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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO PROFESSOR Me. Gilson Aguiar FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 2 C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; AGUIAR, Gilson Fundamentos Históricos e Filosóficos da Educação. Gilson Aguiar Maringá - PR, 2018. 152 p. “Graduação em Educação Física - EaD”. 1. Educação. 2. Filosofia . 3. História 4. EaD. I. Título. ISBN 978-85-8084-495-5 CDD - 22ª Ed. 370 CIP - NBR 12899 - AACR/2 NEAD Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 Jd. Aclimação - Cep 87050-900 Maringá - Paraná www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 DIREÇÃO UNICESUMAR Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva, Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi. NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Direção Executiva de Ensino Janes Fidélis Tomelin, Diretoria Operacional de Ensino Kátia Coelho, Diretoria de Planejamento de Ensino Fabrício Lazilha, Direção de Operações Chrystiano Mincoff, Direção de Polos Próprios James Prestes, Direção de Desenvolvimento Dayane Almeida, Direção de Relacionamento Alessandra Baron, Gerência de projetos especiais Daniel F. Hey, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila de Almeida Toledo, Coordenador(a) de Contéudo Mara Cecilia Rafael Lopes, Projeto Gráfico José Jhonny Coelho, Editoração Humberto Garcia da Silva, Designer Educacional Nádila Toledo, Qualidade Textual Hellyery Agda, Revisão Textual Keren Pardini, Ilustração Bruno Pardinho e André Onishi, Fotos Shutterstock e Istockphoto. Viver e trabalhar em uma sociedade global é um gran- de desafio para todos os cidadãos. A busca por tecno- logia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e solução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro. Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar assu- me o compromisso de democratizar o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. No cumprimento de sua missão – “promover a educa- ção de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro Universitário Cesumar busca a integra- ção do ensino-pesquisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consciência social e política e, por fim, a democrati- zação do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Centro Universitário Cesumar almeja ser reconhecida como uma instituição universitária de referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de com- petências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão uni- versitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e adminis- trativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos, incentivando a educação continuada. Wilson Matos da Silva Reitor da Unicesumar boas-vindas Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Comuni- dade do Conhecimento. Essa é a característica principal pela qual a Unicesumar tem sido conhecida pelos nossos alunos, professores e pela nossa sociedade. Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais daquele conhe- cimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um conhecimento dinâmico, renovável em minutos, atemporal, global, democratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais. De fato, as tecnologias de informação e comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da educação por meio da conectividade via internet, do acesso wireless em diferentes lugares e da mobilidade dos celulares. As redes sociais, os sites, blogs e os tablets aceleraram a informação e a produção do conhecimento, que não reconhece mais fuso horário e atravessa oceanos em segundos. A apropriação dessa nova forma de conhecer transfor- mou-se hoje em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das desigualdades, propagação de trabalho qualificado e de bem-estar. Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a conhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está disponível. Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modi- ficou toda uma cultura e forma de conhecer, as tecno- logias atuais e suas novas ferramentas, equipamentos e aplicações estão mudando a nossa cultura e transfor- mando a todos nós. Então, priorizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância (EAD), sig- nifica possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos em informações e interatividade. É um processo desafiador, que ao mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como já disse Sócrates, “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida”. É isso que a EAD da Unicesumar se propõe a fazer. Willian V. K. de Matos Silva Pró-Reitor da Unicesumar EaD Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando opor- tunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará duran- te todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógi- ca e encontram-se integrados à proposta pedagógica, contribuindo no processo educacional, complemen- tando sua formação profissional, desenvolvendo com- petências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos Kátia Solange Coelho Diretoria Operacional de Ensino Fabrício Lazilha Diretoria de Planejamento de Ensino em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhe- cimentos necessários para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cresci- mento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Vir- tual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendi- zagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica. boas-vindas apresentação do material FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO SEJA BEM-VINDO(A)! Caro(a) aluno(a), este trabalho é a realização de um objetivo e o começo de um desafio. Feito para garantir a(o) graduando(a) em um entendimento das origens do pensamento ocidental e, por consequência,de como está estruturada nossa forma de compreender o homem contemporâeno. Este trabalho é fruto de uma insistência em compreender melhor o que somos para traçar um caminho para o desenvolvimento do pensamento ocidental e da educação no Brasil. É ainda um desafio quando a função deste material é qualificar educadores, aqueles que terão em suas mãos a capacidade de preparar o homem e lhe dar potencial para mudar seu destino. Sou um educador, formado em História, mestre em História e Sociedade, um apaixonado pela construção da civilização ocidental, a qual, você vai perceber, é tema corrente neste trabalho, dedicado a você, futuro(a) profissional. Gostaria de lembrá-lo(a) que ser “educador(a)” na Grécia Antiga é conduzir, para a educação, um desafio ainda nos dias de hoje. Mas há um exemplo que pode ser resgatado, o de Aristóteles. Um dos maiores pensadores gregos nasceu na cidade de Estagira, mas migrou para Atenas, principal cidade-estado grega para ingressar na Escola de Platão, o centro da cultura grega. Buscar como Aristóteles é fruto de uma ação. Um ato necessário que deve partir de nós, mais do que qualquer outra pessoa. Como afirma Sartre (1973, p. 13), o filósofo francês do existencialismo: O quietismo é a atitude das pessoas que dizem: os outros podem fazer aquilo que eu não posso fazer. A doutrina que voz apresento é justamente a oposto ao quietismo, visto que ela declara: só há realidade na ação; e vai mais longe, visto que acrescenta: o homem não é se não o seu projeto, só existe na medida em que sem realiza, não é, portanto, nada mais do que o conjunto dos seus atos, nada mais do que a sua vida. Por isso temos que agir, ir além, fazer nossa vida, escrevê-la. Espero que este trabalho possibilite esse despertar pelo gosto da filosofia, da história da educação e pelo interesse em sua própria vida. Uma vida que não se resuma em seus próprios interesses, mas de uma sociedade melhor. O fazer exclusivamente por nós é uma ideia falsa de um objetivo de vida. Nós só seremos lembrados se deixarmos um legado, ir além da nossa existência, dar um sentido social a ela. Na primeira unidade, trabalharemos os pensadores clássicos. Colocar-se-á em questão as primeiras construções do pensamento ocidental com o homem grego. Resgataremos os pré-socráticos e seus dramas da existência, drama que ainda hoje rodeia nossas vidas. Avançaremos para Sócrates, um pensador que preferiu a morte ao negar sua cren- ça. Falaremos também sobre Platão, um dos discípulos corrompidos pelos seus pensamentos, que descreveu o julgamento do mestre e se colocou no desafio de dar continuidade à educação do homem pleno, o homem sábio. De Aristóteles já falamos, fez uma jornada para migrar para Atenas e ser educado por Platão. Mas nem isso o fez se submeter ao pensamento do mestre. Sem jamais desrespeitá-lo, o questionou, fez a crítica e construiu sua forma independente de compreender a existência. O que se espera de um bom aluno? Talvez o comportamento de Aristóteles nos responda, ir além do mestre, mas sem lhe perder o respeito. Hoje se assiste ao desrespeito ao educador sem se ter um avanço na qualidade humana. No caminho da jornada do pensamento ocidental, procurar-se-á compreender a construção das bases do pensamento europeu. A relação entre a religiosidade cristã, que construiu o predominante pensamento escolástico durante o Período Medieval, e a revolução científica lançada pela Renascença, movimento cultural e científico dos Séculos XIV a XVI. A partir da segunda unidade, avançaremos para o pensamento moderno e contem- porâneo. A supremacia planetária da filosofia ocidental. As conquistas econômicas e sociais da sociedade europeia se expressaram em sua compreensão do homem, na sua organização política e, em especial, na formação dos estados nacionais. A segunda unidade ainda contemplará os grandes clássicos das ciências sociais. O positivismo de Comte, o estruturalismo de Durkheim, o materialismo de Marx e a história cultural de Weber. Mais que isso, resgataremos os pensadores contempo- râneos do existencialismo e os que resgatam por meio da fenomenologia a crise do indivíduo contemporâneo. Visto que o homem de hoje está em crise, necessitamos analisar com profundidade os fatores que a determinam. Esse será um dos temas centrais da discussão desta unidade. Por fim, resgatar-se-á a história da educação. Em um texto rápido, mas com análises necessárias sobre o contexto em que a educação brasileira viveu, a construção de seu dilema nunca foi realmente para todos e quando foi não cumpriu e cumpre o seu papel. Procuraremos demonstrar o papel que o estado teve na ineficiência da educação pública ao longo de boa parte da história brasileira. Mesmo quando assumiu o papel de propagar a educação, a fez de forma quantitativa e não qualitativa. Mes- mo hoje, os resultados da educação do país, comparada com a de outros países, preocupam. O desempenho dos nossos alunos do ensino público comparado com o privado também é um dilema. A história é um importante instrumento para orientar nossa análise sobre esses problemas. Espero que o objetivo que fez com que este trabalho surgisse seja atingido. Sempre haverá algo a ser refeito. Sempre teremos que repensar nossa forma de compreen- der o mundo, sempre descobriremos imperfeições. A imperfeição é nossa carac- terística mais importante e o repensar, o nosso maior instrumento de superação. Um trabalho que peço a ajuda do(a) meu(miha) leitor(a). Não rogo a plenitude, quando educar implica em reconhecer que se tem algo a aprender. Por isso, mande observações, faça e refaça também a sua versão sobre o conteúdo desta obra, ela é feita para você e deve ser revista a partir do momento em que você se relaciona com o conteúdo que está presente nela. “Um homem não toma banho duas vezes no mesmo rio”, a frase de Heráclito nunca deve ser esquecida. Este trabalho é como um rio, quando produzido como seu autor, eu sei que não será visto por mim da mesma forma, como não sou o mesmo após tê-lo produzido. Espero que você também se transforme ao entrar em contato com ele. Ele também irá mudar por tudo isso, com certeza. A mudança é uma necessidade, se a ciência puder promover as bases para que ela ocorra sem perder o sentido que a vida tem para cada um de nós, preservando a convivência social e respeitando-a, este trabalho terá cumprido o seu papel. Muito Obrigado! Gilson Aguiar sumário UNIDADE I A ORIGEM DA FILOSOFIA 14 Introdução 16 A Origem do Pensamento Filosófi co, dos Pré-Socráticos aos Clássicos Gregos 25 Além da Grécia: As Civilizações que Herdaram o Pensamento Grego 32 O Pensamento Filosófi co Medieval 40 O Nascimento do Islã 42 Cruzadas à Redenção do Ocidente, a Unidade Cristã e a Decadência do Papa 47 considerações fi nais UNIDADE II DA FILOSOFIA DO MUNDO MODERNO AOS RACIONALISTAS: A EXPANSÃO OCIDENTAL E A REVOLUÇÃO COPERNICANA 52 Introdução 54 O Nascimento do Pensamento Ocidental Moderno 62 A Construção do Estado Nacional e a Ciência Política 67 O Senhor do Pensamento Moderno 70 Do Racionalismo às Portas do Iluminismo 74 considerações fi nais UNIDADE III DO PENSAMENTO ILUMINISTA AOS PENSADORES CONTEMPORÂNEOS 82 Introdução 84 Os Iluministas 91 Os Pensadores do Mundo Contemporâneo 101 A Crise de Identidade Humana e os Pensadores Contemporâneos 107 considerações fi nais UNIDADE IV A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: UMA AUSÊNCIA SENTIDA 114 Introdução 116 Os Primeiros Tempos 119 Educação Laica, o Abandono 121 Da Colônia ao Império 125 considerações fi nais UNIDADE V DA VELHA REPÚBLICA À REPÚBLICA NOVA 132 Introdução 134 O Regime Republicano: Educação de Saliva e Papel 136 Eis que Getúlio se Estabelece: O Modelo Imposto 139 O Regime Militar e a Educação Abaixo de Botas 142 considerações fi nais 148 Conclusão Geral 151 Referências A ORIGEMDA FILOSOFIA Professor Me. Gilson Aguiar Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • A origem da fi losofi a com os pensadores pré-socráticos • A importância dos fi lósofos clássicos para a construção de uma racionalidade ocidental • A importância da relação entre a fi losofi a e a teologia cristã • As diferentes concepções de cristianismo e sua infl uência sobre a concepção de homem na Europa Medieval Objetivos de Aprendizagem • Entender os desdobramentos do pensamento fi losófi co ocidental na Antiguidade, Grécia e Roma. • Compreender a importância dos pensadores clássicos gregos – Sócrates, Platão e Aristóteles – e seus princípios que se propagaram além da Grécia. • Estabelecer a relação entre o desenvolvimento de uma fi losofi a clássica com as mudanças que o mundo sofreu na passagem da antiguidade para a Idade Média. unidade I INTRODUÇÃO 14 “Lembrar sempre que a filosofia nasceu do parto das ideias e não da compreensão racional das coisas como são”. Prezado(a) aluno(a), a importância da filosofia como base para a compre- ensão do mundo muitas vezes é questionada. Sempre estamos à volta de que a reflexão sobre o mundo que nos cerca é distante demais da realidade e de suas necessidades. Pode haver uma verdade nisso. Se há uma verdade, ela está relacio- nada à ignorância da necessidade de compreender o significado da vida humana, do que um educador não pode abrir mão, mas que infelizmente muitos abrem. Diante dessa dúvida, procurei apresentar em cinco unidades a trajetória do pensamento ocidental. Em relatos resumidos, com relacionamento constante com a contextualização histórica de cada pensador e o contexto em que sua obra foi produzida, busquei desenvolver um texto com os pontos fundamentais do histórico pessoal e os elementos fundamentais que sustentam sua teoria. Ao final da unidade, há uma ou mais citações de autores trabalhados durante a unidade. Esses textos, originais, clássicos são fundamentais para que você se familiarize com o pensamento em uma expressão original, mas também reflita sobre as questões que envolvam o nosso tempo. De nada adianta uma obra de 15 fi losofi a que fi que restrita a um simples relato de ideias. Por isso, procure também desenvolver temas que possam vir a sua mente durante a leitura. Esta unidade parte do pensamento clássico grego, demonstrando as teses de Sócrates, Platão e Aristóteles como base do pensamento fi losófi co ocidental. É possível perceber que esses autores são citados no decorrer da unidade, servindo de base para os demais fi lósofos. Teóricos como Santo Agostinho, Santo Anselmo, São Abelardo e São Th o- máz de Aquino demonstram a corrente de pensamento organizada dentro do discurso católico. A relação direta entre o conhecimento de Deus e a verdade dos homens. Por mais que superado na chamada “modernidade”, essa concepção dominou a vida europeia. Nesta unidade, a principal sugestão é perceber o quanto o pensamento clás- sico (grego) e o pensamento religioso moldam o que se tornará a ética ocidental. Ainda hoje temos instituições religiosas que estabelecem sua perspectiva de exis- tência nas concepções que você vai estudar nesta unidade. Boa leitura! FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 16 A primeira obra que me ocorre é a “Apolo-gia a Sócrates”, uma das obras de Platão. Nela, ele relata o julgamento do pensador grego, o que se considera o maior dos fi lósofos, o “pai da fi losofi a”1. Nesse episódio, o julgamento foi resultado da denúncia de três moradores de Atenas – Ânito, Me- leto e Lícon. O primeiro, Ânito, era um importante comer- ciante grego. Sua discórdia com Sócrates foi o fi lho, um aprendiz do pensador. O comportamento ques- tionador do aprendiz irritou o pai. Dessa forma, jun- tou-se aos demais e fortaleceu a acusação assinada por Meleto. 1 O título de “pai da fi losofi a” é indicado a três grandes pensadores gregos, Sócrates, Platão e Aristóteles. Há motivos para tentar condecorá-los com esse título. Considero que os três têm importantes contribuições para a construção do pensamento ocidental. O que tentaremos, de certa forma, contribuir para o entendimento nesta simples obra. Meleto era um poeta, pouco conhecido, mas, se- gundo se levantou nas obras escritas por pensado- res gregos, teria se indisposto com Sócrates pela sua forma de propagar ideias e de questionar o ganho de quem cobrava do ministério de ensinar, assim como Lícon, um professor desconhecido, o pres- tígio de Sócrates irritava. “A inveja também mata, tanto quanto a vaidade”. O PENSAMENTO SOCRÁTICO Sócrates é um personagem controverso. Jamais dei- xou uma obra escrita, pelos menos até agora nunca foi encontrado nenhum manuscrito de sua autoria. O que se sabe sobre vem de relatos de outros pensa- dores, discípulos, como Platão, ou inimigos e críti- cos, como Aristófanes. Ele se negava aos manuscritos por considerar que a palavra escrita prenderia a ideia e a colocaria A Origem do Pensamento Filosófi co, dos Pré-Socráticos aos Clássicos Gregos EDUCAÇÃO FÍSICA 17 limites, destruindo a capacidade de mudança e eter- nizando os erros. Hoje, são exatamente esses erros escritos que nos fazem reescrever o que somos. Mas em uma Grécia onde a oralidade era o elemento de- terminante para a preservação da memória e repas- sar o saber, não há o que julgar a postura. Sua oposição aos sofistas, homens que percor- riam as cidades discursando sobre temas da natureza e da vida pública, lhe rendeu muitos inimigos. Sua crítica direcionava-se à prática de discutir sem ques- tionar, afinal os sofistas se prendiam ao que não dis- cutia a essência humana, mas apenas à manutenção da conduta ou à complexidade de raciocínios que os afastavam do homem comum. Oposto à vida dos sofistas, Sócrates era visto em meio ao povo, andava descalço. Segundo Platão, brincava com crianças e se apegava a pensar e refletir sobre as questões profundas da existência humana. Jamais cobrou sobre suas palestras e diálogos. A vida de filosofar e refletir sobre a existência humana e a capacidade de entendermos o que nos cerca veio ainda na infância do pensador grego. Esse fato ocorreu quando sua mãe, uma parteira, não de profissão, ao ajudar o nascimento de uma criança, despertou em Sócrates o sentido da reflexão, o que ficou conhecido como “maiêutica”. O papel de um filósofo seria colaborar para des- pertar o nascimento da reflexão, o que todo mundo tem como potencial dentro de si. Seria, ainda, per- mitir que essa capacidade se expresse e se mantenha constante ao entender os elementos que dão sentido a vida humana. Por isso, Sócrates não se considerava um denuncia- dor da verdade, mas alguém que quer despertar a capa- cidade das pessoas de buscá-la. Para ele, mais impor- tante do que propagar a certeza é estimular a dúvida. Fico pensando se não seria essa a função dos educadores. Não só aqueles que se formam hoje para FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 18 a educação institucionalizada, como também os que têm a capacidade de nos indagar sobre o que nos cer- ca, sobre o dia a dia e, enfim, toda a nossa vida. Des- vendar o sentido da existência é o verdadeiro sentido de existir, do que adianta existir se não se tem a com- preensão do por que se existe. Mas, como todo pensador que compreende além do senso comum o sentido da vida, Sócrates pagou com a sua própria a audácia de romper com o espe- rado, de sair do controle. Nasceu em uma família humilde, em 469 a.C., e foi condenado em 399 a.C. Sua origem humilde con- tracenou com grandes momentos da história grega em que foi protagonista. Ele liderou tropas gregas na Guerra do Peloponeso (431 a.C. a 404 a.C.) e, ao ser derrotado, preferiu preservar a vidade seus homens a trazer consigo os corpos dos mortos, um crime para os gregos, mas se livrou da sentença ao argumentar “que sem os vivos não se pode enterrar os mortos”. Por ter se tornado o pensador influente que percorria Atenas e contaminava sua juventude, foi condenado em uma assembleia de 501 cidadãos. O interesse dos juízes era que Sócrates se calasse, que fugisse para não ser executado, ou que tivesse a língua cortada. Ele preferiu morrer, considerava que era um ganho diante das outras opções que demons- travam a perda de fazer o que mais gostava. Para ele, morrer teria duas possibilidades desco- nhecidas, uma delas seria um sono eterno para quem morresse, seria o bom sono de uma única noite; a outra, se caso existisse outra vida, seria de imortalidade e com homens bem melhores do que ele deixava nesta vida. Uma das críticas feitas pelos amigos ao pensador grego, entre sua condenação e a execução (30 dias), era que ele não pensava nos filhos. Caso pensasse, deveria fugir para preservar a integridade de sua fa- mília. Diante dessa questão, ele dizia que os filhos devem seguir seu destino. Da mesma forma que eles não teriam que ser condenados pelo que o pai fez, não cabe ao pai fugir da condenação por eles. PLATÃO E A VERDADE UNIVERSAL, IR ALÉM DE SI, DO PRÓXIMO. ALCANÇAR O ETERNO A principal crítica de Platão (427 a.C. a 347 a.C.) di- recionava-se ao que não se estabelece como verdade universal. Por mais que exista a necessidade dos va- lores imediatos da vida, temos que ter um sentido maior que norteie nossa existência. Não é por acaso que ele é um discípulo de Sócrates. Sua trajetória dentro da filosofia grega ten- ta consolidar o pensamento filosófico e propagar a universalidade do conhecimento. Sua busca por orientar a formação de um governo justo, para ele, dirigido por um filósofo, o levou a Siracusa em três momentos. Neles, tentou mudar o governo de Dionísio I e, depois, mais duas vezes, o governo de Dionísio II. Para Platão, o bom governo tem um pensador à sua frente. A razão e a sabedoria são os melhores governantes. Sua busca por propagar as ideias de justiça além das muralhas de Atenas lhe custou ser vendido como escra- vo por Dionísio I. Foi resgatado por seus amigos ate- nienses que o compraram e lhe devolveram a liberdade. EDUCAÇÃO FÍSICA 19 Entre suas idas e vindas da Magna Grécia (Sul da Itália) e de Siracusa, fundou a Academia de Atenas, a primeira instituição acadêmica oficial do mundo ocidental. O modelo que se propagaria e daria os moldes ao conhecimento desenvolvido pela civiliza- ção ocidental. Uma das grandes contribuições de Platão é a di- visão da verdade em dois elementos, o material e o imaterial. O primeiro se refere às coisas em si, às que, pelos sentidos, percebemos em sua existência física. A outra, a imaterial, é a que damos sentido, valor aos elementos que nos cercam, como o conceito moral, a relevância social e o peso ético. Da mesma forma que Sócrates, Platão consi- dera a sabedoria nata, ela está em nós, mas precisa ser despertada. Vivemos em um mundo de som- bras que encobre a verdade sobre o que nos cerca. Antes de nascermos, vivíamos em outro lugar, em um corpo celeste, onde tínhamos a sabedoria so- bre as coisas da terra, porque a víamos com um saber superior. Ao nascermos, fomos jogados no mundo material e perdemos a consciência sobre nossa sabedoria. Cabe a nós a busca de despertar o conhecimento e sairmos deste mundo de “som- bras”, de ignorância. Por isso, ele considerava que nascemos sem cons- ciência do mundo, ao convivermos com o que nos cerca, lhe damos sentido. Mas a sabedoria repousa dentro de nós. A essa capacidade de reconhecer as “coisas” e desvendá-las por um conhecimento ante- rior, o qual aos poucos desperta, nós chamamos de anamnésia. Essa capacidade de elucidação eleva o homem e lhe dá uma importância maior diante dos demais. Esses devem ter acesso ao comando social. São eles os melhores elementos para conduzirem a vida de uma cidade, de uma comunidade. É assim que Platão concebe o bom governo, o dos sábios. A ordem social perfeita teria neles os elemen- tos mais elevados. Seriam os membros de “ouro” de uma sociedade ideal. Seriam seguidos pelos solda- dos, aqueles que garantem a ordem e mantêm a uni- dade entre os elementos de uma mesma comunida- de. Essa camada social teria como principal virtude a coragem. Por fim, os elementos inferiores seriam os da “temperança”, os servos e escravos, os trabalha- dores, ligados às necessidades materiais constantes e necessárias. Da mesma forma que o corpo social ideali- zado por Platão, o homem, segundo ele, deveria seguir o mesmo modelo. Entender a necessidade de uma vida dirigida por valores superiores, inte- grar o corpo a um ideal maior que conduzisse a coragem e agisse sobre as necessidades materiais concretas. Suponhamos que alguém o traga para o ou- tro lado do muro. Primeiramente ele ficaria ofuscado e amedrontado pelo excesso de luz; depois, habituando-se, veria as várias coisas em si mesmas; e, por último, veria a própria luz do sol refletida em todas as coisas. Com- preenderia, então, que estas e somente estas coisas seriam a realidade e que o sol seria a causa de todas as outras coisas. Mas ele se en- tristeceria se seus companheiros da caverna ficassem ainda em sua obscura ignorância acerca das causas últimas das coisas. Assim, ele, por amor, voltaria à caverna a fim de li- bertar seus irmãos do julgo da ignorância e dos grilhões que os prendiam. Mas, quando volta, ele é recebido como um louco que não reconhece ou não mais se adapta à realidade que eles pensam ser a verdadeira: a realida- de das sombras. E, então, eles o desprezariam (PLATÃO, 1997, pp. 287-289). FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 20 Na Escola de Atenas, fundada por Platão, se desta- cou Aristóteles (384 a.C. a 322 a.C.), o mais comple- to dos filósofos, o de maior destaque. Contudo não foi o herdeiro oficial platônico. Vale lembrar que a crítica ao mestre foi uma marca aristotélica, mas essa é outra história contada aqui, aos poucos, enquanto entendemos o pensamento do preceptor2 de Alexan- dre, o Grande. Várias características do pensamento aristotélico o fazem um filósofo distinto. Em primeiro lugar, a capacidade de compreensão de um mundo que vai além da projeção de uma sociedade ideal. Diferente de seu mestre, Platão, Aristóteles considerava funda- mental compreender o homem em conjunto com os fenômenos que o cercam. A natureza e sua dinâmica foram algumas das preocupações do pensador. 2 Preceptor é aquele que ensina, é um mestre. Alexandre, o Grande, foi o im- perador macedônico que conquistou a Grécia, assim como boa parte do mundo conhecido na antiguidade. Aristóteles foi seu aio, que lhe escla- receu diante das dúvidas de compreensão dos seus atos como senhor do Império Helenístico. No pensamento aristotélico, está o respeito à re- construção de uma lógica histórica. Entender as mu- danças do pensamento com o tempo e a maturida- de do homem que compreende o legado que herda. Aristóteles buscava compreender os resultados das obras dos filósofos que o antecederam e contribuir para o avanço do conhecimento. O perigo da obra aristotélica é a generalização do que o antecedeu, a análise particular de uma grande quantidade de obras com diversidade de posiciona- mentos, nem sempre uma continuidade. Esse deter- minismo acabou por confundir dois conceitos, o de resultado e princípio. O conceito de resultado é a preocupação de que todo o pensamento deve se prender a uma única busca, a semelhança entre os elementos diferentes. Um exemplo é que há algo em comum entre o cére- bro do homem e do macaco, mas essa semelhança não pode ser o fator que determine que o homem e o macacosejam iguais, pois não são. Logo, não se aponta a discordância com condição de se abor- dar um determinado conteúdo. Essa generalização ameaça as abordagens que se faz da sequência his- tórica que Aristóteles propõe. Se fôssemos pensar o que isso significaria na atu- alidade, seria considerar que Aristóteles considera o conhecimento produzido uma continuidade direcio- nada para um determinado fim. Não implicaria em uma dinâmica que pode apontar para diferentes for- mas de compreensão da existência. Se pensarmos no significado de nossa vida e con- siderarmos como chegamos a um determinado pon- to, nós temos a impressão de que todos os fatos que nos antecederam conspiraram para estarmos aqui, vivendo o que estamos vivendo. Isso seria incorreto. Somos um resultado, mas nem sempre de uma con- dição desejada. ARISTÓTELES E A HISTÓRIA DA FILOSOFIA EDUCAÇÃO FÍSICA 21 A PREOCUPAÇÃO COM OS QUE VIERAM ANTES Como falamos anteriormente, Aristóteles se preocu- pou em resgatar os pensadores que o antecederam. Aqueles que deram origem ao pensamento filosófi- co, diferenciando-os dos historiadores ou dos sofis- tas. Para ele, pensadores como Tales (624-547 a.C.) ou Parmênides (530-460 a.C.) foram importantes iniciadores da construção de uma lógica complexa e de um entendimento superior sobre a essência da natureza e do homem. Tales, que viveu na Itália, não buscava nos ele- mentos da natureza o princípio único de tudo o que nos cerca, para ele, o saber deve ir além do princípio moral. Ou seja, se a água está em quase todas as coi- sas, e o Planeta é formado em sua maioria por água, não significa que ela é a essência de tudo o que existe, a sua natureza não é determinante sobre as demais. O saber verdadeiro, segundo o próprio Aristóte- les, não se prende a um conceito moral ou ético, ele vai além, ele é eterno. Heráclito (537-573 a.C.) foi emblemático, ele é o responsável pela célebre frase: “um homem não pode se banhar duas vezes no mesmo rio”. Ou seja, o mun- do viveu um movimento constante. Tudo é mudan- ça. Mas o que muda? Quem foi um pioneiro nesse princípio foi Par- mênides. Em sua série de poemas com o título de “Da Natureza”, ele considerava que o conhecimento é o saber dos deuses. São eles que compreendem a lógica do que existe e sua função. O homem nomina as coisas, mas não sabe sobre sua essência e o que ela é capaz de determinar. Aqui temos mais um aprendizado fundamental. O saber é eterno, os homens, não. Viver sem conhecer a importância da ciência, da essência de tudo, não é vi- ver. Ou, se é, é existir sem dar um sentido à existência. Mas como é possível conhecer as coisas se tudo está em constante mudança? Esta é uma indagação que ainda hoje movimenta as teses filosóficas. Vive- mos um mundo em transformação, como seria pos- sível conhecer sua lógica? Existira um meio de com- preender a permanência sem perder os elementos que explicam as constantes mudanças? Zenão (490-430 a.C.), vindo de Eleia, a mesma cidade italiana de Parmênides, condenava o movi- mento assim como a diversidade, ele considerava que ambas eram uma ilusão. “Nós mudamos, as coi- sas não mudam. Temos que descobrir a mudança em nós e não nas coisas”. Porém a essência do mundo também é impor- tante para os pré-socráticos como elemento de com- preensão da natureza. Os elementos que formam a materialidade das coisas também podem ser os ele- mentos que formam a materialidade da alma. Um dos antecessores de Sócrates que tratou do tema, por mais que com distúrbios das análises de Zenão e Parmênides, foi Anaximandro. Pouco se sabe sobre sua data de nascimento ou morte, mas foi um dos membros da escola de Tales de Mileto. Ele considerava que o ar, e não a água, seria o elemento vital para a manutenção da vida, inclusive da alma. Mas nem todos os pensadores comungaram com a ideia prática da filosofia, do homem que deveria entender os elementos e interferir em sua existência. Pitágoras nasceu na Grécia, em Samos, mas desen- volveu seus trabalhos e sua “escola filosófica” no sul da Itália, em Crotona. Ele considerava que o papel do filósofo é a contemplação. Comparava a existência aos jogos olímpicos, uns vão para comprar e vender, os inferiores; outros vão para competir, os agentes da política, os soldados, os que determinam a vida das instituições; por fim, os que vão assistir e contem- plar, estes são superiores, estes são os filósofos. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 22 CONCLUSÃO DESTA DISCUSSÃO mos sempre polarizando entre a função que ela exerce e o princípio que a norteia. Devemos nos preocupar com o mundo do fazer ou devemos nos dedicar a entender. Em sua obra “História do Pensamento Oci- dental”, Bertrand Roussell faz uma crítica ao re- trocesso filosófico religioso e ressalta a busca dos fatores que determinam os elementos da natureza. Para ele: O problema da sobrevivência significa, em pri- meiro lugar, que o homem precisa tentar sub- meter as forças da natureza à sua vontade. Antes que isso fosse feito com os meios que hoje podemos chamar de científicos, o ho- mem praticava a magia. A noção geral subjacente é a mesma em ambos os casos, pois a magia é uma tentativa de obter resul- tados específicos com bases em certos ritos rigidamente definidos. [...] Por outro lado, a religião se origina de sua fon- te diferente e tenta obter resulta- dos independentemente da sequên- cia regular (RUSSEL, 2001, p. 147). Contudo esse dilema ocidental sobre a na- tureza determinou o futuro não só da filoso- fia, mas de todo o conhecimento por ela pro- duzido. A discussão é longa e, aqui, estamos só começando. O que estamos debatendo, além da lógica de filoso- far, o que nos parece “óbvio” é entender o posiciona- mento do homem diante da natureza e da justifica- tiva de sua própria existência. Ainda hoje buscamos compreender o que poderia estar além da nossa exis- tência. Ou, ainda, qual o papel da ciência na trans- formação do homem e daquilo que o cerca. A filoso- fia, de certa forma, une estes dois elementos e dá um sentido maior à vida humana. Vale ressaltar aqui o que foi discutido ao longo desta unidade, a tentativa dos pensadores da anti- guidade em desvendar o sentido da vida e a lógica do que está por trás do mundo aparente, o que se- ria o princípio da vida e qual o significado do seu resultado. Esse material, que é direcionado aos alu- nos do Ensino a Distância do Cesumar, tenta ressaltar a importância do sentido do conhe- cimento. Ao trabalhar com a formação e in- formação, temos que ter claro que o conceito de homem está se definindo, um homem que contempla ou um homem que transforma? O debate acerca de questiona- mentos como “devemos valorizar os princípios ou as funções?” ainda é atual. Hoje, diante do debate sobre o papel da educação, que discutimos constantemente, esta- 23 LEITURA COMPLEMENTAR Mas até que ponto a inteligência do homem, construí- da sobre a verdade, o colocaria diante de si mesmo e dos outros seres humanos como alguém compreendido? Não há obra que descreva melhor a angústia da “verda- de” do que o Mito da Caverna (PLATÃO, 1979, p. 73). Imaginemos homens que vivam numa caverna cuja en- trada se abre para a luz em toda a sua largura, com um amplo saguão de acesso. Imaginemos que esta caverna seja habitada, e seus habitantes tenham as pernas e o pescoço amarrados de tal modo que não possam mudar de posição e tenham de olhar apenas para o fundo da caverna, onde há uma parede. Imaginemos ainda que, bem em frente da entrada da caverna, exista um peque- no muro da altura de um homem e que, por trás desse muro, se movam homens carregando sobre os ombros estátuas trabalhadas em pedra e madeira, representan- do os mais diversostipos de coisas. Imaginemos tam- bém que, por lá, no alto, brilhe o sol. Finalmente, ima- ginemos que a caverna produza ecos e que os homens que passam por trás do muro estejam falando de modo que suas vozes ecoem no fundo da caverna. Se fosse assim, certamente os habitantes da caverna nada poderiam ver além das sombras das pequenas es- tátuas projetadas no fundo da caverna e ouviriam ape- nas o eco das vozes. Entretanto, por nunca terem visto outra coisa, eles acreditariam que aquelas sombras, que eram cópias imperfeitas de objetos reais, eram a única e verdadeira realidade e que o eco das vozes se- riam o som real das vozes emitidas pelas sombras. Suponhamos, agora, que um daqueles habitantes con- siga se soltar das correntes que o prendem. Com muita difi culdade e sentindo-se frequentemente tonto, ele se voltaria para a luz e começaria a subir até a entrada da caverna. Com muita difi culdade e sentindo-se perdido, ele começaria a se habituar à nova visão com a qual se deparava. Habituando os olhos e os ouvidos, ele veria as estatuetas moverem-se por sobre o muro e, após for- mular inúmeras hipóteses, por fi m compreenderia que elas possuem mais detalhes e são muito mais belas que as sombras que antes via na caverna, e que agora lhes parece algo irreal ou limitado. Se o conhecimento liberta, mas nem sempre é compre- endido, como na citação anterior de Platão, em Aristóte- les selecionamos a compreensão do sentido da educa- ção, ao que ela serve. Em nossos dias, o debate sobre a importância da educa- ção está entre os interesses particulares e os interesses coletivos. A quem interessa dar ao ser humano o conhe- cimento? Qual seria o conhecimento necessário? Neste trecho da obra Política, Aristóteles (2012, p. 172) defende a educação como um instrumento da coletivida- de que dá sentido à particularidade: Ninguém contestará, pois, que a educação dos jovens deve ser um dos principais objetivos de cuidado por par- 24 LEITURA COMPLEMENTAR te do legislador; porque todos os Estados que a despre- zam prejudicaram-se grandemente por isso. Com efeito, o sistema político deve ser adaptado a todos os gover- nos, e costumes adequados a cada governo o conservam e mesmo o mantém sobre uma base sólida. Assim, os costumes democráticos ou oligárquicos são mais seguro fundamento da democracia ou da oligarquia; os costu- mes mais puros dão sempre o melhor governo. Demais, em toda a espécie de talento ou de arte, há coisas que é preciso conhecer antecipadamente, e há- bitos que é preciso contrair, para estar em condições de executar os trabalhos que exigem; assim é evidente que o mesmo deve acontecer com as ações virtuosas. Mas como existe um objetivo único para a cidade, segue-se que a educação também deve ser única para todos, ad- ministrada em comum e não entregue aos particulares, como se faz hoje dirigindo cada qual a educação dos seus fi lhos e dando-lhes o gênero de instrução que me- lhor lhe parece. No entanto, aquilo que é comum a to- dos deve também ser apreendido em comum. Ao mes- mo tempo, é preciso não imaginar que cada cidadão se pertença a si próprio, e sim que todos os cidadãos pertencem à cidade; porque todo indivíduo é membro da cidade, e o cuidado que se põe em cada parte deve, naturalmente, harmonizar-se com o cuidado que cabe ao todo. Quanto a isso, pode-se louvar aos lacedemônios, que empregavam o máximo de atenção na educação dos fi - lhos, exigindo que ela fosse administrada em comum. É evidente, pois, que ao legislador cabe ocupar-se da edu- cação, e que ela deve ser comum. Nem se pode deixar na ignorância o que é a educação, e como é preciso diri- gi-la. Porque não se está de acordo quando os fatos, e já não mais se entende quando as matérias que os jovens devem aprender para chegar à virtude e à vida perfeita. Não se sabe bem se convém ocupar-se da inteligência ou das qualidades morais. O sistema atual de educação difi culta esse exame; não se sabe ao certo se se devem ensinar as artes úteis à vida, ou os preceitos de virtude, ou a ciência de pura recre- ação. Todas essas têm os seus partidários, e nada está bem determinado sobre a virtude; os princípios variam sobre a própria essência da virtude, de tal forma que as opiniões divergem sobre os meios de exercê-la. EDUCAÇÃO FÍSICA 25 O que vimos aqui sobre o desenvolvimen-to do pensamento grego é apenas um fragmento, uma pequena parte de uma discussão que tem uma “infinidade” de possibilidades de entendimento. Mas procuramos demonstrar que a forma de compreender o mundo incomodou aqueles que foram os fundadores do pen- samento ocidental, a cultura helenística. Para entendermos como esse pensamento conse- guiu ir além das fronteiras gregas, avançando ao lon- go da história e chegando aos nossos dias, é neces- sário lembrar que os próprios gregos sempre foram além de si, fundando colônias e mantendo relações mercantis com vários povos da antiguidade. O momento inicial da expansão do pensamento grego, uma prévia do que viria a ser a expansão do “oci- dentalismo”3, foi a conquista da Grécia pelos macedôni- cos, no Século IV. Após conquistar os gregos, o Império Macedônico adotou a cultura grega como o princípio da cultura a ser levada na expansão territorial. As vitórias macedônicas se consolidaram na Ásia Menor, no Egito e em todo o Mediterrâneo Oriental. Os povos que foram submetidos por Alexandre, o Grande, foram subordinados não só a sua força militar, mas tiveram que conviver com a cultura grega. Instituições políticas e língua, por exemplo, passaram a ser introduzidas nos “quatro cantos” do Império. 3 Aqui uso o termo “ocidentalismo” para definir o pensamento ocidental que hoje se propaga por todos os cantos do Planeta. Combatido, mesclado, adotado ou imposto, a compreensão ocidental do mundo se propagou em conjunto com suas conquistas. Nas instituições ocidentais criadas ao longo da história, nas relações que estabeleceu com outros povos, na forma como construiu sua identidade, há uma raiz grega. A influência não foi superficial como uma man- cha em um tecido, ela se aprofundou e passou a ser incorporada nas práticas comerciais, na vida públi- ca na produção do conhecimento, a orientação filo- sófica dos pensadores gregos ganhou novo sentido. Muitos desses conhecimentos os ocidentais iriam reencontrar com as “Cruzadas” promovidas pelos cristãos contra os muçulmanos. O próprio desenvol- vimento científico e econômico dos árabes (Séculos VI ao XV) foi marcado pelas bases do pensamento grego4. O Renascimento Cultural, na Europa, permi- tiu a retomada das raízes filosóficas helenísticas. O Império Macedônico não foi duradouro, na prática, sua decomposição começou com a morte de Alexandre (323 a.C.), o seu fundador. Dividido pelos generais, foi aos poucos conquistado por romanos e árabes. Territórios foram retomados pelos persas, e os egípcios se libertaram da dominação macedôni- ca, mas a cultura grega ficou, deixou suas marcas e orientou o destino do conhecimento do universo em muitas regiões onde os macedônicos percorreram. O clima de insegurança em que o Império Mace- dônico se decompôs gerou uma angústia que predo- minou também no pensamento filosófico do perío- do. Um pensador que expressa esse clima é Diógenes (404 a 323 a.C.). Um discípulo de Antístenes, um se- guidor de Sócrates, ele questionava a vida mundana, a sedução pela matéria e buscava uma vida simples. 4 Quando se fala da Renascença, movimento cultural que atingiu diversos cam- pos do conhecimento, das ciências naturais às ciências humanas, entre os Sé- culos XIV a XVI, na Europa, é necessário mencionar que um dos fatoresque a influenciou foi o deslocamento de pensadores do oriente para o ocidente. A decadência do Império Bizantino levou à migração de empresários e inte- lectuais de Constantinopla para a Península Itálica, o berço da Renascença. Além da Grécia: As Civilizações que Herdaram o Pensamento Grego FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 26 Segundo a lenda, Diógenes andava perambulan- do pelas ruas de Atenas e, depois de ser expulso, pela cidade de Corinto. Morava em um barril e andava pelas ruas em plena luz do dia com uma lamparina. Ele afirmava que fazia aquilo por estar à procura de um honesto. Sua atitude despertou a curiosidade do impera- dor Alexandre, que um dia quis conhecê-lo. Quando o encontrou, ele estava deitado dentro do barril onde vivia. O imperador teria dito que ele poderia fazer o pedido que quisesse e prontamente seria atendi- do. Diógenes teria dito para que Alexandre saísse de sua frente e parasse de roubar sua luz com a sombra. Encantado pela convicção do “andarilho” filósofo, o imperador teria afirmado que se não fosse Alexan- dre, gostaria de ter sido Diógenes. Diógenes foi um dos adeptos do cinismo, uma corrente que associava o homem ao desprendimento das coisas materiais, mas também a uma forma de crítica à vida de excessos. O princípio dos homens que seguiam esse pensamento era ter autonomia diante do mundo, não depender daqueles que bus- cassem o enriquecimento na manipulação dos indi- víduos e na influência de seus interesses. Uma afirmação de Diógenes que expressa a crí- tica ao mundo da materialidade e à busca de influ- ência, convivendo com pessoas de poder, é: “prefiro a companhia dos corvos a dos bajuladores”. Valoriza assim a realidade em detrimento da falsidade que o poder material e a influência política podem nos dar. A crítica ao apego à vida material está na forma como o homem se deforma diante do desejo do pres- tígio adquirido com o enriquecimento, o que hoje é uma condição que atinge a uma grande parte dos se- res humanos. Uma denúncia da perda de princípios profundos que possam conduzir a sociedade a uma condição superior, justa. O que Diógenes criticava era a demonstração da decadência da sociedade de seu tempo. As cidades dominadas pelos macedônicos eram voltadas aos in- teresses particulares e desprezavam os temas de uni- dade política. A formação de um império com uma diversidade considerável de povos acabaria por levar à destruição do que os unia e elevar o particularis- mo. Isso estava expresso na política tanto quanto no comportamento de cada um. O cinismo cresceu, mas acabou se deturpando. Passou a ganhar a conotação de crítica, mas incorpo- rado aos desejos de sucesso material, porém não ha- via a preocupação da perda do enriquecimento pelo cínico, ele estava mais preocupado com seu imedia- tismo. Essa é uma linha do cinismo que chegou até nossos dias. Viver o hoje sem se preocupar com o amanhã, uma “filosofia de vida” expressa na propa- ganda dos cartões de crédito da atualidade. Outra escola do período de crise macedônica foi o ceticismo. Apesar de já ser um tema tratado pelos pré- -socráticos, o “ser cético” cresceu no mundo helênico e teve em Epicuro (342 a 270 a.C.) sua maior expres- são. Ateniense, suas teses acabaram se desenvolvendo na Ásia menor, onde ficou encantado pelas teses de Demócrito (um dos seguidores das teses céticas). O pensamento de negar toda a verdade absoluta, defendida por ele, gerava a necessidade de condu- zir um homem a um eterno questionamento sobre os fundamentos de sua existência e questionar, até mesmo, as respostas que viesse a ter a partir de suas dúvidas. A angústia como condutora e a crise como princípio definem o homem cético. Um contraponto ao cínico é que o cético consi- dera que os prazeres morais devem ser uma busca e um direito do homem. A condição em que se vive, rodeada de prazeres materiais, por que não saciar a mente e os desejos do corpo? EDUCAÇÃO FÍSICA 27 Para os céticos, a mente deve buscar na razão do mundo o espírito elevado da conduta, mas não deve se eximir da existência. Ou seja, viver bem não impede uma compreensão apurada da vida. Um contraponto que para muitos foi a solução para viver com satisfa- ção material e transformar a angústia em um ritual que não necessita de se desfazer da realização do desejo. Nas teses de Epicuro, o homem não tem mais a sensação após a morte. A separação entre o corpo e alma se dá quando o átomo da matéria se decompõe se libertando dos sentimentos de prazer e dor. Dessa forma, não há o que temer na morte e ela não nos aproxima dos deuses, os quais, por mais que tivessem nos gerado, não de- terminam nosso destino. Nossa alma apenas se dispersa pelo mundo, sem sentido. Por isso, não há o que temer na morte, ela nada significa no mundo sensível. O PENSAMENTO ROMANO: FUNCIONAL E MATERIAL A formação do Império Romano é uma demons- tração da eficiência da organização do Estado e sua capacidade de governar as diferenças constantes dos povos que se domina. A dimensão do Império, atin- gindo inúmeros povos, demonstrou sua eficiência em conduzir o poder a lugares onde a cultura local não se identificava com as instituições clássicas latinas5. 5 Latino por ser a origem de Roma do Lácio e ser o latino o povo que fundou a cidade de Roma e lhe deu seus primeiros contornos culturais. Contudo Roma teve, em sua origem, uma forte influência etrusca. Parte considerável deste legado não atingiu os povos dominados por Roma, somente a língua latina, mesmo assim, parcialmente. Os romanos acabaram por incorporar os princípios gregos e transformá-los em instrumento de sustentação do seu poder, o que mais tarde fariam com o cristianismo. O pensamento romano foi expresso por pensa- dores como Zenão (340 a 264 a.C.), o fundador do estoicismo, que valoriza a rigidez do caráter, a ação que expressa os valores da moral incorruptível. Filho de comerciantes, apesar de ser de origem fenícia, se erradicou no mundo grego e viveu a expansão ro- mana. Um homem de valor é constante em seu com- portamento, independente das condições em que se vê obrigado a conviver. Mudança do mundo não sig- nifica desprendimento e mudança de valores. Esses eram princípios defendidos por Zenão. A popularidade do estoicismo cresceu e atingiu mais adeptos do que o pensamento de Platão e Aris- tóteles em seu tempo. Um herdeiro do pensamento socrático, Zenão acabou por influenciar a conduta de reis da antiguidade, apegados ao comportamento “reto” como um princípio de governo. De certa for- ma, era o que Sócrates esperava do bom governante, agir como um filósofo, ter princípios rígidos. Dessa forma, é fácil perceber como a ação ganha força e passa a ser determinante do caráter humano. É preciso dar praticidade ao comportamento, ir além da reflexão, promover a ação. O conhecimento passa a ser um valor impregnado, que se expressa no com- portamento. Até mesmo o valor divino e os deuses FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 28 estão dentro dos seres humanos, nas condutas que determinam sua proximidade ou não com um senti- do superior da vida. Mas se as leis mudam, o homem não muda seus valores? Essa talvez seja a principal crítica ao estoicis- mo. Não é possível ser eternamente detentor de prin- cípios, mas não podemos ser flexíveis o tempo todo. Ou seja, não podemos ser uma mudança constante e transformar os conceitos sobre o mundo em uma su- perficialidade momentânea. Zenão considerava que a perda de bens materiais pode ser reparada, se não no todo, em partes. Já a dignidade humana, uma vez perdida, o desumaniza e condena. HOMENS ROMANOS E SUAS CONTRADIÇÕES, DO PENSAMENTO À AÇÃO A história romana está recheada de uma glória à conduta e de contradições de quem deveria expres-sá-la. Os personagens que apelam no discurso e na estética pública uma conduta moral rígida são, em regra, os mesmos que têm, em sua privacidade, uma vida mundana. Um desses exemplos de contradição entre o pú- blico e o privado é Sêneca (4 a.C. a 65), o senador romano, famoso por sua defesa a moral, discípulo de Zenão. Foi um crítico da perda moral romana, exigin- do de seus governantes um comportamento a “altura” de seu posto. Ele mesmo não obedeceu a esse critério. Em uma de suas críticas a mulher do imperador Claudio, acabou sendo banido de Roma, mas retor- nou quando as práticas da imperatriz foram descober- tas. Ele mesmo tinha uma conduta que dava espaço a críticas como cobrar impostos abusivos de súditos britânicos, quando o Império Romano se estendia até a Bretanha. Ele mesmo foi convidado a cometer suicí- dio após uma série de atos corruptos que o envolviam. Na atualidade, as práticas de corrupção conti- nuam tomando conta do estado. E, como no tempo de Sêneca, o discurso de alguns dos adeptos do abu- so é a conduta reta. O que na retórica prega prin- cípios e faz alusão ao comportamento que não se deixa abater ou seduzir pelos excessos não corres- ponde à realidade. Podemos considerar que o abuso de quem assume o poder acaba por se contradizer com o discurso. Outro estoico foi Epicteto (60 a 100), escra- vo, como o seu próprio nome sugere (adquirido), foi liberto e passou a ministrar aulas em Roma. Mesmo sofrendo de doenças constantes, fruto de seu tempo de sofrimento como escravo, jamais abandonou o ofício da educação e da crítica. A segunda lhe gerou a perseguição por parte do Imperador Nicópolis, um corrupto. Acabou por buscar exílio na Grécia, onde viveu até o fim dos seus dias. Sua principal crítica era a conduta desonrosa do poder. Considerava que o governo justo não se cor- rompe. Se obrigado a aceitar as instituições públicas, elas devem cumprir com suas funções. Para ele, o dever do governante está acima de seus interesses privados. Ele não pode transformar o poder em um instrumento de suas particularidades. O mais ilustre dos estoicos foi Marco Aurélio (121 a 180), imperador romano. Ele buscou docu- mentar sua vida no Império e seguir os princípios de fidelidade à Roma e suas instituições. Dedicado a manter o poder em um império que já sofria as invasões dos povos vizinhos (chamados de bárba- ros) e convivia constantemente com revoltas inter- nas. Marco Aurélio buscou preservar Roma, garan- tir sua integridade, tanto na força física como no discurso moral. EDUCAÇÃO FÍSICA 29 Ter perseguido os cristãos, em seu período, não foi uma tradição ou hábito, foi a forma de garantir a religiosidade romana e a lógica de sua autoridade a qual os cristãos incitavam levantes. Para o imperador filósofo, é necessário que o homem público cumpra o seu papel. Ele necessita executar o seu dever dentro do organismo social. Nesse ponto, Aurélio se aproxima da concepção de Platão sobre a ordem perfeita da socie- dade, em que cada um dos seus elementos deve cum- prir o seu papel de forma eficaz e se subordinar a ele. A própria formação do Império Romano foi marcada pela ação violenta e conquista. O domínio constante possibilitou a incorporação de inúmeros povos e a implantação de uma estrutura militarizada em todo o território dominado pelos romanos. O sucesso da expansão romana se deu sobre povos organizados das mais diferentes formas. As fronteiras romanas foram os rios Da- núbio e Reno, ao Norte, ao Leste, o deserto da Arábia e o Rio Eufrates, ao sul, o deserto do Saara e, ao Oeste, o Atlântico. Em todo esse território, ocorreu a integração e implantação de uma administra- ção bem-sucedida. Ela alcançou seu tempo de paz nos primeiros séculos da Era Cristã. O legado romano também influen- ciou o nosso tempo. Assim como os gre- gos, também deixou marcas que se mantiveram e chegaram até nós: as instituições jurídicas, a produ- ção cultural, a concepção do Estado e o cristianismo. Contudo os romanos tiveram na cultura grega a me- dida para tudo o que fizeram. Podemos considerar que foi nas estruturas de Roma que a cultura grega se alicerçou no ocidente. No oriente, o legado grego se manteve subor- dinado à cultura predominante dos povos que conquistaram as terras do Império Romano, prin- cipalmente os muçulmanos. Nem por isso deixamos de reconhecer que a cultura grega também foi redescoberta pelo ociden- te quando da conquista da Península Ibérica pelos muçulmanos (Século VIII), sendo necessário também men- cionar o contato que o ocidente teve com esses povos, o que já comentamos anteriormente. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 30 O SINCRETISMO CRISTÃO E O PENSAMENTO FILOSÓFICO MEDIEVAL O cristianismo foi criado por Roma e sobreviveu à sua decadência. Fez-se e refez aos moldes do tempo e sobrevive até nossos dias. Podemos considerar que o homem ocidental é “cristão”. Se não mais pela crença, a qual ele não é obrigado a professar, pela carga cul- tural de compreensão do mundo que o cristianismo construiu e permitiu durante a expansão que a civili- zação ocidental promoveu. O ponto de encontro entre o cristianismo e a filosofia grega foi Alexandria, localizada dentro do território egípcio. A cidade, que continha o principal porto da África durante o período romano e ainda hoje é destaque na orla do Mediterrâneo, foi o cen- tro de uma cultura que nasceu de muitos caldos cul- turais e permitiu a concepção cristã que o ocidente disseminou. As ideias de maior expressão que se difundi- ram em Alexandria têm autoria de Plotino (204 a 270). O jovem egípcio estudou em Alexandria e manteve-se na cidade até 243, quando fugiu após uma campanha desastrosa do imperador romano na África. Em Roma, cidade onde propagou seus estudos e difundiu suas ideias, Plotino plantou o pensamento que viria a se impor sobre todo o ter- ritório europeu ocidental e, mais tarde, sobre boa parte do Planeta. Suas ideias, pela carga de misticismo, já demons- travam um desprendimento com a realidade e a des- preocupação em se ter uma conduta política fundada na racionalidade do estado. O contexto de decadên- cia do Império Romano, o qual viveu, demonstrava a dificuldade de se entender de forma racional a crise que se atravessava. O cristianismo nasce da sobrevi- vência diante da crise. Em nosso tempo, não é diferente a forma como o pensamento se desprende da necessidade de ação. Se observarmos, ao longo da história, o pensamen- to ganha conotações metafísicas diante das difi- culdades que as instituições racionais atravessam. Hoje, em pleno desenvolvimento de uma estrutura tecnológica, que é fruto do desenvolvimento cien- tífico, nos apegamos aos misticismos degenerativos da consciência, infantilizamos o pensamento do homem. Calculo que seja medo de enfrentar com a razão e sentir sobre os ombros o peso da existência que nos faz agir assim. Plotino concebe que a vida é fruto de um en- contro entre a “trindade”, aqui, diferente daquela que concebem os cristãos da atualidade. Nela, na trindade de Plotino, há um elemento único que integra, o “Uno”. Esse primeiro elemento conduz a força criadora do “Nous” (espírito), o segundo, propagador da vida. Por fim, a “Alma” é o terceiro elemento, o qual dá vida a toda criação. As bases desse pensamento são gregas, elas são uma releitu- ra da dialética platônica e de Demóstenes6 sobre os elementos da criação. Claro que o pensamento de Plotino não deu origem imediata ao pensamento cristão que co- nhecemos. Sobre esse tema, trataremos na próxima unidade. O que temos que ter claro é que o desenvol- vimento da civilização ocidental se deu com a cons- trução de um legado grego. Nossa busca incessante por respostas, o desejo de encontrar uma lógica de- terminantepara a existência e de dominar a natureza que nos cerca por meio da compreensão das leis que a regem são, sem dúvida, legados gregos. 6 Se lembrarmos da busca dos pré-socráticos pela construção do mundo ma- terial e de todas as coisas vivas que nos cerca, eles desenvolveram a com- preensão de que somos fruto da mistura de elementos vitais. Quais seriam estes elementos? Demóstenes compreende que a terra, o ar, a água e o fogo são construtores da existência. 31 LEITURA COMPLEMENTAR Sêneca foi senador romano. Sua vida foi marcada pela con- tradição entre suas obras fi losófi cas, um apelo à conduta moral, e a vida prática, com diversas ações mundanas, pas- síveis de crítica de conduta infi el. Entre seus discursos sobre a sabedoria, o senador ro- mano defende a qualidade da virtude diante da posse material: Vou ensinar-te agora o modo de entenderes que não és ainda um sábio. O sábio autêntico vive em plena alegria, contente, tranquilo, imperturbável; vive em pé de igual- dade com os deuses. Analisa-te então a ti próprio: se nunca te sentes triste, se nenhuma esperança te afl ige o ânimo na expectativa do futuro, se dia e noite a tua alma se mantém igual a si mesma, isto é, plena de elevação e contente de si própria, então conseguiste atingir o má- ximo bem possível ao homem! Mas se, em toda a parte e sob todas as formas, não buscas senão o prazer, fi ca sabendo que tão longe estás da sabedoria como da ale- gria verdadeira. Pretendes obter a alegria, mas falharás o alvo se pensas vir a alcançá-la por meio das riquezas ou das honras, pois isso será o mesmo que tentar encontrar a alegria no meio da angústia; riquezas e honras, que buscas como se fossem fontes de satisfação e prazer, são apenas motivos para futuras dores. Epicuro resume a importância da fi losofi a como elemento de resposta às angústias da vida. Na parte fi nal de sua co- locação, faz uma refl exão importante sobre a vida quando ela, inevitavelmente, nos leva a morte: Todo desejo incômodo e inquieto se dissolve no amor da verdadeira fi losofi a. Nunca se protele o fi losofar quando se é jovem, nem canse o fazê-lo quando se é velho, pois que ninguém é jamais pouco maduro nem demasiado maduro para conquistar a saúde da alma. E quem diz que a hora de fi losofar ainda não chegou ou já passou assemelha-se ao que diz que ainda não chegou ou já pas- sou a hora de ser feliz. Deves servir à fi losofi a para que possas alcançar a verda- deira liberdade. Assim como realmente a medicina em nada benefi cia, se não liberta dos males do corpo, assim também sucede com a fi losofi a, se não liberta das paixões da alma. Não pode afastar o temor que importa para aquilo a que da- mos maior importância quem não saiba qual é a natureza do universo e tenha a preocupação das fábulas míticas. Por isso não se podem gozar prazeres puros sem a ciên- cia da natureza. Antes de tudo, considerando a divindade incorruptível e bem-aventurada, não se lhe deve atribuir nada de incompatível com a imortalidade ou contrário à bem-aventurança. Realmente não concordam com a bem-aventurança preocupações, cuidados, iras e bene- volências. O ser bem-aventurado e imortal não tem in- cômodo nem os produz aos outros, nem é possuído de iras ou de benevolências, pois é no fraco que se encon- tra qualquer coisa de natureza semelhante. Habitua-te a pensar que a morte nada é para nós, visto que todo o mal e todo o bem se encontram na sensibilidade: e a morte é a privação da sensibilidade. É insensato aquele que diz temer a morte, não porque ela o afl ija quando sobrevier, mas porque o afl ige o prevê-la: o que não nos perturba quando está presente inutilmente nos perturba também enquanto o esperamos. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 32 Com o surgimento de uma estrutura de poder romana associada à Igreja Católica, um novo perso- nagem de poder assume a função da administração dos homens ocidentais, o Papa. A construção de uma cúpula de comando da Igreja (Clero) permitiu a con- solidação de uma instituição política com forte influ- ência sobre os demais povos que viriam a habitar os territórios que um dia foram do Império Romano. A conversão dos bárbaros por membros do cle- ro e a construção de instituições que propagavam o cristianismo foram práticas constantes na decadên- cia romana e ascensão do medievalismo. Muitos pensadores se dedicaram a difundir a fé cristã e apri- morar o pensamento religioso fundado na Bíblia, o documento sagrado dos cristãos que foi compilado e produzido na decadência do Império sobre a égide dos últimos imperadores romanos. A construção do mundo medieval foi o resulta-do da destruição do Império Romano, onde as invasões bárbaras foram um fato deter-minante, mas resultado de outros fatores. A decadência está relacionada à crise escravista, à falta de trabalhadores nas áreas agrícolas e à cons- tante tributação para manter a imensidão do impé- rio. A falta de trabalhadores gerou uma queda de produtividade dentro das terras do Império. A tri- butação, por consequência, caiu e a ineficiência do estado romano se ressaltou. Um governo imperial, tão eficiente para integrar as províncias, não foi capaz de administrar as crises que tiveram origem em diversos territórios, muitos por problemas locais. A imposição centralizadora sempre foi a saída romana, seja pelas tropas, seja pe- las instituições. De problemas locais, uma crise geral se alastrou. Foi nesse contexto que as invasões bárba- ras se disseminaram. Muitos dos líderes estrangeiros serviram a Roma, aprenderam a combater com ela e a destruí-la com o conhecimento que adquiriram. Mesmo antes da decadência do Império, os cris- tãos já não eram mais perseguidos e a religião havia se oficializado. No governo de Constantino e Teodó- sio, a Igreja Cristã formou a estrutura administrativa que acompanharia a sua existência por séculos. Filosófico Medieval O Pensamento EDUCAÇÃO FÍSICA 33 Um dos princípios fundamentais da nova con- cepção que se estabelecia com o desenvolvimento do cristianismo foi a separação entre o comando do Papa – da Igreja, de uma forma geral – e dos impe- radores, monarcas europeus. Enquanto o primeiro deveria governar a alma dos homens, o segundo de- veria administrar a matéria. Essa separação se constitui de um elemento im- portante até nossos dias. A questão da propriedade do corpo e a condução da vida. Até onde o homem comanda sua existência, pela sua consciência, até onde ela não lhe pertence e deve obedecer às regras estabelecidas por uma legislação. De certa forma, a perda de uma liberdade a qual os gregos jamais se submeteram. A concepção do mundo se organizava dentro das instituições organizadas pela Igreja Católica. Nelas, a filosofia se oficializa, independente do império que se estabelece. Seja nas monarquias dos francos, ger- manos, godos ou visigodos, o cristianismo orienta a concepção de homem e garante a supremacia de suas ideias por toda a Europa. Chegou, por consequência, a justificar o próprio poder dos monarcas, o que só foi questionado com o advento da Reforma Protes- tante no Século XVI. A supremacia dos cristãos acaba por ser tam- bém uma contradição em relação aos judeus, re- ligião da qual são dissidentes. No início, o cris- tianismo se colocava como um desdobramento do judaísmo, sem lhe causar rompimento e reco- nhecendo sua validade. Mas com a ascensão dos cristãos ao poder em Roma, os judeus passaram a ser vistos como negadores de Cristo, o filho de Deus. A perseguição aos judeus se acentuou. Iro- nicamente, passaram a ser perseguidos por quem tinha sofrido perseguição7. Uma das formas de romper com o judaísmo e iniciar sua perseguiçãofoi o gnosticismo, um encon- tro entre o cristianismo e o helenismo. Sua principal expressão foi Paulo de Tarso (5 a 67)8, um judeu he- lenizado e cristão. Ele construiu os elementos neces- sários de universalização do cristianismo. Um des- dobramento do gnosticismo foi construído a partir das ideias de Tarso. Nelas, Iavé é o criador das coisas materiais, uma divindade inferior ao “supremo cria- dor”. Ele, Iavé, criou as coisas materiais e deturpou o seu significado, fugindo ao propósito de Deus (o criador universal). Diante disso, a divindade su- prema se materializa para poder colocar ordem no mundo, Cristo. Nessa construção, Deus é perseguido em sua materialidade e rompe com qualquer tipo de elaboração teológica judaica. Na construção do ideário religioso judeu-cristão, a perseguição é um elemento vital, presente como um meio de unir os fiéis e lhes garantir o direito de rea- gir. Em muitos casos, são os verdadeiros agressores, 7 Mas o papel de perseguidor e perseguido ainda persegue o povo judeu. Du- rante o nazismo alemão, com a Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945), os judeus foram caçados pelos nazistas. Cerca de oito milhões de judeus foram mortos, a maioria nos campos de concentração. Na Polônia, durante a Guerra, os alemães prenderam judeus no Gueto de Varsóvia, impedin- do-os de circular pela cidade. Em 1947, dois anos depois, com o fim da Segunda Guerra Mundial, após a criação das Nações Unidas, os judeus tiveram seu território (Israel) de volta. Cortaram a terra dos palestinos para abrigar o estado judaico. Invasões, guerras e anexações territoriais por parte de Israel fizeram dos palestinos um povo enclausurado. Da mesma forma que sofreram perseguição, os judeus perseguem. 8 Paulo de Tarso foi o mais importante pensador do primitivismo cristão. Ele teve sua conversão, segundo os dogmas católicos, em sua viagem a Jeru- salém, para capturar cristãos. Teria tido uma visão de Cristo, ficou cego e passou a pregar o cristianismo após o retorno de sua visão em três dias. A pregação de Paulo converteu principalmente os judeus da orla do Me- diterrâneo. As epístolas da Bíblia (Novo Testamento) são atribuídas a ele, algumas são contestadas. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO 34 mas o discurso de serem perseguidos eternamente os inocenta. Por isso, tanto na defesa do território de Israel pelos judeus ou no discurso de supremacia dos cristãos sobre o Mundo, o discurso de serem perse- guidos justifica o ato de perseguir. Um dos importantes pensadores cristãos do primitivismo foi Orígenes de Cesareia (I185 a 253). Sua obra está relacionada à definição da vida espi- ritual. Ele concebe a existência do espírito separado da matéria, sendo que, ao se juntar com o corpo, lhe dá vida no nascimento. A ideia de eternizar a existência antes e depois da vida lhe dá a autoria de um dos principais elementos que se consolidaria no ideário cristão, a eternidade da alma e sua relação com Deus. Todos esses pensamentos foram incorporados à Igreja Cristã Católica com o governo do imperador Constantino. Nele, se organizou a estrutura dos dog- mas católicos e o princípio administrativo do clero. A centralização da administração clerical foi funda- mental para, mais tarde, quando da decadência do Império Romano, o cristianismo prevalecer não só como culto, mas como instituição de poder político com forte centralização administrativa em torno da figura do Papa. Um dos fatores importantes para o fortaleci- mento da autoridade papal, ainda durante o Império Romano, foi o discurso de defesa dos pobres, profe- rido por uma Igreja voltada aos humildes. Eles, que se sentiam distantes e desamparados por parte de uma administração centralizada, de caráter religioso, agregaram-se às obras do clero católico e se torna- ram sua principal base de sustentação social. Não seria por acaso que a Igreja Católica estaria preocupada, mais tarde, com a organização das or- dens religiosas que deveriam converter a população. Também, parte dessas obras estava para ações mis- sionárias de ajuda à população carente, servindo-lhe de abrigo e massa de manobra para o exercício do poder clerical. O Concílio do Niceia (325) foi fundamental para a organização dos dogmas católicos. Nele, se organi- zaram a doutrinação dos fiéis e os princípios que de- veriam nortear o poder papal. Naquele momento, a Igreja Católica combatia o arianismo, doutrina cristã fundada no pensamento de Ário (256 a 336)9. Mas o pensamento cristão que se propagou no “mundo medieval” se deve principalmente a quatro grandes pensadores: Ambrósio (340 a 397), Jerônimo (347 a 420), Santo Agostinho (354 a 430) e ao Papa Gregório (540 a 604). Foram eles que instituíram o pensamento predominante do cristianismo que irá se instituir por meio da fé católica, mas também lan- çando bases para o protestantismo, que se constituiu após a Reforma Protestante. Ambrósio está ligado diretamente à supremacia do poder papal sobre o estado. Filho de uma família de nobres romanos, ele recebeu educação requin- tada para atuar na administração do estado roma- no. Contudo acabou na administração do Bispado de Milão, na época, a sede do Império Romano do Ocidente. Durante seu bispado, assumiu a responsabilida- de de preservar o poder da Igreja sobre os senadores e, até mesmo, sobre o imperador. Enfrentou a oposi- ção dos arianos, cristãos que seguiam as palavras de Ário, como já chegamos a analisar. Ambrósio conseguiu submeter as autoridades e, até mesmo, obter um pedido de perdão do impera- dor Teodósio, quando este ordenou o Massacre de 9 Ário, ou Arius, foi discípulo católico em Alexandria. Sua doutrina separava Deus de Cristo e os colocava como dois elementos distintos diante da cons- trução da trindade. A materialização de Jesus, como um homem comum e passando por todas as dificuldades na condição meramente humana, cho- cou o comando da Igreja. EDUCAÇÃO FÍSICA 35 Tessalônica (388)10. Em função desse episódio, o impera- dor foi a Abadia de Milão e pediu perdão pelo ato. Dessa forma, Ambrósio é lembrado pela sua ca- pacidade de argumentar e agir em favor dos interes- ses do clero, mantendo o poder da Igreja diante da decadência do Império Romano. Santo Agostinho o admirava pela capacidade de argumentação, fator fundamental que contribuiu para sua permanência diante dos cargos de administração do clero dentro da estrutura de poder do Império. Mas foi na produção documental da Igreja Cató- lica que sobreviveu o instrumento vital para a prega- ção da fé, a construção da Bíblia em latim. Esse feito de tradução e organização do principal documento sacro foi obra de Jerônimo. Nascido no Egito, mas com a sua vida dedicada aos estudos em Roma, aca- bou se desentendendo com autoridades da Igreja Ca- tólica. Jerônimo produziu documentos de condução ética e princípios morais do cristão. Sua postura doutrinária acabou por se traduzir nos estudos dos documentos que formaram a inter- pretação do Velho Testamento e organização dos do- cumentos do Evangelho. Em função de sua expulsão da Itália, por desentendimento com líderes religiosos, acabou por formar um mosteiro em Jerusalém. As- sim, ele inaugurava uma das formas de organização dos estudos do período medieval, o clero regular11. 10 O massacre ocorreu por determinação do Imperador, fiel à Igreja Católica, que não admitia a presença de não cristãos no Império. O fato mostra as transformações pelas quais o Império Romano passava em sua decadên- cia, assim como a submissão do imperador ao poder do clero. O Edito de Milão, assinado por Constantino, também imperador romano, já ha- via colocado fim à perseguição aos cristãos, agora, em nome desse mesmo cristianismo, Teodósio decretava o massacre dos não cristãos. 11 O Clero Regular seria oficializado durante
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