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Aula 1, Introdução a Antropologia Social

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Disciplina: Antropologia Social
Aula 1: Introdução ao Pensamento Antropológico
Apresentação
Uma das maneiras de se conhecer determinada área do conhecimento é traçar a
história de sua constituição. Você verá, no conteúdo exclusivo, elaborado para esta
aula, como foi diversa a constituição do projeto que culminou no nascimento da
Antropologia enquanto ciência do homem na sua totalidade.
No primeiro momento, optamos por esboçar um breve histórico do campo e da
abordagem Antropológica mostrando-lhe a especificidade do seu objeto de
conhecimento. Em seguida, abordaremos a “pré-história da Antropologia”, ou seja, a
descoberta do “outro” pelo mundo ocidental.
De modo sucinto, procuramos efetuar a análise do desenvolvimento da Antropologia
em seus primórdios, assim, você poderá compreender melhor algumas das
características específicas da disciplina.
Aproveite todos os conteúdos que aqui disponibilizamos para você.
Bom curso, e vamos ao estudo!
Objetivos
Descrever uma formação básica e introdutória em Antropologia;
Analisar o desenvolvimento da Antropologia enquanto disciplina científica;
Compreender um panorama geral da Antropologia e o seu lugar no âmbito do
conhecimento.
O nascimento da Ciência do
Homem: a Antropologia
Podemos dividir o surgimento da Antropologia em dois momentos:
Início do século XIX - reflexão do homem sobre si
mesmo e sua sociedade
A Antropologia surgiu aproximadamente no início do século XIX. Ela
atribui-se um objeto que lhe é próprio: o estudo das populações que não
pertenciam à civilização ocidental. Entretanto, em todas as sociedades
humanas sempre existiram homens que interrogaram sobre si mesmos.
Houve até mesmo alguns que forjaram, como disse certa vez o
antropólogo francês Lévi-Strauss, “modelos elaborados em casa”,
referindo-se a uma teorização da sociedade formada pelo próprio nativo
sem a utilização de nenhum recurso científico.
A reflexão do homem sobre si mesmo e sua sociedade, e a constituição
de um saber, são tão antigos quanto a própria humanidade, e se deram
nos cinco continentes: Ásia, África, América, Oceania e na Europa.
Contudo, o projeto de fundar uma ciência do homem, ou seja, a
Antropologia, é ao contrário, bastante recente.
Por muitos séculos as reflexões dos homens acerca de si mesmos, foram
deixadas ao campo da Mitologia , das expressões artísticas, ao
pensamento teológico e filosófico. Faltava então, uma abordagem
científica no que dizia respeito ao homem em si.
Final do século XIX – fundamentação do conhecimento
científico
Foi somente no final do século XIX que começou a se fundamentar um
conhecimento científico tomando o homem como “objeto” de
conhecimento, e não mais a natureza. É apenas nessa época que o
1
pensamento científico começa, pela primeira vez, a aplicar ao próprio
homem os métodos até então utilizados na ciência física ou biológica.
Esse projeto antropológico em desenvolvimento, surge na Europa e,
como veremos adiante, o fato, como não poderia deixar de ser, trouxe
consequências importantes para o desenvolvimento da Antropologia.
Tal desenvolvimento se fez progressivamente e, somente na segunda
metade do século XIX, o projeto antropológico começa a adquirir certa
legitimidade entre outras disciplinas científicas. Isso foi possível, graças à
delimitação do objeto específico do estudo antropológico: as sociedades
então ditas “ primitivas ”.
A especificidade do objeto de
estudo da Antropologia
A Antropologia, para constituir-se como disciplina científica, limitou um objeto
próprio de estudo: as populações que não pertencem à civilização ocidental.
Mas, a constituição de uma disciplina se faz lentamente, desse modo, foram
necessárias ainda algumas décadas para que a Antropologia elaborasse suas
ferramentas próprias de investigação que lhe permitisse a observação direta
no campo.
Atualmente, a Antropologia não mais limita a sua especificidade de estudo por
meio de um objeto empírico próprio, ou seja, as sociedades indígenas e
tradicionais, mas por intermédio de uma abordagem epistemológica.
O objeto de estudo da Antropologia não mais está ligado a um espaço
geográfico, cultural ou histórico particular. Podemos afirmar que:
Antropologia consiste no estudo do homem na sua
integridade e no estudo do homem em todas as
sociedades, em todos os estados e em todas as épocas.
2
O estudo do homem na sua
totalidade
Para que uma abordagem seja considerada antropológica, ela deve ser
totalizante, ou seja, tem que levar em consideração as múltiplas dimensões
do ser humano em sociedade.
Com o advento do projeto antropológico e consequentemente com o
aperfeiçoamento de suas técnicas de investigação houve uma especialização
do saber.
 Silhueta de cabeça humana /
Shutterstock/GrAl
Uma das características principais da Antropologia é o estudo do homem na
sua totalidade relacionando campos de investigação comumente separados,
tais como:
Biologia
Linguística
Psicologia
De acordo com a antropólogo francês François Laplantine (2006:17-19),
existem cinco áreas principais da Antropologia:
Antropologia Biológica (designada anteriormente como
Antropologia Física)
Consiste no estudo das variações dos caracteres biológicos do homem no
espaço e no tempo.
O antropólogo biologista objetiva os fatores culturais que influenciam os
indivíduos. Neste sentido, questionava-se: por que o desenvolvimento
psicomotor da criança africana é mais adiantado do que o da criança
europeia?
Antropologia Pré-Histórica
É o estudo do homem por meio dos vestígios materiais enterrados no solo
(ossadas e qualquer marca de atividade humana). Seu projeto se liga ao da
Arqueologia e tem por objetivo reconstruir as sociedades desaparecidas no
tempo, tanto suas técnicas e organizações sociais, quanto suas produções
culturais e artísticas.
Esse ramo da Antropologia trabalha com abordagens idênticas às da
Antropologia Histórica, da Antropologia Social e Cultural que trataremos logo
adiante.
Antropologia Linguística
A linguagem é, com toda certeza, uma parte importante do patrimônio
cultural de uma sociedade. É por meio dela, que os homens, que vivem em
sociedade, podem expressar seus valores, suas preocupações e seus
pensamentos.
É por meio do estudo da língua que os homens podem compreender como
vivem e o que sentem, como expressam o universo e o social, e como
interpretam seus próprios conhecimentos.
Antropologia Psicológica
Consiste no estudo dos processos e do funcionamento do psiquismo humano.
Nota-se que, de fato, o antropólogo é confrontado no primeiro momento de
suas investigações não a conjuntos sociais, e sim, a indivíduos. A Antropologia
Psicológica olha para os comportamentos — conscientes e inconscientes —
dos seres humanos, buscando assim, a sua totalidade.
A dimensão psicológica é absolutamente indispensável no campo do qual
procuramos aqui dar conta.
Antropologia Social e Cultural
Diz respeito a tudo que constitui uma sociedade: seus modos de produção
econômica, suas técnicas, suas crenças religiosas, suas organizações políticas,
manifestações artísticas, seus sistemas de conhecimentos, seus sistemas de
parentesco, organizações jurídicas, suas línguas e suas psicologias etc.
Isto, posto, agora já podemos esclarecer que a Antropologia consiste menos
no levantamento sistemático desses aspectos do que em mostrar a maneira
particular com a qual estão relacionados entre si e por meio da qual aparece a
especificidade de uma sociedade.

Atenção
O antropólogo procura compreender os gestos, as trocas simbólicas e os
mínimos detalhes de nossos comportamentos, o que faz da abordagem
antropológica profundamente diferente das utilizadas pelos geógrafos,
economistas, juristas, sociólogos, psicólogos entre outros.
Agora que já sabemos como se deu a constituição do projeto antropológico,
lhe apresentaremosa pré-história da Antropologia.
Atividade
1) Podemos dizer que a Antropologia é o estudo sobre o
digite a resposta e a digite a resposta de maneira
totalizante, ou seja, abrangendo todas as suas dimensões.
A pré-história da Antropologia
Durante muitos séculos, coube aos viajantes e missionários elaborar discursos
sobre os “outros”, ou seja, os habitantes que povoavam espaços até então
desconhecidos pelo mundo europeu.
Desse estranhamento entre o mundo ocidental e a alteridade uma primeira
questão é feita: aqueles que acabaram de ser descobertos pertencem à
humanidade?
O critério utilizado naquele momento para lhes atribuírem um estatuto
humano é o religioso. Os missionários perguntavam-se: “— Os selvagens têm
uma alma?”
Este questionamento era fundamental para os missionários, já que a resposta
irá depender de saber se é possível trazer-lhe a salvação.
No século XIV, começa a se delinear duas ideologias concorrentes e
simétricas:
3
4
1
A recusa do estranho percebido pela falta e a boa consciência que se tem
sobre si e sua sociedade.
2
A fascinação pelo estranho e a má consciência que se tem sobre si e sua
sociedade.
De acordo com Laplantine (2006) os termos dessa dupla posição estão
presentes desde metade do século XIV e podem ser percebidos no debate
público ocorrido em 1550, na Espanha, em Valladolid, entre o padre
dominicano Las Casas e o jurista Sepulvera. Vejamos a seguir o que disse Las
Casas:

Àqueles que pretendem que os índios são bárbaros,
responderemos que essas pessoas têm aldeias, vilas,
cidades e reinos, senhores de uma ordem política que,
em alguns reinos, são melhores que as nossas [...]
Esses povos igualavam ou até superavam muitas
nações e uma ordem política que, em alguns reinos, é
melhor que a nossa. [...] Esses povos igualavam ou até
superavam muitas nações do mundo conhecidas como
policiadas e razoáveis, e não eram inferiores a
nenhuma delas. Assim, igualavam-se aos gregos e os
romanos, e até, em alguns de seus costumes, os
superavam. Eles superavam também a Inglaterra, a
França, e algumas de nossas religiões da Espanha. [...]
Pois, a maioria dessas nações do mundo, senão todas,
foram muito mais pervertidas, irracionais e
depravadas, e deram mostra de muito menos prudência
e sagacidade em sua forma de se governarem e
exercerem as virtudes morais. Nós mesmos fomos
piores, no tempo de nossos ancestrais e sobre toda a
extensão de nossa Espanha, pela barbárie de nosso
modo de vida e pela depravação de nossos costumes.
LAS CASAS, apud: LAPLANTINE: 2006, p. 38-39
Em oposição a Las Casas, Selpuvera escreveu:

Aqueles que superam os outros em prudência e razão,
mesmo que não sejam superiores em força física,
aqueles são por natureza, os senhores; ao contrário,
porém, os preguiçosos, os espíritos lentos, mesmo que
tenham as forças físicas para cumprir todas as tarefas
necessárias, são por natureza servos. E é justo e útil
que sejam servos, e vemos isso sancionado pela
própria lei divina. Tais são as nações bárbaras e
desumanas estranhas à vida civil e aos costumes
pacíficos. E será sempre justo e conforme o direito
natural que essas pessoas estejam submetidas ao
império de príncipes e de nações mais cultas e
humanas, de modo que, graças à virtude destas e a
prudência de suas leis, eles abandonem a barbárie e se
conformem a uma vida mais humana e ao culto da
virtude. E se eles recusarem esse império, pode-se
impô-lo pelo meio das armas e essa guerra será justa,
bem como o declara o direito natural que os homens
honrados, inteligentes, virtuosos e humanos dominem
aqueles que não têm essas virtudes.
SELPUVERA, apud LAPLANTINE, 2006: 39
Muitos séculos já se passaram desde as polêmicas por detrás desse duplo
discurso que opunha Las Casas e Selpuvera. Notamos que esses são
estereótipos que povoam, ainda atualmente, nossa imagem acerca das
populações indígenas ou tradicionais. É importante nos determos um pouco
mais sobre essa questão.
Atividade
2) De acordo com o antropólogo francês François Laplantine (2006) a
Antropologia é constituída por cinco áreas principais. Indique V para as
afirmativas verdadeiras e F para as falsas.
a) Antropologia Biológica, Antropologia Pré-Histórica e Antropologia
Linguística são três das cinco áreas principais da Antropologia.
b) Antropologia Biológica, Antropologia Pré-Histórica, Antropologia Social,
Antropologia Cultural e Etnografia são as cinco áreas indicadas por
Laplantine.
c) A Antropologia Social e o Trabalho de Campo são duas das áreas
principais da Antropologia.
d) Antropologia Social ou Cultural e Antropologia Psicológica são duas
das áreas principais da Antropologia.
e) Etnologia e Antropologia Linguista são duas das áreas principais da
Antropologia.
O mau selvagem
O etnocentrismo é uma categoria antropológica definida como a visão
demonstrada por um individuo ou grupo de pessoas considerando o seu grupo
étnico ou cultural como sendo mais importante que outras culturas e
sociedades.
5
Com essa afirmação queremos dizer que raramente as diversidades humanas
apareceram ao homem como um fato positivo. Na antiguidade, os gregos
designavam como bárbaros tudo o que não pertencia ao mundo grego. No
renascimento falavam de naturais ou selvagens, isto é, os seres da floresta,
opondo assim a animalidade à humanidade.
 As índias saciam a vingança ingerindo as
partes do inimigo morto. America tercia pars,
editado por Theodor de Bry. Clichê da Biblioteca
Nacional de Paris.
Essa atitude de expulsar da cultura, ou seja, da civilização, para a natureza,
isto é, para a animalidade todos aqueles “outros” que não pertenciam à
sociedade ocidental é muito antiga, como lembra Lévi-Strauss (1973) o
etnocentrismo é a atitude mais comum praticada tanto pelas sociedades
complexas quanto pelas sociedades indígenas e tradicionais.
6

Ocorrem curiosas situações onde dois interlocutores
dão-se cruelmente a réplica. Nas Grandes Antilhas,
alguns anos após a descoberta da América, enquanto
os espanhóis enviavam comissões de inquérito para
pesquisar se os indígenas possuíam ou não alma, estes
empenhavam-se em imergir brancos prisioneiros a fim
de verificar, por uma observação demorada, se seus
cadáveres eram ou não sujeitos à putrefação.
LÉVI-STRAUSS, 1973: 333
Os critérios então utilizados pelos europeus, do século XIV, para determinar se
os índios seriam humanos, além do critério religioso já mencionado, eram:
1
Aparência física
Eles estão nus ou vestidos de peles de animais.
2
Hábitos alimentares
Comem carne crua.
3
Inteligência
Tal como pode ser apreendida a partir da linguagem: “falam uma língua
inteligível”.
Os selvagens são caracterizados pela falta, pela ausência: sem fé, não
possuem uma alma; não têm acesso à linguagem; sendo assustadoramente
feios e alimentando-se como um animal.
Os selvagens são percebidos como uma besta. É esse discurso sobre o outro
que se apoia o leque das ausências: sem religião, sem moral, sem leis, sem
escrita, sem Estado, sem consciência, sem razão, sem objetivo, sem arte, sem
passado, sem destino, sem futuro.
Essas opiniões que acabamos de relatar — que estão em ruptura com a
ideologia dominante do século XVIII — por mais absurdas que possam nos
aparecer, na atualidade, foram compartilhadas por muitas pessoas naquela
época, e o mais extraordinário, é que ainda encontramos ecos de tais ideias
nas sociedades ditas “contemporâneas”.
O bom selvagem
A figura do mau selvagem é eminentemente compatível de se transformar em
seu oposto: o da boa natureza dispensando suas benfeitorias a um selvagem
feliz.
O selvagem descrito negativamente como despossuído, isto é, sem escrita,
sem tecnologia, sem economia, sem religião, sem leis e Estados, agora, não
mais é tido comouma desvantagem. Mas a ideia do bom selvagem só se
completa dois séculos depois do Renascimento: no rousseauísmo do século
XVIII, e logo depois, no Romantismo.
 “O último Tamoio”, tela de Rodolfo Amoedo,
exposta no Salon de Paris, em 1883. Fonte:
https://goo.gl/pAFXkk
<http://commons.wikimedia.org/wiki/file:Ultimo_tamoio_1883.jpg>
.
A imagem do bom selvagem já era relatada pelos primeiros viajantes à
América. Como podemos verificar na carta escrita por Américo Vespúcio após
sua chegada ao continente americano em 1492:

As pessoas estão nuas, são bonitas, de pele escura, de
corpo elegante [...] Nenhum possui qualquer coisa que
seja, pois tudo é colocado em comum. E os homens
tomam por mulheres aquelas que lhes agradam, sejam
elas sua mãe, sua tia, ou sua irmã, ou sua amiga, entre
os quais eles não fazem diferença [...] Eles vivem
cinquenta anos e não têm governo.
VESPÚCIO apud LAPLANTINE, 2006: 47
O fascínio de uma natureza pura, habitada pelo índio intocado pelo pecado da
sociedade ocidental e que nos convida a reencontrar o paraíso perdido
triunfou nos séculos XVII e XVIII. Nos relatos dos missionários jesuítas, entre
os índios hurons, disseram:

Eles são afáveis, liberais, moderados [...] Todos os
nossos padres que frequentam os selvagens
consideram que a vida se passa mais docemente entre
eles do que entre nós. Seu ideal: “viver em comum sem
processo, contentar-se de pouco sem avareza, ser
assíduo no trabalho.
LAPLANTINE, 2006: 48
Assim, encontramos, em muitos autores do século XVI, a noção do bom
selvagem, e pela primeira vez surgiu uma crítica da civilização e o elogio da
“pureza original”. Esse encantamento exercido pelos indígenas, distantes da
civilização, e que nos convida a reencontrar o universo caloroso da natureza,
triunfa nos séculos XVII e XVIII.
Essa admiração, diante da “pureza intocada dos selvagens”, não se limita ao
ciclo dos grandes navegadores e viajantes. O selvagem adentra
progressivamente a filosofia — os grandes pensadores do Iluminismo — e
também nos salões literários e nos teatros parisienses.
Tal como fizera o Príncipe Maximiliano, nessa época, muitos queriam exibir
seus “verdadeiros selvagens”. Vale a pena ressaltar que essas exibições
constituem, ao mesmo tempo, uma verdadeira acusação contra a civilização.
O indígena Botocudo Quark, que habitava a região do Estado de Minas Gerais,
foi levado, em 1815, pelo Príncipe Maximiliano Wied-Neuwied para a
Alemanha, onde passou o resto de sua vida. Foi retratado por vários artistas,
dentre eles o irmão do príncipe, o autor deste óleo sobre tela de 1830, no
qual se percebem os furos dos botoques que outrora usara nas orelhas. Quack
morreu em 1832, no palácio do príncipe.
 O indígena Botocudo Quark, pintura a óleo de
1830. Fonte: https://goo.gl/3rwJU1
<http://flickr.com/photos/nimuendaju/25930643133>
Atividade
3) Em 1850, o Príncipe Maximiliano Wied-Neuwied leva para morar em
seu palácio na Alemanha o Botocudo Quark, onde permaneceu o resto de
sua vida. Comente, a partir do texto estudado, o mito do “bom
selvagem”.
O outro
Vimos que a imagem que o Ocidente produziu do outro, mas também de si
mesmo, não parou de oscilar entre os dois polos:
Era um selvagem, a meio caminho entre a animalidade e a humanidade, mas
também selvagens eram os ocidentais, sendo que os primitivos tinham lições
de humanidade a nos dar;
Era preguiçoso, mas também muito trabalhador;
Era feio, mas admirado e belo;
Não tinha alma ou era profundamente religioso;
Vivia com medo do sobrenatural ou, ao contrário, vivia na paz e na harmonia;
Vivia uma vida de orgia sexual, ou o seu avesso, vivia uma vida de regras,
tabus e proibições;
Era um animal, um vegetal ou, ao contrário, participava de uma humanidade
que tinha muito a nos ensinar;
Era um ser atrasado e de extrema simplicidade, ou muito virtuoso e
complexo.
São inúmeras as diferentes construções do outro advindas do estranhamento
do mundo ocidental com a diferença.
O outro é utilizado, nesses contextos, como suporte do imaginário europeu.
São objetos acionados tanto com vistas à exploração econômica, às atividades
militares, à conversão religiosa ou às emoções estéticas. O importante aqui é
percebermos que esse outro nunca é considerado em si mesmo, mas sempre
em relação a nós mesmos. Ao olharmos para o outro olhamos para nos
mesmos nele.
Todos os discursos que citamos, nas linhas precedentes, e em especial,
aqueles que glorificam a doçura dos “selvagens” em oposição e negação da
sociedade ocidental ainda são atuais. É verdade que os registros de
antropólogos, viajantes, aventureiros e missionários são, em grande medida,
responsáveis por disseminar o imaginário da existência de uma sociedade
alhures onde predominam o prazer e a doçura em plena harmonia com a
natureza exuberante em sua volta. É precisamente a esses relatos que os
etnógrafos devem grande parte de seu sucesso com o público em geral.
É assim que, nessa época, muito lentamente, é verdade, a partir da
observação direta de um objeto distante e estranho e da reflexão do encontro
com a alteridade, permite a constituição progressiva, não de um
conhecimento antropológico, muitos menos de uma ciência antropológica,
mas sim de um saber pré-antropológico.
Atividade
4) Comente a figura à seguir, utilizando-se como referencial o conteúdo
discutido nessa primeira aula.
 Índios saciam a vingança ingerindo as
partes do inimigo morto. America tercia pars,
editado por Theodor de Bry. Clichê da Biblioteca
de Paris. Fonte:
https://commons.wikimedia.org
<https://commons.wikimedia.org>
5) Defina Antropologia.
Notas
Mitologia 1
Na concepção utilizada pela Antropologia, é a forma como os povos indígenas e
tradicionais refletem sobre si e sua sociedade.
Primitivas 
Aqui você deve entender como “sociedades primitivas” todas aquelas exteriores às
regiões da civilização europeia ou norte-americanas. As primeiras sociedades
estudadas pelos antropólogos tinham como características básicas o afastamento
geográfico às quais são atribuídas as seguintes características:
sociedades numericamente pequenas;
tiveram nenhum ou pouco contato com civilizações vizinhas;
tecnologia pouco desenvolvida em comparação a nossa;
menos especialização das atividades e funções sociais.
Alteridade 
Natureza ou distinção do que é o outro, do que é distinto. Constitui-se por meio de
relações de contraste, distinção e diferença.
Ideologias 
Conjunto das convicções políticas, sociais, filosóficas etc., de um indivíduo ou grupo
de indivíduos.
Etnocentrismo 
Ocorre quando um determinado indivíduo ou grupo de pessoas discriminam outras
pessoas por não possuírem cultura e condição social idênticas as suas.
Bárbaros 
Em referência aos cantos dos pássaros oposto à significação da linguagem humana.
Referências
DA MATTA, Roberto. Relativizando - Uma Introdução à Antropologia Social. Rio de
Janeiro: Rocco, 1993.
LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo: Brasiliense, 2006.
2
3
4
5
6
KUPER, Adam. Antropólogos e Antropologia. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1978.
Próximos Passos
O surgimento dos primeiros pesquisadores da Antropologia;
As primeiras escolas antropológicas: Americana e Britânica.
Explore mais
Acervo de imagens para se pensar o outro. <https://lume-re-
demonstracao.ufrgs.br/imagens-para-pensar-o-outro/>
Assista ao filme Hans Staden que trata do confronto entre o mundo ocidental e as
sociedades indígenas brasileira. Confira o trailer
<https://www.youtube.com/watch?v=OSRihhzsh9Q&t=35s> .
Leia o livro “Historia da Antropologia” dos autores Thomas Eriksen e Finn Nielsen. O
livro é um manual que relata, cronologicamente, o desenvolvimento histórico do
projeto antropológico. ERIKSEN, Thomas Hylland; NIELSEN, Finn Sivert. História da
Antropologia. Petrópolis: Vozes,[s./d.].

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