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SEMINÁRIO-V-O-capitalismo-e-a-Racionalização-do-Mundo

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Disciplina: Sociedade e Território 
Professor: Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro 
Seminário V: O capitalismo e racionalização do mundo. 
Responsáveis: Fabrina Furtado, Fernanda Kopanakis, Mariana Albinati, Robson Santos Dias 
 
Texto base: WEBER, M. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São 
Paulo: Companhia das Letras, 2004
1
. 
 
 
1. Introdução 
 
A sociologia de Max Weber foi produzida na efervescência intelectual européia, a partir 
do século XVIII, em meio aos debates travados entre a corrente até o momento 
dominante, o positivismo, e seus críticos. Considerado, junto com Marx e Durkheim, 
um dos fundadores da sociologia moderna, Weber foi o principal representante do 
individualismo metodológico. 
 
Weber concebe o objeto da sociologia como “a captação da relação de sentido” (caráter 
social) da ação humana. Em outras palavras, conhecer um fenômeno social seria extrair 
o conteúdo simbólico da ação ou ações que o configuram. O autor desenvolveu sua 
investigação sociológica a partir da multiplicidade de casos individuais e do 
delineamento de modelos empíricos de análise, revelando-se este método decisivo nos 
estudos de cultura comparada. A sua concepção de uma sociologia abrangente partia do 
conceito de conduta social, segundo o qual a Ciência devia explicar o fenômeno social a 
partir da investigação do comportamento subjetivo, que vincula o indivíduo a seus atos. 
A investigação seria baseada também nos interesses e nos juízos subjetivos do ser 
humano. 
 
A sociologia weberiana busca compreender e interpretar a Ação Social nas suas causas 
e efeitos, entendendo a ação dentro da conexão de sentidos em que é produzida. Para 
Weber, a crescente racionalização da vida (tanto na economia, quanto na prática política 
e na vida religiosa) é um tema central para a compreensão da sociedade moderna 
ocidental. Embora se manifeste de diversas formas e com diferentes motivações, a 
racionalização, para Weber, pode ser compreendida como o crescimento do formalismo 
na regulação das ações. 
 
Em relação ao estudo da sociedade capitalista, tema muito caro a Weber assim como a 
Marx, a abordagem weberiana contrasta com materialismo dialético, que ele criticava 
por seu “monismo causal”2, ou seja, por considerar apenas um aspecto, o econômico, na 
análise sobre o surgimento e desenvolvimento do capitalismo. Para Weber, uma das 
 
1
 A primeira versão do texto de Max Weber foi publicada originalmente em 1904 e 1905 em 
revista editada pelo próprio autor. Uma segunda versão, revista pelo autor, foi publicada no ano da sua 
morte, 1920. A editora Companhia das Letras fez uma nova edição em comemoração ao centenário do 
livro, em 2004, onde o texto base é o da edição original, com notas em que é apresentada e comentada 
versão final (de 1920). 
2
 QUINTANEIRO, T., BARBOSA, M.L., OLIVEIRA, M.G. Um toque de clássicos: Durkheim, 
Marx e Weber. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.107. 1995. 
chaves do desenvolvimento do capitalismo estava na compreensão das relações de 
interdependência entre a religião, o indivíduo e a sociedade. 
 
 
 2. A Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo 
 
Há mais de cem anos Marx Weber escrevia uma de suas obras mais conhecidas: A Ética 
Protestante e o “Espírito” do Capitalismo (1904-1905). Weber pretendeu demonstrar 
que valores éticos e religiosos haviam exercido forte influência no desenvolvimento do 
capitalismo moderno. Na concepção weberiana, a ação econômica capitalista é dirigida 
para a obtenção de lucro por meio da troca. Na modernidade ocidental a novidade é a 
preferência desse tipo de transação por meios pacíficos, através de uma sistematização 
dos intercâmbios mercantis pela via de uma contabilidade racionalizada. Segundo 
Weber, esta modalidade é inédita porque na história da humanidade, outras ações 
capitalísticas eram empreendidas a partir de oportunidades de lucro advindas do uso da 
força (guerras, por exemplo). Para Weber, apesar da mesma motivação (o lucro), é no 
método formalmente pacífico, sistemático e racional da troca que o capitalismo se 
distingue. 
 
O livro se concentra especialmente não no capitalismo como sistema econômico e modo 
de produção, mas sim como um “espírito” (daí as aspas colocadas pelo autor junto à 
palavra espírito), como uma cultura determinante na condução da vida. A partir dessa 
perspectiva, analisa a influência cultural da Reforma Protestante (substituta da forma de 
dominação eclesiástica), que havia sacudido a escala de valores feudais da Igreja 
Católica (“pune os hereges, mas é indulgente com os pecadores”), permitindo o 
desenvolvimento do capitalismo moderno com o rompimento do tradicionalismo 
econômico. 
 
Para Weber, a emancipação ante o tradicionalismo econômico marca um momento de 
mudança cultural em que era possível a inclinação a “duvidar até mesmo da tradição 
religiosa e a se rebelar contra as autoridades tradicionais em geral”. O autor chama a 
atenção para o forte impacto da Reforma sobre a dominação eclesiástica sobre a vida do 
indivíduo, possibilitando, em diversas partes do mundo ocidental, a substituição desta 
forma vigente por uma outra, mais severa em termos de regulamentação da conduta de 
vida, que se impunha ao indivíduo tanto na sua vida doméstica como na sua vida 
pública. 
 
A partir da compreensão dos fenômenos culturais, Weber buscou demonstrar como a 
lógica do protestantismo e em especial o calvinismo, haviam estabelecido as bases para 
a busca do sucesso econômico (“a prosperidade era o prêmio de uma vida santa”.) e da 
racionalização na sociedade ocidental e, por último, do desenvolvimento do capitalismo 
moderno. Sua análise parte de conceitos como a ética da renúncia ao instinto (ascese 
interior) e o desencanto ante o mundo, e se detém ainda sobre o que Weber chamou de 
ascetismo mundano, ou seja, a dedicação ascética à vocação profissional como uma das 
bases do “espírito” do capitalismo. 
 
 
 2.1 O ¨Espírito¨ do Capitalismo 
 
Como já mencionado, o interesse central do Weber na obra em questão era compreender 
as especificidades das sociedades ocidentais que levaram ao desenvolvimento do 
capitalismo, sugerindo a existência de uma relação entre certos valores presentes na 
época do surgimento do capitalismo moderno e a ética protestante, mais 
especificamente a calvinista, puritana. O objetivo não era entender a origem do 
capitalismo como sistema econômico, mas sim o espírito do capitalismo, as idéias que 
favoreceram o seu desenvolvimento. Para Weber para explicar o surgimento do 
capitalismo, como realidade, estrutura, entidade coletiva, era necessário entender a 
construção do indivíduo capitalista, não necessariamente em uma determinada ordem. 
Para tanto, Weber utilizou uma metodologia de investigação baseada em um “tipo 
ideal” caracterizado por uma individualidade sociocultural e histórica cuja compreensão 
possibilita, a partir de uma realidade do passado, chegar a uma explicação sobre o 
presente. O tipo ideal é um instrumento que orienta o pesquisador na sua busca por um 
complexo de conexões causais na realidade histórica em um mundo de infinitas 
possibilidades, permitindo a realização de uma comparação entre um modelo com 
traços essenciais e significação histórica e a realidade empírica examinada. Ajuda a 
organizar de forma inteligível um acontecimento histórico ou fenômeno social para 
compreender seu sentido e tentar explicar, de forma aproximativa, a sua causalidade. É 
a sociologia compreensiva de Weber. Na obra em questão, o “espírito do capitalismo” é 
o principal tipo ideal desenvolvido por Weber. 
 
O autor inicia sua pesquisa com um delineamento provisóriodeste conceito histórico 
que vai sendo definido gradualmente, a partir de cada um de seus elementos extraídos 
da realidade histórica, até chegar a um conceito definitivo no final do trabalho. Weber, 
preocupado com o papel do pesquisador e a objetividade do conhecimento, objetividade 
esta que não deixa de partir de um determinado valor ou opinião da sociedade, ressalta 
que os pontos de vista por ele colocados não são a única forma de analisar os 
fenômenos históricos considerados. Não é só o que é colocado pelo autor como 
essencial que representa o “espírito do capitalismo”. No entanto, para poder entender o 
conceito orientador da sua pesquisa – a vocação – é preciso definir o delineamento 
provisório que nesta primeira parte não tem relação direta com a religião. 
 
Para iniciar o seu delineamento provisório, Weber utiliza-se de frases do estadista, 
cientista e escritor Norte Americano, Benjamin Franklin (apud., WEBER, 2004, p.42-
43): 
 
[…] tempo é o dinheiro; aquele que com seu trabalho pode ganhar dez xelins 
ao dia e vagabundeia metade do dia, ou fica deitado em seu quarto, não deve, 
mesmo que gaste apenas seis pence para se divertir, contabilizar só essa 
despesa; na verdade gastou, ou melhor, jogou fora, cinco xelins a mais. […] 
crédito é dinheiro. Neste sentido, se alguém me deixa ficar com seu dinheiro 
depois da data do vencimento, está me entregando os juros ou tudo quanto 
nesse intervalo de tempo ele tiver rendido para mim. […] O dinheiro pode 
gerar dinheiro. […] Quanto mais dinheiro houver, mais produzirá ao ser 
investido. […] Um bom pagador é senhor da bolsa alheia. […] A par de 
presteza e frugalidade, nada contribui mais para um jovem subir na vida do 
que pontualidade e retidão em todos os seus negócios. […] As mais 
insignificantes ações que afetam o crédito de um homem devem ser por ele 
ponderadas. […] não te esqueces das tuas dívidas, fazendo com que pareças 
um homem tão cuidadoso quanto honesto, e isso aumenta o teu crédito. […] 
Por seis libras por ano podes fazer uso de cem libras, contanto que seja 
reconhecido como um homem prudente e honesto. 
 
Para Weber, estas frases de Franklin expressam claramente o espírito do capitalismo; o 
ideal do homem honrado, digno de crédito e, sobretudo, a idéia do dever do indivíduo 
de ter como fim o aumento das suas posses. O que é essencial para nesse contexto, é que 
Franklin não ensina simplesmente uma “perspicácia nos negócios” e sim uma ética 
orientadora da vida, cuja violação significaria a violação de um dever. Assim sendo, o 
conceito de “espírito do capitalismo” é utilizado no sentido do caráter de uma máxima 
de conduta de vida eticamente coroada. 
 
É esse ethos que faltava nas formas primitivas de capitalismo como é o caso da China, 
Índia, Babilônia, na antigüidade e na Idade Média. Por isso Weber delimita sua pesquisa 
em termos temporal e espacial para analisar o capitalismo moderno que surgiu na 
Europa ocidental e da América do Norte no séculos XVII e no começo do XVIII. 
 
Weber considera as advertências morais de Franklin como de cunho utilitário. 
Características como honestidade, pontualidade, presteza ou frugalidade têm utilidade 
porque são capazes de atrair crédito; por isso são virtudes. Inclusive, Franklin deixa 
entendido que apenas a aparência dessas virtudes seria suficiente para atingir o objetivo 
desejado e que qualquer excesso seria um desperdício improdutivo condenável. Ou seja, 
são apenas virtudes enquanto são úteis ao indivíduo. 
 
Isso não é hipocrisia. O autor revela a relação feita por Franklin entre a descoberta da 
“utilidade” da virtude e uma revelação de Deus. De acordo com Franklin a vontade de 
Deus era destiná-lo à virtude, que ele não considerava uma utilidade por interesses 
puramente egocêntricas, mas sim por considerar esta ética o summun bonum, um bem 
maior. Esta ética é apresentada por Weber como irracional: ganhar mais e mais dinheiro 
sem nenhum gozo, sem objetivar a felicidade nem o prazer, pensado exclusivamente 
como fim em si mesmo. Ocorre uma inversão da ordem “natural” das coisas: o ganho 
como meio destinado a satisfazer as necessidades materiais do ser humano deixa de ser 
em função do ser humano e o ser humano passa a ser em função do ganho, resultado da 
habilidade na profissão, como finalidade da vida. É essa nova “ordem” que passa a ser a 
motivação do capitalismo moderno. 
 
No entanto, a idéia da profissão como dever não tem importância para o Weber como 
pura valorização de uma força de trabalho ou de propriedade e bens. Isso seria a ética 
social da cultura capitalista. Novamente Weber toma o cuidado de explicar que essa 
ética baseada na profissão como dever, não cresceu somente no solo do capitalismo nem 
que a sobrevivência do capitalismo depende da apropriação subjetiva dessa máxima 
ética por seus agentes. O que o autor tenta explicar é que para que essa conduta de vida 
e concepção de profissão tenham conseguido supremacia, tiveram que ser adotadas por 
um grupo de pessoas e não indivíduos isolados. Conseguiu regularidade espacial e 
temporal. 
 
De acordo com o materialismo histórico, tais idéias surgem como “superestrutura” de 
situações econômicas. No entanto, Weber demonstra que a relação de causalidade é 
inversa: o espírito do capitalismo existiu em diversas cidades antes mesmo do 
desenvolvimento do capitalismo, como é o caso de Massachusetts, Nova Inglaterra, 
terra de Franklin. Demonstra ainda, que o capitalismo foi desenvolvido em cidades, 
como é o caso das colônias vizinhas a Massachusetts, que tinham um menor nível de 
desenvolvimento deste espírito capitalista. É aqui que surge uma das análises do Weber 
sobre a dominação: o espírito capitalista teve que lutar por sua dominação aparecendo 
não só em indivíduos isolados, mas como um modo de vida comum a um coletivo. 
 
Assim, se o espírito capitalista, que teria sido condenado na Antigüidade e na Idade 
Média como também entre grupos sociais menos envolvidos com a economia 
capitalista, não conquistou supremacia por causa das situações econômicas, conforme 
explica o materialismo histórico, o que ocorreu? Weber explica que essa questão não 
está relacionada com a falta do impulso aquisitivo ou da cobiça; a auri sacra fames, a 
ganância, sempre existiu. O grande adversário do espírito do capitalismo encontrava-se 
no tradicionalismo. 
 
O tradicionalismo, novamente como conceito provisório, é entendido por Weber como a 
ética em que o indivíduo busca trabalhar apenas para receber a quantia capaz de cobrir 
suas necessidades tradicionais ao contrário do desejo de ganhar mais e mais. É também 
o hábito. Como Weber tinha um grande compromisso com a demonstração, para 
mostrar o conceito de tradicionalismo ele usou o exemplo da agricultura e mais 
especificamente a colheita. O autor explica que o empresário moderno, na busca de 
aumentar a produtividade, introduziu o salário por tarefa. No caso da agricultura, para 
acelerar a colheita o empresário aumentou o salário por tarefa. No entanto, o resultado 
não foi o aumento da produtividade do trabalho no mesmo intervalo de tempo como 
esperado, mas sim uma diminuição da produtividade. O trabalhador passou a trabalhar 
menos para ganhar o mesmo salário. Ganhar mais o atraia menos que trabalhar menos. 
Não se perguntava quanto podia ganhar por dia rendendo o máximo de trabalho e sim 
quanto deveria trabalhar para ganhar a mesma quantia que cobria as necessidades 
tradicionais. 
 
Nesse sentido Weber afirma que o ser humano não quer por natureza ganhar mais 
dinheiro, mas simplesmente viver do modo como está habituado a viver e ganhar o 
necessário para tanto. O objetivo do capitalismo moderno de aumentar a produtividade 
aumentando a intensidadedo trabalho sempre se esbarrou na resistência do 
tradicionalismo. 
 
Assim sendo, seria natural fazer o inverso: reduzir o salário por tarefa obrigando o 
trabalhador a produzir mais para manter o mesmo salário. No entanto, este caminho 
também esbarrou em limites: o salário fisiologicamente insuficiente diminui a 
produtividade e a longo prazo, significa uma ¨seleção dos mais incompetentes¨ e 
determinados trabalhos exigem um grau de qualificação não sustentado por salários 
baixos. O efeito acaba sendo o oposto do pretendido. 
 
No entanto, este mecanismo não funcionou já que o trabalhador passou a trabalhar 
menos para ganhar o mesmo salário. Ganhar mais o atraia menos que trabalhar menos. 
O caminho da redução dos salários para garantir mais produtividade, também esbarrou 
em limites: o salário fisiologicamente insuficiente diminui a produtividade e 
determinados trabalhos exigem um grau de qualificação não sustentado por salários 
baixos. O que faltava era um meio de garantir que o trabalho fosse realizado com 
responsabilidade e disposição sem a busca de maior comodidade e mínimo de esforço 
ganhando o mesmo salário. O que faltava era a disposição de executar o trabalho como 
um fim absoluto em si mesmo; uma vocação. Essa disposição se constrói através de um 
longo processo educativo, não é natural. 
 
Weber analisa outro exemplo para demonstrar como o aumento do salário se chocou 
com o hábito do tradicionalismo, agora relacionando com a religião. Analisando a 
relação entre patrões e as mulheres alemãs por eles contratadas, Weber constatou que a 
resistência delas de mudarem a forma de trabalhar, de abandonar o hábito em busca de 
um trabalho mais fácil e mais lucrativo, só era superada em mulheres de educação 
religiosa de origem pietista. Características como o sentimento de “dever no trabalhar”, 
o espírito de poupança, um severo domínio de si e uma sobriedade que elevava a 
produtividade eram encontradas nestas mulheres. Assim, pôde concluir que a concepção 
de trabalho como fim, como “vocação numa profissão” capaz de superar o 
tradicionalismo, dava-se em conseqüência da educação religiosa. E aqui Weber coloca a 
questão, trabalhada por ele mais adiante, de como foi possível construir a conexão entre 
a capacidade de adaptação ao capitalismo e fatores religiosos. 
 
O autor esclarece que não existe uma “lei” que determina a dependência da forma 
capitalista de uma economia e o espírito que a conduz. Embora, no caso em questão, por 
uma razão histórica, a sistemática ambição pelo ganho em uma profissão, tenha 
encontrado sua forma mais adequada na empresa capitalista moderna e a empresa 
capitalista moderna seu “espírito“ mais adequado, a forma e o espírito podem ocorrer 
separadamente. 
 
Weber então explica que o tradicionalismo, que continua ocorrendo mesmo em formas 
de organização capitalista, é transformado pelo processo de racionalização onde quem 
não sobe, desce, onde através de uma busca incessante por mais e mais ganho, uma vida 
metódica, disciplinada e calculada, o indivíduo tem como objetivo final, dominar o 
mundo. A dominação é então a ética da ação do indivíduo racional. 
 
Ocorre então uma profunda transformação na conduta da vida. O resultado desse 
processo foi o aumento da competição, o reinvestimento de lucros no negócio e a 
substituição da vida pacata e aconchegante por uma vida dominada pela sobriedade e 
um trabalho intenso. O que provocou essa transformação não foi a questão monetária, 
um aumento no fluxo de dinheiro na economia, a valorização de reservas monetárias 
como capital, mas sim o desenvolvimento do espírito capitalista. ”Por toda parte onde 
emerge e se efetiva, ele cria para si as provisões monetárias como meios de sua 
efetivação, não o contrário” (WEBER, 2004, p.61). Ou seja, não foram as condições 
“materiais” que refletiram sobre a “superestrutura ideal”; o desenvolvimento da 
economia não depende necessariamente de transformações internas a ela; ou ainda, a 
economia não se explica somente pela economia. 
 
Vale ressaltar inclusive que os agentes mais responsáveis por esse processo de 
superação do tradicionalismo por este novo espírito, não foram empresários sem 
escrúpulos, aventureiros ou ricaços, mas sim homens “criados na dura escola da vida, 
audazes e ponderados, sóbrios e constantes, sagazes e inteiramente devotados a causa, 
homens com visões e „princípios‟ rigorosamente burgueses” (ibid., p.61-62). O 
empresário ideal do capitalismo moderno não goza do seu ganho, não ostenta a despesa 
inútil, a aparência nem o poder; ele adota uma conduta de vida baseada no ascetismo 
intramundano. Ou seja, o empresário tipo ideal do capitalismo moderno reununcia o 
prazer, adota uma vida metódica disciplinada com controle ativo e racional da vida, mas 
agora não mais nos mosteiros e sim na ação do mundo. “De sua riqueza „nada tem‟ para 
si mesmo, a não ser a irracional sensação de „cumprimento do dever profissional‟” 
(ibid., p.63). Então de onde surgiram as idéias em torno da atividade profissional como 
vocação? 
 
De acordo com Weber, o mais fácil seria afirmar que o desenvolvimento do espírito do 
capitalismo estava relacionado com o racionalismo econômico. Ou seja, como o motivo 
fundamental da economia moderno é o racionalismo econômico, o processo de 
racionalização da economia e das técnicas, sem dúvida acaba condicionando também 
uma boa parte das idéias. A possibilidade de prover os bens materiais necessários à 
humanidade através do trabalho, o orgulho de empregar inúmeras pessoas, de ter 
colaborado para o crescimento econômico, também fazem parte da “felicidade de viver” 
e do idealismo do empresário moderno. A racionalização com base no cálculo 
aritmético rigoroso, o planejamento sóbrio objetivando o sucesso econômico é também 
característica da economia capitalista. Nesse caso o protestantismo só entraria na análise 
por seu papel de “fruto prematuro” de concepções de vida puramente racionalistas. No 
entanto, a história do racionalismo demonstrou que seu desenvolvimento não ocorreu 
por igual nas distintas esferas da vida. 
 
Não foi somente nos países de maior desenvolvimento capitalista que a filosofia 
racional puramente intramundana do século XVIII aflorou. Considerando o 
racionalismo prático como a determinação da conduta de vida pelos interesses 
intramundanos do “eu individual”, seria mais lógico se a atividade profissional 
entendida como dever, missão tivesse aflorado entre os povos do liberum artibitrium, os 
italianos e franceses. No entanto, não foi o caso. Como explica Weber, existem várias 
formas de racionalizar a vida e diversas contradições no conceito histórico de 
racionalização. 
 
A investigação sobre o espírito que originou essa vida racional da qual resultou a idéia 
de ”vocação profissional“ como elemento central do capitalismo é apresentada por 
Weber mais adiante. Antes disso é importante apresentar uma breve análise sobre a 
origem do conceito de “vocação”. 
 
 
2.2 O Conceito de Vocação em Lutero 
 
Embora o luteranismo não seja central às preocupações de Weber por não ter 
diretamente influenciado o desenvolvimento do capitalismo moderno, Lutero tem um 
papel importante na análise do autor. Podemos inclusive afirmar que enquanto Weber 
não analisa a doutrina posterior dos luteranos, mas inclui a doutrina pessoal de Lutero, 
não leva em conta a doutrina pessoal de Calvino, mas a prática dos calivinistas 
posteriores a ele. 
 
O importante de Lutero para Weber é simplesmente o fato dele ter formulado o conceito 
de vocação. Conceito este que para Weber, melhor expressado pela palavra em alemão 
– Beruf – ou em inglês – calling – as únicas que conseguem refletir a relação entre 
profissãoe vocação, por si só já tem uma conotação religiosa colocando a profissão 
como uma missão dada por Deus. Através de uma análise da história e das línguas de 
diversos povos, Weber verificou que os povos predominantemente católicos não 
utilizam a expressão Beruf, enquanto ela está presente em todos os povos 
predominantemente protestantes. De acordo com Weber, a palavra, que surgiu de uma 
tradução realizada por Lutero, está muito mais relacionada com o espírito do tradutor do 
que do conceito original. O conceito é desenvolvido por Lutero na primeira década da 
Reforma sendo assim um produto desta. 
 
O que havia de novo no conceito de Beruf era a valorização do cumprimento do dever 
através das profissões mundanas como expressão da vida moral. Houve assim, uma 
substituição da moralidade extramundana da ascese monástica pelos deveres 
intramundanos, como forma de agradar a Deus, o que representou uma profunda 
mudança na mentalidade da época. No início, com a tradição medieval predominante, o 
trabalho mundano era considerado como moralmente indiferente, como o comer e o 
beber. No entanto, a partir do momento em que as conseqüências da doutrina sola fide e 
a oposição aos conselhos evangélicos do monacato católico, como conselhos ”ditados 
pelo diabo” tornam-se mais evidentes, a significação da vocação na atividade 
profissional aumenta. E assim, a conduta de vida monástica começa a ser desvalorizada 
e considerada como ato egoísta de falta de amor para fuga dos deveres mundanos. A 
profissão torna-se expressão de amor ao próximo, para depois ser considerada como 
única forma de agradar a Deus. O que é mais complicado para Weber não é a origem do 
conceito e sim a significação prática dele. 
 
Fica claro que Lutero não tinha nenhuma relação com o ”espírito capitalista”. Pelo 
contrário; declara-se abertamente contra a usura, a cobrança de juros, a ambição de 
ganho material para além da necessidade e expressa uma orientação tradicionalista de 
acordo com conceito original. A vocação aparece como algo que o indivíduo deve 
aceitar como desígnio divino, como missão dada por Deus. Lutero desconfiava da 
autodisciplina ascética e assim a relegou a segundo plano por ser considerada como 
santificação pelas obras. Lutero mantinha um certo encantamento pela vida, uma 
espontaneidade, emoção ingênua, características não presentes na racionalização. A 
contribuição da Reforma foi dar ênfase moral e prêmio religioso ao trabalho 
intramundano. Foram os puritanos que retomaram a noção de Beruf, tornando-a um 
conceito-chave na ética protestante. 
 
Assim sendo, o objeto de pesquisa de Weber é melhor compreendido através da 
investigação de outras formas de protestantismo, onde a conexão entre a conduta de 
vida e a religião pode ser melhor constatada. E é por isso que Weber analisa a prática 
dos calvinistas e das seitas protestantes, por terem tido um papel importante na história 
do desenvolvimento do capitalismo, expressando uma relação entre a vida religiosa e a 
ação no mundo. No entanto, Weber ressalta que isso não significa que seus fundadores 
ou representantes tivessem como objetivo o despertar do “espírito” do capitalismo já 
que “os efeitos culturais da Reforma foram em boa parte – e talvez até principalmente – 
conseqüências imprevistas e mesmo indesejadas do trabalho dos reformadores, de tudo 
aquilo que eles próprios tinham em mente” (ibib., p.81). 
 
A contribuição do Weber é então elucidar o modo como as “idéias” em geral se tornam 
eficazes na história. É entender porque determinadas ações surgem na sociedade. Neste 
caso, o impacto que motivos religiosos tiveram no desenvolvimento da cultura moderna 
voltada para “este mundo” e mais especificamente a Reforma como causa histórica. 
Para isso, explica Weber, é necessário reconhecer primeiro que a Reforma não pode ser 
deduzida das transformações econômicas; e, segundo, que o “espírito capitalista” não 
surgiu somente como resultado de determinados influxos da Reforma, o capitalismo 
como sistema econômico não é um produto da Reforma. A questão é averiguar a relação 
entre os influxos religiosos e o desenvolvimento quantitativo e qualitativo do “espírito“ 
do capitalismo. 
 
 
2.3 O fundamento religioso do ascetismo laico 
 
A análise de Max Weber sobre as formas de ascetismo oriundas do protestantismo se 
focou em quatro grupos diferentes: o calvinismo (particularmente na sua vertente 
puritana), o pietismo, o metodismo e as seitas batistas. O interesse de Weber ao analisar 
essas formas de ascetismo é compreender como as sanções psicológicas de origem 
religiosa condicionaram o comportamento individual rumo à racionalização da vida, 
inclusive a econômica. Há de se notar que nas quatro vertentes supracitadas, existem 
consideráveis diferenças em suas concepções teológicas e religiosas do cristianismo, 
mas que ao fim, por diferentes caminhos, contribuíram para a formação do “caldo 
cultural” que permitiu o florescimento do espírito do capitalismo moderno. A principal 
inovação engendrada pela ética protestante foi o estímulo a um estilo de vida ascético 
nas atividades do cotidiano secular. 
 
 2.3.1 O calvinismo 
 
É no calvinismo que Weber encontra a sanção religiosa mais influente para o 
surgimento da personalidade ascética. As idéias de Calvino ganharam uma projeção de 
certo modo independente da teologia de Lutero, de modo que nos séculos posteriores é 
no calvinismo e não no luteranismo que as principais polêmicas teológicas vão ocorrer 
entre os protestantes. Portanto, se podemos adotar algum “tipo ideal” de ideologia 
ascética protestante, deve-se considerar um fervoroso calvinista como modelo. 
 
A teologia calvinista é reconhecida no espectro teológico pela ênfase na doutrina da 
predestinação. A idéia da predestinação, é bom dizer, não foi uma criação de Calvino. 
Agostinho de Hipona e mesmo Lutero acreditavam na eleição divina dos crentes, porém 
foi em Calvino que a idéia foi levada aos seus limites lógicos. 
 
A predestinação se baseia em outras três doutrinas basilares para a dogmática calvinista, 
a saber, o pecado original, a natureza da providência divina e a natureza da graça de 
Deus. O pecado original, cometido por Adão e Eva, condenou toda a raça humana ao 
distanciamento de Deus. Segue-se que a partir desse pecado, o homem perde todo livre 
arbítrio no que concerne à escolha moral, sendo impotente para seguir o caminho do 
bem (para salvação). O capítulo IX, n
o
 3, da Confissão de Westminster (1647) é clara 
quanto à doutrina: 
 
(Da Livre Vontade) O homem, pela sua queda no estado de pecado, perdeu 
completamente toda habilidade de querer qualquer bem espiritual que 
acompanhe a salvação. De modo que, sendo o homem natural totalmente 
avesso a este Bem e morto no pecado, não é capaz, por seu próprio esforço, 
de se converter, ou de se preparar para tanto. (apud., WEBER, 2004, p.91) 
 
Frente a esta situação, a dogmática calvinista defende que Deus, antes da fundação do 
mundo, já havia previsto a transgressão do homem e, num ato de soberania sobre Sua 
criação, escolheu de antemão aqueles a quem concederia a graça da salvação, enquanto 
que aos demais, deixou que permanecessem no estado de condenação, para 
demonstração de Seu poder e de Sua justiça. Assim sendo, a concepção calvinista da 
providência divina, segundo Weber, se aproxima do ideal hebreu do todo poderoso Iavé 
transcendente, em detrimento do Aba pessoal dos Evangelhos. Deste modo, é 
impossível ao homem perscrutar os desígnios divinos, assim como ter alguma ação que 
possa alterar as Suas deliberações soberanas. E a graça (favor) concedida por Deus 
limita-se àqueles que foram predestinados, na eternidade, para desfrutarem da glória dasalvação, ratificada pela morte do Cristo na cruz. Nestes termos, o “mundo”, ao qual o 
messias Cristo veio salvar segundo apontam os Evangelhos, é o mundo dos eleitos, e 
não a totalidade da humanidade decaída. 
 
Existem muitas controvérsias nos meios teológicos sobre esse tema, fato reconhecido 
por Weber, mas é incontroverso a sua influência na evolução do protestantismo no 
mundo ocidental. O corolário imediato da doutrina da predestinação calvinista é a 
eliminação total da magia como meio de se tocar o sobrenatural. Lutero já apontara 
nesta direção, porém seu pensamento ainda aceitava a validade de experiências místicas 
como autenticadoras do relacionamento com Deus. No catolicismo o papel conferido à 
Igreja enquanto mediadora entre o homem e Deus guardava ainda resquícios de certo 
poder mágico que pudesse alterar os destinos humanos. Destarte, a pastoral católica 
garantia um consolo ao fiel diante das incertezas da vida. No protestantismo, de viés 
calvinista principalmente, todo e qualquer ritual de cunho mágico com fins de barganha 
com o sobrenatural é considerado como mera superstição inútil, visto que os desígnios 
soberanos de Deus não são passíveis de serem mudados pela religiosidade humana. 
Mesmo os sacramentos do batismo e da ceia, considerados bíblicos, são praticados 
enquanto ritual memorial e metafórico, em contraposição da doutrina católica (e 
luterana). É neste viés o calvinismo aprofundou o processo de desencantamento do 
mundo, isto é, uma racionalização cada vez maior do cotidiano em detrimento das 
explicações mágicas dos fenômenos. 
 
Ao nível pessoal, o adepto do calvinismo ficou exposto a uma profunda angústia 
existencial. A questão que todo calvinista levanta para si mesmo e para aqueles que o 
rodeiam é: “se quem predestina é Deus, se nenhum ritual religioso pode alterar meu 
destino eterno, como saber que sou realmente um eleito e, logo, que não incorro num 
auto-engano?”. Para além das querelas teológicas, tal questão se tornou um verdadeiro 
problema pastoral. E foi a partir da pastoral cotidiana, segundo Weber, que dois 
conselhos de suma importância para o tema em estudo foram desenvolvidos: (1) o 
crente tem o dever de se considerar eleito e qualquer dúvida deve ser encarada como 
artimanha demoníaca. Segue-se que duvidar da própria eleição é um indício de uma 
graça imperfeita; (2) o crente deve trabalhar arduamente na sua vocação terrena, pois 
através das obras, a graça recebida de Deus se manifestaria. 
 
Estes conselhos criaram uma forte predisposição psicológica para a dedicação nas 
atividades seculares. Nesta perspectiva, a vocação do eleito é promover e espalhar a 
glória de Deus no mundo, sendo a própria fraternidade cristã entendida sob este prisma. 
Através do trabalho diligente e impessoal o cristão abençoará a comunidade em geral 
através dos frutos de sua dedicação. É nestes frutos que o resultado da graça de Deus no 
indivíduo se manifestaria, e não nos sinais externos ou mesmos internos de piedade, já 
que o coração humano é enganoso. O crente torna-se, assim, instrumento de Deus no 
mundo, o que significa um agir ético nas atividades laborais, um zelo sistemático e 
racional dos bens adquiridos e um estilo de vida baseado na frugalidade, visto que a 
riqueza deve ser utilizada para expandir os frutos da vocação e não gasto com 
divertimentos mundanos. 
 
Portanto, o calvinismo teve um importante papel de justificar moralmente as atividades 
seculares de aquisição e enriquecimento, que em outras formas religiosas eram no 
máximo toleradas. Isto se deu através da retirada do ascetismo racional do ambiente 
monástico do catolicismo e sua imposição na vida diária do indivíduo. É a 
sistematicidade racional da conduta presente nesta forma de ascetismo que gerará as 
condições para a formação do espírito capitalista. 
 
Mas não foi só nas comunidades seguidoras da teologia calvinista que o ascetismo 
racional e sistemático foi estimulado. Tal mentalidade também apareceu em outras 
confissões protestantes, porém com um grau de sistematicidade lógica menor. 
 
 2.3.2 O ascetismo em outras confissões protestantes: o pietismo, o 
metodismo e as seitas batistas 
 
O calvinismo, apesar de sua enorme influência para a constituição da teologia 
reformada, não foi aceita por inúmeros movimentos protestantes. Ainda hoje, nas 
confissões protestantes existe a querela fundamental entre os calvinistas, defensores da 
predestinação, e os arminianos, defensores do livre arbítrio moral e soteriológico. Não 
obstante, Weber demonstra que a recusa de diversos aspectos teológicos da doutrina 
calvinista não impediu a existência do ascetismo racional nas outras confissões 
protestantes. 
 
No pietismo, o calvinismo foi o ponto de partida para o movimento, de modo que a 
certeza da salvação também era buscada no desenvolvimento sistemático da vocação 
secular. Segundo Weber, enquanto essa influência ainda se fazia sentir, o ascetismo 
pietista foi ainda mais rigoroso que no calvinismo. Mas foi no luteranismo que o 
pietismo realmente floresceu, de modo que a doutrina da predestinação foi rejeitada, 
mas o foco na conduta cristã na vida secular era o principal atrativo frente ao relativo 
desleixo comportamental verificado entre os luteranos. Porém, o ascetismo pietista foi 
se arrefecendo conforme o misticismo foi se tornando uma prática estimulada no 
movimento. Assim, cada vez mais a certeza da salvação foi sendo garantida pelas 
sensações emocionais do fiel em relação à divindade. Ainda assim, o fervor estimulado 
pelo pietismo criou tipos psicológicos adequados para a economia capitalista. Nas 
palavras de Weber (2004, p.126), 
 
(...) poderemos dizer que as virtudes favorecidas pelo pietismo foram mais 
aquelas, por um lado, do funcionário fervoroso, do escrevente, do trabalhador 
e do empregado doméstico, e, por outro, do empregador predominantemente 
patriarcal com sua condescendência piedosa. 
 
O metodismo, como o próprio nome já diz, foi caracterizado pela conduta sistemática e 
metódica de seus adeptos, como uma forma de obter a certeza da salvação. O 
movimento, no entanto, não adotou as mesmas bases que o calvinismo para a adoção do 
ascetismo. John Wesley, fundador do metodismo, acreditava que a salvação poderia ser 
alcançada pelo arrependimento sincero do homem, o que imprimia forte conteúdo 
emotivo às práticas litúrgicas do metodismo. No metodismo o ascetismo foi engendrado 
pela ênfase dada às “obras” como uma conseqüência da alma redimida. Em termos 
práticos, isso aproximou o metodismo da conduta prezada pelo puritanismo calvinista, 
visto que a conduta do fiel também deveria promover a glória de Deus no mundo. O 
metodismo foi, na verdade, uma peculiar combinação entre a certeza emocional da 
salvação e a busca metódica da perfeição, que levou a uma conduta cotidiana bastante 
racionalizada. 
 
Por fim, as seitas batistas são outro exemplo da adoção do ascetismo em bases 
teológicas diferentes do calvinismo. Os batistas criam que a salvação era fruto da 
revelação interior do Espírito Santo, sendo o conjunto dos redimidos que vão compor a 
Igreja de Deus (não como instituição). Assim, os batistas esperavam formar uma igreja 
(enquanto comunidade dos redimidos) pura, separada de tudo que é carnal. Faz parte da 
fé batista a crença que a ação do Espírito na alma do homem é precedida pela negação 
de tudo que é irracional (carnal), necessitando a alma estar em um estado de quietude 
para ouvir a voz de Deus. Tal crença foi fundamental para a adoção de uma conduta tão 
racionalizada quanto no calvinismo. Outras características do movimento foram a 
recusa de qualquer associação com o Estado, mesmo no funcionalismo público, e acrítica ao estilo de vida aristocrático como uma adoração à materialidade. Finalmente, a 
honestidade foi uma conduta ética muito prezada pelos batistas, o que nas atividades 
laicas foram de suma importância para a criação da ética que Benjamim Franklin 
apregoava. 
 
Em resumo, Weber se preocupou em demonstrar os fundamentos religiosos que criaram 
as condições para a conduta racional e sistemática que caracteriza o espírito capitalista. 
O ascetismo protestante, em especial no calvinismo, foi resultado de desenvolvimentos 
religiosos que, em maior ou menor grau, eliminaram a magia da religião e colocaram a 
certeza da salvação, ou a conseqüência dela, na conduta diária. Tal conduta deve ser 
voltada para a promoção da glória de Deus no mundo, conquistada na obediência à 
tarefa de desempenhar a vocação do cristão no mundo. Deste modo, a conduta do fiel 
protestante tornou-se racionalmente sistematizada para o comportamento segundo a 
vontade de Deus, que apesar de ser de fora do mundo, tinha que viver no mundo. A 
conseqüência dessa ética para a criação do caldo de cultura do espírito capitalista será 
desenvolvida no último capítulo, adiante. 
 
2.4 O ascetismo e o “espírito” capitalista 
 
Antes de analisar as relações entre o ascetismo protestante e a vida econômica sob o 
protestantismo, Weber (ibid., p. 141) alerta o leitor para o fato de que “numa época em 
que o além era tudo e que a posição social dos cristãos decorria da admissão à 
comunhão, a influência do sacerdote na cura das almas, a disciplina eclesiástica, e a 
pregação exerciam uma influência (...) que nós, homens modernos, somos 
completamente incapazes de imaginar”. 
 
É importante lembrarmos, na leitura do seu estudo, que a Reforma protestante 
aconteceu no final do século XVI, época em que a religião era um elemento central nas 
relações sociais, determinante das condições materiais e simbólicas da existência 
humana. Esse dado é fundamental para compreendermos o impacto social da Reforma 
e, mais especificamente, a importância do surgimento de uma nova ética incorporada 
pelas sociedades ocidentais. O advento do ascetismo protestante teve nessa época uma 
influência sobre os indivíduos e a sociedade muito mais relevante do que 
contemporaneamente ocorre com as novas religiões. 
 
A relação que Weber aponta entre o ascetismo protestante e o capitalismo é reflexo de 
uma mudança cultural longamente depurada, que o autor explicita através das palavras 
de Benjamin Franklin, anteriormente citado, que viveu no século XVIII (1760 a 1790), 
período áureo do Iluminismo, já dois séculos após a Reforma. O “espírito” não é, 
portanto, uma relação direta, intencional e objetiva entre ascetismo e capitalismo. 
 
Segundo Weber, o protestantismo teve a capacidade de interferir no “espírito” da 
sociedade, ou seja, de impulsionar a grande mudança cultural (valorização da vida 
secular e do trabalho) que possibilitou que o capitalismo se modernizasse e expandisse 
nos séculos seguintes. 
 
No capítulo final da obra A Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo, o autor 
aponta algumas influências da ética ascética em determinadas características da 
economia capitalista. A pesquisa teve como base escritos de religiosos, derivados da sua 
prática sacerdotal, sendo o calvinista Richard Baxter a principal fonte. 
 
Os trabalhos de Baxter e outros autores pesquisados por Weber discutem enfaticamente 
a questão do enriquecimento, concluindo que a riqueza em si constitui um perigo, pois 
“suas tentações nunca são contínuas, a ambição por ela não só não tem sentido diante da 
significação suprema do reino de Deus, como ainda é moralmente reprovável” (apud 
WEBER, 2004, p.142-143). O verdadeiro perigo está, para o puritanismo, no “descanso 
sobre a posse”, ou seja, na acomodação possibilitada pela satisfação das necessidades 
básicas e, mais, pela possibilidade de uma vida de “ócio e sensualidade”, ao invés de 
uma vida “santificada”, de constante trabalho em glorificação a Deus. 
 
Mas se o ascetismo a princípio temia o enriquecimento – pelo perigo latente de 
afrouxamento moral – como Weber inferiu a sua influência na fundação de um espírito 
capitalista? 
 
A partir da ética protestante, o trabalho, tomado como exercício da Vocação, que é fruto 
da Graça Divina, ganha novo status num mundo marcado pela religiosidade, deixando 
de ser apenas uma atividade secular, do mundo dos homens, e ganhando o propósito de 
louvor a Deus, ou seja, adquirindo um propósito para além do mundo dos homens. Daí 
que, para o puritanismo, todo ócio, todo o tempo que um homem fiel deixa de dedicar 
ao trabalho na sua vocação, é um tempo perdido para a glorificação de Deus. 
 
Weber faz uma analogia interessante entre a idéia de “perda de tempo” que o ócio do 
fiel representaria, com a perda de tempo para a produção capitalista, freqüentemente 
repreendida no mundo ocidental com a máxima “tempo é dinheiro”, citada por Franklin. 
Essa dedicação ininterrupta ao trabalho teria também a função de precaução contra o 
que o puritanismo convencionou chamar de unclean life – tentações da carne e pecados 
variados que podem ser prevenidos com a dedicação enérgica à Vocação. 
 
A acumulação de capital seria, dentro da ética protestante, uma conseqüência da 
frugalidade do fiel, que é recompensado pela sua atitude de resistência aos prazeres 
carnais com o crescimento de sua riqueza. Além disso, a condenação do “descanso 
sobre a posse”, bem representada também pela expressão “quem não trabalha não pode 
comer”, impõe ao cristão o reinvestimento das riquezas adquiridas e a contínua 
reprodução. A ascese condenava a desonestidade e também a ganância instintiva, 
porém, admitia o lucro, considerado como oportunidade divina. 
 
Nesse sentido, Baxter aponta a importância da racionalização do trabalho, e defende que 
“a especialização das profissões, por facultar ao trabalhador uma competência, leva ao 
incremento quantitativos e qualitativos do rendimento do trabalho e serve, portanto, ao 
bem comum, que é idêntico ao bem do maior número possível” (WEBER, 2004, p. 
146). A ênfase ascética na fixidez da vocação, segundo Weber, propiciou uma 
justificação ética para a moderna divisão do trabalho. 
 
O cristão modelo, segundo a ética do ascetismo protestante, era então o self-made man, 
não um aristocrata pouco afeito ao trabalho duro, mas o homem que soube aproveitar as 
oportunidades divinas, produzindo e multiplicando riquezas, trabalhando duro (na 
glorificação de Deus). 
 
O desejo de enriquecer não era então censurado pelo ascetismo, senão pelo perigo de 
que o cristão deixasse de louvar a Deus e passasse a louvar à carne. Em contraposição, 
querer ser pobre equivalia a querer ser doente, assim o ato de mendigar seria uma 
violação do dever de amor ao próximo. 
 
Porém, a glorificação de Deus através da acumulação de riquezas por parte dos homens 
não se confundia com a liberdade de uso desta riqueza. A ética ascética determinava, 
por suas leis invisíveis, a negação do consumo do luxo, do supérfluo, idealizando um 
estilo de vida confortável, porém sem ostentação. 
 
Da restrição ao consumo somada à liberdade de busca de riqueza, segundo Weber, 
decorre a compulsão ascética pela poupança. As riquezas acumuladas, que não 
poderiam ser desperdiçadas com o consumo além do necessário, eram freqüentemente 
investidas em terras produtivas. Weber destaca que a agricultura era avaliada pelo 
puritanismo como uma atividade particularmente importante. Assim, a acumulação de 
terras para a produção se distanciava da simples posse. Este tipo de acumulação não 
significava a adoção, pelo fiel enriquecido, do modo de vida da nobreza, mas sim o 
proveito e contínuo uso da GraçaDivina. Nesse sentido, a colonização norte-americana 
foi marcada pela contradição entre os adventurers, que pretendiam ser senhores de 
terras, usufruindo do trabalho servil, e os protestantes, imbuídos da mentalidade 
burguesa do puritanismo. 
 
A ética protestante estritamente ligada à religiosidade tornou-se cada vez mais próxima 
ao mundo secular e, conforme Weber, “um ethos profissional especificamente burguês” 
(ibid., p.161) surgiu em seu lugar. A ascese religiosa formava não apenas o proprietário 
dos meios de produção, mas também os trabalhadores sóbrios e industriosos que iriam 
contribuir para o seu enriquecimento. Além disso, dava aos trabalhadores “a 
tranqüilizante certeza de que a repartição desigual dos bens deste mundo era obra toda 
especial da Divina Providência, que, com essas diferenças, do mesmo modo que com a 
graça restrita {universalista}, visada a fins por nós desconhecidos” (ibid., p.161). 
 
Assim, podemos concluir, junto com Weber, que a ética protestante criou o “caldo 
cultural” e as justificações éticas que permitiram, na modernidade, o florescimento das 
práticas capitalistas pré-existentes sobre bases mais sólidas. Quando a lógica do capital 
se tornou predominante, a cultura capitalística se desprendeu de sua base religiosa, mas 
manteve a imposição de sua racionalidade voltada para a produção de riquezas e 
obtenção de lucro. 
 
Mais tarde, o capitalismo pôde dispensar a sanção ética do puritanismo, uma vez que o 
ascetismo foi incorporado às estruturais formais das sociedades modernas, inclusive a 
educação básica e profissional, formalizando nas estruturas do mundo secular o que 
Weber denominou “espírito do capitalismo”. 
 
 
3. Debate e Reflexões 
 
 
Atualmente a ordem econômica capitalista é um imenso cosmos em que o indivíduo já nasce dentro e que 
para ele, ao menos enquanto indivíduo, se dá como fato, uma crosta que ele não pode alterar e dentro da 
qual tem que viver. Esse cosmos impõe ao indivíduo, preso nas redes do mercado, as normas da ação 
econômica. O fabricante que insistir em transgredir essas normas é indefectivelmente eliminado, do 
mesmo modo que o operário que a elas não possa ou não queria se adaptar é posto no olho da rua como 
desempregado (ibid., p. 47-48) 
 
A partir da declaração do próprio Weber de que o capitalismo triunfante dispensa o 
apoio da ética religiosa e das suas frases citadas acima, nos perguntamos, como a ética 
protestante se transforma em ética social? 
 
1) A ética protestante se expandiu agindo no mundo economicamente a partir da 
religião: características como competitividade e sucesso. Este comportamento 
foi então transferido para quem não era protestante, tendo importância em um 
mundo baseado na eficiência. 
2) Torna-se valor moral dissociado da religião. A ação social gera efeitos muitas 
vezes não esperados. Ou seja, ocorre o debate sobre predestinação versus o livre 
arbítrio. A ética social traz consigo o livre arbítrio. O sujeito acredita ser 
autônomo, que decide seu próprio mundo, é juiz da sua própria ação. Age então 
no mundo de forma consciente, decidindo. Isso não está relacionado com 
religião. O indivíduo busca justificar a ação para ele mesmo o que afeta o seu 
comportamento. No mundo da magia não era necessário explicar, mas no mundo 
do desencantamento e da racionalização sim. O conceito de empregabilidade 
aparece então como um importante exemplo da justifica dessa ética que agora é 
social e não mais religiosa. Passa a afetar toda a vida não só a econômica. A 
ética econômica aparece em todos, buscando utilidade, produtividade. O 
indivíduo acredita então ser autônomo, racional e assim promove o bem comum. 
Está presente em tudo, na economia, na ciência e na política. 
 
 
Além disso, podemos perguntar se existe um novo espírito do capitalismo? Quais são 
suas características? Através de que processos este espírito garante sua dominação? 
Quais são os elos mediadores? Existe de fato um novo espírito do capitalismo ou será 
que só houve uma transformação no processo de desenvolvimento do modo de 
produção, consumo e organização do capitalismo e dos argumentos que justificam a sua 
sobrevivência e expansão? 
 
É interessante refletirmos sobre a influência do tipo específico de racionalidade 
econômica surgida do ascetismo protestante na construção do tipo teórico de homem 
que dominou a economia neoclássica (predominante até hoje), que presume-se 
racionalista e maximizador das oportunidades econômicas. Seria possível também 
apontar para a transferência dessa racionalidade econômica das pessoas reais para o 
âmbito das instituições, em particular as corporações oligopólicas, que juridicamente 
assumem status de pessoa cujo sentido de existência é o lucro. As corporações trazem 
um traço de impessoalidade às ações. As pessoas reais que dirigem tais empresas apenas 
seguem as regras do jogo da corporação, mesmo que isso não signifique que elas 
pessoalmente agiriam do mesmo modo: quem não sobe, desce. 
A leitura de ¨O Novo Espírito do Capitalismo¨ de Luc Boltanski e Eve Chiapello 
(2002), por outro lado, traz algumas reflexões sobre a importância do papel da crítica na 
justificação necessária ao desenvolvimento do capitalismo. Os autores analisam as 
mudanças do capitalismo entre 1868 e a segunda metade da década de 1990 na França, 
tentando compreender a forma em que se modificam as idéias associadas às atividades 
econômicas. Ou seja, o que faz com que um grupo grande tenha compromisso com o 
capitalismo, com a acumulação? Quais são as justificativas incorporadas? 
 
Nesse sentido os autores explicam que os argumentos clássicos e neoclássicos da 
ciência economia, a idéia de que capitalismo leva ao progresso material, eficácia e 
eficiência na satisfação das necessidades (o cumprimento do interesse individual leva ao 
bem comum, como critério de bem-estar social), que é um modo de organização social 
favorável ao exercício de liberdades econômicas e compatível com regimes políticos 
liberais, não é mais suficiente, principalmente considerando os atuais níveis de 
desigualdades e injustiças. 
 
Assim, eles explicam que existem três espíritos do capitalismo: (1) no fim do século 
XIX, centrado na figura do burguês empreendedor e os valores burgueses como a 
racionalização da vida, mas que mantinham disposições domésticas tradicionais; (2) 
1930 e 1960 baseado na organização empresarial, industrial, centralizada, burocratizada 
e fascinada pelo gigantismo onde o marketing, a racionalidade e o planejamento a longo 
prazo dominavam e; (3) o capitalismo mundializado com novas tecnologias. 
 
Os autores, como Weber, explicam que o espírito, o que em determinado momento 
possibilitou a acumulação, foi muitas vezes desenvolvido com objetivos distintos ao de 
justificar o capitalismo. O espírito é algo que já está presente na sociedade, já tem 
legitimidade. É nesse sentido que os autores explicam como o capitalismo utiliza-se da 
crítica, de algo que lhe é alheio ou até hostil, para se justificar. O capitalismo se utiliza 
da crítica através de três formas: 
1) A crítica serve para deslegitimar o ¨último¨ espírito do capitalismo. Por 
exemplo, a crítica ajudou a legitimar o processo de transformação do ascetismo 
intramundano para um estilo de vida baseado no gozo imediato através do 
consumo, e não mais a poupança, estimulado pelo crédito e a produção em 
massa. Assim, o hedonismo materialista da sociedade de consumo chocou de 
frente com ascetismo intramundano. Isso teve como resultado uma 
desmobilização dos trabalhadores como conseqüência de uma mudança na suas 
expectativas e aspirações, e assim, uma justificativa para o capitalismo; 
2) Ao criticar o processo capitalista,a crítica obriga seus porta-vozes a se justificar 
em termos do bem comum. Assim, o capitalismo se legitima incorporando parte 
dos valores em nome dos quais foi criticado. Por exemplo: do Consenso de 
Washington para o 2
nd
 Consenso de Washington, o processo de ¨humanização¨ 
do capitalismo onde as Instituições Financeiras Multilaterais (FMI e Banco 
Mundial) adotaram políticas setoriais, escolhendo uma parte dos ¨pobres¨ a 
serem beneficiados, para argumentar a sua preocupação pelo social. Hoje ocorre 
a mesma coisa através da ambientalização das instituições. Ou seja, o Banco 
Mundial está liderando o ¨combate¨ às mudanças climáticas, se legitimando 
frente às críticas ambientais e lucrando delas. Outro exemplo é a 
responsabilidade social e ambiental das empresas. É a crítica sendo colocada à 
serviço da acumulação. 
3) Onde o capitalismo se escapa da crítica plantando a confusão, desarmando a 
crítica. No lugar de incorporar a crítica, muda a forma imediata de obtenção de 
benefícios, deixando a crítica sem saber como explicar o ¨novo¨. Um exemplo 
pode ser a economia verde, argumento central dos governos e das Instituições 
Financeiras Multilaterais hoje para combater o que eles chamam de ¨crise¨ 
ecológica que aparentemente está deixando alguns grupos ambientalistas sem 
crítica, mas que no fundo aparece como uma nova ¨roupagem¨ de um velho 
modo de produção e consumo. Podemos usar como outro exemplo, as Unidades 
de Política Pacificador? 
 
No processo de reflexão sobre o atual sistema capitalista e as suas justificativas, 
também analisamos o trabalho de David Harvey (1989) sobre ¨A compressão do tempo-
espaço e a condição pós-moderna¨. Refletimos assim sobre a possibilidade da 
compressão do espaço-tempo garantir a expansão do capitalismo. O autor analisa a 
transição do fordismo, de acumulação rígida para o capitalismo de acumulação flexível. 
Para o autor, no capitalismo de acumulação flexível, a volatilidade e velocidade 
determinam as ações sociais. Processos como a descartabilidade das coisas, a novidade 
e as perspectivas de obsolescência instantânea, como também a manipulação de opinião 
e gostos, a partir da construção de novos sistemas de signos e imagens, significam ou 
uma alta adaptação e a capacidade de se movimentar com rapidez em resposta a 
mudanças de mercado, ou o planejamento da volatilidade. Se, no modo de produção 
fordista, o trabalho se dava em tempo lógico e subseqüente, no capitalismo pós-
industrial, há uma afirmação do presente. Ocorre uma nova significação do tempo e 
espaço. 
 
A existência de uma aparente ¨sociedade global sem fronteiras¨ muda o sentido do 
espaço que levam mudanças não só nas relações sociais, mas também na visão que se 
tem da idéia de tempo. Ocorre também como conseqüência uma ¨desterritorialização¨ 
por parte de corporações que não se fixam mais em determinados territórios, entram e 
saem de países, buscando menores custos trabalhistas e ambientais e assim maiores 
lucros. 
 
A acumulação flexível envolve transformações diversas: novas maneiras de 
fornecimento de serviços, taxas intensificadas de inovação comercial, tecnológica e 
organizacional; novos mercados; novos setores de produção; novas técnicas de 
distribuição; e aceleração de produção, de troca, de giro de capital e de consumo. Os 
mercados de massa, a circulação crescente de produtos, fornecem um meio de acelerar o 
ritmo do consumo não somente em termos de roupas, ornamentos e decoração, mas 
também estilos de vida e atividades de lazer. Este processo leva resultam em um 
passagem do consumo de bens para consumo de serviços efêmeros como também de 
bens simbólicos como a informação. Acentua-se assim a volatilidade e a efemeridade 
dos produtos, como também das idéias e ideologias, dos valores e das práticas. Essa 
acumulação apóia-se na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados, dos 
produtos e padrões de consumo. Assim, sobrevive quem desenvolve capacidade de 
adaptação e movimentação com rapidez. 
 
Além disso, os sistemas aperfeiçoados de comunicação, mais especificamente o sistema 
via satélite, e de fluxo de informações tornaram o custo e o tempo da comunicação 
independentes da distância. Isso representa outro processo de aniquilação do espaço por 
meio do tempo. Ocorre assim um aparente encolhimento das barreiras espaciais o que 
facilitou a expansão de relações capitalistas. 
 
No mundo de encolhimento de barreiras espaciais e temporais, no mundo das 
tecnologias de informação e comunicação, a difusão de valores e idéias do capitalismo é 
garantida. Harvey então argumenta que a produção de signos e imagens tornaram-se 
mercadorias garantindo o poder de transmitir determinados conceitos e idéias. É a força 
da publicidade, do marketing e das imagens que possibilita uma manipulação de 
desejos, gostos e da opinião pública. 
 
Além disso, no sistema capitalista atual onde tudo é mercantilizado, a tradição também 
é. Isso resulta em uma desreferencialização, fragmentação e insegurança. E aqui aparece 
uma das grandes contradição do atual capitalismo. Quanto maior a efemeridade, maior a 
necessidade de produzir algum tipo de verdade. Assim, podemos argumentar que existe 
uma busca pela religião, tradição, raízes, ou localismo e nacionalismo. 
 
Podemos então nos perguntar se o atual ¨espírito do capitalismo¨ está em crise? 
Podemos argumentar que estamos vivendo uma crise civilizatória, societal, onde as 
bases da reprodução das relações sociais constitutivas da sociedade em pauta estariam 
ameaçadas, onde perdemos referências, valores? Uma época de malestar? 
 
Podemos ainda argumentar que hoje o capitalismo não precisa mais de justificação, 
inclusive porque a sua justificação é a acumulação como fim em si mesma? 
 
O importante é destacar que o que Weber nos ensina em termos teóricos e 
metodológicos é o sentido da causalidade. A importância de entender os condicionantes, 
determinantes das ações dos sujeitos não só entendido como indivíduo no ato; é 
importante entender o sentido buscado na ação construído socialmente onde o indivíduo 
escolhe ou acha que escolhe. 
 
 
 4. Bibliografia 
 
BOLTANSKI, LUC. CHIAPELLO, ÈVE. El nuevo espiritu del capitalismo, 
Ediciones Akal. Madrid, 2002. 
 
HARVEY. David. A compressão do tempo-espaço e a condição pós-moderna. 
In:________. A Condição pós-moderna. São Pauo: Loyola, 1989. Cap. 17, p. 257-276) 
 
QUINTANEIRO, T., BARBOSA, M.L., OLIVEIRA, M.G. Um toque de clássicos: 
Durkheim, Marx e Weber. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.107. 1995. 
 
WEBER, M. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2004

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