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Fredie Didier Jr. sobre a fundamentacao da decisao judicial

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Sobre a fundamentação da decisão judicial1 
 
 
 
Fredie Didier Jr. 
Professor-adjunto de Direito Processual Civil da Universidade Federal da Bahia 
(graduação, mestrado e doutorado). Mestre (UFBA) e Doutor (PUC/SP). Advogado e 
consultor jurídico. 
 
 
1. A sentença como norma jurídica individualizada. 
 
 
 
 
O fenômeno de atuação dos enunciados normativos no plano 
social comporta três momentos distintos2: (i) o da formulação abstrata dos 
preceitos normativos; (ii) o da definição da norma para o caso concreto; (iii) 
o da execução da norma individualizada. 
O primeiro momento (formulação abstrata dos preceitos 
normativos) é tarefa que cabe exclusivamente ao Estado. Já a definição da 
norma concreta (a identificação da norma individualizada que se formou, 
concretamente, pela incidência da norma abstrata), bem como a sua 
execução (transformação efetiva em fatos e comportamentos) são atividades 
que não demandam, necessariamente, atuação estatal. 
Ao comprar uma revista numa banca, os sujeitos já identificam 
a norma jurídica individualizada (referente ao contrato de compra e venda), 
que é a que vai reger a sua relação jurídica; se o pagamento é feito e a coisa 
é entregue, ali já se promove a execução da norma individualizada. Tudo 
isso espontaneamente, sem necessidade de atuação estatal. 
Quando, porém, a definição da norma individualizada ou a sua 
execução não se desenvolvem voluntariamente, há necessidade de 
intervenção estatal, o que se dá através da atuação do Estado-juiz — salvo, 
obviamente, se as partes submetem a definição desta norma individualizada 
à arbitragem, ou se trata de caso em que se admite a autotutela. Por exemplo: 
 
1 Escrito para compor coletânea em comemoração aos quinze anos do Curso de Especialização em Direito 
Processual Civil do Centro de Extensão Universitária (CEU). Agradecemos ao Professor Rafael Oliveira 
pela ajuda na pesquisa. 
2 Baseado em ZAVASCKI, Teori Albino. “Sentenças declaratórias, sentenças condenatórias e eficácia 
executiva dos julgados”, in Leituras complementares de processo civil. 3ª ed. Fredie Didier Jr. (org.). 
Salvador: Edições JUSPodivm, 2005, p. 24 e seguintes. 
num acidente de trânsito, os envolvidos atribuem um ao outro a culpa pela 
superveniência da colisão, ou simplesmente discutem sobre os danos 
efetivamente causados. Aquele fato da vida ocorreu, sofreu incidência da 
norma jurídica abstrata, o que lhe atribuiu aptidão para gerar efeitos 
jurídicos. Só que um dos sujeitos enxerga a norma individualizada de uma 
forma e o outro, de outra. Controvertem, pois, quanto à sua identificação. 
Surgida esta crise de identificação, o Poder Judiciário, mediante atividade 
cognitiva, definirá, por sentença — palavra aqui utilizada em sentido amplo 
—, o conteúdo da norma jurídica individualizada, indicando os elementos da 
relação jurídica dela decorrente, seus sujeitos e seu objeto. 
Daí se dizer que a sentença é um ato jurídico que contém uma 
norma jurídica individualizada, ou simplesmente norma individual, definida 
pelo Poder Judiciário, que se diferencia das demais normas jurídicas (leis, 
por exemplo) em razão da possibilidade de tornar-se indiscutível pela coisa 
julgada material. 
Para a formulação dessa norma jurídica individualizada, 
contudo, não basta que o juiz promova, pura e simplesmente, a aplicação da 
norma geral e abstrata ao caso concreto. Em virtude do chamado pós-
positivismo que caracteriza o atual Estado constitucional, exige-se do juiz 
uma postura muito mais ativa, cumprindo-lhe compreender as 
particularidades do caso concreto e encontrar, na norma geral e abstrata, uma 
solução que esteja em conformidade com as disposições e princípios 
constitucionais, bem assim com os direitos fundamentais. Em outras 
palavras, o princípio da supremacia da lei, amplamente influenciado pelos 
valores do Estado liberal, que enxergava na atividade legislativa algo 
perfeito e acabado, atualmente deve ceder espaço à crítica judicial, no 
sentido de que o magistrado, necessariamente, deve dar à norma geral e 
abstrata aplicável ao caso concreto uma interpretação conforme a 
Constituição, sobre ela exercendo o controle de constitucionalidade se for 
necessário, bem como viabilizando a melhor forma de tutelar os direitos 
fundamentais3. 
Quando o juiz dá uma interpretação à lei conforme à 
Constituição ou a reputa inconstitucional, ele cria uma norma jurídica para 
justificar a sua decisão. A expressão “norma jurídica” aqui é utilizada num 
sentido distinto daquele utilizado linhas atrás. Não se está referindo aqui à 
norma jurídica individualizada (norma individual) contida no dispositivo da 
 
3 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2006, v. 
1, p. 90-97. 
decisão, mas à norma jurídica entendida como resultado da interpretação do 
texto da lei e do controle de constitucionalidade exercido pelo magistrado. 
Como se disse, ao se deparar com os fatos da causa, o juiz deve 
compreender o seu sentido, a fim de poder observar qual a lei que se lhes 
aplica. Identificada a lei aplicável, ela deve ser conformada à Constituição 
através das técnicas de interpretação conforme, de controle de 
constitucionalidade em sentido estrito e de balanceamento dos direitos 
fundamentais. 
Nesse sentido, o julgador cria uma norma jurídica (= norma 
legal conformada à norma constitucional) que vai servir de fundamento 
jurídico para a decisão a ser tomada na parte dispositiva do pronunciamento. 
É nessa parte dispositiva que se contém a norma jurídica individualizada, ou 
simplesmente norma individual (= definição da norma para o caso concreto; 
solução da crise de identificação). 
A norma jurídica criada e contida na fundamentação do julgado 
compõe o que se chama de ratio decidendi, tema que será abordado mais 
adiante. Trata-se de “norma jurídica criada diante do caso concreto, mas não 
uma norma individual que regula o caso concreto”4, que, por indução, pode 
passar a funcionar como regra geral, a ser invocada como precedente judicial 
em outras situações. “Ou seja, há necessidade de distinguir a cristalização da 
interpretação e do controle de constitucionalidade da criação de uma norma 
individual que, particularizando a norma geral, é voltada especificamente à 
regulação de um caso concreto”5. 
Assim, de acordo com a lição de LUIZ GUILHERME MARINONI, 
“se nas teorias clássicas o juiz apenas declarava a lei ou criava a norma 
individual a partir da norma geral, agora ele constrói a norma jurídica a 
partir da interpretação de acordo com a Constituição, do controle da 
constitucionalidade e da adoção da regra do balanceamento (ou da regra da 
proporcionalidade em sentido estrito) dos direitos fundamentais no caso 
concreto”6. 
 
2. A legitimação da atividade jurisdicional e o princípio da motivação. 
 
É bem aceita idéia de que o convencimento judicial está 
fundado, sempre ou quase sempre, num juízo de verossimilhança. Esse 
entendimento se funda na idéia de que a “verdade” é um ideal inatingível. 
Por conta disso, prevalece o posicionamento de que o que se busca no 
 
4 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo, cit., v. 1, p. 97. 
5 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo, cit., v. 1, p. 97. 
6 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo, cit., v. 1, p. 99. 
processo é a verdade mais próxima possível da real, ou simplesmente a 
“verdade possível”7, assim entendida aquela necessária e suficiente para que 
o juiz profira sua decisão de forma justa. 
Tendo em vista, pois, que o convencimento judicial 
normalmente está fundado em um juízo de verossimilhança (ou na idéia da“verdade possível”), dada a impossibilidade material de alcançar-se 
efetivamente a “verdade”, impõe-se que o magistrado dê legitimidade à sua 
tarefa. É aí que surge a necessidade da justificação quanto à formação da sua 
convicção e, pois, a exigência de fundamentar a sua decisão. “A motivação, 
nesse sentido, é a explicação da convicção e da decisão”8. “El Estado de 
Derecho no está autorizado para interferir en nuestra esfera personal sin 
justificar su interferencia”9. 
A garantia da motivação das decisões judiciais possui natureza 
de direito fundamental do jurisdicionado. A própria Constituição Federal, 
em seu art. 93, IX, estabelece que toda decisão judicial deve ser motivada e, 
fugindo um pouco à sua linha, normalmente principiológica e descritiva, 
prescreve norma sancionadora, cominando pena de nulidade para as 
decisões judiciais desmotivadas10. Ainda, porém, que não houvesse expressa 
disposição constitucional nesse sentido, o princípio da motivação não 
deixaria de ser um direito fundamental do jurisdicionado, eis que é 
consectário da garantia do devido processo legal e manifestação do Estado 
de Direito11-12. 
A exigência da motivação das decisões judiciais tem dupla 
função. 
 
7 “A tendência atual inclina-se, decididamente, no sentido de libertar o juiz de cadeias formalísticas, tanto 
na avaliação da prova quanto na investigação dos fatos da causa, facilitando a formação de sua convicção 
com a verdade possível, própria da condição humana, que ganha no domínio processual a dimensão de pura 
verossimilhança” (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Do formalismo no processo civil. São Paulo: 
Saraiva, 1997, p. 147-148). 
8 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 4 ed. 
São Paulo: RT, 2005, p. 457. 
9 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Prueba y motivación de la sentencia”, in Temas de Direito Processual 
– 8ª série. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 107. 
10 NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: RT, 1999, p. 
176. 
11 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “A motivação das decisões judiciais como garantia inerente ao Estado 
de Direito”, in Temas de Direito Processual – 2ª série. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988, n. 7, p. 88-90. O 
próprio BARBOSA MOREIRA lembra que “una excepción curiosa es el derecho norteamericano: en los 
Estados Unidos, hasta la Corte Suprema, en ciertos casos, emite decisiones no fundamentadas” (“Prueba y 
motivación de la sentencia”, in Temas de Direito Processual – 8ª série, cit., p. 108). 
12 O art. 308 do Código de Processo Civil do Estado da Bahia impunha expressamente a necessidade de 
motivação: “Os motivos precisos da decisão, tanto de facto, como de direito, devem ser escrupulosamente 
consignados na sentença”. (ESPÍNOLA, Eduardo. Código do Processo do Estado da Bahia Annotado. 
Bahia, 1916, vol. 1, p. 577.) 
Primeiramente, fala-se numa função endoprocessual, segundo a 
qual a fundamentação permite que as partes, conhecendo as razões que 
formaram o convencimento do magistrado, possam saber se foi feita uma 
análise apurada da causa, a fim de controlar a decisão por meio dos recursos 
cabíveis, bem como para que os juízes de hierarquia superior tenham 
subsídios para reformar ou manter essa decisão13. 
Fala-se ainda numa função exoprocessual ou extraprocessual, 
pela qual a fundamentação viabiliza o controle da decisão do magistrado 
pela via difusa da democracia participativa, exercida pelo povo em cujo 
nome a sentença é pronunciada. Não se pode esquecer que o magistrado 
exerce parcela de poder que lhe é atribuído (o poder jurisdicional), mas que 
pertence, por força do parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal, ao 
povo. 
Eis o pensamento de TARUFFO, “os destinatários da motivação 
não seriam somente as partes, os seus advogados e o juiz de instância 
superior (dell’impugnazione), mas também a opinião pública compreendida 
seja em seu complexo, seja como opinião de quisque de populo. A 
conotação política desta mudança de perspectiva é evidente: a ótica 
‘privada’ do controle exercido pelas partes e a ótica ‘burocrática do controle 
feito pelo juízo superior são integradas na ótica ‘democrática’ do controle 
que deve ser exercido por aquele mesmo povo, em cujo nome a sentença 
vem pronunciada”14. 
 
3. O conteúdo da fundamentação. 
 
 
13 Conforme lição de SÉRGIO NOJIRI, “fica claro que os aspectos endoprocessuais são insuficientes para 
revelar todas as facetas que o dever de fundamentar as decisões judiciais implica. Se acaso a 
fundamentação só se prestasse para que os juízes de instância superior pudessem melhor conhecer as razões 
pelas quais um juiz de instância inferior decidiu desta ou daquela forma, não haveria necessidade de se 
fundamentar uma decisão de última instância, o que, vimos, não é verdadeiro”. (NOJIRI, Sérgio. O dever 
de fundamentar as decisões judiciais. São Paulo: RT, 1998, p. 32.) Assim, também, MOREIRA, José 
Carlos Barbosa. “A motivação das decisões judiciais como garantia inerente ao Estado de Direito”, in 
Temas de Direito Processual – 2ª série. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988, n. 7, p. 90. 
14 TARUFFO, Michele. La motivazione della sentenza civile. Padova: CEDAM, 1975, p. 407, tradução 
livre. No original: “i destinatari della motivazione no siano soltanto le parti, i loro avvocati e il giudice 
dell’impugnazione, ma anche l’opinione pubblica intesa sia nel suo complesso, sia come opinione del 
quisque de populo. La connotazione política di questo spostamento di prospettiva è evidente: l’ottica 
‘privatistica’ del controllo esercitato dalle parti e l’ottica ‘burocratica’ del controllo esercitato dal giudice 
superiore vanno integrate nell’ottica ‘democratica’ del controllo che deve poter essere esercitato da quello 
stesso popolo nel cui nome la sentenza viene pronunciata”. 
É na fundamentação que o magistrado resolve15 as questões 
incidentais, assim entendidas aquelas que devem ser solucionadas para que 
a questão principal possa ser decidida. Daí se vê que é exatamente aqui, na 
motivação, que o magistrado deve apreciar e resolver as questões de fato e 
de direito que são postas à sua análise. 
É importante frisar uma distinção: há questões que são postas 
como fundamento de outras e há aquelas que são colocadas para que sobre 
elas haja decisão judicial. Em relação a todas haverá cognição (cognitio); em 
relação às últimas, haverá também iudicium. Todas compõem o objeto de 
conhecimento do magistrado, mas somente as últimas compõem o objeto de 
julgamento (thema decidendum). 
As primeiras são as questões resolvidas incidenter tantum; esta 
forma de resolução não se presta a ficar imune com a coisa julgada. O 
magistrado tem de resolvê-las como etapa necessária do seu julgamento, mas 
não as decidirá. São as questões cuja solução comporá a fundamentação da 
decisão. Sobre essa resolução, não recairá a imutabilidade da coisa julgada. 
Os incisos do art. 469 do CPC elucidam muito bem o problema: não fazem 
coisa julgada os motivos, a verdade dos fatos e a apreciação da questão 
prejudicial, decidida incidentemente no processo. 
Há questões, no entanto, que devem ser decididas e não 
somente conhecidas. São as questões postas para uma solução principaliter 
tantum: compõem o objeto do juízo. Somente em relação a estas é possível 
falar-se de coisa julgada. É o que se retira do art. 468 do CPC: a decisão 
judicial tem força de lei, nos limites da lide e das questões decididas. 
Dois exemplos podem ajudar-nos na percepção da importância 
desta distinção. 
(a) A ação declaratória incidental (arts. 5o, 325 e 470 do CPC) 
tem por utilidade transformar a análise da questão prejudicial controvertida. 
Posta, inicialmente, como simples fundamento do pedido, a questão 
prejudicial será resolvida incidentertantum e, na forma do inciso III do art. 
469, não ficará acobertada pela coisa julgada. Proposta a ação declaratória 
incidental, a questão prejudicial passa a ser objeto de resolução principaliter 
tantum, passa a compor o thema decidendum; a solução que o magistrado lhe 
der poderá ser acobertada pela imutabilidade da coisa julgada (art. 470 do 
CPC). Com ação declaratória incidental, a análise da questão prejudicial 
muda: deixa de ser ela simples fundamento e passa a ser objeto de decisão 
do magistrado. 
 
15 Não só as analisa, tal como sugere a redação do art. 458, II, do CPC; ele as resolve (cf. MOREIRA, José 
Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de Direito Processual – 8ª 
série, cit., p. 118). 
(b) A inconstitucionalidade da lei federal, cuja aplicação in 
concreto se discute judicialmente, é questão prejudicial que pode ser 
examinada por qualquer órgão julgador do Poder Judiciário. Como questão 
prejudicial, o magistrado a resolverá incidenter tantum. O controle difuso da 
constitucionalidade das leis caracteriza-se exatamente por essa 
peculiaridade: qualquer magistrado, em qualquer processo, pode identificar a 
inconstitucionalidade e examiná-la como fundamento de sua decisão. No 
entanto, a constitucionalidade da lei pode ser objeto de um processo; pode 
ser a questão principal, compondo o thema decidendum. É o que ocorre nos 
processos objetivos de controle concentrado da constitucionalidade das leis 
(ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de 
constitucionalidade). Quando figurar como questão principal, a 
constitucionalidade da lei somente pode ser examinada pelo Supremo 
Tribunal Federal, que tem competência exclusiva para “decidir” sobre a 
questão. Note-se: enquanto todos os juízes podem “conhecer” desta questão 
(incidenter tantum; simples fundamento), somente o STF pode “decidir” 
sobre ela (principaliter tantum; thema decidendum; objeto de julgamento). É 
por isso que não cabe ação declaratória incidental para decidir a “prejudicial 
de inconstitucionalidade”: o magistrado não teria competência para tanto. 
Pois bem. 
Na fundamentação, o órgão jurisdicional deve resolver as 
questões incidentes relevantes para a justificação do dispositivo da decisão. 
Inicialmente, deve apreciar as questões processuais suscitadas 
pelas partes ou cognoscíveis de ofício e que eventualmente não tenham sido 
resolvidas em momento anterior. Se houver qualquer vício formal que 
impeça a análise do mérito, e desde que não se possa sanar esse vício, 
caberá ao juiz decretar a inadmissibilidade do procedimento, caso em que, 
em regra, extinguirá o processo sem exame de mérito16. A decretação da 
inadmissibilidade será feita no dispositivo da decisão — elemento estrutural 
sobre o qual se falará mais adiante. Antes, porém, deve o julgador 
fundamentar a sua conclusão e, nesses casos, admite-se que a motivação 
seja sucinta (art. 459, CPC)17. 
 
16 “Nem sempre o juízo de inadmissibilidade implica extinção do processo, como nas hipóteses de 
inadmissibilidade parcial do procedimento ou inadmissibilidade de procedimento incidental (reconvenção, 
por exemplo). Do mesmo modo, a inadmissibilidade decorrente da incompetência também não implica, 
como regra a extinção do processo” (DIDIER JR., Fredie. Pressupostos processuais e condições da ação: o 
juízo de admissibilidade do processo, cit., p. 298). 
17 Há forte corrente doutrinária (MIGUEL TEIXEIRA E SOUSA, JOSÉ ROBERTO BEDAQUE, LUIZ GUILHERME 
MARINONI etc.), a que nos filiamos, que entende ser possível que o magistrado supere a falta de um 
requisito processual de validade, se puder decidir do mérito a favor daquele que se beneficiaria com a 
decisão de invalidade (art. 249, § 2º, CPC). Quebrar-se-ia, então, o dogma da primazia lógica da análise dos 
pressupostos processuais em relação ao mérito (DIDIER JR., Fredie. Pressupostos processuais e condições 
Não havendo questões processuais a resolver, ou tendo 
apreciado e rejeitado aquelas que se apresentaram, deve o magistrado passar 
à análise dos fundamentos de fato da demanda e da defesa, bem como das 
provas produzidas no processo por iniciativa das partes ou do próprio 
julgador18. Analisar questão de fato é, sobretudo, analisar as provas 
aportadas ao processo19. É aqui, por exemplo, que o julgador deve analisar 
se estão presentes os elementos que dão ensejo à responsabilidade civil 
subjetiva extracontratual (conduta, culpa, nexo e dano), numa ação 
indenizatória, bem como a relação de parentesco e a questão relativa à 
necessidade/possibilidade, na demanda por alimentos. 
Muitas vezes o magistrado, analisando os argumentos e provas 
trazidos ao processo, tende a realçar, em sua motivação, apenas aquilo que 
dá sustentação à tese vencedora. É bastante comum que o juiz, por exemplo, 
julgando procedente um pedido, fundamente a sua decisão com base apenas, 
ou ao menos predominantemente, nos argumentos e provas produzidos pelo 
autor. Isso, porém, não é correto. É imprescindível que se indique também 
por que as alegações e provas trazidas pela parte derrotada não lhe 
bastaram à formação do convencimento. Trata-se de aplicação do princípio 
do contraditório, analisando sob a perspectiva substancial: não basta que à 
parte seja dada a oportunidade de manifestar-se nos autos e de trazer as 
provas cuja produção lhe incumbe; é necessário que essa sua manifestação, 
esses seus argumentos, as provas que produziu sejam efetivamente 
analisados e valorados pelo magistrado. Além disso, o julgador deve expor 
na sua decisão os motivos por que tais argumentos e provas não o 
convenceram. “A fundamentação tem implicação substancial e não 
meramente formal”20. Isso é importante até para que a parte derrotada possa 
lançar mão dos meios de controle da decisão que lhe é desfavorável. 
Sobre o ponto, são irrepreensíveis as palavras de LUIZ 
GUILHERME MARINONI e de SÉRGIO CRUZ ARENHART, para quem “embora o 
que ocorre na prática possa parecer lógico, o certo é que o juiz não justifica 
as suas razões apenas ao aludir às provas produzidas por uma das partes. 
Para que possa realmente justificar a sua decisão, o magistrado não pode 
deixar de demonstrar que as eventuais provas produzidas pela parte 
 
da ação: o juízo de admissibilidade do processo, cit.,; DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual 
civil. 7ª ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2007, v. 1). 
18 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de 
Direito Processual – 8ª série, cit., p. 120. 
19 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Prueba y motivación de la sentencia”, in Temas de Direito Processual 
– 8ª série, cit., p. 111. 
20 NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: RT, 1999, p. 
175. 
perdedora não lhe convenceram. (…) é preciso eliminar a idéia de que 
justificar a decisão é o mesmo do que lembrar as provas e argumentos que 
servem ao vencedor”21. 
Importante o conselho de BARBOSA MOREIRA, segundo o qual 
devem ser evitadas “referências genéricas e não justificadas, do tipo: ‘a 
prova produzida pelo autor não convence’. Com isso o juiz de maneira 
alguma se desincumbiu do dever de motivar: ele tem de explicar por que 
não lhe pareceu convincente a prova produzida pelo autor. Analogamente, 
quando o juiz afirma: ‘as alegações do réu não ficaram comprovadas’, ele 
precisa demonstrar que isso realmente aconteceu; se as provas produzidas 
pelo réu não o convenceram, que ele exponha os motivos pelos quais não 
ficou convencido”22. 
Na análise do material probatório, o magistrado deve, antes 
mesmo de verificar se há uma ligação entrea prova produzida e a alegação 
de fato que ela visa demonstrar, avaliar a própria credibilidade da prova23. 
Entendendo que ela carece de credibilidade — por exemplo, porque a 
testemunha foi contraditória em seu depoimento ou porque o perito não 
demonstrou apuro técnico em sua investigação pericial —, deve expor essa 
circunstância, cuidando de apontar os elementos que o levaram a tal 
conclusão. 
Nos casos em que tenha havido produção das chamadas provas 
indiciárias ganha ainda mais relevo a necessidade de justificação que se 
impõe ao julgador, na medida em que esse tipo de prova é dirigido à 
demonstração de fatos secundários (indícios) que apontam para a existência 
ou inexistência de um fato principal, assim entendido aquele cuja 
ocorrência, efetivamente, se pretende demonstrar. A conclusão acerca da 
existência, ou não, desse fato principal decorre de atividade intelectual do 
julgador (presunção), a partir da observação do que normalmente acontece 
(regras de experiência). Importante, assim, que o magistrado exponha o 
caminho trilhado para chegar à conclusão acerca do fato principal, 
baseando-o nos elementos indiciários, a fim de que se possa controlar essa 
sua atividade. 
Se o magistrado observa que um determinado fato, ao final da 
instrução, não ficou comprovado, seja porque as partes não produziram 
provas que o demonstrassem, seja porque essa demonstração não foi 
 
21 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 4ª ed. 
São Paulo: RT, 2005, p. 461. 
22 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de 
Direito Processual – 8ª série. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 121. 
23 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento, 4ª ed., 
cit., p. 464. 
alcançada nem mesmo após a iniciativa probatória oficial do juiz (art. 130, 
CPC), entram em cena as regras sobre ônus da prova, que, como já visto, 
são regras de julgamento. 
Analisadas as questões de fato e estabelecidas as premissas 
acerca do que ficou, ou não, demonstrado, cumpre ao magistrado apontar 
qual o embasamento normativo que incide sobre aquela situação fática, bem 
como quais os efeitos que dessa incidência podem ser extraídos. Trata-se da 
análise das questões jurídicas de mérito. 
Por se tratar de questões de direito, é possível que delas o 
julgador conheça até mesmo ex officio. Assim, pode ele, por exemplo, dar à 
situação fática narrada na demanda (e comprovada nos autos) qualificação 
jurídica diversa daquela proposta pelo autor. É o que ocorre quando o autor 
ingressa com ação buscando anular negócio jurídico e, como fundamento, 
alega determinada situação de fato que, a seu ver, configuraria estado de 
perigo (art. 156, CC); nesse caso, se a situação de fato restar comprovada, 
mas o magistrado observar que ela se subsume a uma outra hipótese 
normativa — relativa à lesão, por exemplo (art. 157, CC) —, poderá, 
perfeitamente, acolher o pedido formulado, conferindo àqueles mesmos 
fatos uma qualificação diversa da que se propusera na inicial, porque a 
lesão, assim como o estado de perigo, é vício que pode dar ensejo à 
anulação do negócio (art. 171, II, CC). Toda essa digressão, relativa ao 
correto enquadramento jurídico dos fatos narrados (e comprovados) nos 
autos, deverá ser feita na fundamentação da decisão. 
Nessa tarefa de aplicar o direito objetivo, averiguando se, 
efetivamente, houve subsunção do fato à norma, não raras vezes o 
magistrado se depara com dispositivos de lei que trazem expressões vagas, 
de conteúdo muitas vezes aberto. São os denominados conceitos jurídicos 
indeterminados, como os de “conduta temerária”, “interesse público”, 
“prova inequívoca”, “preço vil” etc. Isso exige redobrada atenção do 
julgador no momento de motivar a sua decisão, eis que ele precisa 
demonstrar, com acuidade, de que forma a situação fática se encaixa no 
conceito abstrato estabelecido na lei. Não basta que o juiz afirme, por 
exemplo, que a parte agiu temerariamente, razão por que lhe impõe a multa 
por litigância de má-fé (art. 17, V, CPC). Conforme lição de BARBOSA 
MOREIRA, isso seria “mera repetição do texto legal”. E prossegue afirmando 
que deve o magistrado descer à realidade concreta, explicando o porquê de 
ter chegado a tal conclusão24. 
 
24 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de 
Direito Processual – 8ª série, cit., p. 120. 
Cumpre ao julgador também, ao apreciar as questões jurídicas, 
verificar se dos fatos demonstrados nos autos é possível que sejam extraídas 
as conseqüências jurídicas pretendidas pela parte. Nem sempre a 
demonstração, pela parte, das suas alegações de fato é suficiente para que se 
lhe possa reconhecer o direito ao acolhimento da sua pretensão. Se a parte 
autora, por exemplo, narra e comprova que o réu cometera adultério e pede, 
com base nisso, a anulação do casamento, decerto que o seu pedido será 
julgado improcedente, porque do fato narrado — ainda que comprovado — 
não se pode extrair exatamente esta conseqüência (anulação do 
casamento)25. A conclusão quanto à improcedência da demanda constará do 
dispositivo da decisão, mas a digressão acerca da impossibilidade de se 
extraírem as conseqüências jurídicas pretendidas, isto é, a exposição do 
raciocínio jurídico traçado pelo julgador deverá constar da motivação da 
decisão. 
Vale lembrar, ainda, que é também na fundamentação que o 
órgão jurisdicional deverá deliberar sobre a constitucionalidade ou 
inconstitucionalidade de ato normativo, acaso a questão seja suscitada pelas 
partes ou mesmo analisada de ofício — o que é possível, por se tratar, 
igualmente, de questão de direito. Como cediço, no nosso sistema, qualquer 
magistrado pode conhecer da questão relativa à inconstitucionalidade de um 
ato normativo, mas a solução que der a essa questão somente valerá, a 
princípio, para aquele caso concreto, não se estendendo às pessoas que não 
participaram do processo26. Quando se tratar de decisão proferida por 
tribunal, a solução acerca da questão da inconstitucionalidade, que comporá 
a motivação do acórdão, necessariamente tem que ser dada por voto da 
maioria absoluta dos seus membros ou dos membros do respectivo órgão 
especial (art. 97, CF)27. 
São comuns as decisões em que se invocam, na análise das 
questões jurídicas, tão-somente precedentes jurisprudenciais, mais das vezes 
transcrevendo-se apenas as respectivas ementas no corpo do julgado. São os 
 
25 Vale lembrar que o adultério é causa que caracteriza a impossibilidade de comunhão de vida, autorizando 
o pedido de separação (art. 1.573, I, CC), e não o pedido de anulação do casamento (art. 1.550, CC). 
26 Nos casos em que a discussão sobre a constitucionalidade, ou não, de um ato normativo é posta como 
questão a ser decidida principaliter tantum, como objeto do processo, os efeitos dessa decisão se estendem 
mesmo a quem dele não foi parte. Mas isso somente pode ocorrer por meio das ações de controle 
concentrado de constitucionalidade, cuja análise compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal 
(art. 102, I, “a” e § 1º, CF). Há uma tendência, porém, de dar às decisões do STF em controle difuso de 
constitucionalidade uma eficácia vinculativa, semelhante à que se empresta às decisões em ADIN e ADC 
(Ver, a respeito, DIDIER Jr., Fredie, CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual 
civil. 3ª ed. Salvador: Editora JUS PODIVM, 2007, v. 3.) 
27 A questão é solucionada através do chamado “incidente de declaração de inconstitucionalidade”, 
regulado nos arts. 480 a 482 do CPC. (Ver, a respeito, DIDIER Jr., Fredie, CUNHA, Leonardo José 
Carneiro da. Curso de direito processual civil. 3ª ed. Salvador:Editora JUS PODIVM, 2007, v. 3.) 
chamados “fundamentos aliunde”.28 Sobre o assunto, eis o que diz BARBOSA 
MOREIRA: 
 
“Há juízes que se dão por satisfeitos com dizer que a jurisprudência 
se orienta neste ou naquele sentido. A menos que alguma norma 
legal a declare suficiente, com semelhante referência o juiz não se 
desincumbe do dever de motivar. É claro que ele deve levar em 
conta a jurisprudência, sem prejuízo da possibilidade, que em 
princípio tem, de discordar da orientação predominante, mas em 
qualquer caso tem de expor as razões pelas quais adere ou não 
adere a ela. Pode fazê-lo sucintamente, quando segue jurisprudência 
consolidada; todavia, não há de esquecer que o que mais importa é 
seu próprio convencimento”.29 
VALLISNEY DE SOUZA OLIVEIRA também entende que uma decisão 
que se restringe a reportar-se a precedentes jurisprudenciais é 
inválida30. 
 
Com a possibilidade de edição, pelo STF, de “súmula 
vinculante” em matéria constitucional (conforme art. 103-A da CF, 
acrescentado pela EC 45/2004), parece ser lícito ao magistrado, 
simplesmente, fazer alusão à súmula, quando da análise da questão de 
direito, mas deverá, antes, demonstrar se e de que modo a situação concreta 
que lhe é posta para julgamento se encaixa na hipótese sobre a qual versa a 
referida súmula. Aliás, como dispõe o Regimento Interno do STF, a citação 
de qualquer enunciado da “súmula”, pelo número correspondente, 
“dispensará, perante o Tribunal, a referência a outros julgados no mesmo 
sentido” (102, § 4º). 
 
4. Ratio decidendi e obiter dictum. 
 
No conteúdo da fundamentação, é preciso distinguir o que é a 
ratio decidendi e o que é obiter dictum. 
A ratio decidendi são os fundamentos jurídicos que sustentam a 
decisão; a opção hermenêutica adotada na sentença, sem a qual a decisão 
não teria sido proferida como foi; trata-se da tese jurídica acolhida pelo 
órgão julgador no caso concreto. “A ratio decidendi (...) constitui a essência 
da tese jurídica suficiente para decidir o caso concreto (rule of law)”31. 
 
“Para a correta inferência da ratio decidendi, propõe-se uma 
operação mental, mediante a qual, invertendo-se o teor do núcleo 
 
28 Cf. OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Nulidade da sentença e o princípio da congruência. São Paulo: 
Saraiva, 2004, p. 226. 
29 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de 
Direito Processual – 8ª série, cit., p. 121-122. 
30 Cf. OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Nulidade da sentença e o princípio da congruência, cit., p. 226. 
31 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito. São Paulo: RT, 2004, p. 175. 
decisório, se indaga se a conclusão permaneceria a mesma, se o juiz 
tivesse acolhido a regra invertida. Se a decisão ficar mantida, então a 
tese originária não pode ser considerada ratio decidendi; caso 
contrário, a resposta será positiva” 32. 
 
Já o obiter dictum (obiter dicta, no plural) consiste nos 
argumentos que são expostos apenas de passagem na motivação da decisão, 
consubstanciando juízos acessórios, provisórios, secundários, impressões ou 
qualquer outro elemento que não tenha influência relevante e substancial 
para a decisão (“prescindível para o deslinde da controvérsia”33), sendo 
apenas algo que se fez constar “de passagem”, não podendo ser utilizado 
com força vinculativa por não ter sido determinante para a decisão. 
Essa distinção é muito relevante para o estudo (i) da força 
vinculativa dos precedentes judiciais, assunto que ganhou importância por 
conta da adoção da “súmula vinculante” em matéria constitucional (art. 103-
A, CF/88), (ii) do valor que se tem atribuído aos enunciados consagrados em 
súmula dos tribunais (arts. 475, § 3º, 518, § 1º, 544, § 3º, 557 etc., todos do 
CPC), (iii) da possibilidade de julgamento liminar de causas repetitivas (art. 
285-A, CPC), (iv) da admissibilidade do incidente de uniformização de 
jurisprudência (arts. 476 a 479, CPC) e (v) dos recursos que têm por objetivo 
uniformizar a jurisprudência com base em precedentes judiciais, tais como 
os embargos de divergência (art. 546, CPC) e o recurso especial fundado em 
divergência (art. 105, III, “c”, CF). 
A coisa julgada vincula as partes à decisão do objeto litigioso (a 
solução da questão principal apresentada no dispositivo da decisão) de um 
determinado caso concreto. Quando se estuda a força vinculativa dos 
precedentes judiciais (enunciado da súmula da jurisprudência predominante 
de um tribunal, por exemplo), é preciso investigar a ratio decidendi dos 
julgados anteriores, encontrável em sua fundamentação. Assim, as razões de 
decidir do precedente é que operam a vinculação: extrai-se da ratio 
decidendi, por indução, uma regra geral que pode ser aplicada a outras 
situações semelhantes. Da solução de um caso concreto (particular) extrai-se 
uma regra de direito que pode ser generalizada. Configura exatamente o que 
LUIZ GUILHERME MARINONI chama de norma jurídica criada pelo 
magistrado, à luz do caso concreto, a partir da conformação da hipótese legal 
de incidência às normas constitucionais34. SÓ se pode considerar como ratio 
decidendi a opção hermenêutica que, a despeito de ser feita para um caso 
 
32 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito, cit., p. 177. 
33 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito, cit., p. 177. 
34 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo, cit., v. 1, p. 96-97. Ver 
o que foi dito no item relativo à sentença como norma jurídica individualizada. 
concreto, tenha aptidão para ser universalizada35. 
 
“É certamente em decorrência desse relevante aspecto, na órbita de 
um sistema jurídico estribado na observância compulsória dos 
precedentes, que as razões de decidir devem prever e sopesar a 
repercussão prática que determinada decisão poderá oferecer para o 
ordenamento jurídico globalmente considerado”36. 
Tudo isso nos leva a uma importante advertência: não bastasse 
a exigência constitucional de a decisão judicial ser devidamente motivada, é 
preciso que o órgão jurisdicional, máxime os tribunais superiores, tenha 
bastante cuidado na elaboração da fundamentação dos seus julgados, pois, a 
prevalecer determinada ratio decidendi, será possível extrair, a partir dali, 
uma regra geral a ser observada em outras situações. 
Finalmente, uma última palavra: em uma decisão, o órgão 
judicial não indica, expressamente, qual é a ratio decidendi — ressalvado a 
decisão que julga o incidente de uniformização de jurisprudência (arts. 476-
479 do CPC) ou o incidente de decretação de inconstitucionalidade (arts. 
480-482 do CPC), que têm esse objetivo.37 “Cabe aos juízes, em momento 
posterior, ao examinarem-na como precedente, extrair a ‘norma legal’ 
(abstraindo-a do caso) que poderá ou não incidir na situação concreta”.38 
 
5. A fundamentação e a coisa julgada material. 
 
As questões resolvidas na fundamentação da decisão judicial 
não ficam acobertadas pela coisa julgada material (art. 469, CPC). Por esta 
razão, tudo o que aí é analisado pelo magistrado pode ser revisto em outros 
processos, que envolvam as mesmas ou outras partes, não se submetendo os 
julgadores desses outros processos às soluções alvitradas na motivação das 
decisões anteriores. A coisa julgada material torna intangível apenas o 
conteúdo da norma jurídica concreta estabelecida no dispositivo da decisão 
judicial. 
É justamente por isso que a decretação incidental de 
inconstitucionalidade por um determinado juízo singular não opera efeitos 
senão em relação às partes envolvidas naquele processo. É também por isso 
que o reconhecimento, como questão incidental (fundamento), da 
paternidade numa ação em que se pedem alimentos pode serobjeto de 
 
35 É o que se denomina, com eloqüência, de holding (TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial 
como fonte do Direito, cit., p. 177). 
36 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito, cit., p. 176. 
37 No caso do incidente de uniformização de jurisprudência, o próprio art. 479 do CPC diz que “o 
julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de 
súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência” (acrescentamos o itálico). 
38 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito, cit., p. 175. 
discussão em outro processo, seja como questão principal ou, novamente, 
como questão incidental. 
Em que pese não ficar acobertada pela coisa julgada material, a 
fundamentação é extremamente relevante para (i) determinar o seu alcance39 
e (ii) determinar, em alguns casos, se a norma jurídica concreta contida no 
dispositivo da decisão vai, ou não, tornar-se indiscutível pela coisa julgada 
material. 
Há situações em que, por determinação legal, uma decisão 
somente faz coisa julgada material se no processo em que ela foi proferida 
houve esgotamento dos meios de prova. São os casos em que a coisa julgada 
se dá secundum eventum probationis. Assim, se a demanda for julgada 
improcedente por insuficiência de provas, a norma concreta estabelecida no 
dispositivo não terá aptidão para tornar-se imutável pela coisa julgada 
material. É o que ocorre, por exemplo, na ação civil pública (art. 16, Lei n. 
7.347/85), na ação popular (art. 18, Lei n. 4.717/65) e nas ações coletivas 
para defesa de direitos difusos ou coletivos (art. 103, I e II, CDC). 
Em todos esses casos, portanto, a decisão de improcedência da 
demanda não faz coisa julgada material se está fundada na ausência de 
provas das alegações de fato do autor. 
 
6. A decisão sem motivação. 
 
Como já se disse, a motivação tem conteúdo substancial, e não 
meramente formal. É bastante comum o operador do direito deparar-se, no 
seu dia-a-dia, com decisões do tipo “presentes os pressupostos legais, 
concedo a tutela antecipada”, ou simplesmente “defiro o pedido do autor 
porque em conformidade com as provas produzidas nos autos”, ou ainda 
“indefiro o pedido, por falta de amparo legal”. 
Essas decisões não atendem à exigência da motivação: trata-se 
de tautologias40, que, exatamente por isso, não servem como 
fundamentação. O magistrado tem necessariamente que dizer por que 
entendeu presentes ou ausentes os pressupostos para a concessão ou 
denegação da tutela antecipada; tem que dizer de que modo as provas 
 
39 Segundo Liebman, “os motivos da sentença não constituem objeto da coisa julgada, mas devem ser 
tomados em consideração para se entender o verdadeiro e completo alcance da decisão” (LIEBMAN, 
Enrico Tullio. “Limites objetivos da coisa julgada”, in Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: 
Bestbook, 2004, p. 109). 
40 Na terminologia filosófica tradicional, tautologia “significa genericamente um discurso (em especial, 
uma definição) vicioso porquanto inútil, visto repetir na conseqüência, no predicado ou no definiens o 
conceito já contido no primeiro membro”. (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. trad. da 1ª 
edição brasileira coordenada e revista por Alfredo Bosi. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 939.) 
confirmam os fatos alegados pelo autor (e também, como já se viu, por que 
as provas produzidas pela parte contrária não o convenceram). Em outras 
palavras, o julgador tem que “ingressar no exame da situação concreta posta 
à sua decisão, e não limitar-se a repetir os termos da lei, sem dar as razões 
do seu convencimento”41. Em hipótese como essa, CALMON DE PASSOS 
sugere que se “consulte uma sibila, para desvendar o pensamento do 
magistrado. Decisão sem fundamento ou sem fundamento aceitável como 
tal, no mínimo que seja, é decisão nula, que não obriga e deve ser 
reformada”42. 
Tem-se admitido como válida a decisão em que o magistrado se 
reporta, em seus fundamentos, a um outro ato do processo (uma outra 
decisão ou um parecer, por exemplo). É a chamada motivação per 
relationem43. O próprio legislador prevê hipótese em que “se a sentença for 
confirmada pelos seus próprios fundamentos, a súmula do julgamento 
servirá de acórdão” (art. 46, in fine, Lei Federal n. 9.099/95), admitindo 
expressamente a possibilidade, nos juizados, de utilização da motivação por 
referência44. A motivação per relationem, contudo, deve ser vista como uma 
exceção, da qual se pode valer o julgador em homenagem ao princípio da 
economia processual e desde que: a) não tenha havido suscitação de fato ou 
argumento novo, b) a peça processual à qual se reporta a decisão esteja 
substancialmente fundamentada45, aplicando-se, ainda, tudo o que se disse 
até aqui sobre os fundamentos da própria decisão, c) a peça que contém a 
fundamentação referida esteja nos autos e que a ela possam ter acesso as 
partes. 
Questão importante é saber qual a conseqüência da ausência de 
fundamentação. 
Há quem defenda que a decisão sem motivação é uma não-
decisão. A falta de motivação implicaria inexistência de decisão — 
diversamente da motivação insuficiente, que seria caso de nulidade. É o 
caso de MICHELLE TARUFFO, talvez o principal expoente da doutrina que 
defende a inexistência jurídica de decisão judicial sem motivação. 
 
41 NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 5a ed., cit., p. 176. Também 
nesse sentido, MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in 
Temas de Direito Processual – 8ª série, cit., p. 121. 
42 PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil. 8a ed. Rio de Janeiro: 
Forense, 1998, v. 3, p. 40. 
43 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “O que deve e o que não deve figurar na sentença”, in Temas de 
Direito Processual – 8ª série, cit., p. 121. 
44 O STF reconheceu a constitucionalidade do § 5º do art. 82 da Lei n. 9.099/95, que tem a mesma redação 
do art. 46, 2ª parte (STF, 1ª T., HC 86533/SP, rel. Min. Eros Roberto Grau, j. em 08.11.2005, publicado no 
DJ de 02.12.2005, p. 13). 
45 Cf. NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 5 ed., cit., p. 175. 
Sua tese está exposta em célebre trabalho doutrinário46. O 
processualista italiano considera a motivação, tendo em vista a mátria 
constitucional da exigência, um elemento estrutural necessário dos 
provimentos jurisdicionais47; uma decisão judicial somente pode ser 
considerada como tal se puder ser controlada — e a exigência de motivação 
tem exatamente esta finalidade; a motivação é pressuposto da 
“jurisdicionalidade” (giurisdizionalità)48. 
A percepção de que a motivação também cumpre um papel 
extraprocessual (submeter o exercício do poder ao controle da sociedade) 
leva à conclusão, afirma o autor, de que a sentença sem motivação não 
integra o conteúdo mínimo indispensável para que se reconheça um 
exercício legítimo da função jurisdicional49. Muito embora reconheça as 
controvérsias teóricas sobre as decisões inexistentes, diz que não se poderia 
dar a esse vício (de natureza constitucional e que diz respeito à própria 
noção de “jurisdicionalidade”) o mesmo tratamento dado a outros defeitos 
da decisão, submetidos a recurso por provocação das partes50. A intenção de 
MICHELLE TARUFFO é, pelo que se pode constatar do seu belíssimo trabalho, 
ampliar o leque dos meios de impugnação — defende, então, que se admita 
o controle da decisão imotivada pela actio nullitatis autônoma51 — e o 
prazo para tanto. 
Há uma segunda corrente, porém, que encara o vício da falta 
de motivação como apto a autorizar, no máximo, o ajuizamento de ação 
rescisória.“Mesmo ciente da importância do dever de fundamentar as 
decisões judiciais”, SÉRGIO NOJIRI entende que a falta de fundamentação 
implica decisão anulável por recurso ou rescindível no prazo de dois anos 
após o ajuizamento da ação rescisória. Alicerça a sua conclusão no princípio 
da segurança jurídica52. 
Parece-nos correto este último entendimento. 
Para que um fato se subsuma à previsão normativa, é 
necessário que estejam presentes aquilo que se convencionou chamar de 
 
46 La motivazione della sentenza civile. Padova: CEDAM, 1975. 
47 La motivazione della sentenza civile, cit., p. 457-458. 
48 La motivazione della sentenza civile, cit., p. 458. 
49 La motivazione della sentenza civile, cit., p. 464. 
50 La motivazione della sentenza civile, cit., p. 465-466. 
51 La motivazione della sentenza civile, cit., p. 466. 
52 NOJIRI, Sérgio. O dever de fundamentar as decisões judiciais. São Paulo: RT, 1998, p. 109. Neste 
mesmo sentido: PERO, Maria Thereza Gonçalves. A motivação da sentença civil. São Paulo: Saraiva, 
2001, p. 128-129; TUCCI, José Rogério Cruz e. “Ainda sobre a nulidade da sentença imotivada”. Revista 
de Processo. São Paulo: RT, 1989, n. 56, p. 230. 
elementos nucleares do suporte fático53. A falta de um elemento nuclear 
impede que se considere como jurídico determinado fato. Os elementos 
nucleares que compõem o suporte fático do ato “decisão judicial” são, como 
se pode extrair da própria terminologia: a) ter sido proferida por alguém 
investido de função jurisdicional; b) a decisão, a norma concreta, o 
comando, a manifestação do magistrado sobre o objeto litigioso. A 
motivação é elemento que legitima a decisão, deixa-a conforme a 
Constituição. 
É designar uma decisão sem fundamentação de ilegítima, 
espúria, absurda, autoritária etc., mas é inegável que ela é uma decisão. A 
partir do momento que se pode atribuir a um substantivo alguns adjetivos é 
porque algo existe para ser qualificado. É característica dos requisitos de 
validade exercer a função gramatical de adjetivos, conforme lição de 
BARBOSA MOREIRA, já transcrita. 
Não é à toa que o texto constitucional expressamente atribuiu a 
sanção de invalidade à decisão não-motivada. Para que esta sanção seja 
aplicada, é necessário que o ato (decisão) contenha um defeito (ausência de 
fundamentação). De acordo com célebre lição de PONTES DE MIRANDA, 
“defeito não é falta. O que falta não foi feito. O que foi feito, mas tem 
defeito, existe. O que não foi feito não existe, e, pois, não pode ter 
defeito”54. Daí se vê que, para que um ato seja defeituoso, primeiro ele tem 
que ser, tem que existir e, somente se existente, pode conter algum vício. 
É justamente porque há (existe) decisão, em tais hipóteses, que 
ela pode ser anulada pelo tribunal para que outra seja proferida (não se 
anula o que não existe). Trata-se de vício gravíssimo, que pode ser 
conhecido de ofício e permite a sua invalidação mediante o ajuizamento da 
ação rescisória. 
 
 
 
53 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico – plano da existência. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 
2000, p. 47-48. 
54 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. 3a ed. São Paulo: RT, 1983, t. 
4, p. 13.

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