Buscar

George Marmelstein – Princípios constitucionais do Processo Civil

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO CIVIL: ACESSO À JUSTIÇA, DEVIDO PROCESSO, ISONOMIA E CONTRADITÓRIO
Por George Marmelstein Lima, Juiz Federal no Ceará
e-mail: georgemlima@jfce.gov.br
home-page: http://www.georgemlima.hpg.com.br
Sumário: 1. Levando os princípios a sério; 2. Princípios: um bom começo; 3. Normas, princípios e regras; 4. Para que servem os princípios constitucionais?; 4.1. Função fundamentadora; 4.2. Função orientadora da interpretação; 4.3. A (ultrapassada) função de fonte subsidiária; 5. Os princípios constitucionais processuais consagrados pelo constituinte de 1988; 6. Princípio do acesso ao judiciário; 7. Do devido processo legal ao devido processo principial; 8. Princípio da isonomia (igualização); 9. Princípio do contraditório; 10. Para concluir.
1. LEVANDO OS PRINCÍPIOS A SÉRIO
A análise dos princípios constitucionais processuais à luz da moderna teoria constitucional que, aos poucos, vem sendo desenvolvida no Brasil, inspirada no direito estrangeiro, é o objeto científico do presente trabalho. 
Por óbvio, não abordaremos com profundidade todos os princípios constitucionais processuais “positivados” no ordenamento constitucional pátrio. O tempo é exíguo; e o tema, de vastidão infinita. Trataremos, portanto, apenas dos aspectos que julgamos mais importantes acerca de alguns princípios.
Dimensionar a importância desse assunto nos dias atuais é desnecessário. Afinal, como sempre ressalta o Professor Luís Roberto Barroso em suas palestras, nada mais é possível fazer de sério e importante no direito em geral e no direito processual em particular, sobretudo após a promulgação da Constituição de 1988, que não passe pela capacidade de trabalhar adequadamente os princípios constitucionais. 
Na verdade, o toque diferencial do operador do direito, na atualidade, é saber manipular os princípios constitucionais, saber compreendê-los, interpretá-los e aplicá-los na sua dimensão jurídica, como instrumento de atuação profissional. O prof. Vicente Ráo, já na década de 50, afirmava que a ignorância dos princípios, “quando não induz a erro, leva à criação de rábulas em lugar de juristas”�.
No momento em que os aplicadores do direito tiverem plena consciência de toda a potencialidade dos princípios constitucionais processuais, certamente teremos um processo mais efetivo, capaz de facilitar a realização dos objetivos maiores traçados na Constituição Federal. O processo, daí em diante, deixará de ser um emaranhado de regras desprovidas de conteúdo ético, “um esqueleto de formas sem carne”, “um instrumento meramente técnico para o cumprimento formal dos preceitos jurídicos-substanciais”, tornando-se um “dado concreto da vida”, “um instrumento ético de participação política, de afirmação da liberdade e preservação da igualdade entre os homens”, onde o número de tombo protocolizado na secretaria será menos importante do que o direito fundamental posto em litígio, e as partes deixarão de ser meros “requerentes” e “requeridos” assombrados com a burocracia cartorária impregnada de “vistas”, “conclusões”, “prazos”, “publicações” etc.
Esse processo fundado em princípios (processo principialista), dará menos importância à técnica formal e mais importância à concretização dos direitos fundamentais.
Não é preciso, em função dessa nova mentalidade principialista, abandonar a técnica. Séculos e mais séculos de evolução científica, desenvolvendo sólidas construções jurídicas não podem, de uma hora para outra, ser simplesmente esquecidos. Como diria BARBOSA MOREIRA, “renegar a técnica decididamente não é o melhor caminho para fazer avançar a nossa ciência, nem para converter o avanço científico em fermento da Justiça”�. O que não se pode é sacrificar direitos fundamentais em nome de dogmas manifestamente ultrapassados e obsoletos, que não mais se coadunam com a mentalidade transformadora e dinâmica do Direito. “Sacralizar” ideologias - principalmente as que idolatram formalismos inúteis em detrimento dos direitos fundamentais - é querer aprisionar o pensamento, o que fere profundamente a própria natureza humana, que tem na liberdade sua nota essencial.
O impacto revolucionário das novas tecnologias - internet correio eletrônico, telefone celular, cabos de fibra ótica, computadores portáteis, fax, software - e dos mais modernos meios de comunicação - TV a cabo, via satélite, videoconferência etc - parece ser incompatível com a segurança jurídica, que é a razão de ser do ordenamento e talvez do próprio direito em sua essência. E é nesse conturbado cenário que surge a importância maior dos princípios constitucionais: servir justamente para guiar o hermeneuta nessa difícil atividade de adaptação do direito posto às novas situações jurídicas que vão surgindo num planeta globalizado completamente diferente de tudo que já existiu e que tem no signo do efêmero sua qualificadora indissociável
Os princípios, em relação às regras, possuem uma grande vantagem: a abertura. Ou seja, o princípio tem uma estrutura capaz de captar as mudanças da realidade”. Eles não são - nem pretendem ser - verdades absolutas ou axiomas imutáveis. Na medida das transformações ocorridas na sociedade, as interpretações dos princípios vão-se adaptando. Por serem “plásticos”, não precisam esperar as alterações textuais (legislativas) das regras para impor ou orientar as decisões políticas dos membros da sociedade. Ou seja, os princípios transcendem a literalidade da norma em que estão inseridos, permitindo que se mude o sentido, isto é, a interpretação dos textos, sem que se precise, com isso, alterar os seus enunciados normativos. 
Os princípios são, pois, neste momento de incertezas e transformações, o estado da arte na interpretação evolutiva, a única capaz de dar vida ao direito. E eles (os princípios) estão aí espalhados por todo o ordenamento jurídico. A Constituição está cheia deles, já que é Lei Fundamental a “ambiência natural dos princípios” (Willis Guerra Filho). Cabe a nós “descobri-los” e utilizá-los de forma adequada e correta. 
2. PRINCÍPIOS: UM BOM COMEÇO
Para discorrermos com segurança acerca dos princípios constitucionais processuais, precisamos compreender, ainda que superficialmente, o que são os princípios�. 
“Princípio” significa, numa acepção vulgar, início, começo, origem das coisas. Não é este, porém, o sentido que adotamos quando dizemos “princípios constitucionais processuais”.
Aqui a palavra princípio conota a idéia de “mandamento nuclear de um sistema”, utilizando a célebre definição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO XE “BANDEIRA DE MELLO” , para quem princípio é, por definição, “mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico...”� 
Some-se a essa noção um aspecto fundamental na caracterização dos princípios na atualidade, ou seja, os princípios jurídicos caracterizam-se por possuírem um grau máximo de juridicidade, vale dizer, uma normatividade potencializada e predominante. “Tanto uma constelação de princípios quanto uma regra positivamente estabelecida podem impor uma obrigação legal”�, na sugestiva passagem de RONALD DWORKIN XE “DWORKIN” . E mais: “violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma [rectius, regra]. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais...”� 
Partindo dessa noção de princípio como norma jurídica, é preciso fazer uma melhor distinção entre regras e princípios, que são consideradas, atualmente, as duas espécies de normas�. O próximo tópico tratarádo assunto. 
3. NORMAS, PRINCÍPIOS E REGRAS
Durante muito tempo houve uma dissociação dos conceitos de normas e princípios, o que leva, ainda hoje, a grandes juristas incorrerem no erro primário de igualar as regras às normas. Graças, em grande parte, aos estudos de ROBERT ALEXY e de RONALD DWORKIN, essa dissociação foi superada, de tal modo que “a dogmática moderna avaliza o entendimento de que as normas jurídicas, em geral, e as normas constitucionais, em particular, podem ser enquadradas em duas categorias diversas: as normas-princípios e as normas-disposição. As normas-disposição, também referidas como regras, têm eficácia restrita às situações específicas as quais se dirigem. Já as normas-princípio, ou simplesmente princípios, têm, normalmente, maior teor de abstração e uma finalidade mais destacada dentro do sistema.”�
Assim, na atual classificação, de cunho pós-positivista, norma é o gênero do qual são espécies as regras e os princípios, que se diferenciam lógica e qualitativamente. Não pode, pois, o estudioso do direito equiparar a norma jurídica às regras. Estas são apenas uma das faces das normas. 
E qual seria a diferença entre regras e princípios?
Mesmo correndo o risco de ser demasiado simplista, pode-se dizer que:
a) as regras descrevem uma situação jurídica, ou melhor, vinculam um fatos hipotéticos específicos, que, preenchidos os pressupostos por ela descrito, exigem, proíbem ou permitem algo em termos definitivos, sem qualquer exceção. P. ex. “aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor” (art. 62 do CPC);
os princípios, por sua vez, expressam um valor ou uma diretriz, sem descrever uma situação jurídica, nem se reportar a um fato particular, exigindo, porém, a realização de algo, da melhor maneira possível, observadas as possibilidades fáticas e jurídicas (reserva do possível). Possuem um maior grau de abstração e, portanto, irradiam-se por diferentes partes do sistemas, informando a compreensão das regras, dando unidade e harmonia ao sistema normativo. P. ex., “todos são iguais perante a lei”.
As regras são “concreções dos princípios”�, e estes, por sua vez, são “mandamentos de otimização”� das regras. Afinal, por trás de toda regra há um princípio que a fundamenta�. 
Importante salientar que tanto as regras quanto os princípios são necessários à composição do sistema jurídico. As regras são importantes na medida em que fornecem segurança às relações sociais; os princípios, por sua vez, permitem a busca do valor “justiça” na solução de conflitos de interesses. Sem as regras, teríamos a indeterminação, a insegurança. Sem os princípios, teríamos um sistema cerrado, legalista e, possivelmente, injusto.
4. PARA QUE SERVEM OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS? 
Os princípios possuem várias funções, sendo que pelo menos três delas são apontadas com mais freqüência pelos juristas: a) função fundamentadora; b) função orientadora da interpretação; c) função de fonte subsidiária�.
Vejamos mais detalhadamente os desdobramentos dessas funções dos princípios constitucionais.
4.1. Função fundamentadora
O princípio, enquanto “mandamento nuclear de um sistema”, exerce a importante função de fundamentar a ordem jurídica em que se insere. 
É importante salientar que os princípios, enquanto fundamento vinculante de conduta, pautam não somente a ação do legislador constituído, mas de também do administrador, do juiz e de todas as pessoas (físicas e jurídicas, públicas e privadas) que compõe a sociedade política.
Veja-se que os artigos iniciais da Constituição Federal disciplinam precisamente os princípios fundamentais do Estado brasileiro. 
4.2. Função orientadora da interpretação
Talvez, empiricamente, a função mais importante dos princípios seja, justamente, a de servir de bússola ao intérprete do direito. 
A cada dia, a função interpretativa dos princípios vem ganhando a sua importância devida. Na atualidade, é bastante fácil encontrar decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal�, unicamente fundamentada em princípios.
Percebeu-se que a lei (regra), pode, na casuística, levar à injustiça flagrante. Aos princípios, pois, cabe a importante função de guiar o juiz, muitas vezes contra o próprio texto da lei, na formulação da decisão justa ao caso concreto. O juiz cria o direito, quer queiram quer não. E nessa atividade de criação do direito ao caso concreto, os olhos do juiz devem estar voltados para os princípios constitucionais. 
4.3. A (ultrapassada) função de fonte subsidiária
Uma das primeiras lições que aprendemos no curso de Direito é que o ordenamento jurídico é completo, sem lacunas. De tal modo que o juiz é obrigado a julgar todas as controvérsias que se apresentarem a seu exame e deve julgá-las com base em uma norma pertencente ao sistema�. 
Então, na qualidade de fonte subsidiária do direito, os princípios serviam como elemento integrador ou forma de colmatação de lacunas do ordenamento jurídico, na hipótese de ausência da lei aplicável à espécie típica. 
Portanto, caso o juiz não encontrasse disposições legais capazes de solucionar um dado conflito, deveria buscar outros meios para dar a resposta jurídica adequada, como a analogia, os costumes e, por fim, os princípios gerais de direito. Os princípios seriam, assim, a ultima ratio: não há lei? Utilize a integração analógica. Não é possível a analogia? Vá às regras consuetudinárias. Costumes não há? Ah, agora sim vamos aplicar os princípios!
Essa mentalidade, porém, encontra-se ultrapassada. Ao se reconhecer plena normatividade aos princípios, estes perdem o caráter supletivo. 
Dessa forma, não é mais tão correto assim considerar os princípios como mera fonte subsidiária do direito. Aliás, é até um erro utilizar o princípio como fonte subsidiária e não como fonte primária e imediata de direito. Ora, desde o início deste estudo estamos enfatizando a força normativa dos princípios, de forma tal que não podemos admitir que o princípio seja subjugado à condição de mero instrumento supletivo em caso de lacuna de lei. É exatamente o contrário: é a lei que deve suprir, ou seja, completar e esclarecer os mandamentos dos princípios. Logo, “os princípios não são meros acessórios interpretativos. São enunciados que consagram conquistas éticas da civilização e, por isso, estejam ou não previstos na lei, aplicam-se cogentemente a todos os casos concretos”�. 
Nossa Carta Magna captou bem essa importância dos princípios ao afirmar categoricamente que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. A contrariu sensu: dos princípios adotados pela Constituição decorrem direitos (fundamentais)!
5. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PROCESSUAIS CONSAGRADOS PELO CONSTITUINTE DE 1988
No final dos anos 70 e início dos anos 80, ainda não se podia “reclamar” um direito substancial justo aqui no Brasil. Temiam-se, quer queira quer não, retaliações naqueles últimos passos do combalido monstro ditatorial. Ser “constitucionalista”, na época, era ser um estudioso de história, ou um filósofo saudosista, fadado a morrer de fome, já que, durante o regime militar, a ordem constitucional foi destruída pelos atos institucionais. O Poder Judiciário, salvo raras manifestações de revolta que foram prontamente punidas, ficou de mãos atadas diante das atrocidades cometidas pelos milicos. A Constituição deixou de representar os “fatores reais de poder”, na clássica definição de LASSALE, passando a mero farrapo de papel inócuo: os fatos riam da norma! É, então, neste momento, que o direito processual brasileiro mais se desenvolve, já que quase todos juristas “progressistas” - no sentido bom da palavra - preferiram o estudo do processo, enquanto forma de libertação, do que do direito substantivo, que, quando justos, coagulavam mortosnos textos dos Códigos ou eram neutralizados por atos institucionais.
BARBOSA MOREIRA, atento a esta peculiaridade, lembra que várias das leis processuais de mais nítido caráter progressista, como a da ação popular, a dos Juizados Especiais de Pequenas Causas e a da ação civil pública, remontam – na edição ou, ao menos, na preparação – à época de Governos militares generalizadamente vistos como de direita�.
Nessa época surgem estudos primorosos do direito processual. ADA PELLEGRINI GRINOVER, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, BARBOSA MOREIRA, KAZUO WATANABE etc são alguns exemplos de juristas que buscaram, no estudo do processo, a solução para um ordenamento jurídico mais justo e participativo.
Não é de se estranhar, portanto, que nossa Constituição Cidadã dedicasse, em seu texto, inúmeros dispositivos de direito processual, ecoando os clamores mais avançados dessas ondas renovatórias que inspiraram profundamente os legisladores constituintes na elaboração da Carta Magna de 88.
Devido processo, contraditório, ampla defesa, motivação e publicidade das decisões etc. tornam-se doravante termos representativos de uma nova era do direito processual: a Era Principialista. 
É certo, porém, que mesmo antes de 1988, nossas Constituições já albergavam o princípio do contraditório e da ampla defesa�, da isonomia, do juiz natural etc. Outros princípios (e.g. o da motivação das decisões judiciais e do devido processo), embora não constassem no catálogo do texto constitucional, já eram reconhecidos pela jurisprudência e pela doutrina.
No entanto, a partir do momento em que a Constituição foi promulgada, o ordenamento jurídico até então vigente foi completamente renovado, e a nova mentalidade voltada à democracia material incorporada ao texto magno impôs uma reavaliação e uma reformulação de conceitos. 
Houve, efetivamente, uma verdadeira revolução na maneira de tratar os princípios constitucionais processuais. Basta uma simples análise na postura doutrinária e jurisprudencial para perceber como foi modificada a maneira de aplicar esses princípios, o que nos leva a concluir que houve, de fato, um avanço substancial sem precedentes no que se refere aos princípios constitucionais processuais após a entrada em vigor da Constituição de 88. 
Na realidade, nossa Lei Fundamental apenas seguiu uma tendência universal (“a worldwide movement to make rights effective”), qual seja, a de constitucionalizar (ou publicizar) as garantias processuais, com vistas a possibilitar a efetividade do processo, “caracterizada como exacerbação da sua capacidade de oferecer à população canais eficientes para o acesso à justiça”�. 
Feitas essas considerações, passaremos ao estudo de alguns dos princípios constitucionais processuais “positivados” na Carta Magna de 1988, em especial o princípio do acesso ao judiciário, ao devido processo, à isonomia e ao contraditório.
6. PRINCÍPIO DO ACESSO AO JUDICIÁRIO
O princípio do Acesso ao Judiciário não é propriamente um princípio relativo ao “processo”, ou seja, não se refere ao desencadeamento sucessivo de atos que compõe a atividade processual. Trata-se, na realidade, de uma exigência “pré-processual”, de cunho eminentemente político-ideológico, mas que, por ser fundamental à própria existência e razão de ser do processo, isto é, por representar uma aspiração de melhoria do aparato processual, pode ser enquadrado como espécie do gênero “princípio constitucional processual”, até porque suas conseqüências irradiam-se por todo o iter processual. Por esta razão, ou seja, por ser um antecedente lógico em relação ao processo, preferimos analisá-lo antes mesmo de estudar o princípio do devido processo, que, como veremos, é a matriz deontológica onde todos os demais princípios constitucionais processuais vão buscar fundamentação.
O pleno acesso ao Judiciário, em sua acepção normativa, encontra guarida no art. 5o, XXXV, da Constituição Federal de 1988: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. 
Algumas críticas podem, de logo, ser feitas à redação do citado texto constitucional. 
Primeiramente, o termo lei (“a lei não excluirá”) deve ser interpretado extensivamente, para que sejam incluídos, obviamente, os decretos, as portarias, as medidas provisórias, as leis complementares e até emendas constitucionais que tenham como finalidade excluir da apreciação do Poder Judiciário certas matérias. Além disso, o dispositivo não deve ser entendido apenas como um aviso ao Poder Legislativo ou ao Poder Executivo, mas, sobretudo, ao Poder Judiciário. Explica-se: se é certo que nem o Legislativo pode editar leis que excluam o controle judicial de determinados atos, nem o Executivo pode promulgar medidas provisórias ou outros atos normativos (primários ou secundários) limitando a fiscalização jurisdicional, é igualmente certo que o próprio Poder Judiciário não se pode furtar de apreciar qualquer lesão ou ameaça a direito, de qualquer espécie que seja. Daí a adoção do princípio do non liquet� (ou da indeclinabilidade), pelo qual o magistrado não pode deixar de julgar, isto é, mesmo que nada tenha ficado provado, ainda que o juiz não tenha condições de dizer quem tem a razão, ainda que não saiba qual das partes é a vítima e qual o algoz, ainda que ignore qual das partes o está o enganando, tem o magistrado o dever de se pronunciar�. 
A par disso, é de se anotar que a palavra direito (“lesão ou ameaça a direito”) também diz menos do que a abrangência do dispositivo pretende alcançar, embora já tenha avançado em relação às constituições anteriores que se referiam apenas a “direito individual”. Impõe-se que seja entendido que não será excluída da apreciação do Poder Judiciário não apenas a lesão ou ameaça a direito, mas também lesão ou ameaça a interesses legítimos, que são aqueles que, embora não constituam direitos subjetivos em sua clássica acepção, merecem a proteção estatal. 
No mais, o enunciado constitucional que dispõe que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário pode ser considerado como um dos dispositivos mais complexos consagrados pelo constituinte. Dele se extraem diversas implicações, que iluminam toda teoria geral do processo, entre as quais podemos enumerar:
a)	a Jurisdição é, em regra, monopólio Estatal, sendo a atividade preponderante do Poder Judiciário, cabendo, porém, ao cidadão a iniciativa de movimentar o aparato judicial (princípio da ação ou da demanda);
b)	o direito de provocar o Poder Judiciário não pode estar submetido à limitações desproporcionais (princípio da autonomia da ação);
c)	o processo deve dar, a quem tem razão, tudo aquilo e exatamente aquilo a que ele tem direito de conseguir (princípio da efetividade da tutela jurisdicional);
d)	o acesso ao Judiciário deve-se dar da forma mais fácil e econômica possível (princípio da gratuidade judiciária).
Em síntese: o processo deve ser acessível, justo, adequado, participativo e efetivo. É um modelo ideal, beirando a utopia, de processo.
Como se pode perceber, um único dispositivo constitucional pode ser vislumbrado em distintas dimensões, que se irradiam por todo o iter processual (desde uma fase pré-processual, que é a facilitação do acesso à justiça, até uma fase pós-processual, que é a efetividade da tutela, passando por uma fase intra-processual, que é o direito de ação). Cada uma dessas dimensões corresponde a um princípio constitucional autônomo, embora a raiz seja única: o acesso à Justiça. 
Atualmente, existe unanimidade no fato de o acesso à ordem jurídica não se limitar a um direito à ordem jurídica tal como posta, ou seja, não é o acesso à justiça “mera admissão ao processo, ou possibilidade de ingresso em juízo”�. Afinal, já se tornou chavão afirmar que para a aplicação de um direito substancial discriminatório e injusto, melhor seria dificultar o acesso à Justiça, pois assim se evitaria o cometimento de dupla injustiça. 
KAZUO WATANABE reflete bem essa mentalidade quando diz que “a problemática do acesso à Justiça não pode ser estudadanos acanhados limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa.”� 
Portanto, a temática do acesso à ordem jurídica justa é uma tendência irreversível do pensamento jurídico moderno, baseado no que CAPPELLETTI denominou ‘a perspectiva do consumidor’, sempre lembrando que as necessidades humanas (do consumidor) são históricas, isto é, transmudam-se no tempo e no espaço e, por isso mesmo, estão em constante transição. Infelizmente, como adverte WATANABE, a perspectiva que prevalece não é a do consumidor, mas a do Estado, quando não do ocupante temporário do poder, pois, como bem ressaltam os cientistas políticos, o direito vem sendo utilizado como instrumento de governo para a realização de metas e projetos econômicos. A ética que predomina é a da eficiência técnica, e não da eqüidade e do bem-estar da coletividade�. 
7. DO DEVIDO PROCESSO LEGAL AO DEVIDO PROCESSO PRINCIPIAL
De todos os princípios constitucionais processuais, o mais importante, sem dúvida, é o do devido processo. O emérito NELSON NERY JÚNIOR XE “NERY JÚNIOR” chega a afirmar que “bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um processo e uma sentença justa”�. Realmente, a garantia do devido processo desdobra-se em várias outras (como a garantia à ampla defesa, ao contraditório, à imparcialidade do órgão jurisdicional etc), que informam toda atividade jurisdicional�. 
A cláusula do devido processo “legal” diz muito mais do que se pode imaginar. É uma norma de encerramento. Início, meio e fim ao mesmo tempo. Todos os princípios constitucionais processuais ou os simplesmente processuais decorrem, ainda que tangencialmente, do princípio do devido processo. Daí dizer que o devido processo “legal” é a matriz deontológica de todos os princípios constitucionais processuais�.
É importante frisar que, desde a Idade Média, já existiam documentos consagrando o princípio do devido processo. O célebre capítulo 39 da Magna Charta libertatum de João Sem-Terra XE “João Sem-Terra” , na Inglaterra, em 1215, já consagrava que “nenhum homem livre será detido ou sujeito à prisão, ou privado dos seus bens, ou colocado fora da lei, ou exilado, ou de qualquer modo molestado, e nós não procederemos nem mandaremos proceder contra ele senão mediante um julgamento regular pelos seus paras ou de harmonia com a lei do País”.
Ressalte-se que a doutrina é unânime quando afirma que a expressão per legem terrae (lei do País) era equivalente ao due process of law. Esboçavam-se, a partir daí, as linhas iniciais do que, séculos após, viria a ser o Estado de Direito. Aliás, a observância ao postulado do devido processo é um dos principais fatores que distingue o Estado de Direito do Estado Autoritário.
A Magna Carta de 1215, diga-se de passagem, era toda escrita em latim, só vindo a ser traduzida no século XVI para o inglês. Dessa forma, como informa MARCELO CAETANO XE “CAETANO” , foi ela “conquista das classes privilegiadas, eram os homens cultos que a invocavam e que dela extraíam o seu conteúdo político”�. 
Embora se diga comumente que a Carta de João Sem-Terra XE “João Sem-Terra” é a primeira a conter expressamente garantias individuais contra o arbítrio estatal, já existe uma corrente mais atual defendendo que o primeiro documento estatal a proteger esses direitos é da Espanha, concedido pelo Rei Afonso IX, em 1188. Nesse documento, ensina MALUSCHKE XE “MALUSCHKE” �, encontram-se, dentre outros, o direito do acusado ao andamento regular do processo e o direito à integridade de vida, honra, casa e propriedade. O certo, porém, é que quem ganhou fama universal foi a Magna Carta. 
Se por um lado os ingleses foram os responsáveis pela noção inicial do devido processo, foram os norte-americanos que melhor souberam extrair e aprofundar o sentido do preceito. 
Naquele país, a cláusula do “devido processo legal’ passou por uma constante evolução.
Numa primeira fase, a cláusula refere-se apenas às garantias de natureza processual propriamente ditas, restritas ao campo processual penal (presunção de inocência, ampla defesa, irretroatividade das leis, vedação de auto-incriminação forçada etc.). 
No campo processual civil, o devido processo lega impunha a instrução contraditória, o direito de defesa, o direito de ser citado, o duplo grau de jurisdição e publicidade dos julgamentos dentre outras garantias, segundo sua concepção originária e adjetiva. Portanto, a cláusula do devido processo legal não visava questionar a substância ou conteúdo dos atos do Poder Público, mas sim assegurar o direito a um processo regular e justo. É o procedural due process.
No entanto, já no Século XIX, a Suprema Corte dos Estados Unidos por meio de construção jurisprudencial e baseando-se em critérios de razoabilidade passou a promover a proteção dos direitos fundamentais contra a ação irrazoável e arbitrária. Estas são, em síntese, a razão do desenvolvimento da teoria do “substantive due process”. O princípio, dessa forma, tem sido aplicado em muitos casos pela jurisprudência para limitar a ação administrativa do Estado na esfera individual e o poder de polícia, garantindo aos cidadãos a proteção contra abusos e a violação de garantias procedimentais e os direitos fundamentais. 
Assim, o devido processo alcançou significados bem maiores do que o simples direito ao andamento regular do processo, servindo, inclusive, como fundamento para invalidar leis e atos arbitrários que restrinjam direitos fundamentais sem fundamento relevante. 
8. PRINCÍPIO DA ISONOMIA (IGUALIZAÇÃO)
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. É o que diz nossa Carta Magna em seu art. 5o, caput, repetindo o princípio da isonomia que já vinha sendo enumerado em todas as Constituições republicanas anteriores, à exceção da de 1891. Não é a isonomia, propriamente, um princípio constitucional processual, mas um princípio que informa toda a dogmática jurídica, ultrapassando os estreitos limites da proteção processual.
O princípio da isonomia está diretamente ligado ao princípio da razoabilidade, pois o que se veda não é simplesmente o tratamento desigual, mas, sobretudo, o tratamento desigual onde não houver razoabilidade para tanto.
Não é, pois, o fato de haver discriminação ou tratamento diferenciado que se estará malferindo o princípio da igualdade. O que ferirá a isonomia será o tratamento diferenciado irrazoável.
Opinião interessante acerca do princípio da igualdade no processo civil é a do jurista gaúcho RUI PORTANOVA XE “PORTANOVA” . 
Na realidade, esse jurista chama o princípio de igualizador, tomando-se como base as desigualdades existentes entre as partes:
“o princípio jurídico, da igualdade ou da isonomia é um princípio dinâmico. Melhor se diria ao denominá-lo princípio igualizador. Ou seja, não se trata de uma determinação constitucional estática que se acomoda na formula abstrata ‘todos iguais perante a lei’. Pelo contrário, a razão de existir de tal princípio é propiciar condições para que se busque realizar pelo menos certa igualização das condições desiguais. É que, havendo, induvidosamente, desigualdades, a lei abstrata e impessoal que inicia em todos igualmente, levando em conta apenas a igualdade dos indivíduos e não a igualdade dos grupos, acaba por gerar mais desigualdades e propiciar a injustiça. Como diz José Afonso da Silva XE “SILVA” , citando Mauro Cappelletti XE “CAPPELLETTI” , está bem claro hoje que tratar como igual sujeitos que econômica e socialmente estão em desvantagem, não é outra coisa senão uma ulterior forma de desigualdade e de injustiça. O emérito constitucionalista não esquece que ‘os pobres têm acesso muito precário a justiça. Carecem de recursos para contratar bons advogados’ (1992, p. 200). Em resumo, não se pode dar guarida a umavisão tradicional e formalista da igualdade que esquece, absurdamente, as diferenças entre os indivíduos, acabando por confundir o princípio da igualdade com o princípio da legalidade”�.
 O processo - segue o jurista - é o local onde o objetivo, mais do que a vitória de um ou outro litigante, é lograr-se uma solução que atenda às necessidades sociais das partes. Não basta que os sujeitos processuais atuem burocraticamente. Importante atentar-se para as características e peculiaridades de cada caso. Em cada auto processual, mais do que um número, existem pessoas humanas que debatem muitas vezes direitos sociais relevantíssimos como a moradia, a alimentação e a saúde. Estes litigantes, para alcançar-se os objetivos constitucionais a efetiva participação, a efetividade e os escopos do processo, não podem litigar em desequilíbrio de forças. A decisão judicial, face à carga política que representa e face a responsabilidade social que lhe é imanente só pode vir após absoluta garantia que as partes litigaram com razoável igualdade de condições. Só assim se terá a certeza que a decisão do Poder Judiciário não foi fruto da esperteza de uma das partes, mas fruto de um debate jurídico igual.
 Por fim, arremata: “É ilusão imaginar-se que todos os advogados tenham a mesma capacidade de defender seus clientes. O interesse público que rege também o Processo Civil está a exigir do Juiz cível a mesma atenção do Juiz criminal. Isto significa não só a promoção da prova independente do requerimento das partes, mas também cuidado com a qualidade da defesa dos interesses da parte. Com desigualdade entre as partes não há imparcialidade judicial, mas conivência na opressão pela via judicial do mais forte sobre o mais fraco. Sem que as partes estejam em certa igualdade de condições de postularem seus direitos (que não raro desconhecem) o contraditório é uma farsa.Definitivamente, o princípio da igualdade é dinâmico no sentido de promover certa igualização das condições entre as partes. Com o princípio igualizador evita-se dentro do processo o excesso e o abuso de poder econômico sobre cidadão, principalmente os menos favorecidos na relação jurídica material e processual.Este parece o passo adequado para que o Poder Judiciário cumpra um dos objetivos fundamentais previstos na Constituição Federal, qual seja “... reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3o, inc. Ill)”�.
9. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO 
O contraditório constitui, sem dúvida, elemento essencial ao fenômeno processual. É imprescindível a participação dos interessados no processo decisório que, certamente, interferirá em suas esferas jurídicas. 
Dizem, inclusive, que o princípio tem uma origem teológica, tendo em vista que, até Deus, no julgamento de Adão e Eva, o teria observado, pois, apesar de sua onisciência, antes de condená-los, os convocou, para que se defendessem�.
Nossa atual Constituição previu o contraditório no art. 5o, LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes”, dando uma abrangência bem maior do que as Constituições anteriores, pois previu a garantia do contraditório e da ampla defesa não apenas no processo penal, mas também no processo civil e no processo administrativo.
O princípio pode ser encontrado, também, em diplomas internacionais de direitos humanos, como, por exemplo, o Pacto de São José da Costa Rica, que, entre as garantais judiciais mínimas (art. 8o), enumera o direito de toda pessoa a ser comunicada prévia e pormenorizadamente da acusação formulada, bem como de participar da relação processual. 
A melhor doutrina entende que a essência do contraditório pode ser sintetizada na fórmula “informação (necessária) e participação (eventual)”. No dizer de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO XE “DINAMARCO” , “a doutrina definiu o contraditório como a necessária ciência, por ambas as partes, do que se faz ou que se pretende que seja feito no processo e possibilidade de cooperar e contrariar”�. Não foge dessa noção, o enunciado formulado por RUI PORTANOVA XE “PORTANOVA” : “é a ciência bilateral dos atos e termos processuais e possibilidade de contrariá-los com alegações e provas”�. Pode-se dizer que, hoje, o contraditório também é considerado como uma imposição contra surpresas dentro do processo.
Sendo o processo o procedimento em contraditório, conforme a formulação clássica de FAZZALLARI XE “FAZZALLARI” , deve-se permitir às partes, no mínimo, a ciência dos sucessivos atos que se desenvolvem rumo à produção do ato final, que é a sentença. Assim, o processo seria um procedimento do qual necessariamente deve-se buscar a participação daqueles, cuja esfera jurídica pode vir a ser atingida pelo ato final desse procedimento.
Na clássica passagem de CALAMANDREI XE “CALAMANDREI” , “(. . .) no processo, o Juiz nunca esta só. O processo não é um monólogo: é um diálogo, uma conversação, uma troca de propostas, de respostas, de réplicas; um intercâmbio de ações e reações, de estímulos e de impulsos contrários, de ataques e contra-ataques. Por isso, foi comparado a uma luta ou disputa esportiva; mas cuida-se de uma luta de persuasões e uma de disputa argumentativa”�. 
Em face disso, não é mais tão correto visualizar a relação jurídica processual como um triângulo, onde o juiz ficaria no ápice; e as partes (“os pólos ativo e passivo da relação jurídica processual em ângulo”), na base da pirâmide. Na verdade, o processo é uma relação linear e aberta, de coordenação, em que o juiz atua, lado a lado, junto às partes, como um “parceiro de caminhada”.
 
10. PARA CONCLUIR
Das diversas conclusões que puderam ser depreendidas ao longo deste trabalho, só uma terá feito valer a pena toda a sua leitura: a importância dos princípios constitucionais processuais para transformar o processo em verdadeiro instrumento de “pacificação com justiça”.
A elevação do princípio à categoria de norma jurídica provoca uma completa reviravolta na dogmática, podendo-se mesmo dizer que a eterna discussão em torno do jusnaturalismo e do juspositivismo está, hoje, superada. Afinal, a partir do instante em que os valores fundamentais (carga axiológica dos princípios) passa a compor o conceito de norma, chega-se a conclusão de que o direito natural está, de certa forma, positivado! Isso é o que está sendo cunhado de pós-positivismo, mas que poderia muito bem ser chamado de pós-naturalismo, ou seja, a aceitação do direito natural numa instância dentro do sistema. 
Pois bem. E o que o processo tem com isso? 
O processo, com a inserção do princípio no conceito de norma, deixa de ser um instrumento pautado no devido processo legal e passa, doravante, a ser uma sucessão de atos guiados pelo devido processo principialista, isto é, assentado nos princípios constitucionais. E se podemos dizer que os princípios constitucionais não fazem da Constituição um documento apenas para a liberdade, mas, numa visão dialética, também para a libertação do homem (Carmem Rocha), fácil é concluir que o processo torna-se, igualmente, libertário. 
Daí, mais uma conclusão importante: se se quiser um direito de libertação, deve-se saber utilizar adequadamente os princípios constitucionais. 
Sobretudo aos juízes é fundamental a compreensão dos princípios constitucionais. Antes de aplicar acriticamente os “rigores da lei”, tal qual um poeta parnasiano do século passado, através do velho exercício mecânico da lógica formal de subsunção dos fatos à norma, o magistrado deve fazer uma análise tópica, empírica-dialética do caso concreto, buscando a máxima efetivação dos princípios consagrados na Constituição, nunca temendo decidir contra legem, mas pro pricipium. Deve, assim, o julgador aplicar os princípios constitucionais, apesar da lei. Se a lei, por acaso, não está em consonância com o princípio traçado pela Constituição, não deve temer em relegar a lei a um segundo plano e concretizar o preceito constitucional. A função jurisdicional,portanto, só terá sentido se comprometida com os postulados constitucionais; do contrário, melhor não a ter.
 Faz-se fundamental, por igual, que o operador do direito “vista a camisa” da função social e transformadora do direito e do processo em particular. 
Nas irrefutáveis palavras de CANOTILHO:
“Quem hoje quiser uma ‘respiração moral’ nas questões constitucionais não pode desconhecer o poderoso movimento jurídico-filosófico, jurídico-constitucional e filosófico-político centrado nas ‘teorias da justiça’, no ‘levar a sério o direito’, no ‘comunicar reflexivamente’ com os nossos concidadãos. Mas não basta um apelo aos princípios. Sob pena de os princípios se transformarem em postulados de um discurso quase exclusivamente moral, é necessário introduzi-los na metódica jurídica para obtermos uma concretização/aplicação rigorosa e eficaz das normas constitucionais”�.
Se isso não é suficiente para se alcançar a plena justiça social, pelo menos servirá como valioso instrumento para concretização dos objetivos maiores traçados pela Constituição. 
Por fim, se fôssemos resumir tudo o que foi exposto em uma única frase, diríamos: Juristas, levem os princípios a sério!
� O Direito e a Vida dos Direitos, 5a ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1999, p. 48.
� Efetividade do Processo e Técnica Processual. Revista da Ajuris 64, Porto Alegre, p. 154. 
� Para uma compreensão mais completa do tema, fundamental é a leitura da obra Conceito de Princípios Constitucionais - Elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada, de Ruy Samuel Espíndola. Da mesma forma, o capítulo 8 (Dos Princípios Gerais de Direito aos Princípios Constitucionais) do Curso de Direito Constitucional (7a ed.) do professor Paulo Bonavides traz uma análise insuperável do tema.
� MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. Ed. RT, São Paulo, 1980, p. 230.
� apud BONAVIDES� XE "BONAVIDES" �, Paulo. Curso, p. 238.
� MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. Ed. RT, São Paulo, 1980, p. 230. Os colchetes são nossos.
� Deve ser ressaltado, ainda, que alguns autores (Perez Luño, Pietro Sanchis e García de Enterria) incluem os valores, ao lado dos princípio e das regras, como espécies de norma. Porém, por transcender aos estreitos limites do objeto desse estudo, deixaremos de tratar dos valores como espécie de normas, preferindo incluí-los como parte componente do próprio princípio, tendo em vista a enorme carga valorativa que nele está inserida.
� BARROSO� XE "BARROSO" �, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, 2a ed. Saraiva, São Paulo, 1998, p. 141.
� GRAU, Eros Roberto. Licitação e Contrato Administrativo. Malheiros, São Paulo, 1995, p. 16.
� A expressão é de Alexy, conforme SANTOS, Fernando Ferreira dos. Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Celso Bastos Editor, São Paulo, 1999, p. 14. Ressalte-se que Alexy é um dos grandes expoentes dessa dogmática principialista que domina os discursos constitucionais da atualidade.
� Dessa assertiva, vem logo à tona a famosa frase do jurisconsulto WACH de que "a lei é mais sábia que o legislador", ou seja, a regra "tem no espírito do intérprete sua usina e complemento de produção" (FALCÃO, Raimundo Bezerra. Hermenêutica. Malheiros, São Paulo, 1997, p. 265). Cabe, pois, ao hermeneuta extrair da regra o sentido que melhor se coadune com a diretriz dada pelo princípio que fundamenta essa regra mesma.
� ROCHA� XE "ROCHA" �, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 4ª ed. Malheiros, São Paulo, 1999, p. 46.
� Sobretudo no controle de constitucionalidade, difuso e concentrado, os princípios constitucionais funcionam como parâmetros a serem aferidos pelo julgador. 
� BOBBIO� XE "BOBBIO" �, Noberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 7a ed. Unb, Brasília, 1996, p. 118. Nosso ordenamento jurídico, positivou esses dois princípios gerais nos seguintes dispositivos: “o juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade na lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.” (art. 126 do Código de Processo Civil); “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.” (art. 4o da Lei de Introdução ao Código Civil)
� PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3a ed. Livraria do Advogado, Porto Alegre, 1999, p. 14.
� Efetividade do Processo e Técnica Processual. Revista da Ajuris 67, Porto Alegre, p. 151.
� Estes restritos ao processo penal. GRINOVER, após afirmar que a defesa protegida constitucionalmente dizia respeito unicamente ao processo penal, esclarece que os constitucionalitas não poderiam extrair do texto outra interpretação, que não a referida (Garantias Constitucionais do Dirieto de Ação. p. 129).
� GRINOVER, Ada Pellegrini E OUTROS. Teoria Geral do Processo. 11a ed. Malheiros, São Paulo, 1995, p. 15.
� O termo vem da expressão latina iuravi mihi non liquere, atque ita iudicatu illo solutus sum (jurei que o assunto não estava claro, ficando, em conseqüência, livre daquele julgamento). 
� PORTANOVA, Ruy. Princípios...p. 92.
� GRINOVER, Ada Pellegrini e OUTROS. Teoria Geral do Processo. 11a ed. Malheiros, São Paulo, 1995, p. 33.
� WATANABE, Kazuo. Acesso à Justiça e Sociedade Moderna. In: Participação e Processo. Coord. Ada Pelegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1988, p. 128/129.
� Acesso à Justiça e Sociedade Moderna. In: Participação e Processo. p. 128.
� Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 5a ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1999, p. 30)
� Rui Portanova enumera cerca de quarenta princípios todos decorrentes do devido processo legal. É certo, porém, que o emérito magistrado gaúcho não pretendeu ser taxativo, embora tenha sido exaustivo. Assim, muitos outros princípios são, certamente, decorrentes do devido processo legal, inclusive, por exemplo, o do Juiz Natural.
� Utilizamos o termo “legal” entre aspas, pois, no nosso entender, o devido processo não se restringe somente à observância dos preceitos legais preestabelecidos, mas sobretudo à observância genérica dos princípios consagrados na Constituição. Daí, a nosso ver, melhor seria utilizar o termo devido processo principial, ou então, devido processo constitucional. Aliás, é interessante observar que o termo inglês "law", do qual proveio a expressão devido processo legal (due process of law), não tem a acepção de "lei" (rule), mas de "direito". Ou seja, a melhor tradução seria "devido processo jurídico". Até porque, o devido processo, nos Estados Unidos da América, graças à evolução jurisprudencial da Suprema Corte, tem uma acepção procedimental ou formal (procedural due process) e outra substancial ou material (substantive due process). A primeira acepção, ou seja, o devido processo procedimental, tem por objetivo apenas assegurar o regular e justo andamento do processo judicial, através da instrução contraditória, do direito de defesa, do direito de ser citado, do duplo grau de jurisdição e da publicidade dos julgamentos, entre outras garantias. Já em sua segunda acepção, de cunho material, tem-se que "a essência do substantive due process of law reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdades das pessoas contra qualquer modalidade de legislação que se revele opressiva ou destituída do necessário coeficiente de razoabilidade" (STF, ADIMC-1755/DF, rel. Ministro CELSO DE MELLO). Ou seja, o próprio conteúdo do princípio do substantive due process vai muito além do que a simples observância dos dispositivos legais, já que as próprias leis podem ser "invalidadas" pelo "devido processo legal", num dialético paradoxo.
� apud BARROSO� XE "BARROSO" �, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas. 3a ed. Renovar, Rio de Janeiro, 1996, p. 98
�MALUSCHKE� XE "MALUSCHKE" �, Günther. Desenvolvimento Histórico dos Direitos Humanos. Themis Revista Esmec, vol. 2, n. 1, 1998, p. 82)
� Ob. Cit. p. 282. 
� PORTANOVA, Rui. Ob. Cit. 288/289.
� O Senhor Deus disse: "Terias tu porventura comido do fruto da árvore que eu te havia proibido de comer?". Há ainda uma famosa frase de um jurista inglês que, fazendo alusão à passagem bíblica, alerta a necessidade de se ouvir ambas as partes: "Gostaria muito de ouvir as razões da serpente". 
� Apud GUERRA, Marcelo Lima. Execução Forçada. 2a ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1998, p. 27. 
� Princípios do Processo Civil. 3a ed., Livraria do Advogado, Porto Alegre, 1999, p. 160. 
� apud. OLIVEIRA� XE "OLIVEIRA" �, Carlos Alberto Álvaro de. O Juiz e o Princípio do Contraditório. Revista da Ajuris 59, p. 309. 
� Apresentação da obra Conceito de Princípios Constitucionais - Elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada de Ruy Samuel Espíndola. 
�PAGE �
�PAGE �4�

Outros materiais