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seu táxi abalroado pelo veículo de Fábio. Em virtude do acidente, José não conse- guia mais trabalhar, uma vez que o veículo ficou parado por 20 dias para conserto e José também teve danos pessoais, o que igualmente o afastou por, no mínimo, 60 dias do desempenho de suas funções. Ao procurar Fábio, este negou qualquer ressarcimento. José, então, procurou um advogado, mas, por não ter recursos financeiros para remunerar o profissional, não foi possível sua contratação. Foi informado, ainda, que teria de pagar custas do processo para poder movimentar o Judiciário. Questiona-se: atende à previsão consti- tucional do amplo acesso à justiça a situação de José, que tem a legítima pretensão de ver-se ressarcido dos danos que sofreu, mas não tem recursos financeiros para arcar com um advogado particular e nem para pagar as custas do processo? Como deve José proceder para conseguir efetivamente conduzir sua pretensão à proteção do Poder Judiciário? Para solucionar a situação-problema, você precisará: 1º. Conhecer o princípio do amplo acesso à Justiça. 2º. Ccompreender como o ordenamento processual pretende dar concretude ao princípio do acesso à justiça. Agora que você conheceu a nova situação-problema proposta, é impor- tante aprofundar seus conhecimentos teóricos, que o auxiliarão a solucionar a questão. Não pode faltar No atual estágio do estudo do processo, não mais se admite como correta a noção em que o acesso à justiça limita-se à possibilidade de que o cidadão, diante de um conflito de interesses, possa buscar o Poder Judiciário para obter sua pacificação. Outros questionamentos devem ser realizados para que se entenda que determinado Estado efetivamente torna concreto o princípio do amplo acesso à justiça. Dentro desse contexto, é notoriamente importante o papel desempe- nhado pelo Direito Processual, como ciência que tem por objeto o processo Seção 1.3 / Acesso à justiça e constitucionalização do processo - 43 enquanto instrumento que conduz o jurisdicionado à pacificação de seus conflitos por meio da intervenção do Estado-juiz. Pode-se afirmar que o processo e o Direito Processual, em sua linha evolu- tiva, passaram por fases até chegar ao que atualmente se entende como mais adequado para que possam desempenhar as funções que lhes são inerentes. Antes de adentrarmos às linhas evolutivas, é importante advertir, caro aluno, que o ponto de análise para se perceber as evoluções é enxergar o papel do Direito Processual em relação ao Direito Material, bem como seus objetivos e perspectivas. Existem duas correntes que identificam as fases do Direito Processual Civil. Como assinalam Lamy e Rodrigues (2018 p. 25-26), a primeira é capitaneada por Niceto Alcalá-Zamora y Castillo, que afirmam que “a evolução da teoria processual possui cinco etapas: período primitivo, escola judicialista, praxismo, procedimentalismo e processualismo científico”. Por outro lado, Dinamarco (2018) identifica, na Figura 1.3, que o Direito Processual tem três momentos, a saber: Ressalte-se que, na verdade, essa diferença é apenas um detalhamento das fases processuais. As fases: período primitivo, escola judicialista e praxismo estão contidas na fase sincrética, descrita por Dinamarco (2018). O procedimentalismo é similar à fase autonomista, enquanto o processualismo científico é alçado à fase do instrumentalismo. Na primeira fase do Direito Processual, entendia-se o processo como simples meio para a realização dos direitos das partes. Não se analisava o Direito Processual como ciência autônoma em relação ao Direito vinculado no processo, fosse ele Direito Civil, Penal etc., ou seja, não era o Direito Processual dotado de independência em relação ao Direito Material contro- vertido no processo. O Direito Processual era, portanto, um simples Direito adjetivo nessa fase denominada fase sincrética. Comentam Rodrigues e Lamy (2018, p. 28) que: Figura 1.3 | Fases do Direito Processual Fonte: adaptada de Dinamarco (2018, [s.p.]). 44 - U1 / Noções teóricas básicas do processo [...] a expressão sincretismo, que significa a reunião artificial de ideias ou teses de origens diferenciadas, é utilizada, por Dinamarco, para referir-se ao conjunto dos movimentos proces- suais anteriores ao nascimento do processualismo científico [...]. “ Em contraposição radical às ideias instauradas no primeiro período, uma segunda fase se instaurou, na qual se pregava a inteira autonomia entre o Direito Processual e o Direito versado no processo. Tratou-se da denomi- nada fase autonomista ou conceitual, em que se defendia a total indepen- dência do Direito Processual e o Direito Material. Esse período se inaugurou com o surgimento do Estado Moderno, com o fortalecimento da burguesia e dos ideais da Revolução Francesa, no final do século XVIII. Foi, sem dúvidas, um período de grandes avanços científicos para o processo em que a relação processual foi analisada como algo diferente do efetivo Direito discutido pelas partes. O procedimentalismo decorreu do liberalismo instaurado após a Revolução Francesa, e inspirou princípios hoje consagrados, como a separação dos poderes, legalidade e outros. A partir daí, entendia-se que o juiz deveria agir de acordo com os procedimentos processuais, abrangendo ritos, prazos e formas designados em lei, cabendo ao juiz agir conforme o Direito vigente, sem margem a interpretações. Portanto, foi nesse período que o Direito Processual começa a ter a sua autonomia reconhecida, a partir da criação de procedimentos previstos em lei, deixando de ser uma mera praxe forense. Todavia, foi tal independência tratada com demasiado radica- lismo, gerando distorções, uma vez que o processo era visto como um fim em si mesmo. A reflexão sobre esse radicalismo inaugurou uma nova era no Direito Processual. Nesse ponto, é interessante destacar uma polêmica ocorrida entre dois importantes doutrinadores romanos, conhecida como Windscheid x Muther, em que impulsionou o progresso do Direito Processual. Pesquise mais Para entender mais a respeito da Polêmica Windscheid x Muther, pesquise sobre Windscheid x Muther no material a seguir: RODRIGUES, H. W.; LAMY, E. A. Teoria Geral do Processo. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2018. Seção 1.3 / Acesso à justiça e constitucionalização do processo - 45 Atualmente, como podemos analisar o processo e a ciência que o estuda? Podemos afirmar que, o Direito Processual encontra-se na terceira fase, a fase instrumentalista, que tenta corrigir os excessos realizados pela fase anterior. Assim, apesar de o processo ser efetivamente um meio dotado de autonomia para pacificação de conflitos, ele não pode ser encarado de forma desconectada do Direito Material buscado pelo jurisdicionado. O processo é um instrumento de pacificação; instrumento relevante, sem dúvidas, mas não um fim em si mesmo. Foi no período do instrumentalismo (processualismo científico), que surge a ideia do caráter público do processo e também a questão da autonomia da ação, considerando-se também o processo desvinculado das relações jurídicas de Direito Privado. Fazendo uma análise das três fases evolutivas, Cassio Scarpinella Bueno (2013, p. 81), doutrina que E conclui, referido doutrinador, afirmando que “o direito processual civil desempenha a finalidade de instrumento do direito material” (BUENO, 2013, p. 88, grito do autor). [...] de uma concepção em que o processo se confunde com o direito material e, no polo oposto, de uma concepção de que o direito processual civil não guarda nenhuma relação com o direito material, é arredio a ele, passa-se a uma reflexão conjunta destes dois planos do ordenamento jurídico, conjugando os acertos das fases e das escolas anteriores. “ Pesquise mais Interessante ressaltar que há doutrinadores que já defendem uma posição