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Favre, R. Prátucas corporais não caíram do céu

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Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
1 
 
 
As práticas corporais não caíram do céu: são 
produções históricas como tudo mais 
Regina Favre* 
 
1. Um modo muito diferente de viver o corpo. 
Aprender o movimento consigo mesmo, explorar o potencial das sensibilidades, 
dos ritmos, das variações de tônus, dos programas neurais inatos, valorizar a 
funções afetivas da respiração, considerar as emoções como forças da 
natureza em nós, avaliar, nas nossa transformações corporais ou nos nossos 
incômodos e disfunções, os efeitos dos acontecimentos em nós. 
Pessoalizar-se, fazer do seu jeito, insistir na prática para que a suas 
possibilidades, o seu jeito, você mesmo apareça fazendo o gesto, vivendo a sua 
experiência no mundo e, quem sabe, até mesmo, sendo um pouco autor de seu 
próprio destino encarnado, neste mundo. 
Uma arte de viver, não uma arte de galeria ou de palco, mas uma estética de si, 
uma prática de si, uma busca de fazer funcionar juntos na ação, o corpo, a 
emoção, a mente. 
 
Um saber que nos chega de algum lugar que o corpo já não é mais um objeto da 
consciência, que o corpo é um processo, que o corpo está continuamente se 
fazendo. 
Uma resposta às pedagogias e às medicinas que nos dizem como sentir, como 
fazer, como viver e como entender o que acontece conosco. 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
2 
Muita gente já reconhece nessa pequena montagem de palavras, expressões, 
frases e afirmações que acabei de fazer, algumas das características de um 
certo conceito que se tem hoje de saúde e de qualidade de vida. 
 
2. Alguns flash- backs: 
Europa ,meados do século 19. 
 Trazida por uma forte onda de desenvolvimento tecnológico, surge a nova 
sociedade industrial. 
Essa virada remodelou completamente a tradição cultural e artística vigente, 
as concepções de forma e linguagem, os valores, a aparência das ruas, das 
casas e seus interiores, das pessoas e do novo uso que passam a fazer de seus 
corpos, para produzir e incorporar todas essas mudanças. 
 
A Inglaterra é hegemônica, nesse contexto de poder 
 E os efeitos de suas políticas coloniais se fazem ver. 
Os exércitos coloniais e os pesquisadores das grandes universidades trazem o 
Oriente para dentro da sociedade européia toda a arqueologia das grande 
civilizações, com seus corpos e deuses. 
Mas, principalmente, são os budismos – indiano, chinês e japonês - que terão 
uma influencia definitiva na construção da imagem corporal do homem ocidental 
em relação às mudanças sociais que se seguirão. 
Darwin promove a maior reviravolta na auto-imagem do homem desde o inicio 
de sua história, retirando de cena, de uma vez por todas, o Criador e 
apresentando o homem à sua animalidade e capacidade adaptativa, fazendo-o 
ver, em seu corpo, a continuidade dos corpos dos seus parentes animais. 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
3 
É o fim de uma lógica de causa e efeito, do Deus relojoeiro, da separação 
cartesiana de corpo e espírito, do poder monárquico. 
Algo descentrado, sistêmico e vertiginoso se anuncia, com o modelo da 
produção industrial. 
Marx apresenta imagens da grande miséria dos corpos produzida juntamente 
com os novos bens da sociedade industrial – os mineiros de carvão, o 
surgimento do lumpenzinato urbano, como podemos ler nos emocionantes 
romances de Dickens. 
 Freud, também, fala de corpos em crise diante dos novos conflitos 
apresentados pela sociedade industrial – os corpos das histéricas que se 
recusam a funcionar em direção à emancipação da mulher que já dá seus 
primeiros sinais, os sintomas neurastênicos dos obsessivos, os delírios 
corporais dos paranóicos, o encolhimento desvitalizado dos fóbicos, diante do 
enfraquecimento do valor da identidade do cidadão burguês. 
Groddeck, o médico da estação de águas de Carlsbad, inventa uma teoria das 
doenças psicossomáticas, tocando nos corpos, ouvindo as pessoas, conversando 
com suas doenças, buscando criar um dialogo nessa língua somática, o que, 
numa perspectiva de hoje, nos permite imaginá-lo trabalhando com o stress 
dos elegantes freqüentadores dos luxuosos spas do fim de século, stress 
produzido pela nova sociedade industrial que desestabiliza os usos conhecidos 
do corpo. 
 
3. Auto-regulação e autonomia: um antídoto. 
A força do capital ,primeiramente pessoalizado na forma das grandes fortunas 
familiares advindas das novas indústrias, à medida que o século 20 avança , se 
torna cada vez mais impessoal , gerando, cada vez mais, o movimento 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
4 
incontrolável do mercado e da economia, que por sua vez gera uma maior 
concentração de riqueza e, ao mesmo tempo, uma maior quantidade de pobreza. 
O homem ocidental parece estar à mercê das forças do capitalismo, assim 
como o homem primitivo estava à mercê das forças da natureza e o homem 
oriental, do absolutismo de seus governantes. 
As idéias biológicas de auto-regulação e autonomia, com seus correlatos 
políticos e psicológicos que aí começam a germinar, se apresentam, então, como 
uma necessidade absoluta para a sobrevivência, no Ocidente, considerando-se 
Ocidente, a Europa, pelo menos até o fim da Primeira Guerra. 
A multiplicação, que aí se inicia, de técnicas corporais – e que na verdade não 
são apenas técnicas – diz respeito às diferentes perspectivas de ver esse 
corpo necessitando se regular a si mesmo e aos diferentes métodos para que 
isso possa ocorrer. 
As práticas budistas que consideram o corpo como parte das forças da 
natureza e do cosmos , somadas à experiência da vida corporal dos grupos 
políticos de jovens nos anos 20, bolcheviques, socialistas, sionistas, 
anarquistas, em seu contato com a natureza, suas formas de socialização, de 
sexo, de amor, de ideais de luta, contaram muito no modelo de saúde e 
naturalidade corporal que prossegue se formando daí em diante. 
É aí que vamos encontrar Reich, inicialmente na sua divergência com Freud, e, a 
seguir, Reich com seus seguidores, primeiramente na Alemanha, a seguir na 
Escandinávia e, por fim, na América. 
 
4. Uma nova cultura vai ganhando consistência: 
Dos anos 20 ao final da Segunda Guerra, portanto, em menos de duas décadas, 
um grande número de figuras contribuiu para a formação dessa nova cultura : 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
5 
W.Reich, Schultz, Laban, Mathias Alexander, Ola Raknes, Ida Rolf, Gerda 
Alexander, Moshe Feldenkrais e outros tantos que não me ocorrem agora. 
Rompendo os limites da vida universitária e hospitalar - lugares das 
aristocracias do saber - as pesquisas individuais, ou em grupos independentes, 
foram fundamentais para o desenvolvimento da formulação de teorias e 
práticas corporais psicoterapêuticas, terapêuticas, pedagógicas, artísticas, 
políticas, baseadas nas visões da biologia, da antropologia, da psicologia, da 
psicanálise, da fisioterapia, dos budismos, das iogas, das artes marciais, dos 
esoterismos das sociedades secretas, das práticas da medicina naturalista, da 
pedagogia goetheana, e, até, talvez ,dos hassidismos. 
Um grande caldeirão transdisciplinar e transcultural. 
Algo que se apresenta como um novo humanismo. 
 
5. O pólo produtor dessa cultura se muda para a América: 
A promessa da democracia atrai para a América, durante e no final da Segunda 
Guerra, entre uma infinidade de refugiados da Europa e da Ásia, a imigração 
massiva desses novos humanistas europeus. 
No ambiente das tradições americanas do pragmatismo, da psicanálise do ego, 
do valor do corpo, da vida na natureza, e, por que não dizer, do conhecimento 
através da iluminação inerente ao fundamentalismo evangélico americano, mas, 
principalmente, da enorme prosperidadee otimismo do pós-guerra, floresce o 
Movimento do Potencial Humano. 
Viceja, agregando e potencializando a nova mistura que inclui um imenso leque 
de práticas e técnicas de si :as comunidades terapêuticas, os workshops, a 
Bioenergética (primeiro fruto americano do reichismo) ,os grupos de encontro, 
a Gestalt, todos os métodos de integração de corpo e mente trazidos pelos 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
6 
humanistas imigrados, as práticas budistas, as meditações e as artes marciais 
trazidas pelos monges asiáticos. 
 
Medicinas alternativas, terapias alternativas, educação alternativa, sociedade 
alternativa já não são mais, hoje, um bom nome para essas práticas. 
 Mas, na época, era como se qualificavam, quando, após os grandes confrontos 
políticos dos anos 60, tentavam se estabelecer lado à lado com a cultura 
dominante, juntamente, com outra moda, outra música, outra arte, outras 
práticas sociais . 
Era todo um outro uso do corpo, para exorcizar os velhos modos hipócritas e 
tirânicos de se relacionar, trabalhar, viver o sexo, conceber a família, o 
dinheiro, a educação, a loucura, a política, o poder. 
 Era a contra-cultura. 
 
6. Num sentido ou no outro, americaniza-se o mundo. 
É a americanização do mundo. 
Pela cultura do consumo ou pela contra-cultura. 
Essa nova cultura se re-exporta para a Europa, onde se reencontra com as 
sementes deixadas por Reich que já estão dando seus frutos, em forma das 
várias escolas de psicoterapia corporal. 
E prolifera, rapidamente, nos novos grupos e novos centros de crescimento 
pessoal. 
Nos anos 70, na Europa e nos Estados Unidos, tornam-se amplamente 
conhecidas as psicoterapias corporais de raiz reichiana, multiplicam-se as 
práticas e os métodos corporais, seja de exercícios, seja de manipulações. 
Pessoas, fervorosamente, desejam mudar, mudando seus corpos. 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
7 
Participam de grupos, fazem terapia, desejam se tornar terapeutas. 
 
7. E o Brasil, como entrou nessa dança? 
No final dos anos 60, a Tropicália expressava a necessidade absoluta para nós, 
de espanar o pó autoritário da nossa tradição agrária, positivista, católica e 
militar: refazer os corpos e abrir-se para o mundo. 
Gaiarsa, leitor e pesquisador de Reich, em 66 – no day after da pílula anti-
concepcional - é o primeiro a levantar a bandeira do corpo entre nós com sua 
pesquisa para a Revista Realidade – A juventude diante do sexo. 
Com o sufoco da ditadura, brasileiros viajam e se encontram, sobretudo em 
Londres, com essa cultura dita alternativa, nos inícios dos anos 70. 
Já em 75, funda-se, em São Paulo, um curso de psicoterapia corporal no 
Instituto Sedes Sapientiae, primeiro pólo receptor dessa cultura no Brasil. 
E, já, nos anos 80, no eixo Rio-SP, assistimos a vários grupos organizando 
formações de profissionais em torno de alguns nomes internacionais do campo 
corporalista. 
O Ágora Centro de Estudos Neo-Reichianos,em SP, por exemplo, durante 18 
anos, ensinou as diferentes linhas de psicoterapia corporal para um grande 
número de pessoas, profissionais e não profissionais da saúde. 
 No final dos anos 80, muitos Centros já estavam organizados no Brasil 
transmitindo conhecimento reichiano como é o caso da Vegetoterapia, neo-
reichiano como é o caso da Bioenergética e não-reichiano como é o caso da 
Educação Somática Existencial que se constitui, no inicio dos anos 90, como um 
pensamento corporalista baseado principalmente no pensamento neo-
darwinista, não-psicanalítico, não-reichiano de Stanley Keleman. 
 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
8 
8. Uma década na barriga da psicanálise. 
O modo como essas idéias e práticas corporalistas começaram a fazer sentido 
no Brasil, por volta de 75, ocorreu de maneira muito peculiar. 
Sem dúvida, mais do que na Europa ou nos Estados Unidos, elas vinham se 
juntar às forças da esquerda que lutavam para se opor a enorme onda do 
capitalismo que se mundializava através de ditaduras como as que sufocavam e 
dizimavam todas as manifestações culturais e políticas na América Latina, 
particularmente no Brasil e na Argentina. 
Todos sabem o quanto a Psicanálise, uma certa psicanálise militante dissidente 
da IPA ,no Brasil e na Argentina - países de grande desenvolvimento nesse 
campo - foi importante nessa resistência. 
Portanto, nada mais natural, que certos divãs generosos como o de Regina 
Chnaiderman, e outros, acolhessem e gestassem o movimento corporalista 
recém concebido no Brasil. 
Todos sabem também que, por essa afinidade com a psicanálise, o reichismo 
que mais ressonância encontrou entre nós foi o da Analise do Caráter - um 
avanço no campo da psicanálise nos anos 30 – na interpretação americana de 
Alexander Lowen nos anos 50. 
Portanto, o grande esforço do campo corporalista brasileiro dos anos 70 foi 
tentar a construção de uma base psicanalítica para sua prática – encontrar 
lugar para a 2o tópica(id,ego e superego), para noções de inconsciente, para 
noções de transferência – enquanto o corpo em sua pujança e maravilha 
permanecia intocado teoricamente. 
Não fosse o impacto das seguidas visitas de Felix Guattari ao Brasil a partir de 
79 talvez ainda estivéssemos às voltas nessa luta inglória com a tradição 
psicanalítica. Ambos, a partir desse impacto, corporalistas e psicanalistas, e 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
9 
muitos outros campos, puderam validar a singularidade de suas práticas e seus 
agenciamentos teóricos, tendo em vista uma operatividade dos conceitos face a 
especificidade dos problemas que se apresentem. 
 
9. Uma resposta para o capitalismo industrial, outra resposta para o 
capitalismo global: 
Vemos então, como o pensamento da Análise do Caráter/Função do orgasmo 
atende aos problemas das formas de subjetivação produzidas pelo capitalismo 
em seu estado industrial: captura da energia sexual pelas forças produtivas da 
industria baseada na adaptação ao modelo da família patriarcal - o nome do 
pai. Para esse modelo reichiano psicanalítico, o orgasmo se identifica com a 
revolução,o caráter genital com a liberdade e a potência buscada é a potência 
orgástica.A referência de modelo de constituição do sujeito psíquico ainda é a 
2o tópica e os três ensaios da sexualidade, e o corpo, em sua economia libidinal, 
oscilaria entre carga e descarga, funcionamento simpático e 
parassimpático,correspondendo o caráter a formações relativas aos estágios 
de desenvolvimento psicossexual e a totalidade do funcionamento do sistema 
em contato com outro sistema, gerando o reflexo orgástico. 
Entretanto, o capitalismo industrial, no pós-68, rompe as fronteiras nacionais 
passando a operar segundo o modelo do capitalismo mundial integrado , na 
expressão cunhada por Guattari.O romance familiar passa a ser uma pequena 
parte do romance histórico mundial. 
Então, a partir de 79, começo ver com Guattari, e muito com a ajuda de Suely 
Rolnik, uma realidade a que ele chama capitalismo mundial integrado e seus 
efeitos na subjetividade. E começo a perceber que essa idéia de corpo e 
sujeito do mundo corporalista-de-base-psicanalítica não me permitem operar 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
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conceitos como desejo produtivo, campo de imanência, ver os vínculos e o self 
em continuo processo construção/desconstrução, compreender o que são 
rizomas e agenciamentos - toda uma visão de um infinito campo molecular 
dobrando-se, agencianado-se, ligando-se, gerando diferenças e singularidades. 
Descubro a noção de auto-poiese em Varella. 
E finalmente redescubro Stanley Keleman que com sua noção de processo 
formativo, com suas mil distinções sobre o processode produção de corpo, 
cabe exatamente no lugar de Varella, maravilhosamente acompanhando-se de 
seu método de corpar, que mais parece um Spinoza contemporâneo, vital e 
prático, dentro de sua tradição pragmática americana tão admirada por 
Guattari. 
 
10.Um agenciamento teórico e pragmático 
 A Educação Somática Existencial que passo a conceber a partir de 85, imersa 
na experiência de co-dirigir e ensinar no extinto Ágora, com as primeiras 
leituras de Keleman passa a ser uma busca incessante de articular seu 
pensamento formativo com a Esquizoanálise de Deleuze e Guattari e mais 
adiante com contribuições da Neurociência de autores como Gerald Edelman, e 
simultaneamente com elementos da visão de desenvolvimento e vínculo de 
autores como Daniel Stern e John Bowlby. 
 
Essas ferramentas, cuidadosa e continuamente forjadas permitem uma 
coerência com uma visão da realidade enquanto produção, um continuo processo 
de existencialização, e não como um dado. 
Com a ajuda desses autores, torna-se possível visualizar um processo biológico 
e social ocorrendo o tempo todo dentro de nós e fora de nós, os seres humanos 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
11 
como um processo formativo vivo, a existência como um continuum de formas 
somáticas no devir, os modos de subjetivação como continuamente sendo 
produzidos no coletivo segundo jogos de força e a subjetividade como 
emergindo na interação dinâmica entre essas formas e sua pessoalização. 
 
Essa visão formativa, juntamente com a compreensão das distorções das 
formas somáticas e vinculares, instrumentalizada pelo método kelemaniano do 
corpar e o método esquizoanalítico do cartografar, nos permite trabalhar 
sobre o sofrimento e as fragilidades que afetam a potência formativa em nós. 
Potência formativa diferentemente da potência orgástica inerente ao modelo 
reichiano define-se como a capacidade de organizar/encarnar experiência a 
partir dos encontros presentes com pessoas e situações, alinhando-se para 
prosseguir, sempre poroso à continuidade do processo formativo. 
O corpo, passa ser visto enquanto organismo, como um processo auto-
generativo, auto-organizativo e auto regulado que capta e produz experiência 
sensorial, isto é,organiza suas respostas a partir de si mesmo para saber como 
se comportar e prosseguir formando. E no mesmo ato de gerar corpo, gera-se 
ambiente, não existe um sem o outro. 
Um corpo em particular passa a ser visto como contínuum que vai da evolução 
da vida na biosfera aos seus processos embriogenéticos próprios, à contínua 
corporificação de sua experiência dos acontecimentos no mundo, mais a 
maturação pré-programada do corpo animal ao longo de uma vida. 
O corpo, particularmente o humano, passa a ser visto como uma realidade que 
se constrói juntamente com a experiência, se valendo das sua estrutura 
embriogenética (neural, muscular e visceral) e não dos órgãos em particular. 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
12 
Podemos então nos ver como muitos corpos e cada corpo é um ambiente 
articulado a outros ambientes, formando ecologias e tendo como cola os modos 
de vinculação próprios do estágio maturacional daquele corpo. 
Os acontecimentos , por sua vez, são vistos como produzindo excitação 
biológica em nós, portanto os corpos, formas, comportamentos passam a ser 
vistos como solidificações de ondas excitatórias segundo suas regras 
fisiológicas. 
Acontecimentos são vistos como conjunturas de fluxos de todo tipo: físicos, 
biológico, históricos, econômicos, familiares, de classe, da mídia, dos poderes, 
do mercado, de grupos, da tecnologia, da moda, etc.etc.Os acontecimentos 
nunca são percebidos em si mesmos mas são recortados por um estado de 
forma individual contemporâneo a eles. 
O que a Educação Somática Existencial quer dizer, jutamente com Keleman, é 
que somos todos participantes da continuidade desse processo mórfico de 
existencialização corporal, onde o processo seletivo da evolução prossegue no 
dia a dia de nossas vidas, num processo de invenção de futuros. 
 
11. Como age o terapeuta/educador somático existencial: 
- exerce seu olhar/presença para as necessidades formativas dos grupos e 
pessoas 
- enxerga as tendências e funções das diferentes formas somáticas. 
- organiza somaticamente sua própria resposta somática e cognitiva ao 
acontecimento; 
 
Fonte:www.institutoreichiano.com.br 
13 
- transmite a linguagem somático-emocional através das moldagens de sua 
fala e presença somática; 
- ensina a problematizar experiencialmente a função existencial das formas 
corporais; 
- facilita a experiência e o manejo das camadas somático-emocionais com que 
construímos nossos diferentes corpos nos diferentes mundos de que somos 
parte; 
- promove a sustentação das intensidades emocionais e suas moldagens em 
diferentes modos de ligação e ação; 
- age considerando que todos, coordenador e membros, estão imersos num 
campo corpante (bodying field); 
- sustenta uma ecologia vincular propícia ao trabalho formativo; 
- trabalha de modo minimalista de maneira a poder trazer o invisível para o 
visível; 
- navega na linha narrativa da experiência produzida dentro das diferentes 
ecologias vinculares. 
 
*Regina Favre é filósofa,terapeuta, primeira geração na psicoterapia corporal brasileira,introdutora 
do pensamento de Stanley Keleman no Brasil, com quem mantém uma relação constante pessoal e 
profissional.Traduziu praticamente todos seu livros para o português.Foi diretora do Ágora Centro 
de Estudos Neo Reichianos (SP) e do Centro de Educação Somática Existencial(SP). Atualmente 
prossegue independente seu trabalho de clínica e transmissão kelemaniana bem como 
do alargamento filosófico e político do legado kelemaniano.

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