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COMPENDIO - HISTORIA DO DIREITO

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COMPENDIO 
DE 
HISTORIA GERAL DO DIREITO 
OBRAS JURIDICAS DO AUTOR : 
FRAGMENTOS JURIDICO-PHILOSOPHICOS, 1 vol. 
HISTORIA DO DIREITO NACIONAL, 1 Vol. 
OBRAS LITTERARIAS DO MESMO : 
A POESIA SCIENTIFICA, (estudo critico) l vol. VISÕES 
DE HOJE, (poema) l vol. ESTILHAÇOS (versos) l vol. 
TELA POLYCHROMA, (versos) 1 vol. 
COMPENDIO 
OK 
HISTORIA GERAL DO 
DIREITO 
POR 
J. I Z I D O R O M A R T I N S J U N I O R 
Lente Cathedratico da Faculdade do Recife. 
PERNAMBUCO 
RAMIRO M. COSTA & C ~ EDITORES 
LIVRARIA CONTEMPOHANEA 
1898 
A 
 Sylvio Roméro 
O GRANDE JURISTAPHILOSOPHO, 
CUJA OBRA CRITIO-LITTERARIA É O ORGULHO DA ACTUAL 
 GERACÃO BRASILEIRA. 
HOMENAGEM 
De uni dos mais humildes da 
Escola do Recife. 
Du jour où on a connu le sanscrit et entrevu les lois de 
la transformation du langage à travers les temps et les 
lieux, on s'est aperçu que la spéculation pure etait 
impuissante et qu'on perdait son temps à n' étudier qu'une 
seule langue, fût-ce le gree ou le latin. Il en est de même 
de la science du droit. Si elle se livre à la spéculation 
abstraite. elle s'égare; si elle se renferme dans Vétude d'un 
texte unique, fût-ce le Digeste ou le Code Civil, elle se 
condamne à voir sans comprendre. Elle ne peut trouver la 
raison des choses qu'à la condition de n'ignorer aucun des 
monuments de lé' gislation, de les rapprocher les uns des 
autres et de les embrasser tous dans leur ensemble. 
R. DARESTE : Études d'histoire du Droit. 
 
HISTDHH GERAL DO OIBEIIO 
I Evoluçào do Direito e 
leis que a dominam 
Oonsiderado como nnrma agetidi, como coniplexo de regras 
cousuebudinarias ou escriptas, o Direito nâo é sô uni engenlioso 
mffhaninmo regulador da co-existencia social ein tal ou quai griipo 
Jiuiiiîino ; é tambem, e principal mente, uni organismo, mu quasi ser 
estrueturado e vivo, nascendo, evoiuindo e fluando-se en» condiçôes 
détenu inaveis. (1) 
Olhando-o por esse, prisma é que se pôde repetir, coin K. Von 
Jhering, que o Direito «présenta «fcodos os attributos de uni produeto 
natural : a unidade na maltiplieidade, a indivi-dualidade, o cresciinento, 
etc. » 
K é sobretudo nesse ponto de vis!a que se pôde fallar jein mua 
evoluçào juridica, porquauto o lado mechanico e cul-tural do Direito 
presta-se ninito meiios à inanifestaçao desse pheuoiueno. 
Talvez por nao ter attendido ao duplo modo de ser, orga-hnco e 
viechanico, do Direito, foi que 6, Tarde oppoz a idéa de 
(1 ; Vid. Historia do Direito National, pelo ftntor, pags. 8,9 e 10. 
 
OOMTENDIO DE H1HTOKIA 
evolaçâo juridica a de meras tranuformaçOet, determinadas, îa m6r parte 
dos casos, pelo espirito de tmUnçâo. (1) I Real mente, visto no geu aspoeto 
de instituto social, de np-p;trelho regiilador e «Hector fabricado 
voluntariainente para réalisai- na Cidade lui mai la «o accordo das 
vontadea, produziu-do a equaçâo dos intéresses », o Direito pôde 
apparecer-nos desegual, fragmentndo, imitativo, e em miiitos casos 
regrettaioo\ niesnio. 
Nîlo assim si o virntos na sua feie&o fondamental e orga-nloa, conio 
nm prodûéto natural determinndo por fatal idades bio-sbc.iologicas. 
EéimpoKKivnl recusar ver o Direito por esse priant», hoje que OH 
methodoe das scioncias unturaee reunvaram OH estudos soeiaese dominant 
em nbaoluto o campo dos conhecimentos lui-manoa, 
Passaram on tempos em qoe se podia dizer que «o Direito) é nm acto 
do livre-arbitrio, fundado na Ici moral e portait (o lima expansao da 
voutade detorminada pela Intelligeucia. (S) A propria modalidade cultnral, 
apparentement» voluntaria, do Direito, conforme o veinos entre on povos 
modemos. ôbedeee a il Mi deteriiiiiiismo especial. em «pie ON 
antécédentes e o laeio représentai!! o papel principal. 
AMM»ntenios, pois, que te pode fallar desa»sombradameiito de 
umn eeoluçâo jttridictt, d<> inesmo niud<> que se pode fallar de nma 
truluriio dan e*p*d«ê (phllogênin..- on da evolnçao de uma especie 
végétal ou animal detorminada tiuttiygfnUt). 
O niesnio jurintu philosopho que acima Htamoa, o autor do livro Le* 
Traiv/ormaUojtit du Ihoit nfto M auimon a repellir, de modo absolut*, a 
idéa de que se trala. <tejeitando • porito de vista biologico »<» eatudo da 
idéa,-typo do d«M*uvolvintento, pe-diu «Ile MM idéa àê iela da 
mechanica e da loglea, • propo«*«*B a « iudicar os priuçïpaea traçoa da 
emihtçêm <l<> IHrwHm, concebldal coroo uma alta e complexa 
operaçfto de logica noeial.» ; 
«J K K A I . DO DIKEITO 9 
I A eoncepçâo de uni Direito orgnnismo, movendo-se, desenvol 
vendo-se ou evohiindo, no tempo c no espnco, alravez dos povos e dos 
paizes ; uurgindo do plasma piimitivo do facto ou do costume para 
especializar-se nas regras législatives e nos codigos ; liga-se iutiniamente 
a esta outra eoncepçSo da Socie-I dade-organismo, que ê a ceci ta e 
défend ida hoje polos melbores e majores espiritos, em que pesé a G-
uniplowicz, o illustre au-tor da Luta dan riiçu». 
m A Sociedade-organinmo evoluiu e évolue anatomica, mor-phologioa, 
pbysiologica <• psycbologicamenle, por intermedio da luta e sob o 
agnilhao dos elenieutos bereditarios e mesolo-gieos ; o Direjto-
organisnio, visceralinente ligado â .Soeiedade, evoh'ie coin ella e do 
niesuio modo que clin, fazcndo idoufciçà trajeetoria. supporfando egunes 
influeucias e In las, obtendo as mes mas victorias e der rotas. 
fi' esta a lioao dos lac!os ; é este o depoimento da arcbeo-iogia, da 
antbiopok)giu e da historia. 
I Assim, porexemplo, qnando remontainos & phase inicial de 
associacionisnio, em que varies nueleos de iudividuos coiisan-guineos e 
afiins, divididos em tribus e bordas, viviam nomades ou sedentarios, sem 
mua organisacao politiea régular, entregueS exclusivanicnte as 
neeessidndes pbysiologicas da alimenraçâo e da procreacao : vamos 
encontiar types de familia eaboticos e rudiinentares, refleetindo o 
pro]*rio cabos das aggremiacôes primitivas. E' aqii i o hetairisnio, ali o 
nintriarobado polyan-drico, mais longe a polyganiia p.itriarcbal 
endogamiea e exo-gainica e raraniente, ncsle ou uaquelle ponto, o typo 
mouo-gamico da uuiao conjugal. (1) Tu do coufuso e informe, conio o 
envolucro sopial respective H Si enearamos o phenomeno da 
propriedade, vemol-a por 
H (1) Para o fim ijue aqui temos em rista nâo carecemos Raber si promis-
enidade, polyandrie, polyganiia e moiiog-areia dereni ser oonsiderados phases 
rejrnlareu e suoeessivas da evolneâo da familiii. Conheccnios as divergen-oias 
dos antorcs a esse reapeito e saluanos quaoto «5 atacavel n seriaçào de que se 
trata. embora propoata e defendida pela gvneralidadc dos sociolo-Igicos e 
juvistas, 
2 
10 COMPENDÎO DE HISTORIA H 
 .
 
sua vex evoluir, adnptaudo-se snceessivanieutû nos vavios roo-dos de 
coustitnicao social : isto e. vemol-a mobiliaria on im-movel, individual ou 
colleçtiva, colleetiva da fumilia ou dai tribu, conforme as eondieôes de 
existeneia e desenvolvimento dos agrnpamentos sociaes primitivos. (1) 
Foi da familia patriarchal, e posteriormente do clan e da M'ibu, que 
nasceram as primeiras sautcnyas, portauto as pri-roeiras regras de Diieito. 
« Por toda parte, no régime patriarchal, a justica esta no arbitrio dos jimes, 
loi é a decis&o do pae» do chefë dessus aggregaçôes de pessoas, familias 
ou clans que por jnstaposiç&o constituent jâ uni povo nias nâo formaiu 
ainda uuia iiayâo. Isolados os homcus cm grnpos faïuiliarësj a palavra do 
pae é a Ici cm oada casa : é a nnica loi. Depois, aggregadas as familias cm 
clans, coustiluida a nnidadc da villa, os grnpos relaeionamse, e o enefe. 
ré'i, coude, consul, juiss, king, konig, graf, soplietim, etc.-r é coino o pae 
de mua familia mais vasta e o .juiz de «nui asseiubléa mais nniuerosa ; 
mas o seu arbitrio. inspirado pelas Ihàntistes e nâo apeuas caprichoso, é 
ainda a nnica lei, amaueira do que fora a do pae nos limites mais 
acanhados do l'ôro domestico. » (2") 
Os primeiros institntos penaes bu ma nos. taes como o Miâo e a 
vinganya lamilial : o barbare instruinento processnal das ordaliwi wjuizox 
de Dcus, revelam tambem, de modo éloquente, a ligayao intima das 
eoncepeôea e ereacôes juridicas coin o es-tado gérai, — mental, affectivo 
e pratieo—das sociedades cm que ellas surgem. 
Nâo teuios necessidade de mais para nos conveneermos de que o 
Diieito organismo tein, como o organisant social, de qne é commensal, 
uma evolnyao que se pôde déterminai- e cujas leis superiores precisam ser 
estudadas. 
(1 ) Ainda neste ponto devranos advertir qne uào nos préoccupa a questâo de 
sabot si a marcha da evoluçfi" effeetuon-se, nascendo o communismo familial do 
oommunisxno da aldeiâ on da tribn. ou este dnquelle. Basta-nos ter certeza de que 
as dnns formas alludidas ezistiram, tendo alias como con-temporanea e talvez 
como predecessora a propriedade individual mobiliaria. \ enibora exeepcional e 
limitadissima. 
(2) Oliveira Martin» : Qnadro das Instilniçôes primitivas, pâgf. 145, 
 11 
I 
Encarando a qnesrào no se» aspeefco mais gérai, podeuios dizer que 
a lei que préside il evplûçâo do Direito é a mesma que rege a Historia, no 
seu desenvol viuiento secular, e da quai é uni resuino a vida intelleetual 
de cada individno j por isso que jà eni biologia, jâ em sooiologia, a 
ontogênia é uni resuino ou reproduclo individnal da pkilogênia. 
Qualqner que seja a formula ofPerecida para traduzir a rel'e-rida lei 
da Historia, ver-se-lia que o instincto juridico da ha-inauidade adaptou-se 
seinpre as fatal idades da mesma lei. ES uueinos, por exeniplo, a célèbre 
lei dos très estados, forum lada pelo fiindador da Philosophia Position e 
pelo inesmo philosopho lançada eomo alicerce da Sociologia : — Todas 
asl nossas eoncepçdes, qner iiulioiduaes quer collectivas. passant pelos tres 
estados seguintes : o theologico, o metaphi/sico e o positivo. 
Sabe-se que nessa concepçào de Auguste Comte o estado 
theologico caracterisa-se pela predomiiiancia do sobrenatura-lisrao 
religioso na explicaçâo de todos os pheuomenos ; o estado metaphysico, 
negativo e dissolvente, consiste ua explicaçâo dos phénomènes por 
entidades imaginarias, verdadeiros entes de razâo, desprovidos do 
earacter de Divindade ; o estado positivo, eiufim, traduz-se n1 unia 
interpretaç&o do miindo, fornecida pelos processos scientificos, se m 
preoccupaçao de causas originarias ou finaes. 
Dada como verdadeira a lei comteaua, poder-se-ha dizer que o 
Direito perron e tanihem os très estados allodidosf Pa-rece-nos que si in. 
Na India, na China, na Assyria. no Egypto, na Grecia, eut Borna, 
no Péril e no Mexico, para sô fallar das grandes civili-saçôes anfàgas, o 
primitivo Direito, quando nao foi francamente theocratioo, foi 
profundaraeiile theologico. E' o que verifica-remos amplamente no 
correr do nosso estudo, quando tivermos de tratar em particular das 
velhas civilisaçôes referidas, e den- 
 COMPENDIO DK ItlSTOKIA 
tro em ponco, qnando assignalarJUGs a confns&o originaria do| Direito 
coin a lîeligiao e a Moral. 
O periodo metapUysico do Direito foi, e ainda é actual-mente. mua 
realidade ïrrecrisavél. 
Quando, coin o correr dos tempos, os jurisconsultes e phi 
losophe* abri ram brecha, em nome dus idéas de justiça e de 
bumanidndc, no velho rednoto do Direito patriarohal e sagrado, 
comecou para a Jnrisprudencia a phase criticn e dissolvente, 
que do seoalo XV em dennte o espirilo humaiio inieiou, na 
theoria e na pratiea, oontra o regimen eatholioo feudnl. Basta 
recordar a obra dos» prudente* e dos pretor°s no Direito Romane 
para avaliar a importancia da trausformaçao re.nl isada na di- 
iweao a que alludimoa. A cequHm, o jux honorarimn, forain na 
vida jnridica pcoidentail a primeira lunuifcstayao do philoso 
pbisiuo qne (!rotins e sons discipulos transformaram liesse ex-1 
tenso compendio de mi'taphysica qne veio a chamar-se Direito 
Natural, eein que l'allam ainda hoje uiuitosjnristas. 
I O cstado poHtivo do Direito é, pot sen turno, uni facto in-negavel. 
Corrcspondendo a nma coneepçao scientifica do mun-do, que KO em 
ineiados do nosso seeulo nos ponde aer fornecida, elle esta 
necessariameute no seu inicio, e coexiste ainda coin os restos dos estados 
anteriores. Entretanto é indiscutivel que a concepcao qne hoje tomes do 
Direito saturase eada ve* mais de espirito scientitico, isto é. positivo. 
A substitnicao do conneito de um Direito Natural, etemo. iinmntavel 
e anterior ao homeui, pelo de uni Direito hutnano, variavel e évolutive, fil 
lu» das necessidades organicas e cuit limes da sociedade, é o signal da 
crescente e definitiva positiva-e&o das iutniçoes e instituiyôes juridicas. 
Além disse ahi estào as récentes e progrcssivas applicaçôes dos methodos 
das sciencias naturaes aos problemas do direito pénal e mesmo do civil, 
para attestai' a entrada do Direito em uma phase nova, puramente 
naturalistica e scientifica. 
Vê-se que, estudaudo a evoluçâo juridica, poder-se-hia as- j signalar-
lhe conio lei capital a inesma que Auguste Comte deu coino base & 
Sociologia. 
GKRAJ", DO DIREITO 
 
H Mas OH jinistiis nfto Ne téin contentado coni isso, e procura m as 
leis espeeîaes do phénomène que nos estd ocenpando. 
E' assim que G. D'Agnanno, em sen notavel trabalho Lui \genesi e 
Vevoluzione del Diritto Civile, insère uni capitulo des-tinado a esfcndar as 
leis que governam a vida do Direito. I O illustre ci vi lista italiano, 
subordiuaudo-se ao ponto de vista anthropologico que domina toda sua 
obra, aponta a he-rança, o meio, e a Ivta, oomo sendo as lois em qnostao. 
(1) 
Nâo ha d ii vidar que os l'a H os a que se réfère D'Agnanno H&O 
verdadoiros e que tacs factos podem explicar a desenvo-Incâo do Direito, 
eomo parte intégrante do orgauismo social, que, por sua vez, obodoce as 
condiçÔes de licreditariedade, e que In ta. para adaptar-se 
convonicntemente ao meio em que évolue. 
Mas o que torna pou eu apreciavel a explicaeîlo do mestre 
italiano é exactamente a ncnlmma peeuliaridade jnridica das 
leis que elle «présenta eomo doininadnraa das insitituiçôVs rcs- 
peetiv'iiH. Pedindo cinprestadas a os natiu «listas Darwin e Hn>- 
ekel as leis geraes du cvolm/ào das especies, D'Agnanno lez o 
inesiuo que t'aria queiu se limitasse a dizer, segundo a coneepeao 
de Comte, acima ex posta, que o Direito atravessa os très esta- 
dos revelados na Historia durante o evoluir da mentalidade hn- 
niana. ■ 
X estas condiçÔes nâo podemos considérai' as leis de D'Agnanno 
senâo eomo iudicadoras de que o Direito-organisnio évolue do mesmo 
modo, e soi» os inesmos impulses, que a Sociedade-orgunismo ; — 
exactamente eomo na hypothèse da lei comteaua. H Ao contrario de 
Oiuseppe d'Agiiauno, um sen illustre pa-tricio, Pietro Cogliolo, atiron-se 
résolu lamente na pista das lei* technico* e expeeifica* da evoJneao 
juridica. (2) 
(1) Note-se que D'Agnanno, no munmario du capitulo cm que se occupa 
deste luwampto cnunicrti as leis alludidns destc modo ; 1* traditione, 2" crédita-
S'lotta pel diritto ; muH no desejivorrànonto du su» thèse équipant si tradiçâo à 
herança (que iuïo difforcm rcalmcutc) e indien, o umbicnle on meio oomo o 
maior modificador do Direito. ao lado da hereditarieda.de e da lubi. 
(2) Vid. Pietro Cogliolo : Filomfiu del Diritto Privato. 
u ■COMPEKOlf» PP. HISTOUIA 
Eis as que elle fonnulon, clêpois do inquerito a que pvoce-deu nos 
dotai nios da historia : 
0 Direito (• primrtramente formudo un OKXS e ua familim e pouco a 
pouco i tranxferido ao Estado; 
A ewcciiçHo das sentaneos é primeiramente pessodl e dépôts \rwtl 
; M As relttçôt'x juridicas antlgas ne enearuam ntis forma» pro-\ 
eessftae» ; 
Todas a* formas ne modifieam. simplificamlo-se, e passa ado pelo 
estad i» do HIMULATA PEO VBR18; 
Os êodigÔS de uni poco surgnn unqiielle periodo em que os 
eostumes e an regras sâo nmue.rosos e est&o a eorromper-se. ■■ 
Algumas (lestas leis, especiulihetité a 3*. e a 4»., sîlo alta-meutc 
npreciaveis. A preeedencia (la aclio sobre o jus on do Direito adjectivo 
sobre o substaut-ivo, é uni dos facto» mais intéressantes e génies <la 
formucao (lo Direito ; a moditicayào e .siiupli fi cacao graduaes das 
foimas prooessnacs 6, coino veremos daqui a pouco, mua importante lei 
da evoluçao juridica, — loi, alias, jâ assignalada por Pierre Alex, no aeu 
intéressante estndo iutitulado : Le Droit et le Positivisme. 
Ontro antor itaîiano, (i. Carie, l'ai la em mua M de progrès- j sir a 
tspiritualisaeào do Direito, em virlude da quai » força se subordina â 
razâo, o eerto se fax seinpre melhor interprète do ver-dudeiro <■ a 
autoridade procura eada vcz mais o apoio da razâo. « Por forya dêssa lei, 
dix. elle, o Direito veui seinpre se despindo do que tin ha de material e de 
rude mis suas origens para fazer-se de mais em mais interprète bénigne e 
huinnno dos principios de razâo ». 
Podiamos adoptai- pnra e siniplesmente as leis on aigu mas das leis 
propostas por Cogliolo, on a indieada por Carie, simpli-ficando assiiu a 
nossa tarda e pondo remate aqui ao assumpto. Mas parece-nos que 
tomando ponto de vista différente do dos an- j tores da Filosofia del 
Diritto Privato, e da Vita del Diritto pode-remos obter, uesta materia, aigu 
nui cousa de mais simples e de mais précise. 
GERAT. DO DIREITO 15 
TTina vez que considéra mos o Direito uni organismo social «Ni 
tjewrix, nâo é difficil :it(ribuii'-llie um aspecto physiologîco, ou antes, 
aiinlowo-physiologieo e um aspecto morphologico. 
E' o que julgamus necessario fàzer para mais régulai' en-
caminbameiito do traballio que temns cm vista. Vamos pois, indngar 
separadamei ite, 1', quai o modo de evoluçao do Direito o.ncarado como 
organismo activo, dotado de energias fnnceio-naes ; 2; quai o modo de 
evoluçao de suas Formas exteriores. Vejamos. 
Nos primordioB dus vol h as sociedades. avôs da civilisacao, a vida 
collectiva ostentaria o vultuoso polymorpliismo que ve») rificamos lias 
sociedades de hqjeî 
Absolutamente uâo. A confusao mais compléta, o syncre-tismo 
mais absolu to doiuiuavam auquel las epochas as iustitui-çôes soeiaes e 
as relaçôes iiidividuaes ; religiâo, moral, sc.itncin, arte e iudiistria eram 
rai os de um mesmo circulo, coincidiudo e sobrepoudo-se uns aos oiitros. 
A antoridade que autbropomor-pbisava Deus ou os Denses era a mesma 
que estatuia sobre os costumes privados, que dava a e.xplicaeào do 
euigma do m un do, que inspira va. as creaçôes artisbicas e regulava a 
actividade pra-fica. Tu do esta va como uo cabos biblico : escuro e 
araorpho. 1 " Abra-se o Mattava Dharma Saatra, a collecçao de leis de 
Manu, e. ver-se-ba que os sens doze livros te m por objeeto, além da 
creaçâo, da voeaç&o religiosu. das regras de abstiuencia, da penitcncia e 
expiaçào e da transmigra çâo das aimas, mais: o easamento, os modos de 
acquisiç&o, os deveres dos jnizes, as leis ci vis e criininaes, o direito de 
successao e os deveres dos agri-cultores, dos industriacs e dos famulos. 
Quadro somelhante nos offerecem o Zend-Avetita de Zoroas-tro. es 
livros de Confucius, os hierogryphos egypeios, a legis-laçào de Mnysés 
o o livro sagrado da religiâo mahoraetana — o Koran. Em todos esses 
monuraentos da mentalidade antiga ha 
10 COM PENDU) DE HiSTOKIA 
mn f'Oino sinete anagranuuatieo fia religiao. da moral edaartc, 
entrelaçadas an Dire.ito, marcaudn totlas as manifestaçôes (la aetividadë 
social priniitiva. 
K' assitn latnbeui na Grecia, (;m Renia e entre os antigos germanos. 
Na Grecia, diz Ahre.ns, o direito e. a lei u&o se des-taearam iiiinca da 
ethica ; na tlieoria e na pratica o direito e iv politica sào eoiisideiados, 
notadamciite por Platao c Aristo-| te les, conio consti timide siniple.-nu-nte 
mu ramo das sciencias ethiens. 
A se il tnrno os pri moires legisladores ruina nos obedeceram a 
fatalidatle liistoriea. O autor eitado assevera que a priineira epocha do 
direito romano teiu autos de tudo mn earneter re.li-gioso, tïindando a 
nnidade de toda a existeneia e de todas as instituiçôes eom a ligayao délias 
a religiao. B rei'erindo-se aos germanos, escreve: entre os autigos allemaes 
nos vamns achat* mua allianca do Direito e da Religiao analoga a aquella 
que eu-eoiitrainos nos tempos primitives do povo i iu l iano e na velha 
Renia. 
Todos os autores cslâo accordes nesse ponto, e Biagio Brugi résume a 
opini&o dos confrades quando affirma o seguinte : « Xa-quellas 
lunginqnas sociodades, as quaes queiramos remontai*, o Direito, n&o se 
apresenta conio uni eonceito distincte dos outres lados da vida social : ha 
sim mua homogeneidade da vida priniitiva. O Direito confuude-se coin o 
costume, coin a moral e eom a religiao, que envolvem toda a vida do 
individuo, inclusive os principios juridicos. » 
De tudo ifcto verifica-se que no estadio inicial das civilisa-Çôes, o 
Direito nos apparece visceraliuente uuido, ou antes con-fundido coin a 
religiao, a nierai e a arte, pelo menos. 
Mas gradati va mente e dia a dia elle se vae differenciando, 
especialisando, individnando ; destaca-se pouco a pouco da placenta 
conimnm e arroja-se para a vida conio uni ser indepen-dente, automone, 
disponde de vida propria. Dâ-se ocaso, înuito conhecido pelés 
naturalistas, da reproducyao por sisciparidade. 
E essa passagem do complexe para o simples, do homoge-neo para o 
etberogeneo, nao se effectua sô a partir da massa 
GERAT, DO DIREITO 17 
synelirefcica das regras sociaës primitivas até cbegar a accen-tnayâo do 
canon juridico j<l espeeialisado e individualisado. 
Primei rameute é o Direito que se sépara d» Religiao, daj Moral, etc. 
; a differenciacâo é entîlo de natuiezn heteronomica. ISegue-se, poiém, a 
isto a differenciacâo autonomica do Direito, a evohiçao que, sô nelle e a 
partir simplesmcnte délie, se effectua, pela segmentaçâo constante e 
creseente do respectivo organis-1110, sob a aeç&o expansiva das suas 
euergius intimas e ao iufluxo do condicionulismo mesologieo. 
H E é assim que da massa primitivainente homogenea e compacta das 
regras juridicas salie m uo oorrer dos tempos as mo-dalidades diversas 
do Direito : distiiigucm-se o Privado do Publiée, o adjcctivo do 
substautivo pela scparay&o do jus e da aetio (para nos servirmos da 
linguagem romanft); no Privado o houorario ou doutiinario do escriplo, o 
real do pessoal ; noPu-blico o Jnternacional ou cxterno do interuo, etc.. 
(1) 
Glîegados a este ponto, é-nos licito indii/ir, e proclamai'a seguinte 
lei de evoluçâo juridica : 
Organica e phyniologieamtnte} o Direito eeuliie pmaaudn do 
[ttyncretico para o diwreto, do .simples para o componto, do ho-
\mogeneo para o heterogeneo. 
Confirma-se. assiui, ueste particular, a lei fondamental da 
philosophia spenoeriaua. I 
Examineuios agora a desenvoluçao do Direito no tocante a sua 
morphoîogia. 
Nao lia bistoriographo-jnrista que deixe de assignalar ol complicado 
formaiismo do primitivo Direito, em opposiçâo â| simplicidade das 
nossas actuaes regras de processo. 
Todos os povos fornccem-nos documeiitos, mais ou métros 
abondantes, da existencia e predouiinio do symbolisme e das formas sac 
rame n tacs nos primordios da vida juridica. Em Borna, sobretudo, o 
facto é évidentissimo. 
As Institutax de Gaio nos iniciam no segredo das legis actio-\%es, isto é, 
das cinco formas sacraïuentaes a que obedecia o primitivo processo 
romauo (a nacramentum, a postulat io, a condictio, 
(I), Vid. Historia do Direito National, do autor ; introd. 
3 
18 ^ COMPENDIO DK HISTORIA 
a manu» injeetioe a pignoris capio). Modificado este. meclianismo pelaLex 
JRbutia, o régimeii adoptado foi o An* formula- (ad fic-\Ition-em legte 
action-uni) que vigoron até o tempo de Dioeleciauo, sendo entâo 
suplantado pelas cognitiones extraordinariw— ina-j nifcstaçâo ultima do 
direito prnccs.su al entre os romanos. 
Esses très systemas, «spécialmente os dois primeiros, eram 
eminentemente. symbolicos e dramuticos, cbeios de actos e pala-vras 
consagradas, de formalidades e ce remontas rigorosas, iniu-friugiveis sob 
pena de perda da demaiidn. 
H Entre os germaiios o formalismo processual nao teve a fî-l que/.a e a 
rigidez do romano ; mas nem por isso deixou de exis-tir e de impor-se por 
toda parte. (1) Foi em face do phenomeno de que se trata que Frederick 
Pollock, na sua obra Introduction à r élude de la science politique, disse o 
segniutc : «Quanto mais remontamos ao passado mais eneontramos os 
povos esc-ravos do formalismo, e, como hoje diriamos, saerificando total 
mente o fnndo dos negocios â forma. » 
Poderiamos a este juutar mu il os outros testemunlios de mestres 
respeitados. Relembramos, porém, apenas o estadio do simulutu pro verts 
assignai ado por Oogliolo, e a par délie o ,jà citado trabalho de Pierre 
Alex, que explorou o assnmpto com | proficiencia e exgotou-o. 
Resta-nos sômente formulai* a lei que de tudo isso resalta, ' e fal-o-
bemos nestes termos : 
Morphologica ou plasticamente, o Direito évolue simplificando e 
abolindo gradualmente as cérémonies symbolicas e an formas sa- j 
cramentxies primitivas. 
Para nos sao portant o estas, que vimos de formulai-, as dnas 
grandes leis teclinicas e especificas da evolnçâo juridica. Outras 
podevao ser ennociadas e propostas, mas s6 para completal-ns, 
nunca para anuullal-as. H 
Ao fazermos nossa viagem atravez da historia do Direito, havemos 
de aehar, em cada povo e no conjuncto de todos elles, a verdade dessus 
leis, que acabamos de constatai'. 
(1) Vid. ob. cit. do nutor ; introd. 
II 
I Os primcrdios do Direito objectivo nas raças 
inferiores.(*) 
Disse H. Suniner Maine, uni dos inestres (lesta mater i a, que kf as 
idéas rndiiiientares do Direito sa» para o jurisconsulte o que as cainadas 
prinlilivas da terra sao para o geologo : con-teem poteneial meute todas 
as l'or m as que o Direito tomarâ mais1 tarde. » 
A consequeucia a tirar deste îrrefutavel asserto é que o ju-rista-
historiographo deve remontai' taoto quanto possivel aos primeiros dias 
da bnmanidade para surpreheoder no seu surto inieial a sementeira dos 
instiuctos juridicos. 
E nao basta apreciar os primeiros brôtos da arvore do Direito nas 
raças superiores e nos périodes francaniente liistoricos. 
(*) FONTES : D'Affunniio. La genesi e l'evoluzione del Diritto Civile ;| O. 
Miirtins. Raças hum. e a civil, primil. ; Topioard, L'anthropologie; Le-tourneau, 
La Sociologie ; Lubbock. Les origines de la civilisation ; O. Maintins, 
Quadrodas inst. primit, : Spencer, Sociologie ; Laveleye, De la propriété ; 
Letourneau, L'évolution, jurid. dans les div. races hum ; A. Bspinas, Les sociétés 
animales ; Bevilaqua, Contribuiçiiee para a historia do Direito (Re-vista da 
Faeuldade, anno I). 
20 COMFENDIO DE HISTORIA 
Ha necessidade de ir mais longe, visitando com o espirito nao, s6 os povos 
que por defeito organico ou influeneîas do meio esta-caram logo na aurora 
da intell igencia e da cul tara, como tam-bem as régi Ces ante-historicas 
onde o homo primigenius se con-funde ainda com os mais graduados dos 
sens antepassados animaes- 
Pov esta raz&o somos obrigados a tratar a materia deste capital o de 
modo mais lato do que o indicado pela sua épigraphe, lnuitando-nos, 
entretanto, a indicaçôes muito ligeiras. 
Principiemos por affirmai- que sendo o Direito uni a fata-lidade 
social, lima nccessidade organica da vida em co uni m, nao se lhe pôde 
assignaiav mua existeucia limitada ao chamado \reino humiliai da velha 
philosophia inetaphysica. Os primeiros lineamentos rudimeutares de aigu 
mas iustifcniçôes de ordem ju-ridica podem ser encontrados entre certos 
animaes inferiores uos qnaes o instincto de sociabiluiade appareee em grâo 
apre-ciavel. 
Convencido disto disse uni pnblicista notavel : «Todos os animaes 
procriam, algnns cbegam a amar ; todos combatem, al-gnus sentem a 
gloria e o orgulho da Victoria : observam-se che-fes em certos ban dos, 
veeiivse reis nas colmeias; distingue-se faoilmente o medo, embryao dos 
cultos, e quem sabe si no cere-bro dos brutos se nao desenham rudimentos 
de religiao ? » 
Abundaudo no mesmo pensamento escreveu algures o nosso 
eminente collega Clovis Bevilaqna : « Algumas dessas organisa-çôes 
associativas (as dos animaes considerados inferiores) offe- j recem 1 nuit 
os pontos de semelhanya coin as nossas ; pôde-se mesmo dizer que existe 
ahi uni pbeiiomeno correspondent*! ao direito objectivo sob a forma de 
costumes imperiosameute obri-gatoi'ios. E tambem nao lhes poderemos 
uegar a face snbje-ctiva do direito, senao a idéa, ao meuos o sentimento 
juridico, vendo-os combater denodadamente, immolar-se pela defeza de 
sens nucleos associativos, de sens graueis de inverno, de suas cidadelas. O 
direito humano tera uni caracter proprio indnbi-tavelniente : o que se 
affirma é que équivale e corresponde as iusbituiçôes que encontramos em 
estadios meuos elevados da evoluçao do ser. Foi la que se debuxaram os 
primeiros esboços 
GEK.U. DO DIREITO m 
do direito, como ('• là que cm peregrinaçfto descensinunl iremos deparar 
coin as radiculas de quasi todas as art es, e, o que é mais, de quasi todos 
os sentimentos hnmanos. » H Si qnizessemos voltar il nossu thèse do 
Direito-orgauisnio teriamos nesses dizeres mais um argnmento em favor 
délia. Devenu», poréro, prosegnir no deseuvolvimento do nosso assumpto 
actual. 
Assentado que o estndo da enibryogenia juridica é uma 'necessidade 
para a expianayâo desta materia, e qne ella nos for-nece o nixux 
formativus do Direito pondo em relevo os costumes e mesmo os 
sentimentos de certas espeoies animaes, dotadas de forte instincto social ; 
temos precisâo de bnscar, nos grupos hnmanos mais visinhos da 
animalidade ancestral, o desdobramento dos institntos jnridicos iniciaes. 
Para isso é necessario qne tcnhamos :i vista uma classiifca-yao ou 
divisao das rayas humanas, — cotisa que parece facil e que entretanto é 
problema dos mais complicados. Basta notai? que tratando-se de rayas, 
vem a ton a immédiat a monte o célèbre debate sobre a unidade ou 
pluralidade originaria das espeeies bumanas, — a diflicilima queslân do 
monogenUrmo e polygeninmu, ou alites, do tiionophyletismo o 
polyphylrtimw. 
Força é, comtudo, dizer algumas palavras sobre esta materia, 
necessariaincute ligada ao nosso piano de estudo. 
A.té principios do nosso seculo fallava-se geraluiente e con-
victameute de uma experte liumana, o que iuiportava affirmai- à priori a 
unidade originaria de todas as rayas. A Sciencia eaPé davam-se aos ma os 
uesse ponto, e a legenda de Adào tinba fôros | de cidade nos dbiniiiios da 
philosophia. As doutrinas dos naturalistes casavam-se com a tradiyâo 
biblica. 
Cuvior foi o grande defèiisor dessc estado de cousas e seu nome 
symbolisa o intransigente monogenismo classico, de que Quatrcfages, 
em nossos dias, se tornou o mais eminente représentante. 
Agassiz, porém, rompeu com a doutrina dominante e fez-se o arauto 
do polygenismo, susteiitando que as rayas bumanas |nasceram 
separadamente em oito pontos do globo, distiiic.tos uns ! dos outros por 
uma fauna e uma flora propria. 
22 fJOMPEKDIO DE ÎIIHTORI.V 
A questâo parecia insoluvcl quando os modernes traballios de 
Darwin, Wallace, Hœckel e sens discipulos vieram facUitar-v Ilhe a 
sollicita O trausforiuismo de Lamarck, revigoradoe eom-pletado na 
ïnglaterra e na Allemanlia veio Faxer arrefecer o de-bate, niodifioando os 
termos do probleina, que segnndo Topi-nard, sfto hoje os seguiiites : 
«Os typos huinanos mais elementares nos qnaes se possaremontai', 
os typos de al g n ma sorte irrodiictiveis, tenhain elles |o valor de generos 
ou de especies no sentido dudo babitualmente a estas palavras, sahiram de 
varios antepassados anthropoides, pitheeoides ou ontros, —ou dérivant de 
uni sô tronco represen-tado por nm sô genero actualniente conheeido ou 
nâo î Os da-dos da anthropologia pareeem-nos mais favoraveis â primeira 
opiniîio. As rayas melhnr caraeterisadas, vivns on ex ti ne tas, nâo formam 
nma série ascendente unica, comparavel a uni a escala ou a uma arvore, 
mas rednzidus a sua mais simples ex-pressâo a uma série de linhas limitas 
vezes paralellas. » 
E coin Topiuard a maioria dos hoinens de sciencia sustenta 
modernaiiiente a origem polyphyletica das raças e linguas hu-manas. 
Mas esta conqnista scientiftea difticnlton ainda mais o probleina da 
taxinomia ou classificaçao das raças. Desde a antiga divisâo de Linneu (1) 
a té a classifieaçao lingnistica de Fr. Huilier tem-se procurado resolver a 
questâo, se ni que até esta hora se cbegasse a uni aeoordo sobre a inelhor 
das divisées propostas. M As eondiçôes geographieas, os caractères 
pliysipos externos, as partieularidades anatomicas, as aptidôes moraes, as 
diver-Isidades de idiomas -tudo têm si do procurado como base para as 
classificacôes das especies huinauas. Deixaudo de parte os niais antigos, 
podemos citar coino antores de divisôes notaveis : Leibniz, Kant, Morton, 
Agassiz, Isidore Sant-Hilaire, Huxley e Hœckel. 
A verdade, porém, é que a mais simples e uma das mais antigas de 
todas as tentativas taxinoniicas foi a que se enruisou niais ibrteinente no 
canipo de sciencia : reterimo-nos aclassifica- 
(1) Homo sapiens, homo férus, homo mtmstruosits. 
GERAT. DO DIREITO 23 
ç&o de Bluinenback, resninida, ou an tes, redusida por Olivier. 
Distingnindo 1res grandes raças bnmanas (a hranca ou eau est sica, a 
amarella on mongolien e a negra ou ctbiopica) tal ilassi-iieaçào, apezar 
de superficial e aceentuadaniente mouogenista, ganhou até as adbesôes 
dos scientistas ;ict nues, adeptos d;> plu-ralidade originaria das espeeies. 
Para exemplo basfca citar Le-tonrneau, que adoptoua francnuieiite. 
De todos os natiiralistas modernos loi Quatrefages 0 que inclhoi- 
desenvolveu a divisâo ciivieriana. Dos très troneos ci-tados sabem 
respect!vanicnte. os aryanos, seaiilas e allopliylos ; os mongol i.ios e 
oiigria.nos : os negrifos, melnnesios, alVieanos e saabs (hottentotes). 
Tomaudo por base este quadro, ennipre-uos agora iudagar quaes das 
raças indicadas podeiu ser eousideradas inferiuies vo\ ponté de vista do 
desenvol vimento pbysiologico e psycliico. H O citado atitor de La 
sociologie d'après Vethnographie iim-nifesta-se. a respeito de modo 
inequivoco, di/.endo : 
« O typo mais inferior eiu gérai é o typo uegro. Nunea o uegro, 
abmdonado a si niesnio, sein mistura com raças snpe-riores, soube créai' 
uma civilisaçâo elévada. Sob esta relaçîlo o boinein amarello, o mongol, 
é muito superior. Muito eedo os inelbores représentantes deste typo, os 
mongôes asiatieos, loi -niarain grandes soeiedades, sabiamente 
organisadas que, coino a sociedade ebineza. rivalisam coiu as 
civilisaçôes das raças brancas e sob cerfcas relaçôes podem ntê lhes 
servir de modelos. Mesino os inongoloides mais inferiores, os mais 
pobres cm cere-| bro, os a me ri rai) os, souberam, por sens typos 
superiores, dar outrora, no Mexico e no Perd, nofcaveis exemplos de 
progresso social. » 
E' cousa sabida coin effeito que entre os varios grupos do typo negro 
é que se encontraiii os exemplares mais complétas da inl'erioridade 
buiuana, quer quanto â orgauisayâo physiea qner quanto ao desenvol 
vimento psycliico. Espalbado pelaOcea-n ia ( pu puas e wgritos) pela 
Africa (ethiopios on guineauos e ca\ \fres) e por alguns pontos da Asia 
(weddahs e negro» da india) os représentantes desse typo bumano 
começam a ser inferiores pelas condiçôes anatomicas. Todos os 
efclinograplios e antbropo- 
24 COMPENDIO DK HIHTORIA 
logistas assignahtm-lhcs nm enuien alongndo on dolichocéphale» (quando 
muito mcMilicppluiln e $uh-brachic*phnl.o cm certas sub-raças). lima 
front© estreita na base e fugidfa no alto, lima nuta-vel salioneia dos maxil 
lares ( prognat'wnio) aU'm de militas outras particnlaridades osteologicas 
que se nfto encontram notyponma-rello o sobretndo no hranco. 
E' claro que eoiu uni» tal estmetura e sobretudo coin a con-fornia<;âo 
craneana que lhe é propria, o negro na<» pôde possuir nui cerebro 
desenvolvido e npto as mais elevadas funeçôes dessej orgao— séde da 
iiossa vida de relaçao. Suas concepeôes, por-lanto,—religiosas, mornes, 
artisticas, juridieas—hao de ser forçosauiente rndimentares como o 
îespectivo apparelho cérébral. (I) 
Estit démos, pois, os primordios do Diroito cm aigu ILS dos grupos 
mais conheoidos desxa raya. 
Poetas c homeus de sciencia estao de accorde em affirmai' que a 
fome e o amor, o iiistinctu de conservaçao e o de repro-J dueeao, forant e 
sao os dois primeiros e grandes motores do des-envolvimento bumano. 
Délies surgiram a familia e a proprie-dade — dois institutos jnridicos 
fundamentaes. 
Consequentemente vejamos quai é o esta do ou eondiçfio desses 
institutos entre alguus povos negrosdaOceauia eda Afri-ca. Em Beguida 
nos occupareuios das suas intuiçoes e institui-yôes de ordeiu repressiva ou 
pénal. 
(1) Burchell quer que <> bosohimano esteja abaixo de todos os homens ; 
D'Urville dâ esse logar aos australios e tasmanios, Owen aos andamans. Os 
weddahs de quem Dury affirma nâo terem nomes individuaes medem m.1.50 ; as 
mulhercs menos. Os negritos après entam nos sens hnbitos évidentes re-
minisoencias sîmianas. Bowriug vin cm Ceram nma tribu qne vivia nas ar-j vores 
e noton a agilidade corn que o negrito trepa e desce, snspenso polos pés, as 
enzareias dos nnvios. (0. Martins : A» raças Humana* e a civil, primit. vol. II). 
 
GERA t. DO 1MKK1TO 
a) Oceaniu. — Os nsos familiarcs e mntrinionincs das popu-laçôes 
espalhadns pelas mimerosas il bas lia Oeeaiiifi sâo o quej ha de 
maisgrosseiro è rudimeutar. tînindo-se sexual mente de uni modo todo 
animal, more canino, o homciu e a mnlber nào teem, cm gérai, outra 
preoecnpaeao se nào a de dur pasto aos| Sens a petites seusuaes. Nas 
tribus mais atrazadas da Australia, da Tasmania e de Andamuii, o qne se 
nota oomo ponto do par-It ida da sociedade conjugal é mua larga 
promiscuidade ; cele-bram-se até Testas destinadas a annimciar nos 
rapazes e rapa-rigas chegados a certa edade que lhes é permittido 
entregar-se livremente as relaeôes sexnaes. Entre os andainans as nui 
Ibères pertencem a toclos os homens da tribu, seudo para ellas uni cri-nie 
negarem-se a qnalquer délies. 
I Ha entretaiito, no meio disso certas u unies relativamcnte d m'admiras, 
determinadaspela prenlicz da ni i i l l ie re nnscimcuto de uni lillio. Nesta 
hypothèse os progénitures de creanea eon-servaw-se nnidus até que o 
lilho possa alimentar-se pur si. Nisso uada teem os selvageus de sii|)erior 
aoa cliamados irraeionaes, que, coino se sabe, proeedem do mesmo 
modo para coin a proie. 
Ao lado da promincuidade ou hetairismo, que éj pur suai natureza, 
endogamica, encontramos nos povos oceanianos uni processo especial de 
ncqnisiçao de mulbcres a que os au tores diamant exogamico, por se 
eflecluar entre individuos de tribus différentes. O que caractérisa esfe 
proewSSO c o rapto da mnlber, que ora é verdadeiro e brutal por meio de 
uma pancada na ca-beça e arrastamento pelos cabellos, ora 6 
simulado.oii ficticio, eomo entre os tasmanios, segundo affirma o padre 
Bonwick. 
Constitue essa pratiea uma forma de casaineuto, destinada a 
c on s t i t u i r familia regularf Peusaïuos coin Leloiirncau qne isso que os 
viajautes tem impropriauiente cbamado casameuto é « apenas a captura 
de uma escrava, que sein duvida poden't servir aos prazeres amorosos dodouo si elle o qnizer, pois que ella é seu animal domestico, sua 
propriedade, uni ser (pie elle tem o direito de bâter, ferir, matai-, e 
mesmo, segundo a necessidade, de corner. » 
£111 todo caso a apropriayao das mulberes pfelo rapto reall 
ou ficto dâ logar a uni certo esboço de relaeôes familiales, mais 
4 
26 COMPENDIO DK HI8TORIA 
extensas e profundas qiïe :is (las uttiôes livres endogamieas. Militas vt'/.cs 
as duas tribus a que pciteneem mptor e raptada' eonsagrain pybTicàuiciite 
a uniâo dos dois por nicio de festas e banquetcs, e até em algumas 
celebrum-se certas ceremonias es-! peciacs, como a de amarrai' os 
con,juges sV mosinn arvore, qué-brando a anibos o mcsmo dente iucisivo. 
Por toda parte a miilhcr e propriedade do honieni que a toinou para si 
e que tant o direito de toinar quantas queira, pois que a polygamia é o 
costume dominante. Alguns chefes de| tribus, Bobrctudo, possuein 
centenas de mulheres, sendo uni pequeno numéro de légitimas (cujos 
lilhos sào os unieos reco-nlice.idos) e a maioria do eoncubinas ou 
escravas, — todas ellas passiveis de quaesquer encargos e desprovidas de 
quaesquer direitos. 
Todavia esse ente rebaixado e nullo é, dcbaixo de eerto Iponto de 
vista, superior ao iiomem e dominador da l'ami lia, po-| dendo-se 
perfeitamente l'allar de uma gynecocracia geral'entre os povos de que nos 
oecupainos. O facto da maternidade sendo o unieo eerto para déterminai1 a 
filisiçâo c o parentesco (dada a promiscuidade e as pratieus adulterinas 
limitas vexes i m postas i'is mulberes pelos pi'oprios maridos) acontece que 
o matrîar-chado ea nota dominante lias tribus océan binas. Nas uniôes 
exogamicas, os lilhos pertencein â tribu de sua mâe e nâo & de seu pae, e 
îuesnio mis endogamieas o pae e o fil ho nao sào con-siderados como 
parentes., cabendo, quasi seinpre, a niutio a au- j toridadc patenta. 
Em rosunio. e para encerrar esta materia, digamos coin o autor de La 
Sociologie (Va-j-rèn Vethnographie, o quai nos tem ser-vido de guia na 
présente explanaçâo : «Os costumes melanesios fazem nos assistir â 
origem do casameuto ua raça. Ha a prin-cipio uma promiscuidade 
compléta, subsistindo ainda maison imenos larganieute nos diverses grupos 
ethuicos; depuis a rari-dade dus mulheres e a necessidade de uma ou varias 
lestas de cargn levaram a praticar tanto quanto possivel o rapto exoga-l 
mico, a principio coin extrema violenoia. Posteriormeiitc as tribus 
iiiteressadas ratifiearam, dépôts de exaine e por conveni-îlo| débat ida, o 
facto consummado. Mas scmpre a polygamia foi 
«KR\I. DO DfREITO 27 
1 ici ta ; sempre a miilber foi a propriedade do do no, nào poden-do ser-
lhe infiel seuâo qnando elle o ordenava ; nao tendo jamais o direito de ser 
ci osa de sen mai ido e estando sempre exposta a todos os inaos 
tratamentos que elle llie qnizesse infligir. » 
Pnssemos agora a observai- o phenomeno da propriedade) entre os 
oceanianos. 
Como veremos no correr de nossa viagein liistorica, o col-
lectivisnio é o caracter dominante da propriedade priinitiva. Conforme 
observa uni autor, emqnauto nos agrupamentos hu-niauos o nexo 
associaiivo repensa sobre o principio de consan-guinidade e nào sobre o 
da contignidade local, a familla, a gens, o clan, a horda, a tribu possuem 
moveis e imnioveis em com-nium, podendo se qnando mnito fallar no 
dominio individual de certes utensilios, adornos e armas. Nem entre os 
povos nomades, eaçadores ou pastores, se pôde coin p relie nder a 
apropria-yâo individual da terra. 
Xa Oceania, entretanto, vamos encontrar o caso singular da 
existcncia' da propriedade individual reeabindo sobre a terra. O facto foi 
assignalado por Eyre, o autor do importante tra-balbo Discoveriex in A 
uxlralia e fcem sido coufirniado por ontros etlinogi-aplios, como 
Letonriieau, que a proposito escreve estas palavras : «é curioso acbar em 
unia das raças mais inferiores da humanidade a propriedade individual e 
alienavel ; isto é, tal quai existe entre os povos modernos. » 
Cuuipre notar, porém, que é sobretndo ua Anstralia e na Nova 
Caledonia que se dâ o facto alludido. Em miiitos outros pontos da 
Oceania a regra gérai é o collectivismo da familia ou da tribu- Entre os 
tasmaniauos, por exemplo, a propriedade territorial, pessoal ou 
individual, nào existe. O que existe é o dominio venatorio da borda ou 
tribu, isto é, a cxteusâo de terra necessaria para a caça, de que vive a 
communidade. E essa terra é propriedade indivisa da commiinhao. 
A propriedade individual australiana inanifesta-sc do se-guintc 
modo: cada individuo do sexo masculiuo possiie uma| parcella 
determinada do tcrrifcorio da tribu, e tem o direito de vender. trocar c 
repartir sua terra entre sens lilhos. 
O mesnio se dâ em Ko va Caledonia, onde todo boinein, pos- 
28 COMPENDIO DE HISTOEIAl 
sue nma extensâo mais ou menos consideravel de campos culti-vados. 
Aqtii o caso do individualismo domanial é menos extra-nbavel qne o da A 
nstralia, pois os ueo-caledonios sâo, era gérai, agrie-ultores e n&o 
caçadores. 
Reduz-se a isto o que sabemos do institnto da propricdade entre os 
oceanianos. 
I 6) Africa. As institniçôes familiares das numerosas tri-j bus africanas sâo 
fnndamentalmeute semelhantes as dos povos da Oceania. Entretanto a 
promiscuidade e o ebamado casa-inento pelo rapto s&o, no grande 
continente negro, mais raros do que entre os australianos e melanesios. Por 
outro lado o'| regimen do matriarchado appareee-nos aqiii mais nitido e 
des-envolvido. 
Nas populaçôes da Costa de Gui né, no Sénégal, eni Loanda, uo 
Congo, o purentesco femiiiino on de procedencia materna é a| regra gérai. 
Tambem na Africa central prevalece identico re-Igimen, de moda a 
transmittir-se a soberania ao fllho da irmâ- do soberano e nâo ao deste* Em 
algnmas tribus guinéanas quando a mâe é escrava os fdbos sâo tambem 
escravos, inda que sen pae seja o chefe ou rei da tribu. Sempre obedecendo 
ao mesmo priucipio os filhos dos Kimbnndas perteucem ao tio materno, 
que tem o direito de vendel-os. Entre os Goinmi o filho de uni boniem da 
tribu e de nma inulher estraugeira nâo é Commi ; é estrangeiro como sua 
mâe. Os Tuaregs, por sua vez, obedecem a preoceupaçâo de que «é o 
ventre que tinge ofilbo». A criança tuareg é apenas filbo de sua mae : 
nobre si a mâe é nobre, es-eravo si a mâe é escrava. Além disso os bens 
adquiridos pela familia, de caracter collectîvo, sâo berdados pelo 
primogenito da irmâ primogenita, boni preterieâo dos proprios filbos da 
de-funta. 
Quanto ao regimen das uniôes conjugaes, deparamos corn U808 
muito variados, entre os povos da Africa negra. J& obser-vâmos que o 
casamento exogamico pelo rapto ou captura existe em algumos tribus, 
mas nâo é ali o mais geueralisado. Coin effeito, na môr parte das 
popnlaeôes africa nus a comprit toma-o logar do ronbo, o contracte 
oneroso substitue a violencia na constituiçâo da sociedade conjugal. 
Assim na Hottentocia os 
GKR.U. IX) PIREITO 29 
pues (la n i i i l hc r nubil trocnm-n'a amigavelntente por mua rez, 
considéra «do o ca sautento como nm aoto puramenfe commercial, 
résoluve] a vontade e desprovido de qnalqner sanccao. Os ca-fres 
coiuprani suas esposas aos pars desde que cl las salient dai prime ira 
infancia. Entre os Timatiis e Mandingas a mnlher n&o é consultadn 
iiunea para o cnsaniciito ; os pretendentes as compram aos paes, fazendo 
o pagamento eni espeei arias diver-aas. As hordas do Gab&o vendent as 
tillias desde a edade de très ou qnatro minus e os eompradores l'a zem-se 
sens ninridos ao eoiiipletarein ellas doze ou treze an nos — epocha 
normal dit tm-hilidadc feminina entre as populaeôes alricanas. 
A polygamia é por toda parte admittida como na Oceania, e do 
ntesnio modo qne ali a mnlher é seinpre propriedade do| marido, qne 
pôde usar da pessoa e serviyos délia segundo os sens capriclios. tendu o 
direito de puniro seu adulterio eom a mutilaç&o de nui metnbro ou eom 
a morte. Eni certas tribus o divorcio é permittido quer A iiiullier quer ao 
marido, mediante.] compe-nsaçôcs ajustadas. 
S&o estas asprincipaes iustituiydes atVieanas. eni materia de l'a mil 
ia e easameuto. Vejainos as eondicôes da propriedade. *-*. 
Ao contrario do que viiiios na Austral ia, vamos ver ua Africa a 
propriedade territorial indivisa e collectiva. Quanto a movel, aqui, como 
ali, lia o comniunisnio e o iudividiialisiiio — este para os objectas de 
me.ro uso pessoal. H Os calres, ja. agricultores, alias, attribuent a tribu o 
dominin do territorio aravel, e nuia vez destribuido este entre os nieni-
bros da commiitiidade pelo cliefe, cada porçâo de solo distribui-(la [tassa 
a ser propriedade collectiva da l'ami lia que aadqneriu. Entre os Yoloff's, 
u ici ou chel'e, assistido de uni couselho de aucioes, reparte anntialmente 
pelas familias os lûtes de terras a cultivai". 
Ha entretanto regiôes da Alïica equatorial eni que parece nâo baver 
idéa de uuia propriedade territorial, seja collectiva seja individual. Sao as 
habitadas pur certas tribus muito pouco sedentarias que construem uma 
aldeia ltoje para queimul-a amanliâ, si uma doença qnalquer produz mua 
baixa entre os sens. Para taes tribus a propriedade ou riqneza comuiuni 
con- 
30 rOMPBNDIO DF 1ÏIHTORIA 
siste priiicipalmente na porfsè do maioi- numéro de mulliPres e| 
escravos. I 
Como se vê, nâo é possivel encontrar entre os negros da Afriea um» 
coneepçao précisa do doininio. como facto juridico. Podemos affirmai* 
talvez que o union direito de propriedade de que elles terni idéa é o do 
mari do sobre a mullier, proveniente da compra desta. Debaixo deste ponto 
de vista os negros austral ianos e neo-caledonios levam vantagem nos da 
Afriea. En-tretanto estes sao snperiores a aqnelles 110 que diz respeito ao| 
desenvolvimento das instituicoes familiaes e sobretudo no régi inen do 
casaniento, que deixa de ser nm producto da força para tornar-se mn 
contracto de compra e venda. 
Inntitufos pennes oceano- a/ricos. 
Por mais atrazados que sejam os différentes povos da raça negra, 
força é convir que os principaes délies cliegarain nao sô| a esbnyar a 
familia e a propriedade, como a coneeber e réalisai*I nlguinas instituicoes 
do que nos chaînâmes direito publico. A existencia entre elles de chefes ou 
reis e de assemblons e eonsc-Ihos das tribus encarregado de dirigir ou de 
julgar, segnndo «s usas ou costumes dominantes, nao deixa duvida a esse 
respeito. j 
Assim, anteriorniente a essa phase é provavel que a vin*l ganya 
individnal fosse a regra em materia de pénalidadc ; mas nôsjâ encontrainos 
regularmentada essa vingança, que foi trans-ierida do homein para a tribu, 
fazendo-se gradnalmente collecta va. 
Entre os ausfaralianos, por exemplo, assignalain os cthno-graphos a 
existencia, cm cada horda, de uni eonselho (teudi) que fnucciona como 
tribunal de justiya e cujas decisôes sao defini-tivas e obrigatorias. E' esse 
tribunal, composto dos mais velhos da tribu, que toina conhecimento das 
trausgressôcs dos usos eonsagradose décréta as pénalidades respect! vas. 
O furto, o ronbo, as lesôes corporaos, o assassina to sao os I actes 
gérai mente cousiderados cornu criniinosos. Tambem o adultérin o 
é, mas nao como figura criminal distincta ; sim coiiio uni furto ou roubo de 
natureza espeeial. 
Para tacs crimes, com excepcâo do hoinieidin, us pciins sfto, em 
regra, as bastonadas, os golpes de lança, os tiros de flecba, 
GERAI. DO DIREITO m 
iipplicados segundo o principio do tali&o, isto é, produziudo no i"éo, 
(auto quaiito possivel, o mal (eifco ao oifendido. Aigu nias vezes é por 
meio de duellos entre offciisores e victimas que se effectua a pénal 
idade. Termina o duello desde que o offenser e ferido. 
Onde b laliào se toron eoinpleto é no caso de pena)idade por 
lioiiiif idio. Quer o assassine pertença ao clan, quer seja (le t r i b u 
différente, a morte é purçida eom a morte. Mas a pena uâo (cm uni 
earacter pessoal ; o verdadeiro oriniinoso raraS ve-| zes ]>aga per si o 
crime counnettido. B' son irmào mais vellio, seu pae ou um seu parente 
proximo, do se.xo masculine, queni 11* m de ser victinnulo pela 
sentenea do tendi; sô na lai ta do quai quer délies lecalie a pena sobre o 
verdadeiro liomicida. Sise (rata de uni assassïnato por iudividno de outra 
tribu, os inciii-bros da do morte décrétai» o l a l i à o contra todo o clan do 
assassine e sàii todos solidarios na exeençâo. Conforme a jerarcliia d" 
assassinado, maior ou menof numéro de victiiuas estrangeiras lem de ser 
saeri/ioado. 
H Explicam-se estes t'actos pela nalureza. especial dos agritpa-nientos 
tribaes, onde o i u . l i v i d n o desapparece na collectividade,| onde a nocîio 
de personalidade nao esta, aiuda nilidamenle l'or mulada. 
Na Al'rica as regras ou anles OE costumei penaes differen-eam-se, 
embora nao fundanientalmente, dos da Australia. Viinoaj que a vendetta 
primitiva, exerci<la por ineio do desfbrço pessoal, ja uâo appnrece entre 
os a n si rai i an os ; entre os afrieanos, po-réni, cl la coexiste aiuda eom a 
regulamentaçâo instituida pelos elie(es. Km conipensacao encontramos 
na. Afriea uni progresso sobre o taliîio australiano ; cm alguiuas tribus e 
em certes cases adinitte-se como substitutive da pena a eoiuponiçâo, on 
compen-8'içao em val ores. 
O quadroda cri m inalidade entre os al'rica nos, é uni poueo mais 
lato que o de sens irmàos da Oceauia. Entrelanto as prin-cipaes figuras de 
crimes sfw> as que ali notàmos e mais a feitiça-\rui. O roubo e o 
adulterio, sobretndo, sâo as mais notaveis, por isso que sîlo as mais 
terrivelmente punidas. Digamos desde jâ que a puniçao, qnando nao é uni 
restiltado da vingança pessoal 
•* 
32 OOMPENOIO DE HISTOBT& 
o directn, 6 imposta petos rois ou ehefes de tribus, que, segundo «eu 
arliitrio, onveiu on n&n uni Oonselho de velhos. Compre-bende-se isto, 
uinn vez que sis tribus-nfricanas sao, em gérai,| monarcliicas. 
H O roubo aoarreta a pena de morte, luesiao quando seja de; uni objeefco 
de peqne,uo valor. E' assim no Congo e é tanibem assim entre os 
Vuazaramox du Africa Oriental, que décapitai» o eriuiinoso e, expôe.m 
Ihe a eabeça na entrada do aldeiamenfco. Note-se. poréiii, que o furto ou 
roubo so é eonsiderado crime quando é praticado dentro da tribu e reeahe 
sobre objectes délia-A rapinagem e esbulho dos estrangeiros e 
espeeialmente dos brancos nao sô ficam impunes, eomo sào a té 
protegidos por uni fétiche espeeial — o fétiche do roubo, înuito venerado 
no Congo. 
A puniçâo do adulterio— outra mod alidade do roubo eomo na 
Oceania — é realisada iinplïioavel e ferozmente, quando o crime é 
conmiettido coin mua mulher de al ta jerareliia. E' o que se dâ principal 
mente no Gabao e no Congo onde os crimi-l nosos sào quasi seinpre 
mortos violen lamente. Aigu mas tribus eomo em Fernando Pô, sein 
distingnir mesmo a condiçâo das niulheres, cor ta m os punlios aos 
culpados e os abaudouam fora e longe da aldeia. Em certos casos, 
entretanto, a pena do adulterio é simplesme.nte nma eompensaçao ou 
indemnisucao em objeotos do use ou coinmercio. Entre os povos da 
Costa Oriental, por exemple, a pena para o homem culpado é esta : paga-j 
inento de pinco escravos ao marido lesado, si este é uni cbefe ;j de uni sô 
escravo si o marido é de baixa condiçâo. 
O crime de feitiyaria é tambem punido rigorosame.nte, ej coin a 
morte na nier parte dos casos. Por isso mesmo que sao fetichistas, os 
africain» acreditam que certos individnos sao outras tantos espiritos 
malfazejos, causadores de doenças e de mortes. Os individnos tidos eomo 
taes sao quasi sempre condemna-dos a morrer na fogueira. 
Para o homicidio, entretanto, as penas .sào relativanionte nul las, por 
isso que se red nzem ao preço do sangue, indemnisa-]çao ou coniposiçâo, 
maior ou nienor conforme a qualidade da victima, e consistent^ as mais 
das vezes na entrega aos pa- 
 
 
GERAI. DO DIBBITO 33 
 
rentes do oflendido de mua certa porç&o de gado, como car-neiros, 
cabras, etc. 
Acciescentemof» apenas ao que ahi fira que é coi rente nas tribus da 
Afriea o uso dus ordalian, como nieio de prova nos casos crimes. O 
veneno, o fogo, a agnn fervente e ontros instrumentes de tortnra «fto 
àppli endos nos areusados para 8e lhes recoubecer a criiuinalidade on a 
innoceiwia. F" escusado dizer que coni taes expedicntes processuaes raro 
é o innocente que deixa de ser oondeinnado. Islo, porérn, nao p6de ser 
censnrado aos pobres negros i n fer i ores, porque os niesinos expedientes 
ireuios encontrar nu edademédia entre OH indn-europcus, de pelle branoa 
e cerebro largo. 
 
 
 
III 
As grandes monarchias antigas da raça amarella» 
Institutos juridicos da China, Peru' e Mexico. (*) 
§ 
Eni unia adniiravel lioyâo de liistoria, dada lia Escola Po-lytechnica 
de Bordeaux, no aimo de 1871, (lieyâo que infeliz-mente foi unira) o 
grande espirito que se ehainou Emile Littré, apresentou a se us discipulos 
uni programma completo do curso que se propunha a fazer, e nesse 
programma inseriu a seguinte nota: «Ooino entre o homein préhistorien e 
os egypeios, enja civilisaçâo apparece toda formada, uma lacuua existe, 
eu inter-calo uma civilisacSo intermediaria, cujo typo tomo entre os 
Mexicanos e Peruvianos». 
Esta observaç&o do eminente escriptor francez aponta-nos o 
(*) PONTES s-r E. Littrô, La science au point de vue philosophique;1 
TrajaDO de Moura : Do Homem americano ; D« Naclaillae : L'Amerique\ 
préhistorique ; Th. Braga : Historia Universal ; P. Laffitte : Considérations 
générales sur l'ensemble de la civilisation chinoise ; A. Ott. : L'Inde et la Chine ; 
Ahrens : Encyclopédie juridique ; Lctourneau : Lu Sociologie e L'évolution jurid. 
dans les div. rac. hum.; Sylvie Romero : Ethnographia braaileira. 
I 
ORK.VT. HO niRKITO 
liiuiav que devenios transpor para penetrar no gigaulesco edi-ficio das 
antigas civilisaçôes ûo oriente, ftindadas sobre o empirisme» e artes 
industriaes. 
BeaTuiente, de pois dos uegros inferiores que antecedente-mente 
estudamos, a propria classificaçâo das raças proclamada por Bluiueubac-
.il, Olivier e Quatrefages, nos obrigava a descan-sar uni poiic-o no 
segmido degrao da escadaria que vae dos ini-| ci os das sooiedades ao s«u 
mais brilhanto apogeu. O troneo amarello da buiiianidudo, de craneo 
brac-hic-eplialo e de cerebro proporcionalmente desenvolvido, nâo podia 
deixar de prender-mos a attençao, conio o elo neeessario entre a 
selvageria priini-tiva e as elevadas civilisaçôes do oriente nsiatieo-
africano e do occidente europeu. 
Jà deixamos dito, n'a nia citaçao de Letourueau, que nao Isô os 
mongôes asiatieos eoiuo os ebamados mongoloïdes ameri-canos. derain 
ao nmudo docnmentos notaveis do sen val or social coin as civilisaçôes 
chineza, peniviana e wexicana. 
E', agora occasiào de apreeiar taes civilisaçôes, no pouto de vista 
juridieo. 
A notaçao feita por Littré uo seu programma de historia parece que 
nos deveria conduzir a séparai' de qnalquer outro grupo buniano os dois 
curiosos typos das antigas populaçôes aniericanas, que sao commumente 
representadas pelos qqni-cbilas e Aztecs. Certas razôcs, porém, nos 
assistent para en-corporar a este capitule) o estudo da velha eivilisaçâo 
cbineza, lligando assim por uni laço meramente logico as .très grandes 
monarebias antigas da raya amarella. Dizemos por uni laço meramente 
logico para siguificar desde ja que nâo é nossa inten-çfto nom esta em 
nossas idéas dar como cousa provada a origem asiatica dos povos 
americanos, estabeleeendo uni cordâo um-bilical de natureza etbniea 
entre os ehinezes, incas e aztecs. 
Sabemos que tal opiniao é valoutemeute defeudida por scientistas e 
sabios da maior competoncia e que se» o nome de uni délies, Huiuboldt, 
é cnpaz de impor adlièsôes a primeira vista. Mas a vordade é que a 
hypothèse das successivas e di versas migraçôcs de povos do velho para 
o uovo mundo cm e pochas tnte-historicas é aiuda lis aub judice, e 
parece uiesmo ir per- 
 
3b OOMPENDIO DE HISTOKIA 
dendo terreno deante da idéa do antochtonismo das raças anie-rieanas. idéa 
que mais se coaduna coin a doutrina polyphyle-Itica, vencedora hoje nos 
dominios da ethuogenia. 
Uma bel!a aflfirmac&o do que dizemos é o notavel trabalho do 
DOSSO illustre patrieio Dr. Trajano de Moura sobre o Homem americano ; 
trabalho que levou seu antor as conclusôes se-' guintes : 
« Deslocamentos de povos asiaticos para a America poderiam se ter 
realisado ri a epocha quateruaria, si ja entao a fauna e a| flora deste 
continente nâo nprescntassem caractères pecnliares, inteiramente 
independentes, e si por ta! facto uâo fi casse plena-mente refutadaa 
hypothèse da chamada ponte aleutica e do célèbre continente da Atlantide, 
que sô ezistiu na imaginaçao de Platao. » — «Contactas casuaes tiverain 
logar, coino esta prova-do, entre os habitantes do Novo e do Velho Mundo 
uos tempos pre-colombianos, mas nâo forain sufficientes para prodnzir 
uma modificayâo dnradonra nos caractères geraes do homein americano.» 
— «O pretendido type mongolo-americauo sô existe mes regiôes 
hyperboreas da Asia, America e Buropa, onde aiuda hoje é patente e franca 
a mescla de sens habitantes.» — «Os povos americauos, pelo conjuncto de 
caractères physicos e moraes. podiam ser considerados, ao tempo da 
descoberta, como varie-dades multiplas, constituidas no espaço e no 
tempo, de uma \ mesma especie indigena — Homo americanus. » 
Yao neste rnmo as nossas sympatbias theoricas; porém nâo nos é 
licite considérai* absolutamente inanes muitas das ail égayées produzidas 
em favor da thèse contraria. 
Beduzindo a questâo do asiatismo dos americauos ao qmi dro do 
uosso trabalho, mencionaremos aigu us dos facto» que a varios autores 
serviram para levantar a hypothèse de estreito | parentesco entre chinezes e 
americauos do Peni e Mexico. 
O principal dos referidos factos é a tradiçâo ehineza rela-tiva ao paiz 
de Fu-sang, si tu ado a leste do mar oriental. (Le pays connu des anciens 
chinois sous le nom de Fu-Sang, por D'Her-vey de Saint Denis). A esse 
mysterioso paiz se réfère taniheni a obra de Ch. Levand : Fusang or the 
discovery of America by chinese buddhist priests in the fifth century. 
Como se vê deste 
GEKAL DO DIEEITO 37 
expressivo titulo o autor présume que no secnlo V padres bu-i dhistas 
chinezes cstiverani em uni ponto qnalquer do nosso continente. A 
autoridade de De Guignes veio dnr força a essa hypothèse pela 
uffirniae&o, que fez, de que o paiz de Fu-sang era de facto a America. 
Por outro lado descobertas archeologicas vieram fortifies r as 
presumpeôes dos asiatistas : naa rainas de Chimu e Chinca-Alta foram 
encontrados idolos de typo egual aos do Céleste Im-perio. Accresce ainda 
que aigu us au tores n'aérant insistente-mcnte notai* a extraordinaria 
seii'ellia nça existante entre as raças mongol icas e os habitantes do 
uoroeste da America. (1) 
Por nltimo, o Viscoude de Nadaillae resnmin deste modo 0 pouto 
em questao : 
«De Guignes attribue à iminigraçôes chinezas aeivilisayao dos 
peruviniioB. As eu ri osa s analogias que se notam nos costumes, nos 
regnlameutos minuciosos que attingem a todos as acçôes exteriores do 
honiein, o putronato concedido â agriciil-tura. a lesta animal celebrada 
em boura dos agricultorcs pelo inca do Perd e o imperador da China, o 
systema das irrigaeôes, o paganieuto dos impostos em especies, o uso dos 
quipog, a con-strucçâo das pontes snspeusas coiu cordas, a semelhança 
de certes detalhes de architectiira. a das barcas pernvianas eom os jiincos 
chinezes, sao todas de natnreza a justitirai- esta hypothèse. » 
C'hegadosa este pouto nao ê déniais observai' que o etni-uente 
historiador e philosophe Theophilo Braga expressamente ligou os 
mexicanos aos chinezes, considerando-os como ramos «la iiiesma arvure 
ethnica — » nu;» turaniana- Segundo a clas-sificaçao perfilhada pelo 
notavel autor portugnez, as raças his-torieas distribuem-se em très 
grandes grupos : o turaniauo (cru-1 samento do typo branco eom o 
amarello) o IcuschUo-setiiita (cru-samento do braneo eom o negro) e o 
ârico (branco extrême de crusamento). 
B' verda<le que esta classificayâo tem sido rudeiiicnte coin- 
(1) A semelhança é tal, dix um autor ing-lez, que sem o seu rabicho e 
habitos différentes, séria diffieil distinpuir os chinezes dos indios. 
38 . rOMPENDIO DR HIKTORTA 
batida, sobretudo nas suas subdivisôes e detalhes cthnographi-cos. E entre 
os adve.rsavios do turanùmo asiatieo auiericano estai o iiosso grande 
critieo Sylvio Roméro. Nada importa, porém, isso ao nosso proposito, que 
é siraplesincnte assignalar a exis-tcneia de valiosas opiniôes era favov da 
ideutidade de caractères cthiiioos e sociaes entre chûiezcs e 
ainericauos do Mexico e Perd. 
Oonsignado isto volfcamos a affirmât que si ligamos neste capitulo 
as très grandes niouarchias antigas da raya amarella, fazemol-o por outras 
razôes que nao as de Th. Braga, Humboldt, De Guignes, Nadaillac, etc. 
Fazemol-o porqno, no nosso ponto de vista todo xoeiologico, 
eheg&mos a verificaçao de que o conjuncto das coucepçoes re-| ligiosas e 
poli tiens dos qqnichûas e aztecs corresponde nosseus pontos Ciipitaes ao 
conjuncto das mesmas concepçôes entre os ehiuezes. E' assim que vemos 
qualquèr desses povos no mesmo estadio da evolny&o religiosa ; a 
astrolatria, a phase ultiina, do fetichismo iaicial, é que domina era todos 
elles, uni tanto me-diticadajâ por uni grosseiro esboço de polytheismo : o 
inipera-dor filho do Céo e o incafilho do sol obedecem à mesma preoe-
cnpayao nstrolatrica. Quanto nos mexicanos, hasta Citar estas palavras de 
uin amerieanista notavel : «tudo provaque o polytheismo existia entre 
elles, e mesmo uni polytheinmo muito infe-\ rior eomo concepçâo a a quel 
le que a historia nos mostra entre os egypeios e os gregos. » Si 
cousideramos as respectivas organisâmes politico-sociaes, aindit ohinezes, 
peruanos e mexicanos nos appareceni ligados logicamente por n m mesmo 
vinculo instifn-cional, coino veremos daqui a pouco. 
Accresce que as duas nayôes americanas nao passaram o limite que 
sépara o regiraen das classes sociaes mais on menos liierarchisadas do 
systema das castas. Outrotanto aconteeeu ua China, conforme nos diz A. 
Ott. E digamos de passagem, que por este motivo é que nao podemos 
ebamar theocraticus, noj rigor do teruio, as eonstituiçôes dos povos de que 
se trata ; pois seguuda a lucida observaç&o de Laffitte «o que caractérisa a 
theocracia, cuja base é necessariameute polytheica, é o rigimen das castas 
e a coordenaçâo das diversas castas entre si pela pre- 
11 
GERAL DO DIREITO 39 
pondéra nc-ia du cnsta sacerdotal.» Nâo qner isto dizer, porém, que as 
instituiçOes dos ohinczes, peruvianos e inexicanos nào fosseni 
profundaiiiente théologiens. Bem ao contrario, é essa a {respectiva 
earacteristica fondamental. 
Ex postas a largos traços estas idéas introductorias, apres-senio-nos 
a 1 ratai- propriaiiionle do nosso assiimpto. 
§ 
H China.—Este iiumenso paiz da extrema oriental do velho continente 
offerece aos olhos curiosos dos occidentaes o especta-culo de aina naçào 
de cerca de quatrocentos inilhôes de i n d i v i - duos, a quai dois mil an 
nos an tes da era christs jà possuia a original organisaç&o politico-social 
qiieainda hoje apresenta. 
Tracejemos ein primeiro logar o sen direito publico ; vero-mos 
depois suas instituiçOes de direito pi'ivado. 
A constiluiçâo politica da China é a de mua monarchia 
absolu ta e hereditaria calcada sobre o typo domestico do patrio 
poder. eujo ehefe éfilîio do céo sendo ao mesmo tempo pae e mâe 
de fodos os chinezes. A. suprema autoridade paternal, eoncen- 
traila nas mâos do imperador, dirige e régula todos os intéresses 
publicos e privados par iuterniedio de mua extensissima rede 
de fnnccionarios, sahidos da classe dos lettrados. Governando 
em vi r i i i de de um niaudato do ceo, o imperador te m a responsa- 
hilidade de tu do, até mesmo das pertu rbaeôes eli mater i cas. A 
m un lai responsabilidade é> natural que corresponda uni poder 
iiiiinenso. H 
Segnndo Laffîtte, as duas forças que presidiram ao desen-
volvimciito graduai da civiiisaç&o chinez» forain : 1* uniu lïnnilia 
impérial represcnta<ia pur uni individuo uiiieo, que é o sen ehefe, 2" unia 
classe particular, a dos lettrados, que nao a l t i n g i u a sua verdadeira 
constiluiçâo senâo depois de Confucio, mas cnjos fuiidamentos existiam 
desde niuito an tes. R Esta classe, uuica dirigente ou governante ao lado 
do imperador, uHo constitue entretanto lima aristocracia hereditaria. Ella 
é rccrntada em todas as classes da populac&o por meio de 
40 COMPENDÏO DE HI8TORIA 
exnmes diversos que conferem titnlos analogos aos de bacharel, licenciado 
e. doutor. A. esses exames pôde eoncorrer qualquer individuo qne qneira 
habilitasse ao mandarinato (1) on funecio-nalisino publiée. 
Os org&os da administraçâo snperior do Estado sâo, além do 
impcrador, nm conseilla privado o seis ministerios que se sub-dividem em 
uraa iufiuidade de reparti çôes secuudarias. Uni importante e enriosissinio 
documento attribuido a Tcheû-kong, irmâo do fundador da dynastia dos 
Tcheûs, nos fornece indica-çÔes intéressantes e complétas sobre o 
inechanistno do direito publico chinez, qne, alias nenhunia alteraçâo 
notavel tem sof-frido até hoje. Esse documento é o Tcheû-li (ritos de 
tcheû) — especie de almanack administrative do imperio chinez, na 
epocha em que foi escripto (secnlo XI mites da era christs..) 
Segnndo o Tcheû-li. a (esta da administraçâo esta uni pri-meiro 
ministro, o ministro do eêo, que é quem centralisa toda a acçao 
administrativa e tem sob suas ordens cinco outros ministerios : o da terra 
ou do ensino, o da primavera ou dos ritos, o do verâo ou da guerra, o do 
outomno ou da justiça e o do inverno\ ou dos trabalhos publicos. 
N&o ha na organisaçâo politica da China vestigios de inter. venç&o 
directa ou indirecta do povo na gestâo das cotisas pu-blicas. A lei ou esta 
feita nos livros de Confncio ou fal-a o imperador segundo o seu criterio. 
Todavia vê-se pelo Tcheû-li que em très easos a multid&o era consultada 
em assemblea gérai : quando o imperio estava em perigo ; quando se 
tratava de mudar de capital ou se transportava a populaç&o de uni ter-
ritorio para outro por insufficiencia das condiçôes de subsisten-cia ; 
einfim, quando vagava o throno e era preciso eleger mu principe. 
Accrescenta o Tcheû-li que tambem se consultava o povo em caso de 
condemnaçao capital e sô se exécuta vain os cri-minosos quando a 
inultidao nâo pedia que elles fosse n perdoa-dos. 
(1) Convem observât que as palavrns mwndarini, mandarinato, îifio siio de 
origem cbineza, e sim portugueza. 
GEKA L DO DIKEITO 41 
O podcr judiciario uao teni existencia independente da do 
'executive, entre os chiuezes. O ministro do oulomno éo grande 
j jni z criminal, que por si ou por sens agentes julga definitiva- 
ïhente no civel e no crime. Os processos criniimies que podem 
dnrlogar a pena de morte sao instrnidos pelos preboslcs de justdça 
masjiilgados pelos ministros a porta exterior do palacio. Quan- 
to â," qm>stô< « eiveis, as partes comparecem à andiencia eosi uni 
feixe do fleciias, emblema da rectid&o de suas intençôes ou dâo 
trinta libras de ouro para demonstrar sua sinceridade. Os po- 
bres ficam coin o reenrso de tocar uni grande tanibôr collocado 
a porta do palacio e destinado a chaînai- a attencao do ffflio do 
Cêo sobre os infelizes. I 
Notemos, por fini,qne a siieeessao impérial nâo estasujeita ao 
direito de primogenitura, podendo o imperador escolher qualquer de sens 
filhos para succeder-lhe, e lereinos, nas suas linhiis geraes, o direito 
publico chinez. 
A principal instituiçâo de direito privado, a l'amilia, é altamente 
considernda no Céleste Imperio. Foi pelo seu typo patriarchal que se 
modelou o Est ado e é ella quein J'ornece aos chiuezes uma das mais 
importantes modal idndcs de .sua religio-sidade. fetichista— o cnlto dos 
antepassados e respect!vos ritos fnnerarios. Subordinayao e respeito ao 
pae e irmaos niais ve-Ihos, veueraçao â mâe e aos antepassados. sao os 
caracteristicoB da fainilia chineza, eujo typo gérai, entretanto, r.âo é o 
niono-gamico, pois a lei, embora t-ô reconhecendo uma mulher légitima, 
permitte e saneciona uni coiicubinato régulai-. Comtudo a polygamia sô 
prédomina entre as classes elevadas e ri cas da so-ciedade, a partir do 
imperador. 
E' quasi excusado accentuar a iniportancia do patrio poder pas 
relaçôes da ta mi lia chineza : o pae teni autoridade absolu ta sobre os 
filhos podendo vendel-os e castigal-os até o ponto de tirar-lhes a vida. Os 
filhos porém, succedeni â inteslado, por qoanto o direito de suecessao é 
baseado sobre a mauutenç-ao da unidade das familias. Quanto ao casa 
niento é elle gérai mente contrahido sob a forma de compra da esposa, 
sendo o eelibato prohibido qner para o houiom quer para a mulher. Eis, 
se-gundo A. Ott., o que ensina o Tcheû-H a esse respeito : Uni of- 
 
42 OOMPEXIMO DE KISTORIA 
ficial dos easamcntos régistni as uni Ses conjugues e providencia para que 
toda mu Hier seja ensnda nos vinte annos e todo o ho-muni se case o mais 
tardai- aos tri ut a annos de idade. Na lua do meio da primavern é ordenada 
umn reuniao gérai de homens e mulheres. Aquelles que n&o se eonforiuum 
aos editos sein mua causa especial sao punidos pelo dito officiai dos 
casauientos,! «pie é (plein os effectua e qiieni jnlga todos os cusos de 
relacôes sécrétas entre homeui e inulher- 
A legislaçao, on mellior o costume, permit te o divorcio por 
consentimeuto ni ut no ; além disso o iiïarîdo pode répudiai' a niulber por 
diversos motivos, coino sejam : esterilidade, immo-t'alidade, inclinaçao an 
fnrto, maledicencia, etc. 
A propriedade individual, movel e iinniovel, existe un Chi-j nae é 
protegida por varias dispostçôes de Ici. O dominio territorial proprianiente 
dito soffren di versas niodificaeôes no curso da liistoria. Citareraos a este 
proposito, as seguintes palavras de A lire n s, que synthétisant 
sufficienteniente a materia : «Antc-riormente ao meiado do terceiro seculo 
A. O. o imperador era o i inico douo do solo e a propriedade territorial era 
repartida por elle entre os particulares, de modo quo sobre uma extensao 
de terreno determinada, uove décimas partes fosse m cultivadas em 
proveito do doado e a outra cm proveito do doador. Mais tarde as 
provinciasforain dadas pelo imperador aos sens logares-tenentes seguudo a 
maneira feudal, e finalmente a maior parte do solo foi cedida aos 
particulares, a titnlo de propriedade pri-vada alienavel e hereditaria. 
mediante o pagamento de dizimos e a prestaçâo de services feudaes.» 
Resta-nos fallar das institnicôes chinezas em materia crimi-j nal e 
pénal. A este assumpto consagrou Letonr-neau dois grandes capitnlos de 
sua obra L'évolution juridique dans les diverses races humaines. E' elaro 
que nâ-o podemos condensar em alguns periodos a larga exposiçao do 
sociologo francez, ne m isso é précise a uosso ver. Além do que deixamos 
dito sobre a organisaçâo judiciaria da China, consignaremos apenas o 
segninte : 
O Tcheû-li informa-nos que os crimes dos chinezes sao punidos coin 
a prisao temporaria, com a coudemnaçao a trabalhos ignomiuiosos, com a 
escravisaeao e ainda com estas outras pe- 
ORRA T. DO WRRITO 13 
lias : a inarca uegra no rosfco, H ampufacâo do nariz, a reolusâo uo 
palacio (castracâo), a ampntaç&o dos pèse a execne&o capital. Podiani 
ser aecresceutadas a essa enumeraçao outras peu as ainda hoje em us<> ; 
nias nos limitaremos a citar a bas-tonada de bambû, pois no dizer 
incisivo de Letourneau KO bain-brt bastouante é a caracteristica da pénal 
idade chineza. » 
Ha casos, porém. em que qualqner d'essas penas é suhsti-tuida por 
unia composiç&o pecuniaria, porquauto, coino ainda observa Letourneau 
o resgate pénal existe ua China desde a mais alta antignidade, e o 
Chouking (uni dos mais antigos livres sagi ados) estabelece que a inarca 
uegra na face pode ser resga-tada por 100 hoan, a amputaç&o do nariz 
por 200, a dos pes e a] eastraçao por 500 e a peua capital por 1.000, 
H Além do homicidio, das offensas pbysicns em gérai, do adultérin, do 
rapto, do incendio e do furto, a legislacao clii-| neza elassiflca coiuo 
crimes, e dos mais graves : a rebelliâo, a deslealdade, a deserç&o, o 
parricidio, o massacre, o sacrib'gio, a discordia, a impicdade, a 
insubordinacao e o iucesto. O homicidio, em regra acarreta a pena de 
morte, e si se trata de parricidio o autor d'elle e sens cuniplices silo 
condemnados â| morte leuta e dolorosa. 
I Vê-se ahi uma revivescencia do taliâo e da vingança. Terni in aremos 
nota H do que a justiça chineza loin mais em vista a importancia do 
prejnizo causado pelo facto delictuoso do que a intençâo ou grao de 
perversidade do deliuquente, E' assim que os homicidios casuaes, 
fortnitos, ou por erro, sao pu ni dos pela estrangulaçâo, e que o incendio, 
mcsnio quaudo accidentai, détermina a pena de bas ton ad as. 
Perû e Mexico.— Na epocha da conquista hespanhola, o im-perio 
dos in cas ou a velha nacao peruviana, tinba cerea de 3000 léguas de 
extensâo e 400 de largura, coinprehendendo nos seus limites o Perû, a 
Bolivia, o Equador, e mna parte do Chili e da Republica Argentina 
actuacs. Tinha cerea de dess mil Iules de habitantes e as raças 
prédominantes eram as dos qquichûs e aymâras que pelos costumes e 
liuguagem se tinham quasi iden-ti/icado, vivendo alias os aymaras no 
plaiô dos Andes e os qqui-chûas nos arredores de Cozco — a capital do 
imperio. A tra- 
44 OOMPENDI© DE HIOTOEIA 
diyfto narra, diz Nadaillnc, qoe Manco-Capac e a bella Mauia-Oello, sua 
irm& e mulher. fizeram conhecer os primeiros ele-mentos da civilisaç&o a 
tribus atë entfio selvagens e barba ras, e que & sua voz tacs tribus 
quebrnram sens idolos para adorar uni dous do quai o sol e a hia eram a 
forma visivel. Segnudo o niesmo autor P de accordo eom a legenda, 
Manco-Capac e Oello sahiram da ilha de Titicaca, por ordem do Sol, 
levando uni ranio de ouro que n'uni certo ponto dévia in terra r-se no solo. 
Foi em Cuzco que o prodigio se operou e OR incàs, eheios de reeon 
hec.imento, estalieleceram alli a séda do seu i ni péri o. De Manco-Capac a 
Atahualpa (l(Mi2 a 1534) quatorze incas rei-n ara ni no antigo Perû, 
fundando e dirigindo uni a das mais ori-ginaes e brilliantes civilisayôes da 
terra. 
Jâ sabenios que do niesmo modo que na China, a phase as-trolatricn 
do fétichisme era a que dominava entre os qqnichiias, eni materia de 
religiao e culto. E' précise» agora indagar quai a sua organisayao politica e 
juridica. Vanios fazel-o, reprodu-zindo as indicaçôes do autor da America 
préhistorien, que tam-liem quanto ao Mexico nos servira de guia. O 
systema de governo era a mouarchia absojuta e despo- 
tica fundada sobre o respeito religioso devido ao descendente do Sol. 
(Como na China, onde o Impcrador é fil ho do Céo). Uma hierarchia 
administrativa sabiamente combinada levava dos simples decuriôes 
(chefes de decurias e conjunctos de decurias) aos curacaH ou 
governadores de provineias, nui ni dos de poderes extensos e hereditarins. 
(Tambeui entre, os chinezes, segundoo Tcheû-U, cinco familias formant 
uni grupo : cinco grupos for mant uma seeçao ; quatro secçôes fazem 
uma commuua ; cinco comninnas uni cautào, etc.). 
Os

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