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Eletrotécnica Fundamentos da Eletricidade Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profº Dr. Paulo Jorge Brazão Marcos Revisão Textual: Profª. Esp. Kelciane da Rocha Campos 5 Leia atentamente o conteúdo desta unidade, que lhe possibilitará conhecer as dimensões da estrutura da matéria, da eletrostática e da eletrodinâmica. Você também encontrará nesta unidade uma atividade composta por questões de múltipla escolha, relacionadas com o conteúdo estudado. Além disso, terá a oportunidade de trocar conhecimentos e debater questões no fórum de discussão. É extremante importante que você consulte os materiais complementares, pois são ricos em informações, possibilitando-lhe o aprofundamento de seus estudos e o enriquecimento de informações sobre este assunto. Bons estudos! · Abordaremos os aspectos que envolvem a estrutura da matéria e o seu papel no desenvolvimento da eletricidade; · A partir destes, iremos adquirir conhecimentos teóricos sobre as leis e técnicas de análise elementares de circuitos, instalações e dispositivos em corrente contínua e alternada; · Também iremos desenvolver visão analítica com relação à análise de dispositivos, sistemas e equipamentos elétricos; · Assim, você terá um entendimento sobre como a eletricidade é criada e como ela pode ser transmitida e utilizada. Fundamentos da Eletricidade · A Estrutura da Matéria · A Carga Elétrica · Lei de Coulomb · Potencial Elétrico · Corrente Elétrica 6 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Contextualização De modo a iniciarmos os nossos estudos nesta unidade, convido você a refletir a respeito da situação ilustrada a seguir. Trata-se de uma representação de todos os elementos envolvidos na geração e distribuição de energia elétrica pelo que convencionamos chamar de fontes de energia convencionais ou não renováveis. A figura aborda as várias etapas que a eletricidade apresenta desde a sua geração numa usina até chegar às nossas residências. Oriente sua reflexão pelas seguintes questões: • Como a eletricidade pode ser gerada? • Como a eletricidade pode ser transmitida? • Quais os fenômenos e as grandezas envolvidas? • Quais os dispositivos necessários para o correto aproveitamento da eletricidade? • Como deve ser uma instalação elétrica? 7 A Estrutura da Matéria Se pararmos por um breve instante e observarmos o mundo que nos rodeia, veremos que estamos diante de uma série de diferentes formas de matéria: temos o ar que respiramos, a água que bebemos, o chão em que pisamos e andamos. Todos esses exemplos são manifestações de diferentes formas de matéria: T hinkstock/G etty Im ages Fig. 1. As três principais formas de matéria: gasosa, líquida e sólida. Se verificarmos o nosso estado atual de evolução tecnológica, veremos que temos formas ainda mais abrangentes de matéria e que não se encontram nas formas básicas como os estados sólido, líquido e gasoso. (a) Globo de plasma, utilizado em decoração de ambientes; (b) Sistema industrial de corte de chapas metálicas utilizando o plasma; (c) Aglomeração de átomos em baixas temperaturas, formando o 5.º estado conhecido da matéria: o condensado de Bose-Einstein. Fig. 2. Plasma, o 4.º estado da matéria 8 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Contudo, o que todas essas formas de matéria possuem em comum? Todas elas são constituídas por partículas fundamentais, que são chamadas de ÁTOMOS (CALLISTER, 2008, p. 7-12). Então, o que é um átomo? A Fig 3 mostra a estrutura de um átomo: um núcleo constituído de subpartículas, prótons e nêutrons, sendo estes rodeados por um grupo de elétrons em órbita. Como já deve ser do seu conhecimento, provavelmente da época do ensino médio, os elétrons possuem carga elétrica negativa (-) e os prótons, carga elétrica positiva (+). Cada átomo, no que se considera estado normal, possui um número igual de prótons e elétrons, e como as suas cargas elétricas são iguais em módulo e opostas eletricamente, elas se anulam, o que torna o átomo eletricamente neutro, ou seja, com uma carga total NULA. Todavia, a carga elétrica do núcleo é positiva, uma vez que ele é composto de prótons com carga positiva e nêutrons (que não possuem carga elétrica). Fig. 3. Estrutura de um átomo, segundo o modelo de Niels Bohr. Essa estrutura se aplica a todos os elementos químicos conhecidos, embora a quantidade de elétrons, prótons e nêutrons de um elemento seja muito específica. Veja, o átomo de hidrogênio – que é o átomo mais simples da natureza – possui 1 próton e 1 elétron; o átomo de cobre, por sua vez, tem 29 elétrons, 29 prótons e 35 nêutrons. Já o silício – que é um material de extrema importância industrial pelo fato de ser utilizado em componentes eletrônicos – tem 14 elétrons, 14 prótons e 14 nêutrons. Ou seja, cada átomo é diferente do outro. No modelo da Fig. 3, verifica-se que alguns dos elétrons parecem ter a mesma trajetória (órbita), o que cria uma subestrutura de camadas, as quais se encontram representadas na Fig. 4. As órbitas mais próximas ao núcleo formam camadas designadas como K, L, M, N, etc. Cada camada admite apenas uma quantidade determinada de elétrons e nenhum deles pode estar presente no espaço entre elas. O número máximo admitido em cada camada é de 2n2, onde n é o número da camada; portanto, pode haver até 2 elétrons na camada K, até 8 na camada L, até 18 na camada M, e até 32 na camada N (ATKINS, 2012, p. 1-20). Fig. 4. Representação da estrutura de camadas eletrônicas num átomo. 9 O número de elétrons em qualquer camada depende do elemento. Por exemplo, o átomo de sódio: possui 11 elétrons – estando todas as 2 camadas internas completas; porém, a camada mais externa (N) tem somente 1 elétron (Fig. 5). Fig. 5. Representação da distribuição eletrônica de um átomo de sódio (Na). A camada mais externa é conhecida como camada de valência, e o elétron que nela se localiza é denominado como elétron de valência (ATKINS, 2012, p. 1-20). Nenhum elemento tem mais do que 8 elétrons de valência porque quando a camada atinge esse número, ela está completa. Esse é o fundamento da conhecida Regra do Octeto e ela se associa à estabilidade energética de um átomo. Como será visto em breve, o número de elétrons de valência de um elemento afeta diretamente suas propriedades elétricas (CALLISTER, 2008, p. 7-12). A Carga Elétrica Anteriormente, mencionou-se a palavra CARGA. Contudo, é necessário que se foque um pouco mais no seu significado. A carga elétrica é uma propriedade intrínseca da matéria que se manifesta na forma de forças – os elétrons REPELEM outros elétrons, mas ATRAEM prótons, enquanto os prótons se REPELEM e ATRAEM os elétrons (IRWIN, 2000, p.1-10). Ao longo de séculos de história e desenvolvimento científico e tecnológico, os cientistas estudaram essas forças e determinaram que a carga elétrica de um elétron é NEGATIVA e a de um próton é POSITIVA. No entanto, a palavra “carga” representa mais do que isso. Como exemplo, vamos considerar mais uma vez o átomo elementar da Fig. 3. Ele tem o mesmo número de elétrons e prótons, e como as cargas são iguais e opostas, elas se anulam, deixando o átomo sem carga elétrica. No entanto, se o átomo adquirir mais elétrons (ficando com mais elétrons do que prótons), dizemos que ele está negativamente carregado. Por outro lado, se ele perder elétrons e ficar com menos elétrons do que prótons, dizemos que o átomo está positivamente carregado. Ou seja, verificamos que a palavra “carga” representa um estado de DESEQUILÍBRIO entre o número de prótons e elétrons no átomo (CALLISTER, 2008, p. 7-12). 10 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Perceba que toda nossa discussão, até o momento, tem se localizado no domínio MICROSCÓPICO, uma vez que a matéria é constituída por átomos. Agora, vamos mudar um pouco decenário e voltar a nossa atenção para o domínio MACROSCÓPICO. Neste, as substâncias em estado normal geralmente estão sem carga elétrica, ou seja, elas têm o mesmo número de prótons e elétrons. Esse equilíbrio, entretanto, pode ser alterado de maneira relativamente fácil: os elétrons podem ser retirados ou acrescentados aos seus átomos de origem por meio de ações de ELETRIZAÇÃO (ALBUQUERQUE, 2008, p. 23). Estas, por sua vez, se desenvolvem cotidianamente, como no ato de andar em cima de um carpete. De modo geral, a eletrização envolve principalmente as ações de atrito, contato e indução (HALLIDAY, 1994, p.3-4). O ATRITO desenvolvido entre diferentes materiais ou substâncias é um fenômeno local, ou seja, o material só fica eletrizado no ponto de contato. Esse fenômeno é conhecido desde a antiguidade, sendo um assunto relatado por várias civilizações. O processo de CONTATO está baseado, fundamentalmente, na capacidade de uma substância poder conduzir elétrons, ou seja, a sua condutividade elétrica. No caso, se colocarmos dois materiais condutores com diferentes quantidades de elétrons (isso é possível no caso de um deles já estar eletrizado) em contato físico, haverá uma tendência a equilibrar essa quantidade após o contato. Já a ação de INDUÇÃO, diferentemente dos dois primeiros processos, não depende do contato físico entre as substâncias. Para tanto, basta que se aproxime uma substância eletrizada da outra, de modo que a primeira influencie a segunda provocando, inicialmente, uma separação de cargas no que se constitui por POLARIZAÇÃO. Aqui, cargas elétricas positivas se separam das negativas. Para concluir o processo, faz-se uma ligação elétrica do segundo corpo com a terra, de modo a provocar o escoamento de elétrons livres, após o qual essa ligação é cortada, deixando o segundo corpo eletrizado positivamente. Todos esses fenômenos se relacionam com as propriedades e o comportamento das cargas elétricas em repouso. Também consideramos uma relação do equilíbrio de cargas elétricas nos corpos, que de alguma forma, tornam-se carregados de cargas elétricas, ou seja, eletrizados. A área que agrega todo este conhecimento é conhecida por ELETROSTÁTICA (HALLIDAY, 1994, p.2). Diálogo com o Autor O termo carga foi utilizado, pela primeira vez, pelo político e escritor norte- americano Benjamim Franklin (1706-1790) por volta de 1750, como resultado de seus experimentos envolvendo a eletrização de diferentes materiais por meio do atrito. Como verificamos, a “carga” pode se referir à carga de um único elétron ou à carga associada a um grupo de elétrons. Em ambos os casos, identifica-se a carga pela letra Q, e a unidade no sistema internacional (SI) é o Coulomb. No geral, a carga Q associada a um grupo de elétrons é igual ao produto do número de elétrons (n) multiplicado pela carga de cada elétron: Q=n .e (Eq. 1) A carga de um elétron é a menor quantidade de carga elétrica existente e é chamada de carga elétrica elementar, possuindo valor de e = 1,6x10-19 C. Como a carga se manifesta na forma de força, também é definida em termos dessa força (HALLIDAY, 1994, p.4). Esse é o fundamento da Lei de Coulomb. 11 Lei de Coulomb As influências mútuas existentes entre as cargas elétricas foram o foco dos trabalhos do físico francês Charles Augustin Coulomb (1736-1806). Através de suas experiências, Coulomb verificou que a força existente dentre duas cargas elétricas quaisquer, Q1 e Q2, era diretamente proporcional ao produto de suas cargas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre elas. A forma matemática dessas conclusões resulta no que ficou conhecido por Lei de Coulomb, a qual é expressa da seguinte maneira: 1 2 2 Q . Q . r =EF k (Eq. 1) Onde Q1 e Q2 representam cargas elétricas cujos centros estão afastados um do outro por uma distância r. A expressão se completa pela presença da Constante de COULOM, cujo valor é: k = 8,987x109 N.m2/C2, está associado com a capacidade de formação das cargas num determinado ambiente (ALBUQUERQUE, 2008, p.25). Uma consequência imediata da Lei de Coulomb é a previsão da força desenvolvida tanto entre cargas iguais (de mesmo sinal) como entre cargas opostas (de sinais diferentes), ou seja, nos processos de REPULSÃO e de ATRAÇÃO, respectivamente, como se mostra na figura a seguir: Fig. 6. Interações entre cargas elétricas diferentes – ATRAÇÃO – e iguais - REPULSÃO - e as forças resultantes segundo a Lei de Coulomb. Outra consequência desse raciocínio é o efeito da distância existente entre as cargas elétricas sobre a força resultante. No caso, a Lei de Coulomb aponta para a diminuição da força de modo inversamente proporcional ao quadrado da distância. Logo, por consequência, quanto maior for essa distância, menor será a força (seja de atração ou de repulsão) entre as cargas elétricas que estivermos analisando (HALLIDAY, 1994, p.4-5). Essa expressão, como já foi dito, aplica-se a duas cargas elétricas quaisquer, podendo ser aplicada a um conjunto de cargas presentes num material condutor, assim como a um único elétron dentro de um átomo. Essa consideração tem uma implicação de extrema importância, pois devido a esse efeito, a atração desenvolvida entre os elétrons das camadas mais externas e o núcleo de um átomo é muito mais FRACA do que com os elétrons das camadas mais internas. Ou seja, os elétrons de valência são muito menos atraídos pelo núcleo do que os elétrons mais próximos a ele e, caso venham a adquirir energia suficiente, podem escapar dos átomos de origem! 12 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Tal efeito depende intrinsecamente da quantidade de elétrons presentes na camada de valência; ou seja, se tivermos poucos elétrons, será necessária, proporcionalmente, pouca quantidade de energia para deslocá-los. É o que acontece, por exemplo, com a grande maioria dos materiais metálicos, onde os elétrons de valência adquirem espontaneamente energia para se deslocarem dos seus átomos originais em direção a outros por todo o material (CALLISTER, 2008, p. 7-11). Fig. 7. Movimento aleatório dos elétrons livres num material condutor. Veja que os elétrons de valência não escapam do material, eles simplesmente ficam se movimentando livremente da camada de valência de um átomo para a camada de valência de outro aleatoriamente. Portanto, o material continua eletricamente neutro. Os elétrons de valência que apresentam essa capacidade para se movimentarem livremente pela estrutura do material são os chamados ELÉTRONS LIVRES e são os responsáveis diretos pela condutividade elétrica característica de metais como cobre, ouro, alumínio, etc. A energia necessária para gerar todo esse processo pode ser proveniente da própria temperatura ambiente. De acordo com os cientistas, um átomo possui, em média, um tamanho da ordem de 2 a 5 angströms, onde 1 angström (1Å) equivale a 1x10-10 m. Imaginemos, então, um pequeno pedaço de 1 cm de comprimento de fio de cobre. Nele, haverá toda uma população de átomos de cobre com essa dimensão média, algo em torno de 1025 átomos por centímetro cúbico. A quantidade de elétrons de valência e, portanto, aptos a serem LIVRES é proporcional, já que cada átomo de cobre possui um elétron na camada de valência. Materiais que, como o cobre, apresentam esse grande número de elétrons livres são conhecidos como CONDUTORES ELÉTRICOS. De maneira contrária, se um átomo possuir 8 elétrons ou próximo disso na camada de valência, será necessário consumir muito mais energia para provocar o deslocamento dos elétrons. Além disso, pela Regra do Octeto, átomos nessa condição estão mais estáveis, o que, no geral, vem a afetar a disponibilidade de elétrons livres para o processo de condução elétrica. Portanto, observa-se que nos materiais que apresentam essas características, a condução elétricaé mais difícil. É o caso dos ISOLANTES ELÉTRICOS. Finalmente, verifica-se também que existem materiais com comportamento intermediário aos que apresentamos anteriormente. São substâncias que têm suas camadas de valência parcialmente completas, não sendo nem bons condutores nem bons isolantes. Logo, são SEMICONDUTORES. Esses materiais possuem características muito específicas, quando devidamente trabalhados, de modo que apresentam um controle muito elevado dos seus comportamentos elétricos, o que justifica o seu amplo uso em componentes e dispositivos que permitiram a criação e o desenvolvimento da ELETRÔNICA. Observa-se, portanto, que o comportamento elétrico dos materiais é TOTALMENTE dependente da estrutura da matéria. 13 Potencial Elétrico Anteriormente, verificamos que a partir de um desequilíbrio na quantidade de elétrons podemos originar átomos com excesso ou deficiência de elétrons. Estando esses átomos presentes na estrutura dos nossos materiais, acabamos por ter substâncias eletrizadas ou eletricamente carregadas. Imagine exatamente um dos processos de eletrização, onde cargas elétricas são removidas de um corpo e transferidas para outro. O resultado é justamente a escassez desse tipo de carga no primeiro corpo e um acúmulo dessas cargas no segundo corpo. Entre eles, portanto, surge uma diferença de potencial (ALBUQUERQUE, 2008, p.24). De imediato, podemos associar o conceito de potencial com a quantidade de cargas que ficam acumuladas num local ou, como no nosso caso, que foram deslocadas. O potencial então desenvolvido se deve, exclusivamente, à separação das cargas positivas e negativas. Entretanto, além da quantidade de carga que um corpo possui, o potencial elétrico também depende das dimensões do corpo em questão e do meio em que se encontra, podendo ser uma quantidade positiva ou negativa. Conceitualmente, pela Física, a ideia de um potencial se associa com a capacidade de realização de trabalho a partir do armazenamento de alguma forma de energia ou de algum elemento que a possua com a sua posterior conversão ou utilização. Por exemplo, um saco de laranjas suspenso por uma corda a 1 m do chão tem o potencial de realizar trabalho quando é lançado. A quantidade de trabalho necessária para criar essa energia potencial é definida pelo produto da força multiplicado pela distância no qual o saco foi levantado: τ=F . d (Eq. 3) Como, pela primeira Lei de Newton, temos que uma força é dependente de uma massa que sofre uma aceleração, podemos considerar que a força atuante sobre o saco de laranjas resulta da ação da aceleração da gravidade (g) sobre a massa de laranjas nesse saco, o que é por definição, o próprio peso: F=m.a (Eq. 4) Ou, na forma da força peso: P=m.g (Eq. 5) Fazendo, agora, a substituição do valor da força pelo produto descrito na Eq. 5, encontramos o valor total da energia potencial armazenada nesse saco de laranjas suspenso: τ=m.g.d (Eq. 6) De uma maneira muito semelhante, quando precisamos separar cargas positivas e negativas também é necessário realizar alguma quantidade de trabalho, só que, nesse caso, de natureza elétrica. Essa situação nos remete a um dos fenômenos naturais que, com sua beleza e perigos singulares, fascinam a humanidade desde sempre. Veja a seguinte imagem: 14 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Fir0002/G etty Im ages Fig. 8. Relâmpago atingindo um campo durante uma tempestade. Durante as tempestades em que, além da ventania e das fortes chuvas, há também o desenvolvimento de trovoadas, os elétrons das nuvens de tempestade são deslocados dos seus átomos de origem por mecanismos turbulentos e atraídos para a extremidade inferior da nuvem, deixando a extremidade superior deficiente de elétrons (cargas positivas) e a parte de baixo com excesso de elétrons (cargas negativas), na maioria dos casos. A força de repulsão que acaba se desenvolvendo força os elétrons para baixo das nuvens, deixando o solo carregado positivamente. Fig. 9. Representação esquemática do desenvolvimento de cargas elétricas e da diferença de potencial elétrico entre as nuvens e o solo. A carga positiva desenvolvida na parte superior da nuvem acaba por exercer uma força sobre os elétrons numa tentativa de trazê-los de volta, na medida em que são deslocados. Como há uma força sobre as cargas separadas, para que elas retornem ao topo da nuvem, elas têm o potencial de realizar trabalho quando forem deslocadas, ou seja, as cargas têm energia potencial. A diferença na quantidade de cargas elétricas ou potencial elétrico entre a base da nuvem e o solo é tão grande, que o ar, que em condições normais é isolante elétrico, passa a conduzir um fluxo de cargas na forma de uma descarga elétrica, conhecida como relâmpago, na tentativa de equilibrar os potenciais das duas regiões. Segundo dados científicos, o potencial elétrico médio de um relâmpago está em torno de 2,5x107 unidades! 15 Foi Benjamim Franklin quem primeiro teorizou e comprovou a natureza elétrica dos relâmpagos no seu célebre experimento com uma pipa. W ikim edia C om m ons Fig. 10. Representação artística do célebre experimento realizado por Benjamin Franklin para comprovar que as descargas atmosféricas tinham, na verdade, natureza elétrica. A condução das cargas elétricas que compõem o relâmpago não foi feita diretamente pela linha de algodão utilizada para sustentar a pipa, mas sim através da chave pendurada nela. Por ser metálica e eletricamente condutora, a chave consegue atrair ou direcionar as cargas elétricas durante o desenvolvimento da diferença de potencial entre as nuvens e o solo. Esse conhecimento serviu de base para o seu principal invento: o para-raios! A diferença de potencial elétrico criada entre dois pontos quaisquer é denominada tensão elétrica. Nesse caso, a quantidade de energia necessária para separar as cargas depende da tensão gerada e da quantidade de carga deslocada. Assim, define-se que 1 volt (1 V) de tensão é criado quando se consome 1 joule (1 J) de energia para deslocar 1 coulomb (1 C) de carga elétrica de um ponto ao outro (HALLIDAY, 1994, p.55). Matematicamente, temos: =WV Q (Eq. 7) Onde W é a simbologia utilizada para o valor de energia, em joules, Q representa a quantidade de carga elétrica, em coulombs, e V é a tensão desenvolvida nessas condições, em volts (em homenagem ao físico italiano Alessandro Volta). Agora, apenas a título de comparação, aquele valor de 2,5x107 unidades referente ao potencial elétrico médio de um relâmpago talvez faça sentido. O valor do potencial é de 2,5x107 V, enquanto que numa tomada elétrica residencial podemos encontrar 110 ou 220 V. É muita diferença!! Corrente Elétrica Verificamos que nos materiais condutores há uma grande quantidade de elétrons livres. Entretanto, sob condições normais, esses elétrons se movimentam aleatoriamente. 16 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Agora, se de alguma forma, o movimento eletrônico for orientado, teremos o estabelecimento de um fluxo de cargas elétricas (ALBUQUERQUE, 2008, p.35-36). A orientação do movimento dos elétrons pode ser feita através da utilização de uma bateria que, na prática, nada mais é do que um dispositivo que provoca uma diferença de potencial elétrico ou atua como uma fonte de tensão. Fig. 11. Representação esquemática do efeito de uma fonte de tensão sobre o movimento dos elétrons num condutor. A presença da bateria cria um desequilíbrio no circuito assim criado, onde os elétrons são repelidos pelo polo negativo e atraídos pelo polo positivo, criando um movimento ordenado pelo circuito, o qual passa pelo fio e bateria respectivamente. Observe que com a adição da bateria criou-se um caminho fechado, por onde as cargas elétricas (os elétrons) circulam. Esse caminho fechado é o quechamamos de CIRCUITO ELÉTRICO. Já o movimento ordenado de elétrons é definido como CORRENTE ELÉTRICA (HALLIDAY, 1994, p.96). Considerando que carga é medida em coulombs, o fluxo de cargas é medido em coulombs por segundo. No sistema internacional, a unidade coulomb por segundo é denominada de ampère (A). Matematicamente, temos: = QI t (Eq. 8) Sendo Q a quantidade de cargas que passa pela seção transversal de um fio condutor e t é o intervalo de tempo (em segundos) no qual as cargas são medidas. Influenciados pelos resultados da eletrização dos corpos, os cientistas, além de identificarem que havia cargas elétricas positivas e negativas, também concluíram que a corrente elétrica era devida ao fluxo de cargas elétricas positivas. Usando o mesmo exemplo da Fig. 11, temos uma orientação dessas cargas saindo do polo positivo da bateria, para o polo negativo. Tudo o que conhecemos em termos de descrição de fenômenos, leis, formalismo matemático e símbolos na teoria dos circuitos elétricos estão baseados nesse conceito (ALBUQUERQUE, 2008, p.35). É o que chamamos de sentido convencional da corrente. 17 Entretanto, com o avanço da ciência e da tecnologia, descobriu-se o átomo e as suas partículas constituintes, além do fato de que a corrente elétrica, na realidade, é consequência da movimentação de cargas elétricas negativas, os elétrons. Essas descobertas não aboliram o conhecimento prévio, uma vez que a questão é apenas o sentido de circulação das cargas elétricas. Portanto, o sentido real de circulação da corrente é chamado de direção do fluxo de elétrons ou simplesmente sentido real. Sendo assim, no nosso exemplo de circuito, as cargas elétricas saem do polo negativo e são atraídas pelo polo positivo. Cabe enfatizar que agora temos uma situação consideravelmente diferente de quando tínhamos cargas elétricas em repouso. Agora, temos cargas elétricas em movimento. Tem-se, por definição, o estabelecimento da ELETRODINÂMICA (HALLIDAY, 1994, p.96-97). Nossas atenções, por consequência, voltam-se agora para a facilidade ou dificuldade que as cargas elétricas encontram ao se movimentarem nos materiais. De modo geral, os materiais condutores permitem o fluxo de cargas elétricas, ou seja, a circulação de corrente elétrica. Contudo, a intensidade de corrente não é igual para todos os condutores. Devemos ao físico alemão George Simon Ohm (1787-1854) a compreensão da dependência da circulação das cargas elétricas com o tipo de material. Pelo que já falamos, o estabelecimento de uma corrente elétrica num circuito ocorre quando estabelecemos uma diferença de potencial elétrico entre dois pontos de um condutor. Trabalhando com a bateria desenvolvida por Alessandro Volta e com fios de materiais, comprimentos e espessuras diferentes, Ohm desvendou que a corrente total que circula por um condutor depende tanto da tensão que se estabelece entre seus terminais como da dificuldade de circulação da corrente. Ohm definiu como RESISTÊNCIA ELÉTRICA (HALLIDAY, 1994, p.100- 101) a dificuldade encontrada pelos elétrons para circularem num material da seguinte maneira: = VR I (Eq. 9) Onde V é a tensão, em volts (V), a que o condutor está submetido e I é a quantidade de corrente, em ampères (A) que circula por esse condutor. Essa é a forma da conhecida 1.ª Lei de Ohm e que normalmente é representada assim: V=R.I (Eq. 10) O significado da resistência está associado a uma oposição que os elétrons sofrem ao longo do seu percurso pelo condutor. Ohm verificou que, para uma resistência fixa, ao duplicar a tensão, a corrente também duplicava; ao triplicar a tensão, também triplicava a corrente, e assim por diante. A unidade de resistência é o ohm (Ω), em homenagem ao físico alemão de mesmo nome. No caso de fixar a tensão, Ohm observou que a resistência era diretamente proporcional ao comprimento (l) do fio e inversamente proporcional à área (A) da sua seção transversal: R = ρ 1 A (Eq. 11) Soma-se a este o efeito da resistividade elétrica (ρ). Essa é uma propriedade característica de cada material e é medida em ohm-metro (Ω-m) no sistema internacional. A seguir, apresentamos uma tabela com os dados de resistividade elétrica de alguns materiais: 18 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Tabela 1. Resistividade elétrica de alguns materiais condutores, semicondutores e isolantes. MATERIAL ρ - 20 ºC (Ω-m) Ouro 2,443x10-8 Cobre 1,723x10-8 Ferro 12,30x10-8 Germânio 20 – 2300* Silício ~500* Madeira 108 - 1014 Vidro 1010 – 1014 Teflon 1x1016 Esses materiais têm sua resistividade fortemente dependente da quantidade de impurezas que apresentam. Assim, Ohm conseguiu definir a resistência de um fio e demonstrar que a corrente era inversamente proporcional à resistência. Posteriormente aos trabalhos de Ohm, verificou-se que a resistividade total de um material, por sua vez, é influenciada pela temperatura (ρT), pelas características estruturais do material (ρR) e pelo estado de deformação desse material (ρD). A somatória de todas essas contribuições é prevista pela chamada Regra de Mathiessen: ρ=ρT+ ρR+ ρD (Eq. 12) Pelo que foi exposto anteriormente e mostrado na Tabela 1, a resistência de um condutor não se apresenta constante em todas as temperaturas. Na medida em que a temperatura aumenta, mais elétrons escapam das suas órbitas, o que ocasiona mais colisões dentro do condutor. Na maioria dos materiais condutores, o aumento desse número de colisões se apresenta como um aumento relativo da resistência, como se mostra a seguir. Fig. 12. Representação do efeito da temperatura sobre a resistência de um material. 19 A taxa em que a resistência de um material varia de acordo com a variação da temperatura depende do coeficiente de temperatura do material, o qual é identificado pela letra grega alfa (α). Alguns materiais exibem muito pouca diferença na resistência, enquanto outros demonstram mudanças muito fortes na resistência de acordo com a variação da temperatura. Assim, dizemos que um material possui um coeficiente de temperatura positivo (PTC – Positive Temperature Coeficient) quando a sua resistência aumentar de acordo com a elevação da temperatura. Na Tabela 2 são apresentados os coeficientes de temperatura a por grau Celsius, de vários materiais nas temperaturas de 20 e 0 ºC. Tabela 2. Interseções da temperatura e coeficientes para vários materiais. MATERIAL T(ºC) α (ºC)-1 a 20 ºC α (ºC)-1 a 0 ºC Prata -243 0,0038 0,00412 Cobre -234,5 0,00393 0,00427 Alumínio -236 0,00391 0,00424 Ferro -162 0,0055 0,00618 Tungstênio -202 0,00450 0,00495 Nicromo -2270 0,00044 0,00044 Bronze -480 0,00200 0,00208 Tomando como exemplo o metal cobre e cujo valor da resistência elétrica varia de acordo com o comportamento apresentado na Fig. 12, notamos que, na medida em que a temperatura diminui em direção ao zero absoluto (T = -273,15 ºC), a resistência aproxima-se do zero. O ponto em que a porção linear da linha é extrapolada para cruzar o eixo da temperatura é chamado interseção da temperatura ou temperatura absoluta inferida do material. Ao verificarmos a parte da linha reta do gráfico, vemos que existem dois triângulos semelhantes, um com o vértice no ponto 1 e o outro com o vértice no ponto 2. Assim, podemos aplicar a seguinte relação aos triângulos: 2 1 2 1 = - - R R T T T T (Eq. 13) Alternativamente, pode-se determinar a resistência R2 de um condutor a uma determinada temperatura T2 utilizando o coeficiente de temperatura do material, α. Como os dados da Tabela 2 confirmam que o coeficiente não é constante para todas as temperaturas, podemos obtê-lo do seguinte modo: α = m R1 (Eq. 14) Onde a variável m representa a inclinação da região linear do gráfico e proporcional a ∆R /∆T. A unidade de α é (ºC)-1 e a resistência R1, em ohms (Ω), está associada à temperatura T1 (ºC). De posse desse coeficiente podemos construir a seguinte expressão, que é a mais comumente encontrada na literatura (ALBUQUERQUE, 2008, p.46): R2=R1 [1+ α1 (T2 - T1)] (Eq. 15) 20 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Material Complementar Para complementar os conhecimentos adquiridos nesta unidade, leia as seguintes obras: Explore Explore • Ciência e Engenharia de materiais: uma introdução, de William D. Callister Jr.; • Princípios de química: questionando a vida moderna e o meio ambiente, de Peter W. Atkins. Ambas enriquecerão sua compreensão sobre os aspectos da estrutura da matéria e seus efeitos sobre as propriedades elétricas dos materiais. Bom estudo! 21 Referências ALBUQUERQUE, R. O. Elementos de Eletrostática. In: Análise de circuitos em corrente contínua, 21.ª ed. São Paulo, Brasil: Editora Érica Ltda., 2008. 192p. ATKINS, P. W.; JONES, L. Átomos: o mundo quântico. In: Princípios de química: questionando a vida moderna e o meio ambiente. 5.ª ed. Porto Alegre, Brasil: Bookman do Brasil, 2012. 1048p. CALLISTER Jr., W. D. Estrutura atômica e ligação interatômica. In: Ciência e Engenharia de materiais: uma introdução. 5.ª ed. Rio de Janeiro, Brasil: LTC Editora Ltda., 2008. 705p. HALLIDAY, D; RESNICK, R.; MERRIL, J. In: Fundamentos de Física. V.3, 3.ª ed. Rio de Janeiro, Brasil: LTC Editora Ltda., 1994. 335p. 22 Unidade: Fundamentos da Eletricidade Anotações www.cruzeirodosulvirtual.com.br Campus Liberdade Rua Galvão Bueno, 868 CEP 01506-000 São Paulo - SP - Brasil Tel: (55 11) 3385-3000
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