVISÃO LITERÁRIA ......................................................................................................7 4.1 COAGULAÇÃO SANGUÍNEA ................................................................................7 4.1.1. CONSTRIÇÃO VASCULAR ............................................................................7 4.1.2. FORMAÇÃO DO TAMPÃO PLAQUETÁRIO ................................................8 4.1.3. CASCATA DE COAGULAÇÃO SANGUÍNEA..............................................8 4.1.4. VITAMINA K E SEU PAPEL NA COAGULAÇÃO .....................................12 4.2. TROMBOSE VENOSA PROFUNDA - TVP .........................................................13 4.3. FÁRMACOS ANTICOAGULANTES ....................................................................15 4.3.1. HEPARINAS ....................................................................................................16 4.3.2. VARFARINA ....................................................................................................20 5. ENTREVISTA ..................................................................................................................24 6. DISCUSSÃO ....................................................................................................................26 7. CONCLUSÃO ..................................................................................................................28 7. REFERÊNCIAS ...............................................................................................................29 1. INTRODUÇÃO A trombose venosa profunda (TVP) é definida como uma condição na qual ocorre a obstrução do fluxo sanguíneo pela formação de um trombo nas veias do sistema profundo, acometendo mais comumente os membros inferiores, mas, também, podendo ocorrer nas veias jugulares internas, seios cavernosos, membros superiores, bem como nas veias cavas (1). A TVP é uma doença de alta prevalência e geralmente ocorre devido a complicações de outros processos patológicos como neoplasias e as infecções, pós-operatório de grandes cirurgias, traumas e imobilização prolongada dos membros inferiores, porém a TVP também pode ocorrer sem associação a qualquer outra doença como nas trombofilias hereditárias (1,2). O quadro clínico da doença depende das veias e da extensão do trombo. Os sinais e sintomas mais frequentes são: dor, edema, aumento da cianose e dilatação das veias superficiais. Nos membros inferiores a dor ocorre geralmente de forma localizada na panturrilha ou na coxa (1). Os sintomas relacionados à trombose venosa profunda são responsáveis por causar um grande desconforto ao paciente afetado, porém, o mais relevante desta doença são as suas complicações, principalmente o tromboembolismo pulmonar, o qual se caracteriza pelo desprendimento do trombo das veias profundas e migração do mesmo através da corrente sanguínea até atingir a artéria pulmonar onde provoca a obstrução da circulação e infarto pulmonar (1). Reduzir a incidência de trombose venosa profunda e posteriormente um eventual tromboembolismo pulmonar é de fundamental importância na prática médica, principalmente a série de complicações que tais vão acarretar ao paciente, bem como podendo levá-lo ao óbito; para isso utiliza-se principalmente a profilaxia medicamentosa (3,4). A profilaxia medicamentosa será utilizada de acordo com a necessidade de cada paciente, intervindo na cascata de coagulação da maneira mais adequada possível,evitando complicações mais serias relacionada a tromboembolismos venosos (2,3,4). 6 2. OBJETIVO Esclarecer dúvidas, surgidas após a realização da revisão literária, sobre os anticoagulantes heparina e varfarina no tratamento da trombose venosa profunda (TVP). 3. METODOLOGIA Para a elaboração do trabalho foi realizada consulta à literatura médica através de meios físicos e eletrônicos. A consulta por meios físicos foi realizada no acervo da biblioteca do campus de Uvaranas da Universidade Estadual de Ponta Grossa na seção de livros de Farmacologia, representando 6 das referências utilizadas. A consulta por meios eletrônicos foi realizada nas bases de dados “SCIELO”, “MEDLINE E “LILACS”. Nas bases “MEDLINE” E “LILACS” foram utilizados como descritor “Heparina”, “Varfarina”, “Cascata Coagulatória”. A partir dos resultados obtidos, foram lidos os títulos dos 30 primeiros artigos encontrados de cada descritor e foi utilizado como fator de inclusão os artigos que possuíam os dados necessários e como critério de exclusão a indisponibilidades de textos completos. Na base “SCIELO”, foi utilizado os mesmos descritores, foram lidos os títulos dos 9 primeiros artigos, onde foi utilizado como fator de inclusão artigos que apresentavam informações diretas sobre os fármacos em questão e sobre a fisiologia da cascata coagulatória. Foram selecionados 12 artigos publicados em periódicos, revistas nacionais dissertação de mestrado, somando um total de 18 referências físicas e eletrônicas. Foram elaboradas quatro questões que abordavam dúvidas da equipe sobre os fármacos estudados em questão, e estas foram feitas ao Dr. Ricardo Zanetti Gomes no dia 17/11/2014 as 17h06min no bloco M do campus de Uvaranas da Universidade. A entrevista foi gravada, com o consentimento de todos os envolvidos, por meio de um iPhone 4, as informações coletadas foram transcritas e encontram-se anexas neste trabalho. 7 4. REVISÃO LITERÁRIA 4.1 COAGULAÇÃO SANGUÍNEA O sistema circulatório constitui de um sistema fechado de vasos que impede que seu conteúdo, o sangue, escape para banhar diretamente os tecidos (5). O sangue permanece líquido dentro dos vasos, mas quando estes são lesionados, ele coagula rapidamente evitando seu extravasamento. Eventos fisiológicos e bioquímicos que envolvem a dinâmica do fluxo sanguíneo, componentes do endotélio vascular, fatores de coagulação, plaquetas e mecanismos fibrinolíticos interagem para evitar a perda de sangue (5). Em situações normais, existe um equilíbrio entre coagulação e fibrinólise, a fim de impedir a formação de coágulos. Quando esse equilíbrio é rompido, têm- se quadros de trombose (6). A formação do coágulo ocorre em quatro etapas. Primeiramente, tem-se a vasoconstrição localizada, que é decorrente de reflexos neurogênicos e liberação de substâncias vasoativas derivadas do endotélio, como a endotelina. Em seguida, ocorre a hemostasia primária, que consiste na ativação das plaquetas. Essas células mudam de morfologia e passam a liberar substâncias presente em seus grânulos. Esses agentes químicos induzem o recrutamento de mais plaquetas e, por conseguinte, permitem uma maior adesão destas à matriz subendotelial, fazendo com que elas se agreguem no local lesionado. Os próximos passos visam à formação de um tampão estável e permanente. A terceira etapa é a cascata de coagulação cujo resultado final é a ativação da trombina e a quarta etapa envolve a ação da trombina, que consiste em conversão de fibrinogênio insolúvel em fibrina solúvel (7,8). 4.1.1. CONSTRIÇÃO VASCULAR Logo após a lesão do vaso sanguíneo ocorre contração da musculatura lisa da parede do vaso sanguíneo com intuito de reduzir a hemorragia. Essa contração é resultante do espasmo miogênico local, liberação de substâncias 8 vasoativas locais provenientes dos tecidos lesados e das plaquetas e reflexos nervosos (5,8). 4.1.2. FORMAÇÃO DO TAMPÃO PLAQUETÁRIO As plaquetas ao entrarem em contato com o colágeno exposto, após a lesão endotelial, modificam suas características morfológicas tomando formas irregulares e com vários pseudópodes (5,8). As proteínas contráteis das plaquetas se contraem o que facilita a liberação de grânulos repletos de ADP, histamina, serotonina, enzimas que promovem formação de tromboxano A, fosfolipídios plaquetários (5). Esses eventos são importantes para que um número cada vez maior de plaquetas seja atraído para o local lesionado e para que elas se aglutinem formando um tampão plaquetário (5,8). Inicialmente ele fica solto, mas com os outros eventos da coagulação ocorre a formação de filamentos de fibrina que se ligam às plaquetas formando um tampão compacto (8). 4.1.3. CASCATA DE COAGULAÇÃO SANGUÍNEA A cascata de coagulação envolve complexas interações entre enzimas plasmáticas e seus cofatores, onde ocorre uma sequência de ativações, por meio das quais o substrato para cada enzima é uma pró-enzima que é ativada para atuar na próxima etapa da reação (5,8,9 Nas últimas décadas, ocorreram grandes avanços na compreensão da fisiologia desse processo. Em 1964, Macfarlane e Davie & Ratnoff propuseram a hipótese da “cascata”. Ela é dividida em três vias: intrínseca, extrínseca e comum (9). A via intrínseca é uma série de reações ativadas quando o sangue entra em contato com a superfície lesionada. A via extrínseca é ativada quando a lesão do vaso sanguíneo resulta em liberação de fatores teciduais (5,6,7,8,9). 4.1.3.1. VIA EXTRÍNSECA A via extrínseca tem como ativador o fator tecidual (FT). Este fator é uma glicoproteína de membrana expressa em fibroblastos da camada 9 subendotelial. Entretanto, ele não é expresso pelas células que estão em contato direto com o sangue, portanto só são ativados quando o vaso é lesionado. O fator tecidual funciona como um receptor para o fator VII da coagulação. O sangue contém fator VII e em menor quantia VIIa, ambos são capazes de se ligarem ao FT. O complexo FT-FVII tem a capacidade de se auto-ativar transformando-se no complexo FT-FVIIa. O complexo FT-FVIIa ativa o fator IX e o fator X (5,6,8,10). Pequenas quantidades de trombina são sintetizadas a partir do complexo “protromboquinase” extrínseco (FatorXa/FatorVa), mas uma vez iniciado a produção de trombina, esta é capaz de ativar o fator V em fator Va, e o fator VIII em fator VIIIa. Essas reações são essenciais para a formação do complexo tenase intrínseco (fator IXa/fator VIIIa) que converte fator X em fator Xa, e para a geração do complexo “protrombinase” (fator Va/fator VIIIa) que converte protrombina em trombina. O complexo fator IXa/fator VIIa ativa o fator X de forma 50 vezes mais efetiva do que o complexo FT/FVIIa (5,10). Figura 1: representação esquemática dos completos pró-coagulantes. 10 Figura 2: via extrínseca para o desencadeamento da coagulação sanguínea. 4.1.3.2 VIA INTRÍNSECA A via intrínseca inicia com o trauma sanguíneo. O contato do sangue com o colágeno ativa o fator XII. O trauma também lesa as plaquetas fazendo com que elas liberem fosfolipídios plaquetários que contém fator plaquetário 3- uma lipoproteína- que tem função importante nas reações subsequentes (5,8). O fator XIIa ativa o fator XI sendo necessário para essa reação a presença de cininogênio de alto peso molecular (APM), além disso ela é 11 acelerada pela pré-calicreína. O fator XIa atua, então, como uma enzima catalisando a conversão do fator IX em fator IXa. Este, juntamente com o fator VIIIa, fosfolipídios plaquetáriose fator plaquetário 3, ativa o fator X (5,8). Figura 3: via intrínseca para o desencadeamento da coagulação. 4.1.3.3. VIA COMUM A via comum se inicia com a ativação do fator X por meio das vias intrínsecas e extrínseca. O fator Xa combina-se com o fator V e com plaquetas ou fosfolipídios teciduais para formar o complexo protrombinase ou complexo ativador da protrombina. Esse complexo na presença de íons cálcio converte o fator II (protrombina) em fator IIa (trombina) (5,8). A trombina é uma enzima que remove peptídeos do fator I (fibrinogênio) dando origem à monômeros de fibrina. Esses monômeros se polimerizam 12 formando, em questão de segundos, longas fibras de fibrina que compõe o retículo do coágulo sanguíneo. Em um primeiro momento, o retículo é mantido por ligações fracas de ponte de hidrogênio, dessa forma ocorre certa vulnerabilidade do coágulo, podendo se romper facilmente. As ligações entre os monômeros de fibrina são fortalecidas pela ação do fator XIII (fator estabilizador de fibrina) que é ativado pela própria trombina. O fator XIII na presença de íons cálcio cria ligações covalentes entre os monômeros de fibrina formando, assim, um coágulo de fibrina insolúvel (5,8). Figura 4: esquema para a conversão da protrombina em trombina. 4.1.4. VITAMINA K E SEU PAPEL NA COAGULAÇÃO A vitamina K, descoberta por Henrick Dam em 1929, é importante em vários processos biológicos, tanto para pequenas bactérias como para o ser humano e plantas. Ela pode ser encontrada em associação com duas substâncias naturais, sendo denominada de vitamina K1 (fitonadiona ou floquinona) – encontradas em plantas – e vitamina K2 (menaquinonas) – produzida por bactérias da microbiota intestinal humana. Tanto a fitonadiona como as menaquinonas participam da biossíntese das formas γ- 13 carboxiglutamato (Gla) dos fatores II, VII, IX e X da coagulação, das proteínas anticoagulantes C e S, e da proteína Z (um cofator inibidor do fator Xa), através do processo de γ-carboxilação (6,11). A γ-carboxilação é um processo no qual a vitamina K serve de cofator para a γ-glutamil carboxilase, que converte resíduos de glutamato (Glu) dos fatores de coagulação e de outras proteínas em resíduos de γ- carboxiglutamato (Gla), transformando-os em proteínas ativas. Nesse processo, a vitamina K é utilizada na forma de hidroquinona da vitamina K reduzida (HK2). Além da formação de Gla ocorre a síntese de 2,3-epoxido de vitamina K, que sofre ação da 2,3-epóxido redutase e volta a formar a HK2. A conversão Glu Gla permite a interação dos fatores de coagulação com o Ca2+ e, assim, a interação com fosfolipídios das membranas plaquetárias (6,11). Figura 5: Papel da vitamina K na γ-carboxilação. Glu: glutamato; Gla: γ- carboxiglutamato; HK2: hidroquinona da vitamina K reduzida. Ter consciência desse papel da vitamina K sobre a cascata de coagulação é de importância quando se discute a utilização dos anticoagulantes orais como a varfarina e a cumarina, que são antagonistas da vitamina K (6,11). 4.2. TROMBOSE VENOSA PROFUNDA - TVP A trombose venosa profunda (TVP) é uma doença que acomete principalmente os membros inferiores e é caracterizada pela formação aguda de trombos em veias profundas desses membros(12). 14 Cerca de 900.000 casos de TVP são estimados anualmente apenas nos Estados Unidos (13), com uma mortalidade anual de 50.000 pessoas devido a complicação de maior importância dessa afecção, a embolia pulmonar (EP) (12). Outra complicação da TVP é a síndrome pós-trombótica, na qual ocorre lise incompleta do trombo, fazendo com que esse se desenvolva ao longo de vários meses, levando a uma hipertensão venosa da veia inicialmente acometida ou em segmentos venosos não diretamente envolvidos na TVP prévia (14). Os fatores de risco para o desenvolvimento de TVP são aqueles em que aumentam as chances de ativação da cascata coagulatória. Entre eles estão idade, imobilização, histórico familiar e prévio de TVP, plásica), insuficiência cardíaca, uso de anticoncepcionais e terapias de repocirurgias de duração longa, câncer (manifestando como uma síndrome paraneosição hormonal (12). Além desses fatores, há também alguns fatores hereditários que estão diretamente envolvidos na TVP, dentre os quais estão: mutação G20210A no gene da protrombina, mutação no fator V (chamada de fator V de Leiden), deficiência heterozigota da proteína C, deficiência autossômica dominante da proteína S, e a deficiência autossômica dominante da antitrombina (13). Segundo a tríade de Virchow (12), os fatores de importância primária para desenvolvimento da trombose venosa profunda são: anormalidades no fluxo sanguíneo, como a estase; anormalidade no sangue, como alterações nos sistemas de coagulação ou no fibrinolítico; e lesão vascular. O endotélio produz, em condições normais, substâncias anticoagulantes como trombomodulina, proteína C, heparina sulfato, dermatan sulfato e ativador de plasminogênio tecidual. Em estados de distúrbios hemodinâmicos, ocorre ativação do fator de ativação plaquetário, endotelina-1, fatores coagulantes (fator de von Willebrand e fator V) e fator tecidual. A inflamação está relacionada diretamente com a trombose, uma vez que há aumento do fator tecidual, da reatividade plaquetária e do fibrinogênio, além de queda da trombomodulina e da atividade da proteína C (13). A estase venosa possui influência sobre a trombogênese devido a distúrbios do fluxo laminar, depósito de hemácias, plaquetas e leucócitos nos seios valvulares, aumento da concentração de fatores de coagulação ativados e de ADP, diminuição da chegada de fatores anticoagulantes e hipóxia do endotélio (12). 15 Os estados de hipercoagulabilidade ou trombofilias são situações em que ocorrem aumento das chances de coagulação sanguínea, seja por fatores genéticos, como no caso de mutações, seja por estados fisiológicos (exemplo, gravidez), patológicos (exemplo, câncer ou alterações hepáticas) ou terapêuticos (exemplo, uso de esteroides). As trombofilias também podem ocorrer pela diminuição da atividade fibrinolítica, como no caso de pós- operatório imediato (12). A presença de trombo venoso produz alterações locais e sistêmicas a partir de três mecanismos básicos: obstrução venosa, inflamação e desprendimento total ou parcial dos trombos. A obstrução venosa leva a aumento da pressão venosa e, por consequência, das pressões venular e capilar, fazendo com que haja acúmulo de líquido no meio intersticial (edema) (12). A obstrução venosa também pode fazer com que ocorra alterações do fluxo arterial, como na flegmasia alba dolens, em que ocorre palidez do membro causada por espasmo arterial, e a flegmasia cerúlea dolens, na qual há cianose devido ao impedimento do fluxo arterial levando a uma isquemia (14). A inflamação ocorre de maneira secundária à trombose, podendo ser discreta, com lesões focais no endotélio, ou intensa, com lesão endotelial, edema e infiltrado leucocitário tanto venoso como perivascular (12). No exame físico, isso leva ao aparecimento do sinal de Homans (dor à palpação e dorsoflexão do pé) e o sinal de Lowenberg (dor à compressão da panturrilha pelo esfigmomanômetro) (13). O desprendimento dos trombos venosos é a principal consequência da TVP e a mais preocupante. Ele pode levar a complicações como a embolia pulmonar, a síndrome pós-trombótica e hipertensão pulmonar (12). A partir do entendimento de como ocorre a TVP e a necessidade de diminuir as chances do desenvolvimento da mesma, a fim de evitar as suas complicações, principalmentea EP, vários fármacos foram desenvolvidos com a finalidade de inibir a coagulação, seja ao potenciar o papel da antitrombina, como no caso das heparinas, seja inibindo a ativação dos resíduos Gla dos fatores de coagulação. 4.3. FÁRMACOS ANTICOAGULANTES 16 4.3.1. HEPARINAS 4.3.1.1. HEPARINA NÃO FRACIONADA 4.3.1.1.1. ESTRUTURA QUÍMICA A heparina é uma mistura heterogênea de polímeros de um polissacarídeo natural, extraído de vísceras animais, com peso molecular variando entre 3.000 a 30.000 daltons, encontrado nos grânulos secretores dos mastócitos (15). É sintetizada a partir de precursores do UDP-açúcar, como polímeros de resíduos alternados de ácido D-glicurônico e N-acetil-D- glicosamina. Possui uma elevada carga negativa, sendo considerado o ácido orgânico mais forte do corpo humano (6). 4.3.1.1.2. MECANISMO DE AÇÃO As heparinas não possuem atividade anticoagulante intrínseca. Tais agentes se ligam a antitrombina e aceleram a taxa na qual esta inibe a via das proteases da coagulação (6). O desencadeamento do seu mecanismo de ação é dependente de antitrombina III (6,7), um inibidor específico de proteases plasmáticas. Esse inibidor possui o papel de inativar a trombina (fator IIa) além de outros fatores necessários para a coagulação como os fatores IXa, Xa, XIa e XIIa [7]. A antitrombina funciona como um “substrato suicida” para essas proteases [6], pois quando uma protease entra em contato com uma molécula de antitrombina, o resíduo da serina no sítio ativo da protease ataca uma ligação peptídica arginina-serina no sítio reativo da antitrombina, com isso tem- -se a inibição dessa protease, formando um complexo estável entre as moléculas de protease e antitrombina impedindo qualquer participação destas sobre a cascata de coagulação (6). 4.3.1.1.3. ETAPAS DA REAÇÃO Inicialmente temos a ligação da heparina, de carga negativa, a uma região rica em lisina na antitrombina III. Durante essa reação de conjugação, a 17 heparina pode ser liberada da antitrombina III tornando-se assim disponível para novas reações. Todavia, a alta carga negativa da heparina faz com que essa molécula permaneça ligada à protease, à antitrombina ou outra molécula adjacente formada na proximidade de um trombo(7). É válido ressaltar que podemos ter diferentes atividades coagulantes entre as heparinas devido a pesos moleculares bem distintos, tais diferença são oriundas das exigências diferenciais de ligação da heparina exibidas pela inativação da trombina e do fator Xa pela antitrombina III. Para ocorrer a reação de inativação da trombina pela antitrombina III de modo mais efetivo, uma molécula de heparina deve-se ligar simultaneamente à molécula de trombina e à antitrombina. Para ocorrer a inativação do fator Xa pela antitrombina III, a molécula de heparina precisa se ligar apenas a antitrombina III visto que a mudança de conformação da antitrombina III induzida pela heparina é suficiente para tornar a antitrombina susceptível a conjugação com o fator Xa (7). 4.3.1.2 HEPARINAS DE BAIXO PESO MOLECULAR (HBPM) 4.3.1.2.1. ESTRUTURA QUÍMICA As heparinas de baixo peso molecular podem ser obtidas através da despolimerização da heparina, tendo como resultado a produção de fragmentos com peso molecular menor (aproximadamente 5000 Daltons) (12). São compostas principalmente por glicosaminoglicanos formados por sequências alternantes de resíduos de D-glicosamina com ácido urônico, ácido glicurônico e ácido idurônico, podendo ser obtidas através de despolimerização química ou enzimática (16). 4.3.1.2.2. MECANISMO DE AÇÃO Esses fragmentos não catalisam a inibição da trombina com tamanha efetividade, mas possuem alta capacidade de catalisar a inibição do fator Xa pela antitrombina III. As heparinas de baixo peso molecular possuem uma menor afinidade com proteínas plasmáticas, vasculares, células endoteliais 18 macrófagos e plaquetas, o que consequentemente aumenta sua biodisponibilidade e meia vida plasmática, fator este que pode auxiliar na redução dos efeitos relacionados à trombocitopenia (15). As HBPM atuam sobre a antitrombina ao mudar sua conformação, potencializando a inibição do fator Xa. Devido ao seu tamanho reduzido, as HBPM não conseguem se ligar simultaneamente à antitrombina e à trombina, logo não atuam sobre a inibição desta. O mecanismo seletivo das HBPM na inibição do fator Xa garante uma maior eficácia terapêutica já que a disponibilidade e a concentração deste último são maiores em relação à trombina. Uma única molécula de Xa contribui para a prevenção da formação de centena de moléculas de trombina (16). Algumas experiências recentes vêm sendo realizadas relacionando a eficácia da heparina não fracionada comparado a da HBPM no tratamento da TPV. Os estudos indicaram que a HBPM, utilizada em doses fixas, ajustada ao peso corpóreo e administrada via subcutânea, foram mais efetivas em relação a diminuição da mortalidade e a incidência de complicações hemorrágica (15). Figura 6: Mecanismo de ação da HNF e HBPM [13]. 4.3.1.3. USOS CLÍNICOS As HNF e HBPM podem ser utilizadas para o tratamento inicial da trombose venosa e da embolia pulmonar, devido ao seu rápido início de ação [6], podendo ser utilizado também como medida profilática para doenças tromboembólicas (7). 19 A heparina não fracionada é com frequência utilizada em associação a agentes antiplaquetários no tratamento da síndrome coronariana aguda, na tentativa de limitar a extensão da lesão causada por infarto. Um fator importante é o controle do efeito anticoagulante dentro da faixa terapêutica, visto que a administração excessiva de heparina coloca o paciente em risco eminente de hemorragias (6). 4.3.1.4. EFEITOS ADVERSOS O principal efeito adverso da heparina é o sangramento (6,7,15,16), ocorrendo de modo significativo em 1-5 % dos pacientes. Além disso, pode-se observar trombocitopenia induzida por heparina, que proporciona uma baixa contagem de plaquetas dentro de aproximadamente 5 dias durante o tratamento, sendo esta patologia transitória e reversível com a suspensão do medicamento, além de estarem ligadas ao aparecimento de hemorragias intracranianas (7). Anormalidades nas provas de função hepática são frequentes em pacientes que recebem a HNF e HBPM, como elevações discretas nas atividades das transaminases do plasma sem o aumento de fosfatase alcalina e bilirrubina. Em casos mais raros, pode ocorrer osteoporose resultando em fraturas espontâneas de vértebras em pacientes tratados com heparina, além de diminuir a síntese de aldosterona pelas glândulas suprarrenais e, em certas ocasiões, pode causar hiperpotassemia mesmo quando administrada em doses baixas (6). 4.3.1.5. FARMACOCINÉTICA As heparinas de baixo peso molecular possuem menor afinidade pelas proteínas plasmáticas, células endoteliais e pelos macrófagos, o que aumenta a sua biodisponibilidade em relação às heparinas não fracionadas, sendo administradas na forma de bolus (endovenosa ou subcutânea) uma ou duas vezes ao dia, substituindo as infusões contínuas de heparina (6,15). HBPM possuem meias-vidas biológicas longas de 4 horas aproximadamente, são depuradas quase que em sua totalidade pelos rins, podendo se acumular em 20 pacientes com função renal comprometida (6,16) e possuem uma biodisponibilidade de 90% (6). A heparina não fracionada possui uma variação na biodisponibilidade quando administrada via subcutânea tendo o início da reação retardado em 1 a 2h [1], sendo de aproximadamente30%. Devem ser administradas via infusão intravenosa intermitente a cada 4-6 h ou injeção subcutânea 8-12 horas possuindo uma ação imediata quando administrada via intravenosa. Sua meia- vida no plasma depende da dose administrada, quando são injetadas doses de 100, 400, 800 unidades/Kg por via endovenosa as médias das atividades anticoagulantes são, respectivamente, de 1, 2,5 e 5 h, podendo ser depurada gradativamente no sistema reticuloendotelial, e identificada pequena porção não degradada na urina(6). 4.3.1.6. CONTRA INDICAÇÕES As principais contraindicações encontram-se divididas em absolutas e relativas. As contraindicações absolutas incluem casos de vigência de hemorragias não passíveis de controle, trauma do sistema nervoso central (SNC), hemorragia recente do SNC, coagulopatias (congênita ou adquirida grave). As contraindicações relativas incluem casos de hipertensão severa refratária a tratamento, endocardite bacteriana, sangramento digestivo recente, retinopatia diabética, trombocitopenia grave e idade avançada. (15). 4.3.2. VARFARINA A partir da década de 50, os anticoagulantes orais tornaram-se a viga mestra da prevenção de doenças tromboembólicas e passaram a ser administrados a milhares de pacientes anualmente (6,17). O protótipo dos anticoagulantes orais é a varfarina e é o prescrito com maior frequência (6). 4.3.2.1. ESTRUTURA QUÍMICA A varfarina é uma mistura racêmica de enantiômeros anticoagulantes R e S, sendo o S mais potente(6). 21 4.3.2.2. MECANISMO DE AÇÃO Como já citado, os fatores de coagulação II, VII, IX, X e as proteínas anticoagulantes C e S são sintetizados pelo fígado e biologicamente inativos, a não ser que os resíduos de glutamato aminoterminais sejam carboxilados, e tal reação exige a presença de dióxido de carbono, oxigênio e vitamina K(6,14,15). A fim de que ocorra o processo de carboxilação e consequentemente a síntese de proteínas biologicamente competentes, a vitamina K reduzida deve ser regenerada, sendo tal processo mediado pela enzima vitamina K epóxido redutase (VKOR) (6,17,18). A ação da varfarina nesse processo de coagulação se refere à inibição da enzima VKOR, diminuindo, portanto em 30 a 50% a quantidade total de cada um dos fatores de coagulação dependentes da vitamina K e sintetizados pelo fígado, mas cabe ressaltar que o efeito antitrombótico da varfarina só é atingido após dias, devido à longa meia vida da maioria dos fatores de coagulação. Não há seletividade no efeito da varfarina sobre qualquer fator específico dependente da vitamina K(6). 4.3.2.3. FARMACOCINÉTICA A biodisponibilidade deste fármaco é quase completa quando administrado por via oral, mas a presença de alimentos acaba por diminuir a absorção do fármaco. Após a administração oral a varfarina pode ser detectada no plasma, com concentrações plasmáticas máximas entre 2 a 8 horas. Todavia, devido ao mecanismo de ação, esse pico não é coincidente com o efeito farmacológico máximo, que ocorreu após 48 horas. A meia vida da varfarina varia entre 25 a 60 horas(6). O metabolismo é feito principalmente através da CYP2C9, mas também há a participação da CYP3A4, e os metabólitos inativos são excretados através da urina e das fezes. A distribuição se dá através da ligação à proteína plasmática, principalmente a albumina(18). 4.3.2.4. POSOLOGIA 22 A posologia do fármaco é entre 2 a 5 mg/dia nos primeiros 4 dias, sendo posteriormente administrado de 1 a 10 mg/dia. Cabe ressaltar que em idosos ocorre um aumento da sensibilidade ao fármaco. A administração também pode ser por via intravenosa não sendo necessário ajustes na dose, e não recomenda-se o uso intramuscular porque pode causar hematomas(6). 4.3.2.5. USOS CLÍNICOS O fármaco em questão é indicado para a prevenção e tratamento (evita a progressiva) de trombose venosa profunda aguda e embolia pulmonar, sendo também eficaz na prevenção do tromboembolismo venoso em pacientes submetidos a cirurgias ortopédicas ou ginecológicas, na isquêmica coronariana recorrente em pacientes com infarto agudo do miocárdio e na embolização sistêmica em pacientes com próteses de valvas cardíacas ou fibrilação atrial crônica(6,17,18). 4.3.2.6. CONTRAINDICAÇÕES Os anticoagulantes orais são contraindicados na presença de discrasias sanguíneas associadas à hemorragia ou trombocitopenia, aneurismas cerebrais ou dissecantes, hemorragia cerebral suspeita ou comprovada, hipertensão arterial não controlada, ulcerações ou lesões ativas no trato gastrintestinal ou urinário, cirurgias neurológicas, oftalmológicas e urológicas, traumas recentes, alcoolismo crônico e insuficiência renal e hepática. Cabendo ressaltar que a idade não é fator de contraindicação, porém requer cuidados especiais referentes a condições associadas que predispõe ao sangramento. Na gestação não se utiliza varfarina, pois a mesma atravessa a barreira placentária e pode causar anormalidades fetais (6,18). 4.3.2.7. EFEITOS ADVERSOS As complicações mais importantes que podem vir a ocorrer com o uso do medicamento são as hemorragias(15). Sendo que, também há a 23 possibilidade que ocorra icterícia colestática, hepatite, vasculite, náusea, vômito, reações de hipersensibilidade e diarreia (6). 4.3.2.8. INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS As interações medicamentosas da varfarina são extensas, porém cabe ressaltar as que aumentam o risco de hemorragia devido à diminuição do metabolismo do anticoagulante oral, por inibição da CYP2C9; sendo eles: amiodarona, antifúngicos, clopidogrel, cotrimoxazol, metronidazol e fluoxetina (antidepressivos em geral)(6,18). 24 5. ENTREVISTA P1: Quando se utiliza a heparina não fracionada e a HBP? Existe diferença no uso clínico desses dois fármacos no tratamento da TVP? R. Z. Gomes: A princípio, do ponto de vista de efetividade das duas drogas, não. O que a gente tem de diferente é que o sítio de ligação de uma age sobre o fator X mais a antitrombina III e o outro age sobre o fator Xa. O que a gente tem de diferença é que a heparina tem um efeito colateral hemorrágico mais acentuado do que a HBPM. Então a heparina de baixo peso molecular tem menos efeito colateral hemorrágico. Uma outra coisa extremamente importante que vai a favor da heparina de BPM é a posologia, no qual a HBPM vai ser utilizada de 12 em 12 horas, podendo ser subcutânea, enquanto a heparina não fracionada temos que utilizá-la endovenosa de 4 em 4 horas, o que obriga a hospitalização. Quanto à escolha da heparina a ser utilizada, a grande vantagem da heparina não fracionada é que ela possui antídoto. Se eu estiver em uma situação em que eu precise de uma anticoagulação rápida e precisa, como em uma cirurgia cardíaca no qual é necessário anticoagular o paciente exatamente ao iniciar circulação extra-corpórea (CEC), e em um momento preciso, como ao tirar o paciente da CEC, eu necessito terminar o efeito anticoagulante, a heparina não fracionada é a escolhida, por ter seu efeito interrompido com o uso de antídoto (protamina). Com exceção de ocasiões como essa, todos os protocolos de tratamento preferem a HBPM. P2: Quais as diferenças na prescrição entre a varfarina e a heparina no tratamento da TVP? R. Z. Gomes A heparina é utilizada no estágio inicial da anticoagulação, ou seja, a curto prazo, e a varfarina vai ser utilizada na anticoagulação a longo prazo. O não uso da varfarina em um primeiro momentoé porque ela irá depletar a proteína C e ela vai se transformar em um elemento pró-trombótico. Portanto, primeiro de tudo eu tenho que usar a heparina, e ela concomitante com as primeiras doses da varfarina até que esta atinja o efeito anticoagulante. 25 P3: Quais os cuidados na prescrição da varfarina? R. Z. Gomes: (Risos) Todos os cuidados. Primeiro nunca iniciar a varfarina sozinha, sempre inicia-la com a heparina. Segundo, ter cuidado com as interações medicamentosas com a varfarina, tanto interações que potencializem o efeito hemorrágico, como os anti-inflamatórios e os anti- fúngicos, como as que diminuem o efeito da varfarina, a exemplo os barbituratos e a carbamazepina, transformando-a em pró-trombótica. P4: Como avaliar se as doses de heparina e varfarina estão adequadas? R. Z. Gomes: Para a varfarina é utilizado o tempo de ativação da protrombina, o TAP, e para a heparina você usa o kTTPa, tempo de tromboplastina parcial ativada. Em relação a heparina, se pega o total de doses em um dia (5000 U, EV, a cada 4 horas, totalizando 30000 U), dilui-se em soro fisiológico e, utilizando uma bomba infusão, a heparina é infundida no paciente de maneira contínua de modo concomitante com a avaliação do kTTPa, que deverá estar a RNI entre 2 e 3 em relação ao normal, sendo o normal 3,2 s. Isso é feito pois a administração de heparina a cada 4 horas irá fazer com que haja flutuações no kTTPa, interferindo na interpretação do efeito anticoagulatório da heparina. Para a varfarina, a avaliação do TAP é feita diariamente a partir do segundo dia até que se consigo um valor de RNI do TAP entre 2 e 3. 26 6. DISCUSSÃO Tendo em vista que a trombose venosa profunda é uma afecção na qual ocorre oclusão geralmente de uma veia profunda dos membros inferiores por um trombo, e que a embolia pulmonar, sua consequência mais preocupante e letal, é uma das mais importantes causas de internações hospitalares nos Estados Unidos, a necessidade de se conhecer a fisiologia da coagulação afim de desenvolver um esquema terapêutico profilático em pessoas com fatores predisponentes é de suma importância. Entre os fármacos anticoagulantes, as heparinas não fracionadas e de baixo peso molecular e a varfarina estão entre os medicamentos de escolha quando o assunto é a profilaxia da TVP. As heparinas atuam potencializando os efeitos da antitrombina III sobre o fator X, e sobre a trombina no caso da heparina não fracionada; enquanto a varfarina irá atuar interrompendo o ciclo da vitamina K, importante cofator para a formação dos fatores de coagulação dependentes de vitamina K. Conhecendo-se essas informações e também dos efeitos hemorrágicos que cada um desses medicamentos podem causar no caso de super-dosagem, e baseado nos conhecimentos clínicos fornecidos pelo doutor Ricardo Zanetti Gomes, a varfarina é a melhor droga de escolha para a profilaxia da TVP quando comparada à heparina. Entretanto, a varfarina incialmente deve ser utilizada juntamente com a heparina, até que o efeito pró-trombótico da varfarina pela depleção da proteína C seja reduzido e os efeitos anticoagulatórios sejam atingidos, sendo isso observado ao se obter um TAP com RNI entre 2 e 3. Uma vez alcançado isso, a heparina é retirada do esquema, mantendo a dose diária única de varfarina. Quando comparadas as heparinas não fracionadas com as de baixo molecular, exceto em casos que é necessário uma anticoagulação precisa e rápida seguida de uma reversão dos efeitos de modo instantânea, as HBPM são as mais recomendadas principalmente pela via de administração ser subcutânea e ser administrada apenas duas vezes ao dia, ao contrário da heparina não fracionada que é administrada a cada 4 horas via endovenosa. Portanto, pode-se concluir que as práticas clínicas preconizam a varfarina como medicamento de escolha para a profilaxia da TVP, devido a 27 melhor adesão do paciente à posologia da varfarina e por possuir menos efeitos colaterais hemorrágicos que as heparinas. Já em relação aos diferentes tipos de heparina, as HBPM são preferidas por poder ser administradas em menos doses ao dia que a heparina não fracionada e a via de administração ser subcutânea. Em todos os casos, deve-se sempre avaliar o efeito anticoagulatório dos fármacos, a fim de evitar efeitos colaterais hemorrágicos. Assim, esses conhecimentos são fundamentais para evitar a TVP e sua consequência letal, a embolia pulmonar. 28 7. CONCLUSÃO Conclui-se, diante desta revisão literária e da entrevista com o Dr. Prof. Ricardo Zanetti Gomes, que a profilaxia da TVP é realizada utilizando principalmente os fármacos heparina e varfarina. A primeira é usada em tratamento de curto prazo, a segunda é usada quando necessita-se de um tratamento mais longo. Apesar disso, o uso da varfarina deve ser feito com muito cuidado, pois apresenta muitas interações medicamentosas, além disso, em um primeiro momento apresenta características pró-coagulatória (recruta proteína C). Por fim, o controle das doses desses fármacos se dá por exames diferentes, sendo para a heparina usado o tempo de tromboplastina parcial ativada (kTTPa), e para a varfarina o tempo de ativação da protrombina (TAP). Para escolher o fármaco que será mais efetivo e que ofereça o menor risco ao paciente no tratamento da TVP, deve-se avaliar o estado do mesmo e os efeitos anticoagulatório dos fármacos em questão. 29 7. REFERÊNCIAS 1. PORTO, Celmo Celeno. Semiologia Médica. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. 2. GARCIA, Antonio César Franco et al. Realidade do uso da profilaxia para trombose venosa profunda: da teoria à prática. J Vasc Bras, v. 4, n. 1, p. 35-41, 2005. 3. DO AMARAL BARUZZI, Antonio Claudio et al. Trombose venosa profunda. Profilaxia. Arq Bras Cardiol, v. 67, n. 3, 1996. 4. ENGELHORN, Ana Luiza Valiente et al. Profilaxia da trombose venosa profunda-estudo epidemiológico em um hospital escola. J Vasc Bras, v. 1, n. 2, p. 97-102, 2002. 5. CARLOS, Maria Marília Leite; DE SOUSA FREITAS, Polyanna Dantas Fernandes. Estudo da cascata de coagulação sangüínea e seus valores de referência. Acta Veterinaria Brasilica, v. 1, n. 2, p. 49-55, 2007. 6. Brunton, L.L. Goodman & Gilman. 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In: Maffei FHA, Lastória S, Yoshida WB, Rollo HA, Giannini M, Moura R. Doenças Vasculares Periféricas, 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008, v.2, p. 1557- 1566.30 13. Vandy FC, Wakefield TW. Chapter 48 – Acute Deep Venous Thrombosis: Pathophisiology and Natural History. In: Cronenwett JL, Johnston KW. Rutherford’s Vascular Surgery, 7ed. Filadélfia: Saunders Elsevier. 2005, v.1, p.736-749. 14. Baruzzi ACA, Nussbacher A, Lagudis S, Souza JAM. Trombose Venosa Profunda. Profilaxia. Arq Bras Cardiol, v.6, n.3, 1996, p.215-217. 15. Hamerschlak & Rosenfeld. Utilização da Heparina e dos Anticoagulantes Orais na Prevenção e Tratamento da Trombose Venosa Profunda e da Embolia Pulmonar. Arq Bras Cardiol volume 67, (nº3), 1996. 16. GARCES Erwin Enrique Otero. Heparina de baixo peso molecular versus heparina não fracionada como anticoagulação de hemodiálise venovenosa contínua em pacientes com insuficiência renal aguda. Porto Alegre, 2006. Dissertação de mestrado em ciência médicas: nefrologia. Programa de pós-graduação em ciências médicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 17. LIMA, Nuno. Varfarina: uma revisão baseada na evidência das interações alimentares e medicamentosas. Rev. Port. Clin. Geral, 2013, vol. 24, p. 475-482. 18. TELES, Juliana Souto; FUKUDA, Ellen Yukie; FEDER, David. Varfarina: perfil farmacológico e interações medicamentosas com antidepressivos. Einstein (16794508), v. 10, n. 1, 2012.
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