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A Pedagogia Dialógica de Paulo Freire : um poderoso 
antídoto contra a violência da escola e na escola. 
 
 Reuber Gerbassi Scofano 
RESUMO 
O presente artigo tem por objetivo principal apontar elementos que expressem a 
atualidade das idéias de Paulo Freire especialmente de sua concepção dialógica. 
A partir de suas obras Educação com prática de liberdade, Pedagogia do 
oprimido, Pedagogia da Esperança e Pedagogia da autonomia procurei demonstrar 
como sua concepção educacional é democrática e forma cidadãos capazes de fazer 
uma leitura crítica do mundo e da vida. 
Em um mundo de relações cada vez mais frias e contingentes, sua concepção 
de educação é um verdadeiro antídoto contra a violência da escola e suas práticas de 
transmissão impositiva de conteúdos bem como da violência reativa dos alunos 
agredindo colegas e professores exatamente porque não são ouvidos nem respeitados 
em seus interesses. 
 
 
 
 
 
 
 
Paulo Freire dispensa apresentações pois é o maior educador brasileiro com 
amplo reconhecimento internacional. Muito já se escreveu sobre ele e fica até difícil não 
repetirmos coisas que já tenham sido afirmadas sobre este pensador. 
O objetivo do presente trabalho é apresentar alguns aspectos entre tantos outros 
que poderiam ter sido apontados, que demonstram a extrema atualidade de suas 
reflexões e práticas educacionais especialmente no que se refere ao aprendizado do 
convívio respeitoso com o outro seja ele quem for. 
Toda a obra desse grande educador é um combate sem tréguas às praticas 
autoritárias tradicionais na educação que além de oprimir os alunos incutiam neles o 
espírito do opressor 
Filósofo de primeira grandeza pois além de ter como alicerce de seu pensamento 
clássicos do quilate de Karl Marx, Hegel, Karl Jaspers, Jean Paul Sartre e tantos outros 
soube criar uma série de conceitos de sua própria lavra, resignificando conceitos 
aprendidos com esses pensadores. Criou um pensamento filosófico próprio 
redescrevendo o ato educativo seja no que se refere ao papel da escola, do professor , 
do aluno ou da comunidade onde a educação se processa. 
O enfoque principal será o da nova relação que se estabelece entre educador 
educando proposta por Freire e que a meu ver é atualíssima pois em muitos aspectos 
não é sequer conhecida por muitos educadores. 
Utilizarei como base desta reflexão obras como Educação como prática da 
liberdade, Pedagogia do oprimido, Pedagogia da esperança e Pedagogia da 
Autonomia. 
Estas obras serão a espinha dorsal do trabalho com o qual pretendo mostrar a 
importância do diálogo no pensamento educacional de Freire que chegou inclusive a 
criar um neologismo que reflete tal preocupação : a Dodiscência. 
Este termo é fundamental para compreendermos a redescrição que ele faz de 
todo o processo educacional. 
 
Na obra Educação como prática da liberdade encontramos o DNA de todo 
pensamento educacional elaborado posteriormente por Paulo Freire. O interessante é 
que ao relermos essa obra podemos notar que ela ainda é de extrema atualidade e 
relevância para o nosso tempo. 
A valorização da cultura local e da bagagem que o aluno possui é um dos 
alicerces do pensamento de Freire e é algo que não pode ser desprezado por 
educadores de qualquer seguimento. 
Não estamos falando aqui somente de alfabetização ou do ensino de língua 
portuguesa mas de todas as áreas. São incontáveis as experiências educacionais 
baseadas em Paulo Freire seja no ensino de Matemática, Geografia, Historia, Língua 
Estrangeira, Filosofia, Física, Química, Sociologia, Programa da Saúde, Psicologia, 
Teatro, Artes Plásticas etc. 
Observemos a atualidade: “sempre confiáramos no povo. Sempre rejeitáramos 
fórmulas doadas. Sempre acreditáramos que tínhamos algo a permutar com ele nunca 
exclusivamente a oferecer-lhe” (Freire, 1977,pág.102). 
Essa idéia de permuta é uma contribuição genial de Paulo Freire. Ele redescreve 
o ato educativo como troca de experiências entre professores e alunos. Propõe que o 
educador se transforme também em educando de seu educando. 
Ambos aprendem e ambos ensinam. É claro que o professor assume a liderança 
no processo, porém sem autoritarismo. Trata-se de autoridade conquistada na partilha 
de idéias e não de autoritarismo. 
Ouvi, nesses anos de magistério superior, por parte de opositores da proposta 
de Freire, frases como: “O que eu como professor formado e pós-graduado tenho a 
aprender com os alunos” ; “Paulo Freire foi um tanto quanto demagógico ao propor 
isso.” 
Frases como essas expressam o grau de despreparo de muitos de nossos 
professores, inclusive de nível superior, pois demonstram uma visão centralizadora do 
processo educacional. Não é por acaso que muitos fracassam em suas disciplinas, 
obtendo um alto índice de rejeição entre os alunos tanto no que se refere ao conteúdo, 
quanto à forma trabalhados. É por isso que utilizam do terrorismo com as provas e 
testes para poderem manter a paz em suas salas de aula. 
Perdem assim esses professores, a oportunidade de tornar suas disciplinas mais 
interessantes e vivas no contato com a turma. 
Saber o que os alunos trazem, quais os seus costumes, qual a sua visão de 
mundo bem como o que pensam da disciplina em questão. O que sabem sobre ela, que 
pontos já conhecem e como podem relacionar o conhecimento a ser aprendido com o 
seu cotidiano. 
Paulo Freire nessa mesma obra já manifestava que tudo era um processo em 
construção: 
 
“Experimentáramos métodos, técnicas, processos de comunicação. 
Superamos procedimentos. Nunca, porém, abandonamos a convicção que 
sempre tivemos, de que só nas bases populares,e com elas, poderíamos 
realizar algo de sério e autêntico para com elas. Daí jamais admitirmos que a 
democratização da cultura fosse a sua vulgarização ou por outro lado, a 
doação ao povo, do que formulássemos nós mesmos em nossa biblioteca e 
que a ele entregássemos como prescrições a serem sugeridas. (Freire, 1977, 
p.102). 
 
Na mesma linha de redescrição da educação colocando-a sobre um novo olhar, 
Paulo Freire chega a criar novos termos para ressignificar as concepções tradicionais 
de escola, de professor e de aluno. 
Ao invés de escola, o que lhe parecia um conceito ultrapassado, bem como 
bastante carregado de passividade, propôs o Circulo de Cultura. Ao invés de professor, 
uma palavra também carregada de tradição doadora, propôs Coordenador de debates. 
A aula diálogo substituiu a aula discursiva ou expositiva. A palavra aluno também 
foi substituída pelo termo participante de grupo. Os programas, unidades e pontos 
alienados foram substituídos por programação compacta reduzida em unidades de 
aprendizado. 
Vários educadores, seguiram essa trilha aberta por Paulo Freire. Na atualidade 
temos o melhor exemplo na Escola da Ponte de Portugal, escola esta que reformulou 
toda sua estrutura na gestão de um educador freireano chamado José Pacheco 
Rubem Alves em sua obra A escola com que eu sempre sonhei sem imaginar 
que pudesse existir nos fala do espanto que teve ao conhecer tal escola que lhe foi 
apresentada por uma das alunas: 
 
Eu nunca tinha tido experiência semelhante e nunca imaginei que fosse 
possível que um diretor entregasse a uma aluna, menina de 9 anos, a tarefa 
de mostrar e explicar a sua escola a um educador estrangeiro 
.A menina não se fez de rogada. Encaminhou-se resolutamente na direção 
da porta da escola e eu, obediente, a segui. Chegando a porta ela parou, 
voltou-se para mim e disse em voz resoluta e confiante: 
“Para entender nossa escola o senhor, terá de esquecer tudo o que sabe 
sobre escolas. Não temos turmas, não temos alunos separados por classes,nossos professores não dão aulas com giz e lousa, não temos campainha 
separando o tempo, não temos provas e notas”.(Alves,2001, pág. 41) 
 
A Escola da Ponte mostra a atualidade das idéias de Paulo Freire, pois avança 
ainda mais nas propostas feitas pelo educador. A pedagogia libertadora tinha como 
uma de suas marcas fundamentais a não formalidade. Isso possibilitou a redescrição do 
ato educativo. A Escola da Ponte, inspirada nitidamente em Freire levou a redescrição 
ao espaço escolar formal implodindo-o. Apesar de ainda conservar o nome de escola 
nada mais do que acontece em seu interior tem a ver com qualquer coisa que tenha 
sido feita antes. 
Ainda na obra Educação como Pratica da Liberdade, Paulo Freire afirma que 
toda a programação de debates era sugerida pelos próprios participantes, algo que 
ainda é raro em nossas escolas. 
Para dar conta da situação da extrema centralização no processo educacional 
ele redescreveu este processo criando um novo conceito. Ele o nomeou de Educação 
Bancária. Uma concepção educacional que trata o aluno como paciente no processo. 
Ainda é bastante comum vermos em nossas escolas e até nas universidades tal prática. 
Sua crítica começou em relação aos processos de alfabetização de adultos 
 
Uma pratica que tratava o aluno como paciente no processo. Essa critica 
começou em relação aos processos de alfabetização de adultos que se caracterizavam 
pela infantilização dos alunos e por serem extremamente reprodutoras 
 
na verdade,somente com muita paciência é possível tolerar, após as durezas 
de um dia de trabalho ou de um dia sem”trabalho”, lições que falam de ASA 
–“Pedro viu a asa” - “A asa é da ave”. Llições que falam de Evas e de uvas a 
homens que as vezes conhecem poucas Evas e nunca comeram uvas. “Eva 
viu a uva”. Pensávamos numa alfabetização que fosse em si um ato de 
criação,capaz de desencadear outros atos criadores. Numa alfabetização em 
que o homem, porque não fosse seu paciente, seu objeto, desenvolvesse a 
impaciência, a vivacidade, característica dos estados de procura, de 
invenção e reivindicação. (IBDEM, pág. 104) 
 
A concepção educacional de Paulo Freire tanto no processo de alfabetização 
quanto em qualquer outro momento do ensino, parte da idéia de que o homem não 
apenas está no mundo, mas está com ele. Esta reflexão é atualíssima pois em um 
mundo que vive uma crise ambiental sem precedentes, inclusive com previsões 
catastróficas devido à postura arrogante.do homem, faz-nos refletir sobre uma revisão 
de práticas.. A natureza também foi oprimida. 
 O interessante no método Paulo Freire é que ao dar voz e vez às culturas locais 
e com elas também aprender, muitas soluções para a relação do homem com o meio 
ambiente foram absorvidas. A própria idéia de desenvolvimento sustentável em que o 
homem ao invés de ser um predador passa a ser um parceiro da natureza, teve muita 
influência das culturas tribais ou mesmo de caboclos das mais diversas regiões. Um 
exemplo que poderíamos citar é o do grande líder seringueiro Chico Mendes que 
demonstrou em sua simplicidade e sabedoria como o homem poderia extrair seu 
sustento da natureza sem destruí-la. 
O dialogo como marca registrada do pensamento freireano se expressa de forma 
inequívoca quando na obra A Pedagogia da Autonomia ele cria o neologismo 
DODISCÊNCIA. A experiência educacional se dá em sua plenitude na troca entre 
educador e educando,entre docente e discente, por isso ele redescreve a prática 
educativa com esse novo conceito que tenta dar conta do novo modo de fazer 
educação. 
 
A importância vital dada ao diálogo começa porém, na obra Educação como 
Prática de Liberdade que nos diz: 
 
”E que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma 
matriz critica e gera criticidade. Nutre-se do amor, da humildade, da esperança, 
da fé, da confiança. Por isso, só o diálogo comunica. E quando os dois pólos 
do diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé, um no outro, se 
fazem críticos na busca de algo.Instala-se,então uma relação de simpatia entre 
ambos. Só aí há comunicação”.(Ibdem,pág. 107) 
 
O diálogo no pensamento filosófico de Freire é indispensável. Sua fonte foi o 
grande filósofo existencialista alemão Karl Jaspers que propunha o diálogo não só nas 
questões vitais para ordenação política mas nos mais variados sentidos de ser. É 
preciso crer no outro e nas suas potencialidades. É desse pensador que nosso 
educador maior recebe a visão de que somente podemos chegar a ser nós mesmos 
quando os demais também chegam a ser eles mesmos.Trata-se do diálogo que se 
opõe ao anti diálogo que é algo tão entranhado em nossa formação histórico-cultural. O 
anti diálogo implica numa relação vertical de A sobre B é o oposto de tudo isso. Ele é 
desamoroso, não é humilde, é desesperançoso, arrogante e auto suficiente. No anti 
diálogo não existe a relação de simpatia entre os pólos, que caracterizam o diálogo. O 
anti-diálogo não comunica. Faz comunicados. 
 
Essa postura que rejeita o diálogo, segundo Paulo Freire, ainda se faz presente 
em boa parte de nossas salas de aula, inclusive no ensino superior que para usar uma 
expressão freireana ainda é extremamente Bancário. 
Não faltam em nossas instituições de ensino professores que não estão 
preparados para o diálogo. Existem ainda tal qual sinalizaram Jaspers e Freire, muitos 
professores arrogantes, auto-suficientes e desamorosos. 
Outra questão atualíssima e que Paulo Freire já havia desenvolvido em 
Educação como Pratica da Liberdade é a valorização da cultura popular frente à 
cultura erudita. O educador deveria desde os primeiros encontros mostrar que não se 
trata de trocar uma cultura pela outra e sim estabelecer um troca de experiências que 
aumenta o repertorio cultural de ambos, educandos e educadores. 
Assim: 
“tanto é cultura o boneco de barro feito pelos artistas,seus irmãos do povo, 
como cultura também é a obra de um grande escultor, de um grande pintor, de 
um grande místico, ou de um grande pensador. 
Que cultura é a poesia dos poetas letrados de seu País, como também a 
poesia de seu cancioneiro popular. Que cultura é toda criação humana”. 
 ( Freire,1977,pág. 109) 
 
Essa postura freireana trouxe o respeito mútuo para a relação e sem duvida 
valorizou a auto estima do educando que muitas vezes se via como inferior. 
Há um episódio narrado por Freire na obra Pedagogia da Esperança que 
mostra o quanto ele valorizava o que o aluno possui. 
Quando um aluno lhe disse que eles eram ignorantes Paulo retrucou : 
 
 “Muito bem”, disse em resposta à intervenção do camponês “Aceito que eu 
. sei e vocês não sabem. De qualquer forma, gostaria de lhes propor um jogo 
 Que, para funcionar bem, exige de nós absoluta lealdade. Vou dividir o 
quadro negro em dois pedaços, em que irei registrando, do meu lado e do 
lado de vocês, os gols que faremos eu, em vocês; vocês, em mim. O jogo 
consiste em cada um perguntar algo ao outro. Se o perguntado não sabe 
responder, é gol do perguntador. Começarei o jogo fazendo uma primeira 
pergunta a vocês.” 
A essa altura, precisamente porque assumira o “momento” do grupo, o clima 
era mais vivo do que quando começáramos, antes do silêncio. 
Primeira pergunta : 
- Que significa a maiêutica socrática? 
Gargalhada geral e eu registrei o meu primeiro gol. 
-Agora cabe a vocês fazer a pergunta a mim – disse. 
Houve uns cochichos e um deles lançou a questão : 
-Que é curva de nível? 
Não soube responder. Registrei um a um. 
-Qual a importância de Hegel no pensamento de Marx? 
Dois a um. 
-Para que serve a calagem do solo? 
Dois a dois. 
-Queé um verbo intransitivo? 
Três a dois. 
-Que relação há entre curva de nível e erosão? 
Três a três. 
-Que significa epistemologia? 
Quatro a três. 
-O que é adubação verde? 
Quatro a quatro. 
Assim, sucessivamente, até chegarmos a dez a dez. 
Ao me despedir deles lhe fiz uma sugestão : “Pensem no que houve esta 
tarde aqui. Vocês começaram discutindo muito bem comigo. Em certo 
momento ficaram silenciosos e disseram que só eu poderia falar porque 
só eu sabia e vocês não. Fizemos um jogo sobre saberes e empatamos 
dez a dez. Eu sabia dez coisas que vocês não sabiam e vocês sabiam dez 
 coisas que eu não sabia. Pensem sobre isto. ( Freire,1992, p. 48) 
 
 
Este relato demonstra como Freire valorizava a cultura que seu aluno possuía e 
propunha uma partilha de saberes, 
Outra contribuição freireana que permanece atualíssima e altamente importante 
para educadores que pretendem alfabetizar tanto adultos quanto crianças é a idéia de 
que alfabetizar não é um ato mecânico de execução de leitura e escrita exclusiva de 
letras. Ela é a tomada de posse da palavra,do texto e da idéia que se transmite enfim. 
É um ato de critica frente ao que se lê. 
A alfabetização a partir desse momento passou a ser muito mais do que um 
mero domínio psicológico e mecânico de técnicas de escrever e ler. É um domínio 
consciente. Entende-se o que é lido e escreve-se ou fala-se o que é lido. O que é 
construído na aprendizagem passa a fazer parte da leitura crítica também do mundo à 
nossa volta. 
 
“Implica, não uma memorização visual e mecânica de sentenças, de palavras, 
de silabas, desgarradas de um universo existencial - coisas mortas ou 
semimortas mas numa atitude de criação e de recriação. 
Implica numa autoformação de que possa resultar uma postura interferente do 
homem sobre seu contexto”.( Freire,1977,Pág. 111) 
 
O papel do educador nesse modelo de alfabetização é fundamentalmente 
dialogal com o alfabetizando. Situações concretas do seu cotidiano são instrumentos 
com os quais se alfabetiza. Paulo Freire rejeita uma alfabetização feita de cima para 
baixo. Não é uma doação oferecida pelo mestre pois, o que ocorre é uma alfabetização 
de dentro para fora, construída pelo alfabetizando com a ajuda do professor. 
Paulo Freire agendou com essa nova visão, tanto na alfabetização quanto em 
qualquer outro momento da educação seja das primeiras séries, ensino fundamental, 
médio ou superior uma nova postura em que o método utilizado é também instrumento 
do educando e não só do educador. 
A crítica de Paulo Freire às cartilhas vem dessa reflexão. Elas apresentavam a 
montagem da sinalização gráfica como uma doação e colocavam o alfabetizando mais 
como objeto do que sujeito da alfabetização. A construção das sentenças deve ser 
resultado de um processo criativo. 
 
o fundamental na alfabetização em uma língua silábica como a nossa é levar o 
homem a aprender criticamente o seu mecanismo de formação vocabular, para 
que faça ele mesmo, o jogo criador de combinações. Não seu sejamos contra 
os textos de leitura, que são outra coisa, indispensáveis ao desenvolvimento 
do canal visual gráfico, e que devem ser em grande parte elaborados pelos 
próprios “participantes”.Acrescentemos que a nossa experiência se 
fundamenta no aprendizado da informação através de canais múltiplos de 
comunicação. (Freire, 1977, nota de pé de página,p.111) 
 
A partir dessa contribuição de Freire, muitos educadores, inclusive não somente 
alfabetizadores passaram a relativizar o uso de livro didático pois além de muitas vezes 
contribuir para a veiculação de ideologias, não permitem que professores elaborem o 
material didático a partir de experiência conjunta construída com os educandos. 
As etapas de construção do método de alfabetização proposta por Paulo Freire 
que são investigação do universo cultural, elaboração do material didático e a 
conscientização não somente revolucionaram a alfabetização no Brasil mas também 
lançaram as bases para que professores das mais diversa áreas se inspirassem nelas. 
Professores de Matemática, Língua Portuguesa, Geografia, História, Biologia, 
Química, Física, Filosofia, Sociologia, Teatro, Língua Estrangeira, Artes e Educação 
Física entre tantas outras áreas, passaram a valorizar a cultura local dos alunos e a 
relacionarem com seus campos específicos de saber. Não é incomum um professor de 
Química antes de falar da molécula de H2O, conversar com seus alunos sobre qual a 
importância da água em suas vidas e como ela é distribuída entre os diversos bairros 
da cidade. Não escapam dessa reflexão conversas sobre o esgoto, o lixo, questões 
ambientais e toda sorte de informações que se fazem necessárias a uma formação 
cidadã. O Construtivismo, corrente educacional contemporânea, se apóia bastante 
nessa prática freireana. 
No clássico freireano Pedagogia do Oprimido o filósofo questiona o falar da 
realidade como algo fixo, estático, hierarquizado e compartimentado. Trata-se de uma 
concepção de mundo alheia à experiência de vida dos educandos. Sua filosofia é uma 
redescrição das relações do homem com a natureza e os outros homens apresentando 
uma nova proposta de relacionamento que se caracteriza por ser móvel, dialógica, anti 
hierárquica, aberta ao novo e criadora de infinitas possibilidades para a vida 
comunitária. Podemos sem dúvida aproximar nesse ponto , o pensamento de Paulo 
Freire com o de autores da filosofia que alguns anos depois desenvolveram a teoria da 
Complexidade tais como Edgar Morin e Prigogyne. 
Ao criar o conceito de Educação Bancária, que aparece pela primeira vez na 
obra Pedagogia do Oprimido, inventou um termo novo, uma metáfora genial e 
atualíssima para dar conta da práticas educativas transmissoras e conteudistas: 
“Nela, o educador aparece como seu indiscutível agente, como o seu real 
sujeito, cuja tarefa indeclinável é “encher” os educandos dos conteúdos de sua 
narração,conteúdos que são retalhos da realidade, desconectados da 
totalidade em que se engendram e em cuja visão ganhariam significação. A 
palavra, nestas dissertações, se esvazia da dimensão concreta que devia ter 
ou se transforma em palavra oca e alienada e alienante. Daí que seja mais 
som do que significação e assim, melhor será não dizê-la. 
Por isto mesmo é que uma das características desta educação dissertadora é 
a “sonoridade” de palavras e não sua força transformadora. Quatro vezes 
quatro dezesseis. Pará capital Belém, que o educando fixa, memoriza, repete, 
sem perceber o que realmente é quatro vezes quatro. O que significa capital na 
afirmação Pará capital Belém, Belém para o Pára e Pará para o 
Brasil”.(Freire,1981,pag.65) 
 
Trata-se de uma prática pedagógica que leva os alunos a uma memorização 
mecânica do conteúdo repassado. Freire utiliza a metáfora do aluno “vasilha” que vai 
ser enchido por depósitos que o professor faz. Quanto mais passivos, melhores os 
alunos para o modelo Bancário. A educaçâo ainda é em muitas situações uma 
experiência de depósito em que os educandos são os recipientes e o educador o 
depositante. 
O educador não se comunica, ele simplesmente faz comunicados que devem ser 
memorizados e assimilados pelos alunos. 
Uma educação que não ensina a buscar, a pesquisar por conta própria dificulta a 
transformação ou a criatividade, dois dos requisitos fundamentais reclamados pela 
sociedade pós industrial. 
Uma prova contundente da atualidade da crítica freireana ao modelo bancário 
pode ser retirada da Pedagogia do Oprimido e pode ser observada em diversas 
experiências educacionais no Brasil ainda hoje: 
 
Na concepção ‘bancária’ que estamos criticando, para a qual a educação é o 
ato de depositar, de transferir, de transmitirvalores e conhecimentos, não se 
verifica nem pode verificar-se esta superação. Pelo contrário, refletindo a 
sociedade opressora, sendo dimensão da “Cultura do silencio” a “educação 
bancária” mantém e estimula a contradição. 
Daí, então, que nela: 
a) O educador é o que educa; os educandos, os que são educados; 
 
 b)o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem 
 
 c) o educador é o que pensa;os educandos, os pensados; 
 
 d) o educador é o que diz a a palavra ; os educandos, os que 
escutam docilmente ; 
 
 e) o educador é o que disciplina ; os educandos, os disciplinados ; 
 
 f) o educador é o que opta e prescreve sua opção ; os educandos os 
que seguem a prescrição ; 
 
g) o educador é o que atua ; os educandos, os que têm a ilusão de 
que atuam, na atuação do educador ; 
 
h) o educador escolhe o conteúdo programático ; os educandos, 
jamais ouvidos nesta escolha, se acomodam a ele ; 
i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade 
funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos ; 
estes devem adaptar-se às determinações daquele ; 
 
j) o educador,finalmente, é o sujeito do processo ; os educandos, 
meros objetos. ( Freire, 1981, p. 67) 
 
 
Que atualidade! Se nos aproximamos com sinceridade do que se faz em muitas 
salas de aula no Brasil, veremos que a concepção bancária ainda impera. 
Em contraponto a essa concepção educacional Freire propôs o que ele 
denominou Educação Problematizadora.Trata-se de um concepção radicalmente 
oposta à Bancária. Ela não trabalha com comunicados tão pouco com depósitos de 
conhecimentos. Jamais trata o aluno como mero paciente mas como alguém ativo no 
processo de construção do conhecimento. Para que isso ocorra, no entanto, se faz 
necessária a superação da oposição entre educador-educando. 
 
Em verdade, não seria possível á educação problematizadora, que rompe com 
os esquemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como 
prática de liberdade, sem superar a contradição entre educador e educandos. 
Como não lhe seria possível faze-lo fora do diálogo. (Ibdem,pág. 78) 
 
A pergunta que podemos fazer, atestando a atualidade de Freire é: Qual a 
prática educativa que pode abrir mão de um diálogo aberto e franco nos dias de hoje? 
Somente através do diálogo é possível realizar o objetivo de Freire, não mais o 
educador do educando ; não mais o educando do educador, mas educador-educando 
com educando-educador. 
O educador não é mais apenas aquele que educa, porém alguém que ao educar 
é também educado pelos educandos. Ambos são sujeitos no processo educacional. 
Constroem-se-se juntos e não há argumento de autoridade; trata-se de parceria. A 
liderança do professor é conquistada no convívio, no processo. Essa autoridade mansa 
se constrói com liberdade e não contra ela: 
 
Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si 
mesmo:os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. 
Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que na prática “bancária” são 
possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos 
passivos. (Ibdem,pág. 79) 
 
O educador problematizador está sempre reelaborando seu conhecimento ao 
estabelecer contato com o conhecimento do aluno, ambos são investigadores. 
Enquanto a prática bancária inibe o poder criador do educando mantendo-o 
imerso no cotidiano, a prática problematizadora investe na emersão das consciências 
que resulta numa insersão crítica na realidade. A problematização, quanto mais 
exercida proporcionará desafios, possibilitando assim um esforço permanente através 
do qual, os homens vão tomando conhecimento da realidade e acabam por intervir 
criticamente. 
 
“A educação problematizadora, que não é fixismo reacionário, é futuridade 
revolucionária. Daí que seja profética e, como tal, esperançosa. Daí que 
corresponda à condição dos homens como seres históricos e à sua 
historicidade. Daí que se identifique com eles como seres mais além de si 
mesmos – como “projetos” – como seres que caminham para a frente, que 
olham para a frente; como seres a quem o imobilismo ameaça de morte; para 
quem o olhar para traz não deve ser uma forma nostálgica de querer voltar, 
mas um modo de melhor conhecer o que está sendo, para melhor construir o 
futuro. Daí que se identifique como o movimento permanente em que se 
acham inscritos os homens , como seres que se sabem inconclusos; 
movimento que é histórico e que tem o seu ponto de partida, o seu sujeito, o 
seu objetivo. (Ibdem,pág. 84) 
 
No seu texto Pedagogia da Autonomia, Paulo Freire faz uma espécie de 
apanhado dos principais temas que merecem sua reflexão educacional. 
Propõe os saberes necessários á prática educativa. Trata-se de uma obra 
atualíssima e felizmente bastante utilizada em cursos de formação para o magistério. A 
temática central é da formação docente e o que ela deve valorizar. 
Aparecem nessa obra certos aspectos que estão presentes em toda a sua obra 
anterior. A inconclusão do ser humano, a consciência crítica em contraponto à 
consciência ingênua, a idéia de que formar é algo muito mais amplo que somente 
treinar o educando para o exercício de tarefas . 
Nessa ultima obra de Freire podemos observar claramente a coerência de seu 
pensamento trinta anos após a publicação de Educação como Pratica Liberdade e 
Pedagogia do Oprimido. Em total conformidade com o Paulo Freire em seu início de 
trabalho ele propõe que não há docência sem discência. Ambas ensinam e aprendem 
e seus sujeitos, apesar das diferenças que os definem, não se reduzem à condição de 
objeto um do outro”. 
Alguns tópicos desse livro são bastante atuais. Vejamos alguns: 
Para Freire, ensinar é algo que exige pesquisa. Não há ensino sem pesquisa 
tampouco não há pesquisa sem ensino. Ao exercer o magistério, o professor é alguém 
que continua buscando e procurando continuamente. 
 
“Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso 
para constatar, constatando intervenho, intervindo educo e me educo. 
Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ao ao anunciar 
a novidade”. (pág. 32) 
 
O professor não é portador de um conhecimento estático e fechado, pelo 
contrário, hoje mais do que nunca ele deve mostrar a seus alunos que não há verdade 
absoluta em nenhum campo. 
Precisamos aprender a lidar com a pesquisa, com a curiosidade e levar os 
alunos a perceber que eles também podem pesquisar nos lugares mais simples. Não 
há necessidade de laboratórios, pode ser no quintal, na cozinha, no banheiro enfim em 
qualquer lugar que o educando possa exercer seu espírito de pesquisa. 
O respeito ao saber dos educandos permanece como um dos pilares da 
pedagogia freireana: 
 
Porque não aproveitar a experiência que têm os alunos de viver em áreas da 
cidade descuidadas pelo poder publico para discutir, por exemplo, a poluição 
dos riachos e dos córregos e os baixos níveis de bem-estar das populações, 
os lixões e os riscos que oferecem a saúde das gentes. .Por que não há 
lixões no coração dos bairros ricos e mesmo puramente remediados dos 
centros urbanos?. (Freire,2003, pag. 38) 
 
Trata-se uma prática pedagógica que trabalha os conteúdos vinculando-os à 
realidade concreta dos alunos. Isso pode ser feito em qualquer disciplina. 
A criticidade é outro tópico constante no pensamento de Freire e de atualidade 
impressionante. O papel do professor como provocador da consciência critica é algo 
fundamental em uma sociedade midiática como a nossa. Hoje, muito mais do que nos 
idos da década de sessenta, quando foram produzidas as obras que deram a base para 
a concepção educacional freireana, se faz necessária uma leitura crítica da “realidade” 
que se nosapresenta. O impacto das mídias sejam elas quais forem pode ser algo 
devastadoramente alienante ou pode ser um belo instrumento de inclusão e 
valorização da democracia. O papel do professor como investigador e de instigador da 
reflexão dos alunos a respeito de como nos chegam as informações e de que maneira 
podemos utilizá-las em favor da comunidade é fundamental. 
A criticidade porém não precisa ser algo ácido ou que engesse nossa visão de 
mundo tornando-nos donos da verdade. Daí a importância de que essa postura crítica 
frente ao mundo seja banhada de ética e estética. Pode ter leveza e ser contundente e 
acima de tudo, construtiva em prol do bem comum. 
 
A experiência educativa tem um caráter forte de formação para o convívio. Este 
convívio norteado pela ética de valorização da vida e da justiça não precisa ser algo 
ranzinza ou puritano. Pode ter leveza e respeito, além de beleza e alegria sem qualquer 
ranço patrulheiro de sentido moralista. Há ainda em nossas escolas uma visão de que o 
riso e a alegria não devem ocorrer nas instituições de ensino. Em diversas escolas, 
inspetores ou coordenadores ficam a espreita das salas de aula onde ocorrem 
gargalhadas. O professor é muitas vezes mal visto por trabalhar com alegria e contagiar 
seus alunos a tal espírito. Se fizéssemos como fez Paulo Freire, um exame de 
consciência, vamos ver que muitos momentos em que acontece realmente o 
aprendizado em nossas vidas, foi via humor. Por isso ele não abre mão da ética e da 
estética juntos na sala de aula, respeito à vida em todos os seus sentidos 
acompanhado da beleza, do prazer e da alegria. 
É por essa seara que, por exemplo,desenvolverá sua visão de ensino o 
educador e pensador Rubem Alves em obras marcantes como: A alegria de ensinar, 
Estórias de quem gosta de ensinar, Conversas sobre educação, Por uma 
educação romântica e A escola com que sempre sonhei sem imaginar que 
pudesse existir. 
Há uma contribuição importante que Paulo Freire agenda e que se dá no 
contexto da relação entre o professor e seus alunos. Ele acredita assim como Carl 
Rogers e sua pedagogia não diretiva, que uma das funções mais importantes do 
professor é de criar um clima favorável ao convívio, à amizade, ao respeito ao outro e 
sua convicção. Um clima em que todos se sintam à vontade para participar das 
experiências oferecidas. Nesse sentido o professor é uma referência, um signo 
importante para o aluno. Deve estar atento as suas atitudes afim de que sejam 
estimuladoras da cidadania e do espírito democrático. Deve corporificar suas palavras 
através de atos. 
A capacidade de aceitar o novo e reformular convicções é outra característica 
valorizada pelo filósofo. O professor freireano é aberto ao diálogo com a polissemia do 
mundo. 
disponibilidade ao risco, aceitação do novo que não pode ser negado ou 
acolhido só porque é novo, assim como o critério de recusa ao velho não é 
apenas cronológico. 
O velho que preserva sua validade ou que encarna uma tradição ou marca 
uma presença no tempo continua novo. 
(...) A rejeição mais decidida a qualquer forma de discriminação. A prática 
preconceituosa de raça, classe, de gênero ofende a substantividade do ser 
humano e nega radicalmente a democracia (...) 
(...) a tarefa coerente do educador que pensa certo e, exercendo como ser 
humano a irrecusável. prática de inteligir, desafiar o educando com que se 
comunica e a quem comunica, produzir sua compreensão do que vem sendo 
comunicado. Não há inteligibilidade que não seja comunicação e 
intercomunicação que não se funde na dialogicidade”. (pág. 42) 
 
A concepção de homem como ser condicionado mas não determinado é outra 
contribuição essencial de Paulo Freire para a educação. Bebendo na fonte do 
Existencialismo trouxe para o âmbito da educação esse pensamento que dá força 
intensa a sua concepção educacional. Tanto professor quanto aluno são seres 
inacabados e por isso em processo de construção permanente. Não há determinismo 
absoluto em nossas vidas, podemos mudar determinadas situações mesmo que à custa 
de muito esforço.Esse tipo de visão freireana contribuiu muito para estimular alunos a 
atuarem mais em suas vidas e abandonar explicações mágicas sobre o porque das 
coisas. 
 
“É neste sentido que para mulheres e homens, estar no mundo 
necessariamente significa estar com o mundo e com os outros. Estar no 
mundo, sem fazer cultura, sem ”tratar” sua própria presença no mundo, sem 
sonhar, sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, 
sem usar as mãos, sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o 
mundo, sem fazer ciência, ou teologia, sem assombro em face do mistério, 
sem aprender, sem ensinar, sem idéias de formação, sem politizar não é 
possível”. ( Freire, Ibdem ,pág. 64) 
 
A partir dessa inconclusão humana é que se fundamenta a educação como 
processo permanente. Para Freire o homem é alguém educável na medida em que se 
reconhece como ser inacabado. Não foi a educação que fez o homem educável mas a 
própria consciência de inconclusão que gerou sua educabilidade. 
A valorização da autonomia do educando, é um outro saber absolutamente 
necessário à pratica educativa e que Freire destaca. A valorização da dignidade de 
cada um e o tratamento respeitoso sem qualquer estabelecimento de barreiras 
hierárquicas no ensino, se faz fundamental. Jamais desrespeitar a curiosidade do 
educando, seu gosto estético, suas preferências, sua linguagem sua sintaxe e sua 
paródia. São parte do seu mundo e é inadmissível que o professor pós Paulo Freire 
humilhe o aluno ou desdenhe de seus saberes. Ao valorizar os elementos culturais 
presentes no cotidiano do aluno sem caracterizá-lo como crendice, ignorância ou 
superstição o professor dá início ao diálogo franco e aberto. Nesse dialogo ambos 
aprendem e crescem na diferença. Esse clima fertilizado pela postura do professor 
propiciará um convívio banhado pela humildade intelectual, pela tolerância e pela 
cidadania. 
A alegria e a esperança são componentes bastantes representativos no 
pensamento pedagógico de Paulo Freire. Ele nunca abriu mão da alegria como base 
fundamental para a construção de um clima de parceria, cumplicidade e bem estar 
entre educandos e educador. 
Alegria e a esperança estão imbricadas em sua pedagogia pois esse processo 
educacional só se dá porque professores e alunos acreditam que podem aprender e 
ensinar juntos; 
 
Seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, 
primeiro o ser humano não se inscrevesse ou não se achasse predisposto a 
participar de um movimento constante de busca e segundo, se buscasse 
sem esperança. A desesperança é negação da esperança. A esperança é 
uma espécie de ímpeto natural possível e necessário, a desesperança é o 
aborto deste ímpeto. A esperança é um condimento indispensável à 
experiência histórica. Sem ela, não haveria História mas puro determinismo. 
Só há História onde há tempo problematizado e não pré-dado. A 
inexorabilidade do futuro é a negação da História. (Ibdem, pág. 81) 
 
A educação para Freire é uma forma de intervenção no mundo. Essa intervenção 
vai muito além do conhecimento de conteúdos e tanto pode ser uma forma de 
transmissão alienante ou uma desbanalização do que chamamos realidade. A 
educação não é um fazer neutro e indiferente. 
Muitos educadores nas décadas de 50 e 60 deram ênfase exclusiva a escola 
como espaço de reprodução entre eles figuram Pierre Bordieu e Jean Claude Passeron. 
Paulo Freire discordou deles afirmando que é um erro decretar a escola como 
unicamente reprodutora de ideologia dominante, pois ela também pode colaborar com a 
desocultação da realidade e implementar mudanças. 
 
“Aoreconhecer que, precisamente porque nos tornamos seres capazes de 
observar, de comparar, de avaliar, de escolher, de decidir, de intervir, de 
optar nos fizemos seres éticos e se abriu para nós a probabilidade de 
transgredir a ética, jamais poderia aceitar a transgressão como um direito 
mas como uma possibilidade. Possibilidade contra que devemos lutar, e não 
diante da qual cruzar os braços. Daí a minha recusa rigorosa nos fatalismos 
quietistas que terminam por absorver as transgressões éticas em lugar de 
condená-las. Não posso virar conivente de uma ordem perversa, 
irresponsabilizado-a por sua malvadez, ao atribuir a “forças cegas” e 
imponderáveis os danos por elas causados aos seres humanos. A fome 
frente a frente à abastança e o desemprego no mundo são imoralidades e 
não fatalidades como o reacionarismo apregoa com ares de quem sofre por 
nada poder fazer. O que quero repetir, com força é que nada justifica a 
minimização dos seres humanos no caso das maiorias compostas de 
minorias que não perceberam ainda que juntas seriam a maioria. Nada, o 
avanço de ciência e/ou da tecnologia, pode legitimar uma “ordem” desordeira 
em que só as minorias do poder esbanjam e gozam enquanto as maiorias 
em dificuldades até para sobreviver se diz que a realidade é assim mesmo, 
que sua fome é uma fatalidade do fim de século”. (pág. 113) 
 
Como fica claro nesse texto contundente, Paulo Freire agenda um paradigma 
educacional que se compromete de forma visceral com o papel político de educação. 
A idéia de que o educador deve ser alguém que sabe escutar é um outro aspecto 
fortemente presente em sua pedagogia. É ouvindo a fala do educando e dando- lhe vez 
e voz, que o educador irá desenvolver um trabalho construído na partilha de ambos. O 
sonho democrático não se realiza se centralizarmos o processo falando com os alunos 
de cima para baixo como se fôssemos donos da verdade. É no exercício da escuta que 
aprendemos a falar com eles. Essa escuta tem que ser paciente,incorporadora e 
acolhedora das informações que possam ser trazidas pelos nossos interlocutores 
alunos. 
Grande parte das práticas educativas, desenvolvidas antes de Paulo Freire não 
valorizavam em nada a escuta. Isso ocorreu e ainda ocorre exatamente porque são 
práticas que tratam a educação como mero treino. A proposta educacional de Freire 
inova ao propor a educação como formação integral do ser humano e que baseia-se no 
falar com. As próprias avaliações nas práticas pedagógicas tradicionais eram 
estimuladoras do adestramento e não da formação dialogada. 
 
“Os sistemas de avaliação pedagógica de alunos e de professores vêm se 
assumindo cada vez mais como discursos verticais, de cima para baixo, mas 
insistindo em se passar por democráticos. A questão que se coloca a nós, 
enquanto professores e alunos críticos e amorosos da liberdade; não é 
naturalmente, ficar contra a avaliação, de resto necessária, mas resistir aos 
métodos silenciadores com que ela vem sendo às vezes realizada. A questão 
que se coloca a nós é lutar em favor da compreensão e de prática de avaliação 
enquanto instrumento de apreciação do que-fazer de sujeitos críticos a serviço, 
por isso mesmo, da libertação e não da domesticação. Avaliação em que se 
estimule o falar a como caminho do falar com”. (Ibdem,pág. 131) 
 
 
 A escuta é um processo de aprendizado que o professor deve desenvolver 
 
exercitando através do controle de seu ímpeto de interromper o aluno. Daí a importância 
do silêncio no processo de comunicação. 
 
 
 
A importância do silêncio no espaço da comunicação é fundamental. De um 
lado me proporciona que, ao escutar, como sujeito e não como objeto, a fala 
comunicante de alguém procure entrar no movimento interno de seu 
pensamento,virando linguagem; de outro, torna possível a quem fala, 
realmente comprometido com comunicar e não com fazer puros comunicados, 
escutar a indagação, a dúvida, a criação de quem escutou. Fora disso,fenece a 
comunicação. (Ibdem,pág. 132) 
 
O professor para Paulo Freire deve ser um provocador do aluno no sentido de 
aguçar e refinar a curiosidade. Deve incitar o aluno afim de que ele construa a 
compreensão do objeto ao invés de recebê-lo pronto. 
E por ultimo e não menos importante,gostaria de sublinhar um ponto legado pelo 
educador que a meu ver foi abandonado por muitos estudiosos de Paulo Freire. Trata-
se da afetividade que por muitos pode ser visto como pieguice mas nada mais longe de 
sua prática. 
Para Freire ensinar exige querer bem aos educandos. Isso não é algo tão óbvio 
pois ainda podemos encontrar professores que tratam os alunos como números ou 
cabeças vazias que irão receber seus ensinamentos. 
O educador com inspiração freireana deve estar aberto a querer bem aos seus 
alunos. A afetividade nunca foi desprezada por nosso educador maior. Isto se constata 
claramente em diversas de suas obras como em sua militância como educador e 
também como formador de educadores. 
 
Significa, de fato, que afetividade não me assusta, que não tenho medo de 
expressá-la. Significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de 
autenticamente selar o meu compromisso co m os educandos numa prática 
específica do ser humano. Na verdade, preciso descartar como falsa a 
separação radical entre seriedade docente e afetividade. Não é certo, 
sobretudo do ponto de vista democrático, que serei tão melhor professor 
quanto mais severo, mais frio, mais distante e “cinzento” me ponho nas minhas 
relações com os alunos, no trato dos objetivos cognoscíveis que devo ensinar. 
(Ibdem, pág. 160) 
 
A afetividade não se acha excluída da cognoscibilidade. Paulo Freire , na esteira. 
de Carl Rogers agenda de forma cabal no pensamento educacional, a importância da 
afetividade no processo de ensino aprendizagem. Outro educador brasileiro que dará 
continuidade a essa prática freireana é o filósofo Rubem Alves que desenvolve uma 
pedagogia calcada na afetividade, no desejo do educando e também na escola como 
espaço de alegria e prazer. 
A alegria no espaço educacional tem bastante valor em Freire: 
 
 
 A atividade docente de que a discente não se separa é uma experiência 
alegre 
 
 por natureza. É falso também tomar como inconciliáveis seriedade docente e 
 
 alegria, como se a alegria fosse inimiga da rigorosidade. 
 
Pelo contrário, quanto mais metodicamente rigoroso me torno na minha 
busca e na minha docência, tanto mais alegre me sinto e esperançoso 
também. A alegria não chega apenas no encontro do achado mas faz parte 
do processo de busca. E ensinar e aprender não podem dar-se fora da 
procura, fora da boniteza e da alegria. O desrespeito à educação,aos 
educandos, aos educadores e às educadoras corrói ou deteriora em nós, de 
um lado, a sensibilidade ou a abertura ao bem querer da própria prática 
educativa de outro, a alegria necessária ao que – fazer docente”. 
(Ibdem,pág. 161) 
 
Para Freire o educador jamais deveria perder o gosto de querer bem e o gosto 
da alegria partilhada com seus alunos. Sem isso a educação perderia muito de sua 
razão de ser. Aprender a conviver é algo fundamental, porém é esquecido pela grande 
maioria de nossas instituições de ensino que só tem olhos pra o preparo conteudista . 
Não se trata, no entanto de uma afetividade alienada. Pelo contrário, a vivência 
dialógica afetiva no espaço escolar pode ser formadora de uma concepção política 
cidadã, democrática e que esteja atenta aos direitos civis. 
Tampouco a prática educativa apoiada no afeto não é algo que visa escamotear 
a falta de conteúdo dos professores. 
Pelo contrário, a prática educativa banhada pela afetividade e alegria, não 
prescinde da formação científica nemtampouco da clareza política. A prática educativa 
é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade científica, filosófica, artística, religiosa e 
política. 
 
“Nada que diga respeito ao ser humano, à possibilidade de seu 
aperfeiçoamento físico e moral, de sua inteligência sendo produzida e 
desafiada, os obstáculos e seu crescimento, o que possa fazer em favor da 
boniteza do mundo como de seu enfeamento, a dominação a que esteja 
sujeito, a liberdade por que deve lutar, nada que diga respeito aos homens e 
às mulheres pode passar despercebido pelo educador progressista. Não 
importa com que faixa etária trabalha o educador ou a educadora. O nosso é 
um trabalho realizado com gente, miúda, jovem ou adulto, mas gente em 
permanente processo de busca. Gente, formando-se, mudando, crescendo, 
reorientando-se, melhorando, mas por que gente, capaz de negar valores de 
distorcer-se de recuar, de transgredir” (Ibdem,pág. 163) 
 
Paulo Freire jamais entendeu a educação como experiência fria e sem alma. Os 
desejos, os sentimentos e as emoções devem ser valorizados. Isso não implicava para 
ele como falta de rigor ou seriedade. 
 
Estou convencido, porém de que a rigorosidade, a séria disciplina intelectual, o 
exercício da curiosidade epistemológica não me fazem necessariamente um 
ser mal amado, arrogante, cheio de mim mesmo. Ou em outras palavras não é 
a minha arrogância intelectual a que fala de minha rigorosidade cientifica. Nem 
a arrogância é sinal de competência nem a competência é causa de 
arrogância. Não nego a competência por outro lado, de certos arrogantes, mas 
lamento neles a ausência de simplicidade que, não diminuindo em nada seu 
saber, os faria gente melhor. Gente mais gente”. (Ibdem,pág. 165) 
 
 
 
 
 
 
 
 Conclusão 
 
 
 
 Paulo Freire é pensador reconhecido no mundo inteiro com livros 
 
publicados nos mais variados idiomas e aqui mesmo no Brasil mesmo não sendo tão 
 
valorizado quanto deveria , é utilizado nas mais diversas experiências educativas. 
 
 Ainda é uma fonte atualíssima para a educacação de jovens e adultos como em 
 
diversas disciplinas específicas oferecidas em qualquer segmento desde a educação 
 
infantil até a Universidade. 
 
 Como professor de Filosofia da Educação que leciona para vários cursos de 
 
Licenciatura, posso atestar que alunos de todas as áreas conseguem aplicar Paulo 
 
Freire na especificidade de seus campos. Alunos de todas áreas presentes no currículo 
 
do ensino Fundamental e Médio bem como futuros professores ou mesmo 
 
 profissionais de saúde como Psicologia, Enfermagem, Fisioterapia, Fonoaudiologia, 
 
Psicomotricidade entre outras áreas. 
 
Fiz questão no entanto de pautar este trabalho por um aspecto que considero 
 
fundamental para a formação de professores na atualidade : aprender a dialogar. 
 
Ninguém melhor do que Paulo Freire para nos acompanhar no caminho da 
 
Dodiscência, uma ferramenta poderosa para eliminarmos o autoritarismo escolar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS : 
 
 
Alves, Rubem. A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse 
existir. Campinas, Papirus, 2001. 
 
Freire,Paulo. Educação como prática de liberdade. Rio de janeiro, Paz e Terra, 
1977. 
 
__________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, 1981, Paz e Terra,1981. 
 
___________ Pedagogia da Esperança. São Paulo, Paz e Terra, 1992. 
 
___________ Pedagogia da Autonomia.São Paulo, Paz e Terra,1996. 
 
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