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FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br DESCRIÇÃO DA DOENÇA A doença reumática (DR) é moléstia inflamatória, resultante de resposta auto-imune contra antígenos do estreptococo beta-hemolítico do grupo A de Lancefield, em indivíduos geneticamente hipersensíveis. Ocorre, em média, uma a três semanas após infecção das vias aéreas superiores, em geral da orofaringe. É freqüente- mente classificada como doença do tecido conjuntivo por expressar lesões, de caráter sistêmico, de células, fibras colágenas e substância fundamental, principal- mente das valvas cardíacas. Pode atingir articulações, sistema nervoso central, tecido subcutâneo, vasos, e, menos freqüentemente, outros órgãos1. Clinicamente pode apresentar-se sob as formas aguda ou crônica. A forma aguda pode ser fatal, devido à grave endomiocardite, ou evoluir com graves disfun- ções de valvas e/ou miocárdio. Na maioria dos casos o processo inflamatório valvar agudo evolui para a forma crônica, com presença de fibrose e/ou fibrocalcifica- ção. A valvopatia reumática crônica, a mais importante seqüela da doença, pode exibir caráter estacionário ou progressivo. Nos outros órgãos o processo em geral evolui para a cura sem seqüelas, exceção à artropatia de Jaccoud, pouco freqüente2. Em qualquer fase a DR crônica (DRC) pode ser en- trecortada por surtos agudos, às vezes sub clínicos, de- nominados recorrências. Estes podem agravar lesões valvares preexistentes transformando disfunções leves em graves, com necessidade de terapêuticas mais agressivas, tais como cirurgia para implante de próte- ses ou plastias valvares. Atualmente a valvoplastia por cateter-balão é muito utilizada nos laboratórios de he- modinâmica intervencionista para correção de lesões estenóticas valvares crônicas, como, por exemplo, a es- tenose mitral. ASPECTOS HISTÓRICOS O termo reumatismo articular agudo foi utilizado pelo francês Guillaume de Baillou (1538-1616), consi- derado o pai do “reumatismo”, para diferenciar a doen- ça reumática aguda (DRA) das outras causas de “reu- matismo”. Thomas Sydenham (1624-1689), na Ingla- terra, a diferenciou da gota e descreveu a coréia aguda. Nenhum destes reconheceu que a doença reumática afetava o coração. Giovanni Morgagni (1682-1771) foi o primeiro a descrever as lesões cardíacas valvares, ob- servadas a partir de autópsias3. EPIDEMIOLOGIA A DR raramente surge antes dos quatro anos de idade. É mais freqüente em crianças e adolescentes de cinco a 15 anos, declinando progressivamente a partir dessa faixa etária1. É a causa mais comum de doença cardíaca em crianças e adultos jovens de países em de- senvolvimento4. Sua distribuição é universal, pode atingir todas as raças e a sua prevalência é maior em paí- ses em desenvolvimento, atingindo, principalmente, populações de baixo nível socioeconômico que vivem em áreas densamente povoadas e precárias condições de higiene. Sua incidência aumenta no inverno, em vir- tude do confinamento3,5. Em países em desenvolvimento houve importante declínio de sua incidência, iniciado antes da era da peni- cilina, por conta da melhoria de condições socioeconô- micas e culturais6. Nos EUA, na década de 1980, em al- 287 12 Doença Reumática Luiz César Nazário Scala daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. guns estados, observou-se aumento da incidência da DR em populações de classe média, chamando a atenção para o fato de não serem suficientes as medidas profiláti- cas e um melhor padrão de vida7. Apesar da inexistência de estudos epidemiológicos de âmbito nacional, no Bra- sil são diagnosticados apenas 4,8% dos casos agudos8. Uma vez que a DR continua sendo muito comum, deve ser considerada, pelos médicos e autoridades da área da saúde, um importante problema de Saúde Pública nos países em desenvolvimento, como o Brasil. ETIOLOGIA O estreptococo, um dos agentes mais estudados pela microbiologia, é constituído por uma cápsula celu- lar composta de hialuronato e mucopolissacáridos (áci- do glucorônico e N-acetil-glucosamina), com função antifagocitária para os leucócitos humanos. A parede celular compõe-se de três camadas: a externa (protéi- ca), a média (hidrocarbonada) e a interna (mucopeptí- dica). A interna, composta pelas proteínas M, T, R, é responsável por uma especificidade que possibilita a identificação de cerca de 80 diferentes tipos de estrep- tococos do grupo A. A camada média é gru- po-específica, permitindo a identificação dos estrepto- cocos dos grupos A a O. A camada interna, responsável pela rigidez da célula bacteriana, é o local de ação da penicilina, permitindo sua destruição. Apresentam fím- brias, projeções pilosas (espécie de flagelos), sem mo- bilidade, compostas por ácido lipotecóico e proteína M, dotadas de enorme antigenicidade e adesividade (às cé- lulas epiteliais da faringe humana)9. Os produtos liberados pelo estreptococo induzem à formação de anticorpos circulantes cuja detecção, útil para o diagnóstico da DR, marcam infecção prévia pelo agente. Desses antígenos extracelulares, cerca de 20, destacam-se: estreptolisina-O, estreptolisina-S, estrep- toquinase, hialuronidase, desoxirribonucleases A, B, C e D, difosfopiridinonucleotidase, proteinases, toxina eritrogênica, estreptocina A e algumas substâncias cha- madas exotoxinas pirogênicas10. Existem evidências clínicas, epidemiológicas, imu- nológicas e profiláticas que estabelecem a relação causal entre estreptococo beta-hemolítico do grupo A e DR1. Sob o ponto de vista clínico observou-se que as estrepto- coccias faríngeas sempre precedem o desenvolvimento da DR nos primeiros surtos ou recidivas11. Contudo, ou- tros fatos não explicam de forma completa aquela rela- ção causal, pois cerca de 50% dos portadores de DR não apresentam história prévia de infecção faríngea; e as cul- turas de secreção faríngea são, freqüentemente, estéreis e hemoculturas negativas12. A evidência epidemiológica mais expressiva é o registro do aumento da incidência da DR (de 0,3% para 3%), em acampamentos militares onde ocorreram epidemias de faringite estreptocócica13. As evidências imunológicas são: títulos de antiestrepto- lisina-O elevados no sangue periférico; imunecomple- xos circulantes contendo peptídeos de estreptolisina-O (pacientes com DRA), presença de anticorpos anties- treptocócicos, circulantes, auto-reativos e de reação cru- zada com antígenos de músculo cardíaco8. Evidências profiláticas: o tratamento de infecções estreptocócicas faríngeas com penicilina benzatina evita o desencadea- mento de surto de DRA (profilaxia primária). A utiliza- ção contínua impede a ocorrência de novos surtos (profi- laxia secundária). PATOGENIA As condições necessárias para que ocorra a DR são: 1) presença de estreptococos; 2) localização em orofaringe; 3) tempo suficiente para causar infecção (não só colonização); e 4) elevação significativa de tí- tulos de antienzimas estreptocócicos no soro. A maio- ria dos investigadores admite que a DR seja o resultado de uma resposta imune anormal, humoral, celular, ou mista, que ocorre em indivíduos geneticamente susce- tíveis. O mecanismo patogênico não está completa- mente esclarecido1,8. A resposta humoral é caracteriza- da por: depósito de imuneglobulinas15; títulos elevados de antienzimas16 anticorpos auto-reativos14,15, imune- complexos circulantes17, deposição de imuneglobuli- nas e componente C3 do sistema complemento no mio- cárdio. Existe resposta imune celular aumentada a cer- tos antígenos estreptocócicos e expressivo infiltrado de células mononucleares em articulações, coração e va- sos5,14,17. O papel patogênico dos anticorpos auto-reativos não está ainda estabelecido, existindo forte tendência em considerá-los mais como resultado do processo pa- tológico, do que como causa1. Muitos trabalhos demonstram que no soro de paci- entesexistem anticorpos que reagem cruzadamente com antígenos de tecidos humanos e de mamíferos em geral, tais como músculo cardíaco e esquelético, tecido valvar, rim, pele e tecidos neuronais14. Seqüências de aminoácidos comuns (ou muito semelhantes), compar- tilhadas por estreptococos e auto-antígenos humanos, explicariam as reações cruzadas observadas entre antí- genos estreptocócicos e auto-antígenos. Este fenômeno foi denominado mimetismo antigênico18. 288 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br Linfócitos T. Estudo do perfil fenotípico dos lin- fócitos T em valvas cardíacas, apêndices atriais e mio- cárdio, tanto na DRAcomo DRC, revelaram excesso de linfócitos T-CD4 positivos (linfócitos T auxiliado- res)19. Foram observadas células longas, semelhantes a macrófagos, intimamente ligadas a fibras colágenas e fibroblastos em proliferação, com elevada expressão de antígenos HLA-DR20,21. Entre os mecanismos de le- são tecidual, mediados por células destacam-se a cito- toxicidade mediada por linfócitos T, e lesões dependen- tes de liberação de substâncias produzidas por macró- fagos, tais como fator de necrose tumoral, colagenases ou fatores de proliferação de fibroblastos22. A excessi- va proliferação de fibroblastos, com produção de colá- geno, pode estar relacionada à fibrose e degeneração valvares21. Reatividade aumentada a antigenos estrep- tocócicos23 e atividade citotóxica, causada por linfóci- tos T (em indivíduos normais estimulados in vitro por antígenos estreptocócicos), em tecido cardíaco, foram evidenciadas em pacientes com DR24. Uma vez que anormalidades nas proporções de linfócitos T e suas subpopulações (TCD4 e TCD8), no sangue periférico podem refletir distúrbios de imunorregulação, muitos trabalhos foram realizados com este objetivo, porém a relação entre os achados e a patogenia da DR ainda é controversa8. FATORES GENÉTICOS DE SUSCETIBILIDADE A DR tem caráter de agregação familiar. Parentes consangüíneos de pacientes com DR têm mais probabi- lidade de contraí-la do que a população em geral. Há mais de 110 anos Cheadle observou que a doença apre- sentava-se freqüentemente em mais de um membro da família25. Muitos estudos confirmaram, posteriormen- te, a agregação familiar nesta patologia. A análise dos resultados de 12 trabalhos sobre ocorrência de DR em gêmeos, totalizando 236 pares, em que pelo menos um dos mesmos era afetado, demonstrou que a concordân- cia da doença era maior em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos26. Por outro lado, a relativa baixa concordância em gêmeos monozigóticos deve refletir a provável existência de outro fator, talvez ambiente. Para alguns autores a herança é autossômica recessi- va27, autossômica dominante28, ou não obedece a pa- drões mendelianos estritos29. SISTEMA ERITROCITÁRIO ABO Em relação aos antígenos eritrocitários ABO, pre- sentes em secreções orgânicas (saliva, suco gástrico e esperma), alguns autores relataram a associação entre DR e o caráter não secretor daqueles antígenos30 A sa- liva de indivíduos suscetíveis seriam não secretora de IgA, o que facilitaria a aderência do estreptococos à membrana celular do hospedeiro31. Observou-se me- nor incidência do grupo sangüíneo O em crianças com DR32. Estudos posteriores não confirmaram a impor- tância dos grupos sangüíneos ABO como marcadores genéticos de suscetibilidade à DR33. MARCADORES GENÉTICOS O reconhecimento, nas populações de risco, de um marcador que permita a identificação de indivíduos ge- neticamente suscetíveis à DR é importante, pois permi- te: 1) indicar quais indivíduos deveriam ser seguidos mais cuidadosamente em relação a infecções estrepto- cócicas, inclusive com a utilização precoce de antibió- ticos; 2) selecionar candidatos preferenciais à imuniza- ção com uma futura vacina estreptocócica; 3) auxiliar no diagnóstico de DR em indivíduos previamente in- fectados que apresentem manifestações sutis ou não es- pecíficas da DR5. Marcador “883” e Similares Patarroyo, em 1979, descreveu um aloantígeno de superfície, encontrado em linfócitos B, que estava pre- sente em 70% dos pacientes com DR. O aloantígeno foi definido por um soro policlonal, de número “883”, daí seu nome34. Este marcador foi encontrado em 70% de pacientes com DR, tanto de Nova York como de Bogo- tá e, contrariamente, ocorria em somente 17% dos con- troles não reumáticos de ambas populações. Em 1985, o mesmo grupo de pesquisadores produziu outro anti- corpo monoclonal, denominado D8/D17, que reconhe- ceu linfócitos B de 100% de pacientes caucasóides americanos com DR e de 14% dos controles35. Este mesmo anticorpo revelou expressiva positividade em reumáticos da Índia (63% DR x 12% controles36, e no Brasil (38,5% DR x 7,5%)37. Estudos de segregação fa- miliar do marcador D8/D17 mostraram padrão compa- tível com herança recessiva autossômica. Não existe, na literatura, correlação entre os monoclonais D8/D17 e “883”. Estes achados são importantes marcos na pes- quisa de marcadores genéticos na DR. Marcadores do Complexo HLA Como o sistema HLA é o sistema mais polimórfico estudado no homem é natural que os pesquisadores ten- 289 daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. tassem observar se existe alguma associação entre a DR e estes marcadores8. Os primeiros trabalhos, estu- dando somente antígenos HLA classe I (A e B) e DR, não revelaram associações importantes38. Outros estu- dos, compreendendo a determinação de antígenos HLA classe II (DR), sugeriram uma série de associa- ções positivas (quando a freqüência de determinados antígenos é mais elevada nos pacientes do que nos con- troles). Estes fatos sinalizam a participação de genes do complexo HLA na suscetibilidade à DR8. Em pacientes caucasóides foi observada associação com HLA-DR4 (Estados Unidos e Arábia Saudita)39. Em negróides en- contraram-se associações com HLA-DR1 (Martinica), DR1 e DRw6 (África do Sul) e DR2 (EUA). Na Índia foi descrita associação com HLA-DR3 e HLA-DQw28. Em 1993 estudamos, por método de análise de cos- segregação, 22 famílias que apresentavam pelo menos dois indivíduos afetados pela DR (irmãos, tio-sobrinho, primos e avó-neta). Os resultados obtidos em 13 pares de irmãos sugeriram a presença de pelo menos um gene de suscetibilidade à DR localizado no complexo HLA ou próximo a este8,40. Pesquisamos também uma amostra de 40 pacientes reumáticos brasi- leiros, caucasóides e não aparentados entre si, sob o método de associação. Comparando-se as freqüências de antígenos HLA-A, B, DR, DQ, com as de população caucasóide local (São Paulo), não observamos nenhu- ma diferença significativa entre pacientes e controles8. Estudo realizado com pacientes brasileiros, de origem étnica mista, mostrou associação com HLA-DR7 e DRw5341. Mais tarde nosso grupo realizou outro estu- do, com pacientes brasileiros brancos e mulatos, porta- dores de cardiopatia reumática crônica. Observou-se uma associação significante com antígenos HLA-DR7 (mulatos) e HLA-DR1 (brancos)42. Neste trabalho fo- ram confirmados os achados de Guilherme e colabora- dores41. Nossos resultados são interessantes, pois, em dois diferentes grupos étnicos vivendo na mesma área geográfica (São Paulo), obtivemos duas associações claramente diferentes. Estes dados sugerem, fortemen- te, que as diferentes associações de genes do complexo HLA com DR, citadas em diversas publicações, de- vem-se mais a fatores genéticos que ambientais. Estes antígenos seriam os marcadores genéticos da susceti- bilidade à DR em nossa população42. PATOLOGIA As alterações histopatológicas ocorrem com maior freqüência no coração articulações e no sistema nervo- so central. É afetado omesênquima que sustenta as arti- culações, tecidos subcutâneos, pulmão, pleura, rim e, em especial, tecidos cardíacos e pequenos vasos. Coração (Cardite). Apresenta em geral uma pan- cardite que envolve miocárdio, endocárdio e pericár- dio, cujas anormalidades podem ser sistematizadas em três fases2. 1ª) Fase exsudativa — de ocorrência precoce, apresenta edema da substância fundamental do tecido conjuntivo, seguida de tumefação, degeneração e frag- mentação das fibras colágenas, através de reações ex- sudativas. No pericárdio, existe um exsudato fibrinoso revestindo as serosas, com aspecto macroscópico de “pericardite em pão com manteiga”. Em geral estas al- terações regridem sem seqüelas, ou levam a espessa- mentos e aderências que raramente prejudicam a fun- ção cardíaca com pericardite constritiva. 2ª) Fase proliferativa — representada, principal- mente, pelos corpúsculos ou nódulos de Aschoff, um granuloma patognomônico da agressão causada pela DR. É um agregado perivascular de linfócitos, plasmó- citos e grandes células basofílicas com núcleos poli- morfos, denominados miócitos de Anitschkow (células cujos núcleos alongados se assemelham a “olho de co- ruja”), dispostas como uma roseta ao redor de um cen- tro avascular de material fibrinóide. Apresentam-se em etapas histopatólogicas evolutivas, de início de aspecto “ativo” e, tardiamente, “senescente”. Encontrados no miocárdio, valvas atrioventriculares e aurículas de por- tadores de DRA ou DRC, são sugestivos de reação his- tológica ativa sem evidências clínica ou laboratorial de atividade. Alguns autores discutem a hipótese de tra- tar-se de atividade subclínica da doença2. 3ª) Fase de fibrose — caracterizada por fenômenos cicatriciais, de caráter estacionário ou progressivo, que acometem anel valvar, cúspides ou cordoalhas. Existe em geral encurtamento de cordoalhas, fusão das comis- suras e deformação das valvas, em especial do folheto posterior mitral, que levam a graus variáveis de insufi- ciência ou estenose. As valvas mais atingidas são a mi- tral e aórtica, com menos freqüência a tricúspide, e ra- ramente a pulmonar. Articulações (Artrite). A membrana sinovial é precocemente atingida na DRA. Há edema articular, periartircular, degeneração fibrinóide e infiltrado de monócitos e polimorfonucleares. O derrame articular é escasso e desaparece em pouco tempo. Não existem pannus, alterações de membrana ou erosão de cartila- gem. As lesões são reversíveis e as limitações motoras são transitórias. Raramente, em casos com várias reci- divas, as articulações metacarpofalângicas podem apresentar tumefação, subluxação e desvio cubital que 290 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br lembra a artrite reumatóide. O estudo histopatológico revela fibrose periarticular, com integridade da mem- brana sinovial. Podem surgir erosões nas cartilagens e extremidades ósseas das mãos ou dos pés, quadro de- nominado artropatia de Jaccoud43. Sistema Nervoso Central (Coréia); Pulmão (Pneumonite), Rins (Glomerulonefrite). Em casos de coréia ocorre arterite, degeneração celular perivas- cular e, em algumas ocasiões, hemorragias, petéquias, êmbolos e infartos44. Estas alterações podem também ser observadas em casos de DR sem coréia. O seu signi- ficado ainda não está esclarecido. A pneumonite reu- mática, muito rara atualmente, pode surgir com derra- me serofibrinoso, e aumento de polimorfonucleares46. Os rins podem apresentar lesões tipo glomerulonefrite difusa, proliferativa e nefrite crônica, habitualmente sem manifestações clínicas46. QUADRO CLÍNICO A história natural apresenta quatro fases: o seu co- nhecimento pode impedir o desenvolvimento da DR. 1ª fase: infecção estreptocócica (duração de três a oito dias) — toda acuidade diagnóstica deve ser dirigi- da ao seu reconhecimento. Infecções que envolvem a orofaringe (amigdalites, faringites, laringites, alveoli- tes), o ouvido (otites), ou estreptococcias sistêmicas (escarlatina) devem conduzir a rigorosos controle clíni- co e laboratorial. Duas atitudes de ordem prática se im- põem: 1) todo portador de estreptococcia desse grupo pode, potencialmente, desenvolver o quadro clínico da DR; 2) a prevenção e a imediata erradicação das estrep- tococcias desta fase deverão impedir o desenvolvimen- to da DR (prevenção primária). Diversas manifestações atípicas podem ocorrer: sintomas e sinais de “gripe” ou infecção inespecífica, tais como febre, mal-estar, anorexia ou artralgias leves podem ser causadas pela estreptococcia da DR. Adicio- nalmente, o fato de cerca de 30% de reumáticos não re- ferirem qualquer história compatível com infecção res- piratória prévia dificulta o diagnóstico da DR, princi- palmente em adultos. 2ª fase: período latente (duração de duas a três se- manas — média 18,6 dias) — não existe expressão clí- nica. Os exames laboratoriais podem demonstrar anor- malidades1,47. Caso esta fase siga seu curso natural, é fundamental reconhecer e tratar de imediato a DR, pois o acometimento cardíaco será menor quanto mais pre- coce ocorrer a terapêutica. 3ª fase: atividade reumática [duração de seis sema- nas (1/3 dos casos) a três meses (2/3 dos casos)] — apresenta importante expressão clínica: cardite, poliar- trite e coréia (mais freqüentes em nosso meio), nódulos subcutâneos e eritema marginado (menos comuns), pneumonite, glomerulonefrite (muito raros)47. 4ª fase: crônica — neste período ocorre a cura ou a evolução para a cardiopatia reumática crônica. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DE JONES Não exis tem exames laborator ia is ou manifestações clínicas patognomônicas da fase aguda da DR. Em 1944 T. Duckett Jones desenvolveu um conjunto de normas diagnósticas baseadas na combinação de manifestações clínicas. O objetivo era “estabelecer um guia e não um conjunto de regras para serem obedecidas cegamente”, como afirmou o próprio Jones. Havia a intenção específica de não aplicar tais normas estritamente a todos pacientes, evitar diagnósticos exagerados e servir apenas para a fase aguda da doença3. Os achados clínicos foram classificados em manifestações principais (major) e secundárias (minor), segundo a importância para o diagnóstico, e não a freqüência ou intensidade de determinada manifestação Os critérios, muito úteis, foram submetidos a diversas revisões45,48. Duas manifestações principais (major), ou uma principal (major) e duas secundárias (minor), indicam alto grau de probabilidade, e não a certeza, de DR aguda (Tabela 12.1). Em 1965 foi estabelecido que uma infecção estreptocócica prévia é um pré-requisito para o diag- nóstico da DR47. Limitações e Exceções aos Critérios de Jones. Em algumas situações os pacientes podem preencher os Critérios de Jones e, contudo, serem portadores de outras doenças48. Exemplo: o lúpus eritematoso sistê- mico pode combinar artrite, febre, VHS elevado, e, co- incidentemente, história de estreptococcia recente. Contrariamente, alguns pacientes não preenchem os critérios de Jones apesar de não existir outra explica- ção, senão a DR, para explicar o quadro clínico. Estes devem ser cuidadosamente observados na hipótese de surgirem outras manifestações da doença45,47. Existem outras exceções: freqüentemente pacien- tes com coréia de Sydenham isolada, cardite de início insidioso, ou episódio recorrente da doença, sem mani- festações principais, tratados ou não com antibioticote- rapia prévia, apresentam títulos de antiestreptolisina “O” (AEO) normais quando examinados pela primeira vez. Na ausência de outra explicação, estes pacientes devem ser considerados portadores de DRA, principal- mente se forem oriundos de populações de baixo nível socioeconômico ou condições ambientesdesfavorá- 291 daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. veis3. A experiência obtida ao longo deste século nos países em desenvolvimento demonstra que, atualmen- te, cardiologistas, clínicos, pediatras ou reumatologis- tas experientes não necessitam dos critérios de Jones para estabelecer o diagnóstico da DRA47,49. Contudo, em termos didáticos ou para elaboração de protocolos de pesquisas eles são muito úteis. QUADRO CLÍNICO DA DOENÇA REUMÁTICA AGUDA Cardite Pode causar anormalidades estruturais muitas ve- zes graves, incapacitar grande número de pacientes mesmo em baixa idade, ou causar a morte durante o ataque agudo. É a manifestação mais grave da doença, podendo cursar de forma assintomática. Habitualmente se expressa por uma pancardite reumática, envolvendo pericárdio, miocárdio e endocárdio. Insuficiência car- díaca, aumento do volume do coração, presença de so- pros cardíacos orgânicos, ou modificações de sopros preexistentes e sinais de comprometimento pericárdico são as manifestações mais freqüentes1,47. Pericardite Reumática Clinicamente se exterioriza por dor precordial e/ou atrito pericárdico, audíveis em para-esternal esquerdo e áreas da base. O derrame pericárdico costuma ser de pequeno volume e pode não ser detectado. O eletrocar- diograma (baixa voltagem, alterações progressivas da repolarização ventricular), o radiograma do tórax (au- mento da área cardíaca) e, principalmente, ecocardio- grama ajudam a estabelecer sua presença. Sua existên- cia é de elevada sensibilidade para o diagnóstico da DRA. As pericardites de grande volume indicam mau prognóstico e os fenômenos de tamponamento são ra- ros. Miocardite Reumática Apresenta-se, freqüentemente com taquicardia persistente, não proporcional à febre, detectável mes- mo com o paciente dormindo, acompanhada de agita- ção precordial (hipermotilidade do precórdio) desen- volvimento, ou agravamento, de insuficiência cardía- ca. Este achado deve ser destacado, pois a palpação do precórdio nestes casos é sui generis. A hiperdinamia precordial da cardite reumática aguda é mais intensa do que a existente em casos de insuficiência cardíaca de outra causa ou endocardite infecciosa. A insuficiência cardíaca na maioria das vezes é pouco sintomática, porém os sinais são evidentes ao exame físico. Algumas vezes apresenta-se sob a forma de insuficiência cardíaca congestiva, com sintomas exuberantes. O ritmo de galope, protodiastólico, pré-sistólico, ou de soma pode ser um indício de mio- cardite, expressão da disfunção miocárdica. Deve ser correlacionado com a intensidade da taquicardia. É ne- cessário cuidado nesta avaliação, pois a presença de terceira bulha ou mesmo quarta bulha fisiológicas, na presença de taquicardia, podem induzir a erros de inter- 292 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br Tabela 12.1 Critérios de Jones (Modificados) Manifestações Principais Manifestações Secundárias Cardite Clínicas Poliartrite — Artralgias Coréia — Febre Eritema marginado — Antecedente pessoal de DR ou Nódulos subcutâneos presença de cardiopatia reumática Laboratoriais — Provas laboratoriais de fase aguda alteradas (aumento de VHS, presença de PCR, leucocitose) — Aumento do intervalo PR (eletrocardiograma) — Prova de estreptococcia anterior recente (escarlatina) — Quadro típico de infecção com cultura positiva em secreção faríngea — títulos ↑ de anticorpos antiestreptocócicos (ASLO e outros) A presença de dois critérios principais, ou um principal e dois secundários, indica alta probabilidade de presença de DR, se apoiada por evidência de infecção estreptocócica anterior. Adaptado45. daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br pretação. A terceira bulha pode surgir após exercício fí- sico ou estar presente na vigência de valvopatias que aumentam o enchimento ventricular, sem significar fa- lência miocárdica49. Endocardite Reumática Atinge preferencialmente, por ordem de freqüên- cia, as valvas mitral, aórtica e tricúspide e, raramente, a pulmonar. As disfunções tricúspides isoladas são raras, geralmente coexistem com as mitrais. A disfunção val- var inicial é sempre do tipo insuficiência. Assim, o sur- gimento de sopro sistólico mitral (holossistólico, de alta freqüência, irradiado para axila ou dorso), caracte- riza a insuficiência mitral. O sopro diastólico aórtico, de alta freqüência, basal, decrescente, mais bem audí- vel em paraesternal esquerdo ou área da base, é a ex- pressão clínica do acometimento valvar aórtico47,49. Nos casos com cardiopatia prévia torna-se difícil avaliar o acometimento da disfunção valvar, mesmo quando há evidências do seu agravamento. Nestes ca- sos o fator miocárdico, conferido pelo processo infla- matório agudo, pode ser o maior responsável pelo agra- vamento do quadro clínico. Por esta razão, não é acon- selhável avaliar a gravidade da valvopatia na fase agu- da da doença. Além disso, a utilização de antiinflama- tórios pode melhorar de forma significativa uma grave disfunção valvar. O surgimento de um sopro mesodiastólico apical, de baixa freqüência, algumas vezes com caráter de ruflar (sopro de Carey Coombs), sinaliza a valvulite mitral. Não pode ser atribuído à estenose mitral orgânica, uma vez que o sopro de Carey Coombs é um fenômeno este- to-acústico causado por edema edema mitral reversível com o uso de antiinflamatórios. Quando presente é um excelente elemento para o diagnóstico de cardite. Pode ser facilmente diferenciado do ruflar diastólico da este- nose mitral pois não apresenta acentuação da primeira bulha, estalido de abertura ou reforço pré-sistólico. So- mente na fase crônica da doença pode-se atribuir à este- nose mitral orgânica a gênese do sopro diastólico de ponta. Finalmente a insuficiência mitral, moderada ou grave, também pode produzir sopro diastólico apical por aumento do fluxo transvalvar mitral. A cardite pode apresentar-se sob três formas clíni- cas: típica, atípica ou fugaz. Cardite Reumática Típica O primeiro surto, ou as recidivas, caracterizam-se pelo aparecimento de taquicardia persistente (mesmo com o paciente dormindo), hiperdinamia precordial à inspeção e palpação, desenvolvimento de insuficiência cardíaca, presença de sopros sistólicos mitral ou aórti- co, ou mesodiastólico apical de Carey Coombs, palidez cutaneomucosa, prostração, às vezes febre. As reações sorológicas de fase aguda estão alteradas49. Cardite Reumática Atípica (“Dissociação Clínico-laboratorial”) Alguns casos, que cursam com disfunções valvares moderadas ou graves, podem apresentar insuficiência cardíaca com provas laboratoriais de fase aguda negati- vas. Não há resposta ao tratamento clássico, a não ser quando se associa a corticoterapia via oral. Estes casos com “dissociação clínico-laboratorial” podem ser cau- sadas por uma modalidade da doença que cursa de for- ma prolongada, persistente, subclínica e que, em dado momento, conduz o paciente à descompensação clíni- co-hemodinâmica. Alguns autores admitem a hipótese, não suficientemente investigada, de atividade imuno- lógica persistente, de caráter subclínico49. Cardite Reumática Fugaz com Sinais e Sintomas Gerais da DRA São formas clínicas com manifestações discretas de cardite que quase sempre passam despercebidas pelo clínico. Os pacientes podem apresentar alguns si- nais ou sintomas inespecíficos tais como: astenia, disp- néia discreta, tosse, às vezes febre, anorexia, artralgias leves ou mialgias. Este quadro, de rápida regressão, às vezes é semelhante a um quadro “gripal”. Outras vezes podem surgir dor abdominal, náuseas e vômitos, agita- ção ou epistaxe. Estes pacientes podem ser os “porta- dores de cardiopatia crônica sem história anteriorde DR”1, 47, 49. Recidivas São novos surtos de DR que se instalam em porta- dores de cardiopatia prévia. A cardite, com manifesta- ções clínicas semelhantes a um surto anterior, pode en- volver a mesma valva ou outra, não lesada. É importan- te estabelecer o diagnóstico diferencial com insuficiên- cia cardíaca descompensada por lesão valvar prévia que se agravou, e afastar a hipótese de endocardite in- fecciosa. O surgimento de novos sopros marca o acome- timento de valvas poupadas pelo surto inicial. Quando surge o sopro de Carey Coombs, este tem que ser dife- renciado do sopro diastólico de hiperfluxo (por insufi- 293 daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. ciência mitral moderada ou grave), do diastólico de Austin-Flint (por refluxo aórtico moderado ou grave), e do ruflar de estenose mitral preexistente49. ARTRITE — POLIARTRITE TÍPICA Apresenta-se como poliartrite de grandes articula- ções, mais freqüente em joelhos, cotovelos, punhos e tornozelos, de forma assimétrica e migratória, na maio- ria das vezes acompanhada de impotência funcional. Permanece de um a cinco dias em cada articulação (muito raramente quatro semanas). e costuma regredir em dois a três dias com antiinflamatórios. Raramente deixa seqüelas, a artropatia de Jaccoud. As reações so- rológicas de fase aguda, habitualmente alteradas, de- vem ser realizadas na ausência de terapêutica antiinfla- matória1,47,49. Poliartrite Atípica. Pode ser poliartrites cumula- tivas, monoartrites, artrites de pequenas articulações (falanges distais), artralgias ou poliartralgias de gran- des articulações, monoartralgias e cervicalgias. CORÉIA DE SYDENHAM Coréia reumática ou doença de São Vito — mais comum após a puberdade e até os 16 anos, surge geral- mente meses após uma estreptococcia. Pode apresen- tar-se isolada ou associada à artrite ou cardite. A coréia isolada permite o estabelecimento presuntivo de DRA. As reações sorológicas de fase aguda são, quase sem- pre, normais. Podem estar elevadas taxas de antideso- xirribonuclease B, a prova que mais tardiamente se normaliza após uma estreptococcia. A coréia caracteri- za-se pela existência de movimentos involuntários, in- coordenados, especialmente da face e membros (que desaparecem durante o sono), e hipotonia muscular, que pode impedir a deambulação. Disartria, alterações do comportamento, irritabilidade, insônia e labilidade emocional são muito comuns. Na maioria das vezes as queixas são de falta de atenção, incapacidade de abotoar a roupa ou de sustentar objetos com as mãos, dificulda- de na escrita e mímica facial exuberante (caretas). A língua pode apresentar contrações erráticas, serpigino- sas e desordenadas. À vezes apresenta-se em apenas um lado do corpo (hemicoréia). Algumas manobras são úteis para auxiliar o diagnóstico: incapacidade de man- ter a língua imóvel; incapacidade de escrever em linha reta (há nítida piora da caligrafia — que melhora com a regressão do quadro); aperto de mão com pressão irre- gular; dificuldade de manter os braços estendidos e, quando eleva-se os braços, as mãos se apresentam em pronação. O exame neurológico não revela alterações sensitivas nem comprometimento do sistema pirami- dal. As manifestações da coréia duram poucas semanas e regridem lenta e progressivamente sem seqüelas. Po- dem persistir por até dois anos1,48,49. ERITEMA MARGINADO Surge no início da DR e costuma acompanhar a cardite. É uma erupção cutânea, não pruriginosa, não descamativa, fugaz, de cor rosada ou roxo pálido, que afeta geralmente o tronco ou as partes proximais dos membros, porém nunca o rosto. São placas eritemato- sas de 1 a 3cm de diâmetro, com superfície às vezes dis- cretamente elevadas. É também denominado eritema anular, pois exibe um centro claro e margens rosadas, bem delimitadas. Sua incidência é baixa e variável, de 2% a 13%1,48,49. NÓDULOS SUBCUTÂNEOS Apesar de manifestação típica da doença são raros e se associam, habitualmente, com quadros de cardite grave. São nódulos duros, móveis, indolores, tamanho variável (0,5 a 2,0cm de diâmetro), distribuição simé- trica e número variável. Surgem tardiamente e regri- dem, espontaneamente, em uma a duas semanas. Loca- lizam-se principalmente nas saliências ou superfícies ósseas, tendões e aponeuroses. Predominam nos torno- zelos, joelhos, dorso das mãos, punhos, cotovelos, omoplatas, regiões frontal, parietal e paravertebral. São incomuns nas costelas, clavículas ou cristas ilíacas50. QUADRO CLÍNICO DA DR CRÔNICA — CARDIOPATIA REUMÁTICA CRÔNICA Uma vez que a coréia não deixa seqüelas, e que es- tas são excepcionais na forma articular, a fase crônica da DR resume-se, essencialmente, à forma cardíaca. Suas seqüelas constituem as valvopatias. Nesta fase as reações inflamatórias de fase aguda são negativas. As manifestações clínicas dependem da magnitude do dis- túrbio hemodinâmico. A disfunção de uma ou mais val- vas, ao longo dos anos, pode cursar de forma estável (cardiopatia reumática crônica de caráter estacioná- rio) ou progressiva (cardiopatia reumática crônica ati- va). Geralmente a progressão da lesão valvar ocorre por conta de novos surtos (recidivas). Outro grupo de pacientes agrava as valvopatias independentemente de novos surtos reumáticos, fato não explicado definitiva- mente49. 294 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL POLIARTRITES Deve ser feito com artrite reumatóide juvenil (ARJ), anemia falciforme, artrite séptica, lúpus erite- matoso sistêmico, doença do soro, púrpura de He- noch-Schönlein, osteomielite aguda e artrite traumáti- ca, as mais correntes. O problema mais comum são si- tuações que cursam com poliartrite, febre, VHS eleva- do e, coincidentemente, títulos de antienzimas eleva- dos. Este quadro pode ocorrer, por exemplo, na artrite séptica. Esta, no entanto, acomete, em geral, uma única articulação. O líquido sinovial na artrite séptica contém > 100.000 leucócitos/mm3 enquanto que na DR < 100.000 leucócitos por mm3. Artrite Reumatóide Juvenil. Simula a DR quan- do se inicia com poliartrite migratória aguda de grandes articulações. Rigidez matinal, edema fusiforme dos de- dos e envolvimento de pequenas articulações, mãos ou pés, erupção macular, linfadenopatia ou esplenomega- lia são característicos da artrite reumatóide. O curso crônico da ARJ e suas deformidades podem ser, a única forma de se estabelecer o diagnóstico diferencial1. Linfomas e Granulomas. Até 10% dos pacientes com leucemia apresentam dores ósseas ou articulares. Deve-se suspeitar de leucemia quando surge anemia mais acentuada ou propensão à cianose48. Anemia Falciforme e Outras Hemoglobinopa- tias. Podem cursar com artralgias, sopros, dilatação cardíaca e dor abdominal. A eletroforese da hemoglo- bina ajuda a esclarecer o diagnóstico. As dores de cres- cimento, que às vezes podem acordar as crianças du- rante a noite, localizam-se atrás dos joelhos, nos torno- zelos ou músculos da perna49. CARDITE E CARDIOPATIA REUMÁTICA O diagnóstico diferencial deve ser feito com sopros funcionais (“inocentes”), endocardite infecciosa (EI), outras cardites, pericardites e cardiopatias congênitas. A EI pode ser confundida com uma recidiva de DR em pacientes com cardiopatia reumática já estabelecida. A EI pode cursar com febre mais alta que a DR, artralgias, sopros, taquicardia, e provas de atividade inflamatória alteradas. As hemoculturas e o ecocardiograma, para detectar vegetações, são muito úteis50. Miocardites, Pericardites. Quando a DR cursa com cardiomegalia, insuficiência cardíaca e sem mani- festações extracardíacas pode ser impossível o diag- nóstico diferencial com as miocarditesde outras etiolo- gias. Alguns fatos ajudam a distinção: o refluxo mitral é mais grave na cardite reumática aguda. A pericardite da DR pode surgir antes da valvulite e miocardite. A pericardite viral ocorre geralmente de forma isolada, enquanto que a pericardite reumática se associa, simul- taneamente, com lesão valvar. As cardiopatias congê- nitas raramente oferecem problemas diagnósticos, sal- vo quando o sopro cardíaco ocorre durante episódio fe- bril51. CORÉIA Os movimentos coreiformes podem ser diferencia- dos dos tiques múltiplos, isolados ou espasmos. Estes últimos são repetitivos, e seguem um padrão mais uni- forme, sem interferir na coordenação. A coréia de Hun- tington raramente começa na infância e, em geral, tem história familiar47. EXAMES LABORATORIAIS Não há provas laboratoriais específicas para o di- agnóstico da DR. O diagnóstico se apóia em um con- junto de dados clínicos e laboratoriais. Para se diagnos- ticar um surto de DRA é muito importante identificar a ocorrência simultânea de uma infecção estreptocócica recente e um quadro inflamatório em atividade51. EVIDÊNCIAS DE INFECÇÃO ESTREPTOCÓCICA RECENTE Cultura de Secreção de Orofaringe. A p e n a s 25% das culturas são positivas para o estreptococo do grupo A, pois durante o período de latência os mecanis- mos de defesa do hospedeiro são capazes de erradicar o agente3. Deve-se considerar que culturas positivas po- dem ocorrer em estreptococcias não complicadas ou em portadores sãos51. Testes Imunológicos para Detecção de Anticor- pos Séricos. O mais utilizado é a dosagem de anties- treptolisina O (AEO), cujo aumento ocorre em cerca de 85% dos pacientes. Consideram-se normais títulos de AEO ≤ 240U Todd em adultos e ≤ 333U em crianças. São significativos os títulos acima de 333U para crian- ças e 500U para adultos A AEO eleva-se uma a três se- manas após a infecção, com valores máximos de três a cinco semanas, seguindo-se redução lenta. Na coréia isolada, habitualmente uma manifestação tardia da DR, a AEO pode ser normal. Não há correlação entre o os tí- tulos de anticorpos antiestreptocócicos, incluindo a AEO, e a intensidade ou permanência da atividade reu- mática. 295 daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. Taxas elevadas de AEO podem persistir após a fase aguda, sem significar atividade da doença ou evolução clínica desfavorável. Obviamente, a elevação isolada de AEO não significa presença de DR, mas sim contato anterior com o estreptococo. Dislipidemias puras, ou associadas à retenção biliar e a tuberculose pulmonar, podem cursar com títulos elevados de AEO49. A estrep- tozima é um teste de hemaglutinação que conjuga uma mistura de anticorpos: antiestreptoquinase, an- ti-hialuronidase, antidesoxirribonuclease B (an- ti-DNASE). Devido a dificuldades de reprodutibilida- de a Organização Mundial de Saúde não recomenda o seu uso47. Nos casos de coréia a anti-DNASE B apre- senta melhor sensibilidade diagnóstica. EVIDÊNCIAS DE PROCESSO INFLAMATÓRIO SISTÊMICO Velocidade de Hemossedimentação (VHS) e Proteína C Reativa (PCR). Estes exames refletem a magnitude do quadro inflamatório (“atividade reumáti- ca”). São úteis apenas para determinar o início e o final do processo agudo. Não são específicos para a DR, po- rém são muito sensíveis. É o caso, por exemplo, de pa- cientes com suspeita de DRA com artralgias. Um VHS normal ou PCR negativo praticamente exclui o di- agnóstico da doença. Porém se estes testes forem anor- mais recomenda-se a reavaliação do paciente a interva- los curtos, na tentativa de se detectar outras evidências da DR. Não devemos esquecer que o VHS pode estar normal, ou baixo, nas hepatopatias, insuficiência car- díaca, e no uso de salicilatos ou outros antiinflamatóri- os47. Hemograma. O mais comum é haver leucocitose leve, com predomínio de polimorfonucleares, pequeno desvio para a esquerda e anemia leve a moderada, nor- mocítica e normocrômica47. Mucoproteínas (MP). É um dos melhores parâ- metros, pois está elevada em quase 100% dos pacientes com DRA, mais elevada nos casos mais graves. É útil para o acompanhamento do processo agudo e não sofre a influência da terapêutica antiinflamatória. Pode haver elevação da taxa de MP após injeções intramusculares repetidas, endocardite infecciosa, neoplasias, leucoses ou tuberculose ativa52. Eletroforese das Proteínas (EP). A fração al- fa-2-globulina, a mais importante, tem o mesmo valor que a MP para o seguimento do curso da DRA (signifi- cativa se > 0,80g%49. A gamaglobulina pode apresen- tar valores > 1,80g% em casos de grave agressão mio- cárdica2. OUTROS EXAMES COMPLEMENTARES Eletrocardiograma. Não tem padrão característi- co. O bloqueio atrioventricular de 1º grau (aumento do intervalo PR > 0,20 segundo) é a alteração funcional mais comum, presente em 25% a 40% dos casos de DRA. Podem ocorrer extra-sístoles, fenômenos de We- chenbach, ritmo nodal, bloqueio A-V total, alterações inespecíficas da repolarização ventricular. A miocardi- te pode se manifestar com inversão das ondas T, au- mento do intervalo QT. A fibrilação atrial, rara na car- dite reumática aguda, ocorre com freqüência nos gran- des crescimentos atriais da cardiopatia reumática crô- nica47. Radiogramas Tórax. Útil para avaliar o grau de cardiomegalia, o padrão da circulação pulmonar (hipertensão arterial ou venocapilar pulmonar), as disfunções valvares eventualmente presentes na cardite reumática aguda e derrame pericárdico. Articulações Acometidas. Evidenciam apenas edema das partes moles. São úteis nos casos de artropa- tia de Jaccoud e no diagnóstico diferencial em relação a outras colagenoses. Ecocardiograma. Útil nas fases aguda e crônica da doença, define a presença de lesões valvares, vege- tações endocárdicas, avalia as câmaras cardíacas, a função ventricular e a presença de derrame pericárdico (este, de grande sensibilidade para o diagnóstico da cardite reumática aguda). Cintilografia com Gálio 67. Possibilita detectar a presença de cardite na fase aguda da DR, e a sua re- gressão na fase crônica53. É um método de boa aplica- bilidade prática na detecção ou exclusão de cardite. TRATAMENTO Os objetivos do tratamento da DR são: a) erradica- ção da estreptococcia (profilaxia primária); b) tratar o surto agudo e evitar novos surtos infecciosos em indi- víduos predispostos (profilaxia secundária); c) tratar a insuficiência cardíaca e as seqüelas valvares (profila- xia terciária)51. MEDIDAS GERAIS O repouso, em casos de DRA articular ou coréia, na ausência de insuficiência cardíaca, é mantido en- quanto persistir os sinais ou sintomas da artrite ou co- réia. Em casos de cardite a duração do repouso depende 296 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br da gravidade. Em casos de cardite leve, de duas a qua- tro semanas. Em presença de insuficiência cardíaca o repouso depende do seu controle, isto é deve durar en- quanto houver taquicardia persistente, dispnéia aos pe- quenos esforços e fadiga. As outras medidas são: dieta hipossódica, tratamento da insuficiência cardíaca com digital, diuréticos, vasodilatadores (inibidores da ECA), reposição oral de cloreto de potássio, tratamento da anemia e verminoses49. TRATAMENTO DA ESTREPTOCOCCIA Deve eliminar a bactéria antes que ocorram as rea- ções imunitárias que precipitam o quadro clínico da DR. As amigdalites ou faringites agudas, pultáceas, que cursam com hiperemia, febre, odinofagia, e adeno- megalias cervicais devem ser tratadas, de forma ideal, com penicilina benzatina em dose única, IM, profunda, de 600.000U ou 1.200.000U. Pode ser utilizada a peni- cilina procainada (400.000U-IM de 12 em 12 horas— 10 dias) ou a penicilina V, 250g de oito em oito horas — 10 dias). A eritromicina deve ser utilizada em pacientes alér- gicos à penicilina, na dose de 30 a 40mg/kg/dia, de seis em seis horas; ou 250mg de seis em seis horas. Pode, ainda, ser utilizada a cefalexina 500mg de oito em oito horas — 10 dias, em pacientes adultos51. MEDIDAS ANTIINFLAMATÓRIAS Artrite Aguda. Ácido acetilsalicílico (AAS) 100-120mg/kg/dia (dose máxima de 4-6g/dia), de qua- tro a seis doses, com dose plena durante três a quatro semanas. Em geral a resposta é imediata e eficaz, po- dendo-se reduzir progressivamente a dose de AAS numa média de quatro a seis semanas de tratamento. Cardite Aguda e Coréia. Quando ocorre com- prometimento cardíaco, ou em casos de coréia, a droga de eleição é a prednisona, na dose de 1 a 2mg/kg/dia (dose máxima diária, única, e matinal de 40mg na cri- ança e 60mg no adulto). A dose plena deve ser mantida de duas a três semanas, com retirada gradual (1/8 da dose/semana — ou 5mg/semana) num intervalo de seis a 12 semanas, enquanto durar os sinais de cardite e na dependência da normalização das provas de atividade inflamatória. Quando a retirada do corticóide se faz de forma rápida pode ocorrer o “rebote”, uma situação de agravamento do quadro clínico que pode cursar com fe- bre, taquicardia, mialgias, artralgias. O rebote não cos- tuma surgir se a retirada do corticóide ocorrer de forma lenta. É possível associar 2g de AAS, na fase de retira- da do corticóide, e assim evitar o fenômeno do rebo- te54. Tratamento da Cardite Grave com Pulsotera- pia. Este tratamento envolve o uso de grandes doses de esteróides (500mg a 2g de metilprednisolona ou equi- valente), com o objetivo de se obter efeitos imunossu- pressores maiores, com menores efeitos adversos56. A pulsoterapia esteróide utiliza 1g de metilprednisolona por via EV diluídos em 200ml de soro glicosado a 5%, em duas a três horas no período da manhã. As infusões são divididas em quatro ciclos: três dias consecutivos na primeira e segunda semanas; dois dias consecutivos na terceira semana e um dia na quarta semana. Eventual- mente a terapêutica pode ser prolongada por mais uma semana caso persistam os sinais de cardite reumática. Utilizada em casos de cardite reumática grave, com le- sões hemodinâmicas importantes ou grave agressão miocárdica, a pulsoterapia pode protelar a cirurgia car- díaca visando ao controle da atividade reumática. Pro- move uma significativa ação imunossupressora55,56. Em nível nacional não existe consenso acerca da utili- zação desta terapêutica. Tratamento da Coréia. Classicamente utiliza-se o haloperidol, com dose variável de 0,5 a 5mg/dia, em função da intensidade dos movimentos coréicos. A cor- reção da dose deve ser feita, semanalmente, de forma gradual e a dose máxima diária não deve ultrapassar 6-7mg. Sua retirada é feita também de forma lenta e gradual. As medidas gerais para o tratamento da coréia são: ambiente calmo, sem estímulos excitantes (sono- ros ou visuais), para não exacerbar a irritabilidade habi- tualmente presente na coréia. Quando a insuficiência cardíaca é grave podem ser utilizadas drogas vasoati- vas. Se a coréia acompanha a artrite ou a cardite, deve-se utilizar antiinflamatório, que é ditado pela asso- ciação: artrite = aspirina; cardite = corticosteróide, nas mesmas doses referidas para a artrite e cardite. Nos ca- sos de coréia isolada é discutível a validade do uso de antiinflamatórios49. PROFILAXIA DA DOENÇA REUMÁTICA PROFILAXIA PRIMÁRIA Consiste no rigoroso tratamento de toda estrepto- coccia das vias aéreas superiores — amigdalites, farin- gites, sinusites, otites, principalmente na faixa etária dos cinco aos 15 anos. A orofaringite é caracterizada por odinofagia, febre, geralmente > 38°C, cefaléia, lin- fadenite, exsudatos purulentos locais, às vezes dor ab- dominal, náuseas, vômitos e erupção escarlatiforme54. Sinais e sintomas irritativos, não associados à infecção 297 daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. estreptocócica, sugerem infecção de etiologia viral: tosse seca, coriza, rouquidão, conjuntivite, estomatite, hiperemia, amígdalas hipertrofiadas e diarréia. De- ve-se obter cultura de secreção de orofaringe, que cos- tuma ser positiva em apenas 25% dos casos54. A dosagem de AEO, e outras antienzimas, na fase inicial são normais e sem valor prático. Cabe destacar que cerca de 20% dos escolares podem apresentar es- treptococcias prévias não complicadas, com títulos de AEO > 333U. Outros podem apresentar hipertrofia de amígdalas e serem portadores crônicos do estreptoco- co. Ambas situações criam dificuldades na diferencia- ção entre infecção viral ou bacteriana57. Esquemas Terapêuticos 1ª escolha — Penicilina G Benzatina IM — 600.000U para crianças até 30kg e 1.200.000U para adultos e adolescentes. Estas doses mantêm concentra- ções séricas de 0,015 a 0,03U/ml, desejáveis para fins de prevenção58. 2ª escolha — Penicilina V oral, 250mg, quatro ve- zes/dia por 10 dias. 3ª escolha (para alérgicos à penicilina) — eritromicina estolato — 20 a 40mg/kg/dia por 10 dias. PROFILAXIA SECUNDÁRIA Indicada para pacientes com surto prévio de DRA ou portadores de lesões reumáticas. Esquemas Terapêuticos 1ª escolha — Penicilina G Benzatina 600.000 U para pacientes com peso < 30kg ou 1.200.000U > 30kg, com intervalos de 15 dias, pelo menos, nos dois primei- ros anos após o surto inicial, e a seguir, de 21 em 21 dias58. 2ª escolha — Penicilina V oral, 250mg, duas ve- zes/dia, ou eritromicina estolato 250mg 2 x dia, ou sul- fadiaziana 0,5g/dia para pacientes < 30kg e 1 grama para > 30kg. A sulfadiazina é contra-indicada no tercei- ro trimestre de gestação e pode desencadear leucope- nia2. Duração da Profilaxia. Sob o ponto de vista orto- doxo deve manter-se a profilaxia durante toda a vida, pois a suscetibilidade biológica, embora decline com os anos, jamais desaparece. Para pacientes com DR sem lesões valvares e os que possam permanecer afas- tados de contatos nocivos: crianças com 12 anos ou menos, manter a profilaxia até que completem 18 anos; e para jovens e adultos, por período de cinco anos58. Os portadores de valvopatia residual ou coréia, que freqüentam ambientes contaminados (médicos, en- fermeiros, funcionários de hospitais ou creches), os de baixo nível socioeconômico e/ou cultural, devem man- ter a profilaxia por períodos mais longos, teoricamente por toda a vida, ou, pelo menos, até atingir a terceira dé- cada de vida58. Profilaxia da Endocardite Infecciosa. É neces- sária profilaxia antibiótica para todos portadores de cardiopatia reumática crônica, próteses valvares, e aos que fazem profilaxia secundária da DR59. PROGNÓSTICO Os fatores que indicam pior prognóstico são início precoce da doença, cardite com pericardite e recorrên- cia(s). A remissão da DR pode ser total. Cerca de 90% dos pacientes com DR, sem cardite, não tem nenhuma seqüela em 5-10 anos. Em caso de cardite, permanece algum comprometimento cardíaco em 20% dos pacien- tes ao fim de 20 anos. As causas mais freqüentes de óbi- to na DR são choque cardiogênico, arritmias, insufi- ciência cardíaca, EI, tromboembolismo pulmonar e pneumonite reumática60. “FATORES DE RISCO”, MARCADORES GENÉTICOS E VACINA NA DR Finalmente, se consideramos o estado atual do co- nhecimento da DR, é possível admitir alguns “fatores de risco” para o seu desenvolvimento: 1) faixa etária dos cinco aos 15 anos; 2) títulos de anticorpos anties- treptocócicos (AEO) elevados no sangue periférico; 3) baixo nível socioeconômico; 4) pelo menos um familiar afetado pela doença; 5) presença de antígenos HLA-DR7 ou DRw53 (mulatos) ou DR1 (brancos). Os portadores destas características, não necessariamente todas, seriam “candidatos preferenciais” à utilização de uma vacina, a ser desenvolvida no futuro. Sabe-se, atu- almente, que aproteína M é um fator de virulência im- plicado na resposta imune. Pesquisadores dedicam-se à identificação dos determinantes antigênicos desta pro- teína, compartilhadas com cepas de estreptococos reu- matogênicos, cujas propriedades imunogênicas, de- sencadearia a produção de anticorpos permanentes. Enquanto a imunogenética não esclarece esta questão, medidas de vigilância epidemiológica devem ser espe- cialmente dirigidas à população portadora desses “fato- res de risco”. 298 FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br daniel © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. FERREIRA - ATHENEU FER-12 - 2ª Prova 01/09/99 ABREU’S SYSTEM e-mail: abreussystem@uol.com.br BIBLIOGRAFIA 1. Stollermann GH. Rheumatic fever and other rheumatic diseases of the heart. In: Braunwald E. Heart disease: a textbook of cardiovascular medicine, 3rd ed. Philadelphia: WB Saunders, 1721-66, 1992. 2. Décourt LV. Doença reumática, 2ª ed. São Paulo: Sarvier, 60-80, 1972. 3. Homer C, Shulman ST. 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