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História dos Povos Indígenas e Afrodescendentes

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Aula 6: Teorias raciais e interpretações sobre o Brasil 
A origem da Espécie
A eugenia vinha de encontro aos interesses políticos da Europa e dos Estados Unidos. Os europeus acreditavam que compunham um grupo humano puro, livre de hibridização, muito mais perto da perfeição e, justamente por isso, seriam responsáveis pela civilização dos demais grupos ― argumento que justificou e legitimou tanto a colonização americana como o “Imperialismo Europeu” e o sentimento do fardo do homem branco. 
Já os estadunidenses, mesmo tendo sido colonizados pela Grã-Bretanha, comprovaram seu desenvolvimento, principalmente por terem evitado a miscigenação entre o branco dominador e o negro escravizado; por isso, também estavam fadados ao progresso e à civilização.
Independentemente de certa tradição mazomba do Brasil ― que, vale ressaltar, até 1822 era uma colônia portuguesa ― foi impossível evitar as repercussões da afirmação da ciência como chave explicadora do mundo e da humanidade. 
Na realidade, a vitória do discurso científico caminhou par e passo com a construção de uma identidade nacional brasileira. A primeira ideia de Brasil (entendido como uma unidade nacional soberana e desvinculada politicamente de Portugal) foi construída com os primeiros museus, institutos históricos e geográficos, faculdades de direito e de medicina em terra brasilis. Durante o século XIX, nacionalismo e ciência fundiam-se e confundiam-se.
Todavia, a importação desse sistema explicativo científico trazia no seu bojo ― conforme visto acima ― uma questão deveras espinhosa para a elite intelectual brasileira: o problema da mestiçagem. 
A constatação (por parte dos cientistas) da existência de hierarquia entre as raças humanas não era algo tão estranho a uma sociedade que escravizava, sem muitos conflitos morais ou religiosos, os elementos indígenas e negros da sociedade. Na realidade, a ideia da supremacia branca frente às demais raças ou “espécies” humanas parecia corroborar a realidade brasileira de então. 
Entretanto, a massa de mulatos, cafuzos, caboclos, pardos e cabras, lembravam, a todo o momento, que o Brasil era uma nação majoritariamente mestiça ― o que inviabilizava que o país galgasse o estágio supremo da civilização.
Como outras localidades da América Latina, o Brasil tornou-se uma espécie de laboratório vivo, onde cientistas procuraram comprovar na prática o que compuseram, e onde “ilustrados” brasileiros buscaram desesperadamente uma unidade, uma homogeneidade para definir o povo brasileiro. 
Importantes cientistas como Thomas Buckle, Arthur de Gobineau e Louis Agassiz analisaram o fenômeno da mestiçagem brasileira, tendo inclusive visitado o país. Infelizmente, suas conclusões sobre o futuro do Brasil não eram muito esperançosas.
De tal modo, aceitar, copiar e reproduzir essas teorias iria interromper um projeto de construção nacional brasileira que mal tinha começado. Os homens de ciência do Brasil tiveram que achar uma resposta original, adaptando essas teorias, utilizando o que combinava e descartando o que era problemático para a construção de um argumento racial no país (SCHWARCZ: 1993, 37). 
Aula 07: Mestiçagem como saída? 
Aula 8: Herança Indígena e a sua inserção efetiva no Brasil contemporâneo 
A questão indígena também ganhou espaço no debate, pois qualquer debate sobre meio ambiente no Brasil precisa levar em consideração as agências desses sujeitos. 
No entanto, o Brasil tem uma questão a ser resolvida em relação a essas sociedades, que é a sua definição. O critério da autoidentificação étnica vem sendo o mais amplamente aceito pelos estudiosos da temática indígena. 
Na década de 1950, o antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definição elaborada pelos participantes do II Congresso Indigenista Interamericano, no Peru, em 1949, para assim definir, no texto “Culturas e línguas indígenas do Brasil”, o indígena como: 
“(...) aquela parcela da população brasileira que apresenta problemas de inadaptação à sociedade brasileira, motivados pela conservação de costumes, hábitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradição pré-colombiana. Ou, ainda mais amplamente: índio é todo o indivíduo reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e é considerada indígena pela população brasileira com quem está em contato.”
Uma definição muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do Índio (Lei nº 6.001, de 19/12/1973), que norteou as relações do Estado brasileiro com as populações indígenas até a promulgação da Constituição de 1988.
Nessa aula será analisada, então, a questão indígena na contemporaneidade brasileira.
Quando os portugueses chegaram ao Brasil, encontraram um número significativo de povos autóctones a quem chamaram índios. Ainda que eles julgassem estar frente a uma raça diferente, ainda nos primeiros anos de colonização, os lusitanos conseguiram encontrar traços específicos que diferenciavam essas sociedades, apontando parte da complexidade que regeu a vida desses grupos.
O processo colonial foi extremamente violento com as sociedades indígenas. As estimativas apontam que no início do século XVI existiam entre 1 e 10 milhões de índios, no que hoje é o Brasil. Esses habitantes se dividiam em diferentes povos, com culturas, crenças e línguas diferentes.
Vimos nas primeiras aulas do curso que dezenas de milhares de índios morreram em decorrência da colonização da América portuguesa. Gripe, sarampo, tuberculose e varíola mataram sociedades indígenas inteiras, contribuindo para aquele que foi o maior genocídio da história da humanidade. 
Junto com a mortandade causada pela falta de imunidade indígena, a efetivação do sistema colonial trouxe muitas mudanças nos padrões organizacionais desses povos. Resumidamente, as sociedades indígenas que habitavam o Brasil tinham sua economia organizada em modos de produção de uso, ou seja, produziam o suficiente para o consumo interno. 
Ainda que pesquisas recentes apontem a presença de moeda em algumas sociedades indígenas que habitavam a bacia amazônica, grande parte das trocas realizadas entre esses grupos ocorria por meio do escambo. 
A instauração do aparelho colonial, a produção do açúcar, o movimento das bandeiras e a criação de gado fizeram com que tais sociedades tivessem que se adaptar a um ritmo de trabalho extremamente pesado, o que, uma vez mais, acarretou na morte de milhares de índios e na desestruturação das sociedades que entraram em contato com os colonos europeus.
A catequese foi outro instrumento de colonização e, justamente por isso, um processo que desestruturou boa parte dos povos indígenas. Embora muitos missionários objetivassem levar a verdadeira fé aos índios, e em muitos casos tenham (na sua perspectiva) defendido os indígenas, a conversão ao catolicismo, a criação de uma língua geral e até mesmo os movimentos de resistência eram indícios de que o contato entre portugueses e índios estava criando novas formas de sociabilidade, sobretudo para os últimos, que estavam subjugados dentro do sistema colonial que se forjava. 
Estudos recentes apontam que, atualmente, os únicos grupos que não tiveram suas línguas alteradas pelo contato com os portugueses foram os Fulniô (de Pernambuco), os Maxakali (de Minas Gerais) e os Xokleng (de Santa Catarina). Interessante notar que nenhuma das sociedades apontadas pertence à família Tupi, mas estão ligadas ao tronco Macro-Jê.
Durante todo o período colonial, os portugueses e colonos nascidos na América utilizaram os índios não só como mão de obra barata (ou então escrava), mas também fizeram uso de seus saberes. A técnica da coivara foi levada
a proporções imensas. A região das minas foi encontrada graças a ajuda indígena; remédios eram feitos com base nos saberes de pajés e xamãs e a mandioca transformou-se na base da alimentação da colônia durante 300 anos. 
Findo o período colonial, os índios continuaram fazendo parte da história brasileira. Em meados do século XIX, uma determinada ideia de índio foi criada pelos intelectuais brasileiros, que a utilizaram como ícone de herói nacional. 
No final desse mesmo século e no início do século seguinte, os índios que habitavam a região norte do país foram fundamentais para as atividades extrativistas. Sociedades indígenas inteiras foram ― direta e indiretamente ― trabalhar na busca pelo látex, bem como nos movimentos exploratórios da região amazônica. Foi nesse contexto que o positivista Marechal Rondon despontou no quadro nacional. 
Momentos exploratórios da Amazônia:
A partir das décadas de 1920 e 1930, os movimentos exploratórios da Amazônia despertaram não só interesses econômicos, mas também chamaram a atenção de muitos intelectuais brasileiros. 
Conforme visto em aulas anteriores, nesse período havia um forte debate sobre a identidade nacional brasileira, que passava a encarar a mestiçagem de forma positiva. Embora boa parte dos estudos históricos e sociológicos se detivesse ao exame do legado africano no Brasil, os antropólogos (brasileiros e estrangeiros) iniciaram uma série de análises sobre os grupos indígenas.
Foi graças a esses trabalhos que o arquétipo de índio construído no século XIX foi desmontado. Em primeiro lugar, os estudos antropológicos apontaram que era impossível falar de índio no singular. O contato com os portugueses e demais colonos havia transformado padrões socioeconômicos e culturais. O estudo das línguas indígenas demonstra isso. 
Segundo os estudos da FUNAI:
“Os povos que habitavam a costa leste, na maioria falantes de línguas do Tronco Tupi, foram dizimados, dominados ou refugiaram-se nas terras interioranas para evitar o contato (...)
Os Guaranis, que vivem em diversos estados do Sul e Sudeste brasileiro e que também conservam a sua língua, migraram do Oeste em direção ao litoral em anos relativamente recentes.
As demais sociedades indígenas que vivem no Nordeste e Sudeste do País perderam suas línguas e só falam o português, mantendo apenas, em alguns casos, palavras esparsas, utilizadas em rituais e outras expressões culturais.
A maior parte das sociedades indígenas que conseguiram preservar suas línguas vive, atualmente, no Norte, Centro-Oeste e Sul do Brasil. Nas outras regiões, elas foram sendo expulsas à medida que a urbanização avançava”.
Texto na íntegra disponível em: www.funai.gov.br
Tais estudos criaram novas demandas estatais. 
Conselho Nacional de Proteção aos Índios:
Em 1939 foi instituído o Conselho Nacional de Proteção aos Índios (CNPI,  Decreto nº 1.794, de 22 de novembro de 1939), órgão que permitiu que antropólogos destacados atuassem na formulação das políticas indigenistas brasileiras. Era preciso reavaliar a política “sertanista” do SPI que, em certa medida, dava continuidade às premissas coloniais como a distribuição de presentes, a defesa de vestir os índios, ensinar-lhes a tocar instrumentos e a comportar-se como ocidentais.
O “governo dos índios” exigia ainda uma boa formação científica e “espírito de dedicação à causa pública”. A produção de informações cartográficas e ambientais era fundamental para subsidiar as atividades de conquista e exploração comercial do interior. 
Além disso, a proposta de registrar minuciosamente as expedições acabou por contribuir com a formação da antropologia no Brasil e das coleções de cultura material indígena dos museus brasileiros e estrangeiros. Tal política já vinha sendo questionada pelos irmãos Villas-Boas que ficaram famosos por suas expedições na região central do Brasil entre as décadas de 1940 e 1960.
Nesse contexto, antropólogos importantes como Heloísa Alberto Torres, Darcy Ribeiro, Roberto Cardoso de Oliveira, Eduardo Galvão, tentaram levar ao SPI as premissas antropológicas da época, questionando os cânones e práticas sertanistas. Embora considerassem inevitável a integração dos índios à sociedade nacional, defendiam que o órgão indigenista não se comprometesse a estimular este processo. 
As discussões que propunham estavam em consonância com os debates latino-americanos e internacionais mais amplos realizados no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), que, em 1957, promulgou, através da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Convenção nº 107 “Sobre a Proteção e Integração das Populações Indígenas e outras Populações Tribais e Semitribais de Países Independentes”, que apenas foi ratificada pelo Brasil em 1966 (Decreto nº 58.824/66). 
Os poucos recursos destinados ao SPI e o baixo grau de profissionalização dos seus funcionários (muitos deles militares e trabalhadores rurais que não tinham qualquer conhecimento frente às questões indígenas) e acusações de genocídio levaram à extinção do órgão juntamente com o CNPI. 
Fundação nacional do Índio (FUNAI)
Em 1967 foi criada a Fundação nacional do Índio (FUNAI) cujo principal objetivo era servir como tutora dos índios brasileiros. A partir de então, cabe à FUNAI promover a educação básica aos índios; demarcar, assegurar e proteger as terras por eles tradicionalmente ocupadas; estimular o desenvolvimento de estudos e levantamentos sobre os grupos indígenas.
A Fundação tem, também, a responsabilidade de defender as comunidades indígenas; promover o interesse da sociedade nacional pelos índios e suas causas; e gerir o seu patrimônio e fiscalizar suas terras, impedindo ações predatórias de garimpeiros, posseiros, madeireiros e quaisquer outras que ocorram dentro de seus limites e que representem um risco à vida e à preservação desses povos.
Demarcação das terras indígenas
Uma das questões mais trabalhadas pela FUNAI é a demarcação das terras indígenas. Na legislação brasileira terra indígena é “a terra tradicionalmente ocupada pelos índios, por eles habitada em caráter permanente, utilizada para as suas atividades produtivas, imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar e para à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. 
Atualmente, para uma terra ser reconhecida e demarcada como indígena, ela precisa passar por um longo processo: 
Demarcação das terras indígenas
Uma das questões mais trabalhadas pela FUNAI é a demarcação das terras indígenas. Na legislação brasileira terra indígena é “a terra tradicionalmente ocupada pelos índios, por eles habitada em caráter permanente, utilizada para as suas atividades produtivas, imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar e para à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. 
Atualmente, para uma terra ser reconhecida e demarcada como indígena, ela precisa passar por um longo processo: 
Demarcação das terras indígenas
Uma das questões mais trabalhadas pela FUNAI é a demarcação das terras indígenas. Na legislação brasileira terra indígena é “a terra tradicionalmente ocupada pelos índios, por eles habitada em caráter permanente, utilizada para as suas atividades produtivas, imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar e para à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. 
• Estudos científicos chefiados por antropólogos reconhecidos pela FUNAI; 
• Aprovação da FUNAI do relatório feito pelo estudo científico e publicação no Diário Oficial;
• Passar os 90 dias de contestação; 
• Declarar os limites da área;
• Demarcação física do território bem como o reassentamento da população não indígena (tarefa que cabe ao INCRA); 
• Homologação do Presidente da República; 
• Registro da homologação no Serviço de Patrimônio da União.
Observa-se que esse é um processo longo
e burocrático, e que ainda tem que se deparar com outros obstáculos. De um lado, os interesses econômicos, sobretudo a exploração madeireira e a derrubada sistemática da floresta amazônica para a criação de gado e a produção de soja têm colocado sociedades indígenas, a FUNAI e os grandes proprietários de terra em constante embate. 
De outro, a noção de terra e território dos grupos indígenas é muito mais fluida do que a lei brasileira determina. Conforme visto nas primeiras aulas do curso, a maior parte das sociedades indígenas era nômade ou seminômade o que, por si só, já aponta outros usos e significados da terra para esses povos. 
Mapa das Terras Indígenas Brasileiras
Percebe-se, então, que as questões referentes às populações indígenas ainda estão longe de uma solução que agrade os diferentes sujeitos, principalmente os índios. 
Embora a presença indígena e o legado por eles deixado na história e nos costumes do Brasil sejam cada vez mais reconhecidos, ainda falta muito para que sua integração seja feita de forma efetiva, levando em consideração não só os interesses da União, mas a diversidade indígena em suas múltiplas facetas.
Aula 9: Movimento Negro e a Busca de Outra Memória Afrodescendente 
João Cândido
O ano de 1910 foi marcado pela luta dos marinheiros brasileiros pelo fim dos castigos corporais. Embora o uso da chibata como castigo na Armada brasileira já houvesse sido abolido em um dos primeiros atos do regime republicano, na prática, os marinheiros, cuja grande maioria era formada por homens negros e mestiços, continuavam a receber as punições. Era um claro resquício da escravidão.
O estopim da Revolta ocorreu no dia 16 de novembro de 1910, quando foi publicado em diferentes jornais brasileiros que o marinheiro Marcelino Rodrigues de Menezes havia sido punido com 250 chibatadas aplicadas na frente de toda a tripulação do Encouraçado Minas Gerais. Seis dias depois, lideradas pelo marinheiro e filho de ex-escravos, João Cândido, tripulações de diferentes embarcações em todo Brasil fizeram um levante por meio do qual reivindicavam a abolição da chibata na marinha, com o lema: “nós, marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos, não podemos mais suportar a escravidão na Marinha brasileira”. 
Foram quatro dias de muita tensão. A cidade do Rio de Janeiro estava sob a mira dos canhões da marinha e, caso as reivindicações não fossem atentidas, a cidade seria atacada. Todavia, após inúmeras negociações, os marinheiros conseguiram fazer com que as autoridades brasileiras se comprometessem a acabar com as punições e terminaram o levante. 
Porém, a história não acabou aí. Ainda que o Congresso brasileiro tenha votado pela anistia dos marinheiros envolvidos, logo depois de se entregarem, grande parte dos sublevados foi presa ou morta pelas próprias autoridades. O líder, João Cândido, passou alguns anos preso na Ilha das Cobras e depois foi expulso da marinha. Ele faleceu em janeiro de 1969, aos 89 anos, esquecido por seus contemporâneos. 
Periódicos como A Gazeta da Tarde, cujo editor era José do Patrocínio, e A Redenção foram instrumentos importantes na luta abolicionista. Em pouco tempo, o número de associações abolicionistas cresceu. Tais organizações não apenas faziam denúncias contra a escravidão por meio dos artigos escritos nos jornais, dos discursos feitos em praça pública e das peças teatrais encenadas em importantes teatros do Brasil, realizavam também festas e reuniões nas quais arrecadam dinheiro que seria usado na compra da alforria de alguns escravos.
Lei nº 2040 - A Lei do Ventre Livre
No ano de 1871, o Senado brasileiro aprovou a Lei nº 2040, mais conhecida como a Lei do Ventre Livre, determinando que a partir daquela data (28\09\1871) todas as crianças nascidas de ventre escravo seriam livres. 
Para garantir que receberiam bons cuidados e que não seriam separados das mães, todos os senhores deveriam ficar com os recém-nascidos até eles completarem oito anos de idade. Depois disso, o senhor de sua mãe poderia escolher receber 600 mil réis do governo e dar a liberdade total para a criança ou então utilizar os serviços dessa criança até ela completar vinte e um anos. 
A Lei nº 2040 ainda reconheceu que todo escravo que tivesse o dinheiro necessário poderia comprar sua liberdade, independentemente da vontade senhorial de conceder ou não a carta.
Ainda que as condições de liberdade garantidas pela lei fossem de médio prazo e que permitissem aos senhores utilizar os filhos de suas escravas durante o período em que eles tinham grande potencial de trabalho, a garantia do Estado brasileiro sobre a liberdade de todos aqueles que nasceram após 28 de setembro de 1871 deu mais força para os abolicionistas.
A abolição da escravidão
A abolição da escravidão causou uma verdadeira comoção na população brasileira. Missas e festas foram realizadas para comemorar o feito que, além de acabar com o escravismo, não ressarciu nenhum proprietário. Estava totalmente extinta uma instituição que vigorou por mais de trezentos e cinquenta anos.
A luta por igualdades sociorraciais no Brasil
A abolição da escravidão era apenas uma das etapas na luta por igualdades sociorraciais no Brasil. 
Conforme visto nas aulas 6 e 7, junto com a República brasileira nasceu a busca por uma identidade que a diferenciasse do Império escravista, mas que, ao mesmo tempo, desse conta do debate racialista internacional. 
Associações e Grêmios
Um dos primeiro movimentos foi criar associações e grêmios que permitissem não só o encontro, mas o debate. 
 Em São Paulo, que na época já era o principal centro econômico do país, foram fundados o Centro Cultural Henrique Dias, a Associação Protetora dos Brasileiros Pretos e o Grêmio Dramático Recreativo e Literário “Elite da Liberdade”. 
Associações e grêmios semelhantes foram criados nas demais cidades brasileiras. Nessas organizações eram realizados diversos tipos de atividades como festas, bailes e reuniões ¯ ocasiões em que havia diversão, discussão e diversas redes de solidariedades e amizade eram estabelecidas. 
Imprensa Negra
Todavia, as questões experimentadas pela população negra não ficaram restritas às associações e grêmios. Como os meios de comunicação da época apenas reproduziam os padrões de beleza europeus e estampavam a população negra como “criminosas em potencial” ― reforçando, assim, o racismo ―, diversas das organizações negras que compunham as associações e grêmios se articularam e fundaram jornais voltados para a população negra. Não por acaso tais jornais ficaram conhecidos como: imprensa negra. 
Esses jornais, em parte influenciados pelos periódicos escritos pelos e para os imigrantes, eram direcionados a uma elite de homens e mulheres negros e mestiços, que, mesmo pequena, tinha representantes em diferentes localidades do Brasil. 
Alguns deles eram jornais muito semelhantes aos produzidos no restante do país e pouco, ou quase nunca, tocavam na problemática do racismo. Nesses casos, os periódicos traziam ofertas de emprego, anúncios de concursos de beleza e outras notícias cotidianas.
No entanto, em periódicos como O Clarim d´Alvorada, A Liberdade, a Sentinela, O Alfinete, e O Baluarte, jornalistas e intelectuais negros não só denunciavam situações de preconceito racial, como também usavam o jornal para ajudar na educação e aumentar a autovalorização da população negra e mestiça ¯ questões que não tinham espaço nos outros jornais brasileiros.
Alguns periódicos chegaram a abrir espaços para que seus leitores publicassem poemas e contos. E não foi por acaso que muitos jornais da imprensa negra faziam menção constante aos abolicionistas brasileiros.
Jornal A Voz da Raça
Em geral, havia uma grande preocupação em transmitir mensagens morais que pregavam contra a vadiagem e enalteciam o trabalho e o trabalhador negro. Produzidos em pequenas gráficas e muitas vezes contando unicamente com o financiamento de seus editores
ou com o dinheiro angariado em rifas, a grande parte desses jornais tinha uma pequena tiragem e era distribuída gratuitamente ou então vendida a custos baixos nas organizações e agremiações frequentadas pela população negra. 
Porém, uma vez mais, a solidariedade entre os membros da comunidade negra se fez sentir
Jornal Quilombo
Quatro anos depois, Abdias do Nascimento e outros intelectuais negros fundaram um dos jornais mais famosos da imprensa negra: o Quilombo, publicado entre 1948 e 1950. 
Diferentemente dos outros periódicos, o Quilombo contava com a participação de jornalistas negros e brancos, tinha forte diálogo com intelectuais negros do Caribe, África e Estados Unidos e dava especial atenção à cultura afro-brasileira, sobretudo às manifestações artísticas e culturais realizadas pelos negros do Brasil. 
Por meio da exaltação de importantes personagens negras da história brasileira, o Quilombo permitiu que muitos negros, especialmente aqueles que estavam na classe média, criassem uma identidade negra que tivesse um respaldo histórico. 
Muitos dos intelectuais que fizeram parte do corpo editorial do jornal Quilombo tinham grande diálogo com os movimentos internacionais que combatiam o racismo, inclusive com o Pan-africanismo, e com importantes lideranças negras dos Estados Unidos envolvidas na luta pelos direitos civis dos negros estadunidenses. 
Panteras Negras
Além de exaltar a cultura negra, esses movimentos passaram a fazer reivindicações constantes contra o racismo e a favor da igualdade de oportunidade entre negros e brancos. 
Na década de 1980, foi fundando o Movimento Negro Unificado que, com outras organizações parecidas, inclusive movimentos e ONGs que trabalham com a dupla discriminação sofrida pelas mulheres negras, tem lutado para que negros e mestiços tenham a mesma oportunidade que o restante da população brasileira. 
As denúncias e o combate desses movimentos fizeram com que intelectuais negros e brancos tivessem que revisitar a história brasileira para acabar com a ideia de que o Brasil era um país sem racismo. 
As provas da discriminação racial no Brasil serviram de base para a exigência de melhorias urgentes na vida dessa parcela da população e na adequação do racismo como crime inafiançável. Mesmo assim, essa luta ainda está longe de terminar. 
Outra importante ação desses movimentos foi recuperar importantes figuras negras da história do Brasil, como Zumbi dos Palmares que, atualmente, é considerado um dos heróis brasileiros.
Aula 10: Somos Racistas? 
Introdução
Em 2009, uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo concluiu que o Brasil não é um país racista, mas um lugar onde existe racismo. Dentre as pessoas entrevistadas, 97% afirmaram não ter nenhum tipo de preconceito racial, mas 98% afirmou conhecer alguém que pratica ou já praticou discriminação racial. Tal constatação é uma contradição, que acaba se tonando a base das relaçõesraciais no Brasil.
Nessa período será abordado parte da luta contra o racismo no país, bem como as ações estatais que tentam alcançar este objetivo.
O samba
Os tempos idos
Nunca esquecidos 
Trazem saudades ao recordar 
É com tristeza que eu relembro 
Coisas remotas que não vêm mais 
Uma escola na Praça Onze 
Testemunha ocular 
E junto dela balança 
Onde os malandros iam sambar 
Depois, aos poucos, o nosso samba 
Sem sentirmos se aprimorou
 Pelos salões da sociedade 
Sem cerimônia ele entrou 
Já não pertence mãos à Praça 
Tempos Idos - Cartola 
Já não é mais o samba de terreiro 
Vitorioso ele partiu para o estrangeiro 
E muito bem representado 
Por inspiração de geniais artistas 
O nosso samba de, humilde samba 
Foi de conquistas em conquistas 
Conseguiu penetrar o Municipal 
Depois de atravessar todo o universo 
Com a mesma roupagem que saiu daqui
Exibiu-se para a duquesa de Kent no Itamaraty 
Ao retratar a trajetória do samba no Brasil, o cantor e compositor Cartola mostrou que o ritmo musical que nasceu com as quitandeiras baianas na Praça Onze conseguiu vencer os preconceitos e ganhar o estrangeiro. Hoje, o samba é uma das marcas do Brasil.
Quando se fala em uma comida tipicamente brasileira, qual a primeira palavra que vem à cabeça? E um ritmo musical? E o esporte? 
A feijoada, o samba e o futebol, que se tornaram símbolos do Brasil, são heranças diretas dos africanos que para cá foram trazidos. 
A feijoada, o samba e o futebol, que se tornaram símbolos do Brasil, são heranças diretas dos africanos que para cá foram trazidos. 
A capoeira, que no passado foi responsável pela prisão de muitos escravos e libertos, hoje se transformou em sinônimo de esporte brasileiro. 
Os africanos também trouxeram diferentes tipos de tambores e outros tantos instrumentos musicais que permitiram que a música brasileira se tornasse tão diversificada. Tambores, atabaques, agogôs, cuícas, berimbaus, zabumbas são alguns dos instrumentos presentes em diferentes ritmos musicais brasileiros. Tão diversificado quanto os instrumentos são os tipos de músicas brasileiras que herdaram a harmonia, o ritmo ou a cadência de diferentes regiões da África. 
O samba (palavra que também tem origem africana e significa divertir-se) talvez seja o maior exemplo disso. Ele foi criado na segunda metade do século XIX, na Pedra do Sal, que ficava no Morro da Conceição, situado na região central do Rio de Janeiro. Nesse local, escravos e libertos, africanos e crioulos se encontravam no final do dia para fazer música e conversar. 
Já no século XX, o samba sofreu influências de outros ritmos musicais, como o maxixe, e introduziu outros instrumentos, transformando-se no que se conhece hoje. 
O samba proporcionou a criação de uma ampla rede de amizade e solidariedade entre pessoas negras, principalmente nos morros cariocas. Porém, o ritmo do samba foi tão contagiante que costuma se dizer que ele “desceu o morro” e revelou grandes músicos brasileiros como Cartola, Dona Ivone Lara, Martinho da Vila e Paulinho da Viola; tornando-se, assim, uma música tipicamente brasileira. 
Atualmente existem diferentes tipos de samba, como o samba-enredo, tocado pelas escolas de samba, e o samba de roda, mais encontrado em regiões rurais do Brasil, onde as pessoas tocam e dançam em forma de roda.
Arte e Cultura
Atualmente existem diferentes tipos de samba, como o samba-enredo, tocado pelas escolas de samba, e o samba de roda, mais encontrado em regiões rurais do Brasil, onde as pessoas tocam e dançam em forma de roda.
Cont... Arte e Cultura
O maracatu é um exemplo de dança que tem muita herança indígena. Na região amazônica, festas como Parintins vêm se tornando cada vez mais conhecidas em todo o país.
Do ponto de vista cultural, é possível afirmar que há um reconhecimento significativo da pluralidade brasileira e que tal pluralidade é organizada a partir das heranças deixadas pelos “três povos” que fundaram o Brasil: o indígena, o português e o africano. Contudo, essa pretensa harmonia cultural não se estende aos campos socioeconômicos e políticos do país.
A desigualdade
Dados obtidos por diferentes órgãos de pesquisa (como o IBGE e o IPEA) indicam que a população brasileira está cindida por uma significativa desigualdade que se expressa por meio da cor. Os índices mostram que a diferença salarial, a população carcereira, a entrada nas Universidades públicas e os índices de assassinatos passam pelo crivo racial.
Das Contravenções
Art. 3º - Recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem ou estabelecimento de mesma finalidade, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.
Pena - prisão simples, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa de 3 (três) a 10 (dez) vezes o maior valor de referência (MVR).
Art. 4º - Recusar a venda de mercadoria em lojas de qualquer gênero ou o atendimento de clientes em restaurantes, bares, confeitarias ou locais semelhantes, abertos
ao público, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.
Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).
Art. 4º - Recusar a venda de mercadoria em lojas de qualquer gênero ou o atendimento de clientes em restaurantes, bares, confeitarias ou locais semelhantes, abertos ao público, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.
Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa de 1 (uma) a 3 (três) vezes o maior valor de referência (MVR).
Art. 8º - Obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público civil ou militar, por preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil.
Pena - perda do cargo, depois de apurada a responsabilidade em inquérito regular, para o funcionário dirigente da repartição de que dependa a inscrição no concurso de habilitação dos candidatos.
De toda forma, a tentativa e a instauração do sistema de cotas revigorou o debate sobre o racismo no país e serviu como holofote para outras questões importantes, como a demarcação das terras indígenas e quilombolas.
Porém, essa é uma questão que ainda está longe de ser encerrada e, cujo debate, é fundamental para a criação de um Brasil que não faça distinções de seus habitantes.

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