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Direito 1ª edição 2017 Direito 3 Palavras do professor Olá, aluno! Seja bem-vindo à disciplina de Direito Empresarial. Com grande prazer apresentamos o projeto didático do grupo Newton Paiva da disciplina Direito Empresarial. Nossa disciplina é dividida em oito unidades de aprendizagem que permitirão, dentre outros objetivos, anali- sar as noções gerais do Direito Empresarial, via uma visão sistêmica e inter- disciplinar da matéria sem se distanciar da efetividade prática e profissional. Na primeira unidade, trataremos sobre a parte introdutória do Direito Empresarial, quando estudaremos os aspectos voltados ao conceito pro- priamente dito, sua definição, abordando as características e sua natu- reza jurídica. Trabalharemos também, na mesma unidade, a autonomia, as fontes e as funções do Direito Empresarial. Em seguida, na Unidade 2, aprenderemos sobre as características ineren- tes ao conceito de empresa e das pessoas que a exercem as atividades empresariais, para que possamos compreender como funciona a sua apli- cação. Assim, vamos compreender o conceito de empresa e empresário, sua respectiva função social, bem como caracterizar e diferenciar o que são agentes, prepostos e auxiliares do comércio e do empresário. Na Unidade 3, poderemos compreender sobre o estabelecimento comer- cial, estudando o conceito de matriz, filiais e sucursais, bem como os ele- mentos conceituais de nome empresarial, estabelecimento e fundo de comércio/empresa, trespasse. Veremos, ainda, os conceitos e as regras gerais do direito de propriedade industrial. Já na Unidade 4, poderemos adentrar nas diversas formas das sociedades empresarias, quando faremos a distinção de cada uma, estudando suas hipóteses de constituição. Prosseguindo com nossos estudos, na Unidade 5 falaremos sobre as sociedades empresarias especiais, pois elas possuem peculiaridades, tais como a sociedade cooperativa e a sociedade advocatícia. Seguindo adiante, na Unidade 6, apreenderemos sobre a administração da sociedade. Para tanto, estudaremos atos e decisões do conselho fiscal e os requisitos para as deliberações dos sócios. Veremos, ainda, situações relacionados ao consórcio de empresas e grupos societários. Já na Unidade 7, abordaremos acerca da responsabilidade dos adminis- tradores, momento em que estudaremos a autoria, coautoria ou parti- 4 Palavras do professor cipação em conduta ilícita, bem como a desconsideração da personali- dade jurídica. Por fim, na Unidade 8, estudaremos os aspectos materiais e processuais que envolvem a recuperação judicial das sociedades empresariais. Sem dúvida o tema é extenso e complexo, motivo pelo qual estudaremos muita coisa, mas, ao mesmo tempo, perceberemos que ele está presente em nossa realidade. Ao longo da disciplina, vamos utilizar textos legais e a doutrina especiali- zada do tema, tornando o aprendizado do assunto mais dinâmico. Convido ainda para que você acesse os outros materiais disponibilizados no ambiente do aluno para aprender ainda mais. Então, foco nos objetivos e vamos aos estudos! 1 5 Unidade 1 Introdução ao Direito Empresarial Para iniciar seus estudos Nesta unidade, veremos as noções gerais do Direito Empresarial e, para tanto, analisaremos a origem e evolução da matéria tanto no direito estrangeiro quanto no direito pátrio. Ademais, para melhor compreensão do tema, traremos a base legal que conceitua os atos de comércio, ou seja, os temas relacionados ao Direito Empresarial no Código Civil. Assim, sem mais tardanças, vamos aos estudos! Objetivos de Aprendizagem • Conhecer a origem e a evolução do direito empresarial. • Estudar sobre a autonomia do Direito Empresarial: fontes e princípio. • Elencar o conceito, o objeto e os limites do Direito Empresarial. • Diferenciar Direito Empresarial Interno e Internacional. • Apresentar conceitos da teoria dos atos de comércio à teoria da empresa. 6 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial 1 Introdução ao Direito Empresarial O capítulo introdutório ao Direito Empresarial será de sua importância para toda a unidade, pois veremos concei- tos gerais e que serão base ao longo dos nossos estudos. Sendo assim, preste muita atenção aos conceitos que traremos a seguir, uma vez que eles serão nosso alicerce nesta matéria. 1.1 Direito empresarial: origem e evolução O comércio é, sem dúvida, uma das práticas humanas mais antigas, razão pela qual podemos presenciar tais atos desde os primórdios das sociedades, o que o torna uma das atividades mais importantes no cotidiano. Temos notícias de que a atividade comercial era exercida desde a Antiguidade. Podemos constatar varias regras relacionadas ao comércio no Código de Manu e no Código de Hammurabi, por exemplo. Contudo, somente no século XI, com o surgimento das “Corporações de Ofício” que a relação comercial buscou ser sistematizada, criando-se as normas e estruturas para dirimir possíveis conflitos. Para Rubens Requião: É nessa fase histórica que começa a se cristalizar o direito comercial, deduzindo das regras cor- porativas e, sobretudo, dos assentos jurisprudenciais das decisões dos cônsules, juízes designa- dos pela corporação, para, em seu âmbito, dirimirem as disputas entre comerciantes (REQUIÃO, 1998, p. 10-11). Inicialmente, o Direito Comercial era construído com base na teoria subjetiva, uma vez que deveria ser aplicável apenas aos comerciantes matriculados nas corporações, ou seja, o marco para a aplicabilidade do Direito Comer- cial fazia ilação ao indivíduo: o comerciante. Corporações de ofício eram associações que surgiram na Idade Média para regulamentar o processo produtivo artesanal nas cidades. Essas unidades de produção artesanal eram mar- cadas pela hierarquia (mestres, oficiais e aprendizes), bem como pelo controle da técnica de produção das mercadorias pelo produtor. Para mais conhecimento do tema, acesse: <http:// www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewFile/67461/70071>. Com o passar do tempo, sobretudo com a Revolução Francesa, a concepção tradicional do Direito Comercial foi perdendo sentido, dadas as diversas modificações sociais, políticas e jurídicas. Assim sendo, não fazia mais sen- tido entender que o Direito Comercial estava relacionado à pessoa que pratica os atos comerciais, mas sim pela análise da própria atividade comercial, surgindo com isso a teoria objetiva. Segundo os ensinamentos de Rubens Requião: E, malgrado a reação do direito territorial, se foi ampliando a competência dos cônsules aos estranhos às corporações, que tivessem contratado com um comerciante nela inscrito. Ao mesmo tempo, relaxa-se a exigência da matrícula como condição para o comerciante subme- ter-se à jurisdição consular, estendendo-se sua competência a comerciantes não matriculados (REQUIÃO, 1998, p. 12). 7 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Tal teoria foi influenciada pelos ideais de “liberdade, igualdade e fraternidade”, palavras de ordem da Revolução Francesa, na qual se buscou excluir o privilégio de determinadas classes e, consecutivamente, assegurar a tutela do direito a todos os indivíduos que exerciam atividades comerciais. Figura 1.1 – Revolução Francesa. Fonte: 14789656 (123RF). Diante da consolidação da Revolução Francesa e do fomento do lema, as modificações ocorridas na França exer- ceram influência na elaboração de legislações comerciais de outros estados, conforme informa Rubens Requião: O sistema objetivista, que desloca a base do direito comercial da figura tradicional do comerciante para a dos atos de comércio, tem sido acoimado de infeliz, de vez que até hoje não conseguiram os comerciantes definir satisfatoriamente o que sejam eles (REQUIÃO, 1998, p. 13, grifos do autor). Por fim, salientamos ainda que essa influência foi incutida na ordem jurídica nacional,conforme veremos nesta unidade. 8 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial 1.2 Direito empresarial internacional e interno Diante do atual cenário de globalização, é de suma importância estudarmos os vínculos relacionados à disciplina no seu âmbito internacional e nacional, com o escopo de delimitar os requisitos para a determinação da nacio- nalidade da sociedade. O Direito Empresarial Internacional busca examinar as características, a regulamentação do mercado e as codi- ficações existentes. Para tanto, envolvem diversas organizações econômicas e financeiras. Podemos citar como uma das principais a Organização Mundial do Comércio (OMC), que se apresenta como uma via de solução de conflitos entre os Estados, ou seja, busca regulamentar o comércio internacional por diretrizes gerais. A OMC iniciou suas atividades em 1º de janeiro de 1995 e, desde então, tem atuado como a principal instância para administrar o sistema multilateral de comércio. A organização tem como objetivos: estabelecer um marco institucional comum para regular as relações comer- ciais entre os diversos membros que a compõem; determinar um mecanismo de solução pacífica das controvérsias comerciais, tendo como base os acordos comerciais em vigor; e, por fim, criar um ambiente que permita a negociação de novos acordos comerciais entre os membros – que atualmente conta com 160 e o Brasil é um dos fundadores. Sua sede está localizada em Genebra (Suíça) e as três línguas oficiais da organização são o inglês, o fran- cês e o espanhol. Acesse: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/diplomacia- -economica-comercial-e-financeira/132-organizacao-mundial-do-comercio-omc>. Figura 1.2 – Mundo, Terra, globo terrestre, mão, acesso ao mercado. Fonte: 20613883 (123RF). Não podemos deixar de mencionar a chamada lex mercatoria, que é um direito surgido dos usos, jurisprudência e costumes internacionais. No âmbito internacional, as pessoas jurídicas são sociedades transnacionais, ou seja, possuem matriz em um país, mas atuam em diversos outros. 9 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Transnacional: que ultrapassa os limites das fronteiras de um país. Fonte: <https://diciona- riodoaurelio.com/transnacional>. Glossário Nesse sentido, uma das principais distinções entre o Direito Empresarial Internacional e o Nacional se refere à unificação das normas comerciais. É fortemente presente no âmbito internacional a autorregulamentação, que consiste em ajustes comerciais feito pelos próprios Estados, em decorrência da livre concorrência. Por tais motivos, a doutrina entende que no âmbito internacional vigore a técnica do “direito flexível”, em que se prima pela harmonização normativa por meio de princípios reguladores. Por seu turno, o Direito Empresarial Interno, quando analisado sob a perspectiva da pessoa jurídica, possui como base legal os artigos 40 a 69 do Código Civil. Para Rubens Requião, podemos conceituar pessoa jurídica como o ente incorpóreo que, como as pessoas físicas, pode ser sujeito de direitos. Não se confundem, assim, as pessoas jurídicas com as pessoas físicas que deram lugar ao seu nascimento; pelo con- trário, delas se distanciam, adquirindo patrimônio autônomo e exercendo direitos em nome pró- prio. Por tal razão, as pessoas jurídicas têm nome particular, como as pessoas físicas, domicílio e nacionalidade; podem estar em juízo, como autoras ou como rés, sem que isso se reflita na pessoa daqueles que a constituíram. Finalmente, têm vida autônoma, muitas vezes superior às das pes- soas que as formaram; em alguns casos, a mudança de estado dessas pessoas não se reflete na estrutura das pessoas jurídicas, podendo, assim, variar as pessoas físicas que lhe deram origem, sem que esse fato incida no seu organismo. É o que acontece com as sociedades institucionais ou de capitais, cujos sócios podem mudar de estado ou ser substituídos sem que se altere a estrutura social (REQUIÃO, 1998, p. 204). A pessoa jurídica pode ser constituída por pessoas (universitas personarum) ou bens (universitas bonorum), sendo subdivididas em pessoas jurídicas de direito público externo, pessoas jurídicas de direito público interno e pes- soas jurídicas de direito privado. Podemos citar, a título exemplificativo de Direito Público Externo, a Organização das Nações Unidas (ONU); nos casos de Direito Público Interno, a administração pública direta (União, Distrito Federal, estados e municípios) e administração pública indireta (autarquias, fundações públicas, agências reguladoras e agências executivas); por fim, de Direito Privado (associações, sociedades civis e sociedades empresariais). Existem diversas teorias relacionadas à natureza das pessoas jurídicas de direito privado, e, dentre elas, as mais significativas são a teoria da ficção e a teoria da realidade: a primeira, cujo defensor foi Savigny, informa que é fictícia a figura da personalidade jurídica, pois ela decorre de uma criação legal (sua finalidade seria a de facilitar determinadas funções); já a teoria da realidade técnica, cujo defensor foi Ihering, entende que a pessoa jurídica ocorre em virtude da união de um grupo de pessoas para fins específicos, sendo que, para esta corrente, a pessoa jurídica é uma realidade social. 10 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Não são admitidas a registro, nem podem funcionar, sociedade de advogados que apresen- tem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fan- tasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proi- bida de advogar. Essa previsão está contida no art. 16 do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/94). Ademais, no caso das pessoas jurídicas de direito privado, existem duas hipóteses para a sua criação: por ato constitutivo (escrito e preliminar) e pelo registro em cartório. Para que surta seus efeitos legais, o ato constitu- tivo deve ser levado para registro, pois caso contrário existirá uma “sociedade de fato“. O registro em cartório ocorre na junta comercial, exceto para as sociedades civis de advogados cujo registro ocorre na Ordem de Advogados do Brasil. 1.3 Direito empresarial no Brasil No Brasil, o Direito Comercial se iniciou em 1808, com a vinda da família real portuguesa e, posteriormente, com a promulgação de normas comerciais, o estabelecimento do livre comércio e a criação do Banco do Brasil. Neste período, as regras inerentes às atividades comerciais eram reguladas pelo Pacto Colonial, que tinha como objetivo regrar as atividades comerciais das colônias junto à metrópole, situação que foi marcada pelo monopó- lio da metrópole em face das colônias. Figura 1.3 – Banco do Brasil e incentivo do livre comércio. Moedas nacionais. Fonte: 10281892 (123RF). 11 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial O Pacto Colonial era um conjunto de regras, leis e normas que as metrópoles impunham às suas colônias durante o período colonial. Em 25 de junho de 1850, sancionou-se o Código Comercial Brasileiro. Até então, as relações comerciais eram regidas pelas leis portuguesas. Ademais, com o surgimento de um código comercial próprio, substituíram-se os regramentos estrangeiros em detrimento das particularidades brasileiras. O Código Comercial Brasileiro possuía fortes influências da legislação francesa, motivo pelo qual foi adotada a teoria dos atos de comércio, corrente superada com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, que adotou a Teoria da Empresa. Para Fabio Ulhôa Coelho: O Direito Comercial brasileiro filia-se, desde o último quarto do século XX, à teoria da empresa. Nos anos 1970, a doutrina comercialista estuda com atenção o sistema italiano de disciplina pri- vada da atividade econômica.Já nos anos 1980, diversos julgados mostram-se guiados pela teo- ria da empresa para alcançar soluções mais justas aos conflitos de interesse entre empresários. A partir dos anos 1990, pelo menos três leis (Código de Defesa do Consumidor, Lei das locações e Lei do Registro do Comércio) são editadas sem nenhuma inspiração na teoria dos atos do comér- cio. O Código Civil de 2002 conclui a transição, ao disciplinar, no Livro II da Parte Especial, o direito de empresa (COELHO, 2007, p. 26). No Brasil, houve grande dificuldade para se definir um conceito para as relações jurídicas comerciais. Atual- mente, a divergência entre a adoção da teoria dos atos de comércio e da teoria da empresa encontra-se supe- rada, conforme se constata no Código Civil de 2002. 1.4 Direito empresarial: conceito, objeto e limites Existem diversos conceitos que podem ser adotados para conceituar a disciplina Direito Empresarial. Neste contexto, iremos defini-lo como um conjunto de normas que regra as atividades das empresas e daqueles que atuam nesta atividade, bem como dos direitos diretos e indiretos ligados a tais atividades. Nas palavras de Fabio Ulhôa Coelho: O Direito Comercial cuida do exercício dessa atividade econômica organizada de fornecimento de bens ou serviços, denominada empresa. Seu objeto é o estudo dos meios socialmente estrutura- dos de superação dos conflitos de interesses envolvendo empresários ou relacionados às empre- sas que exploram. As leis e a forma pela qual são interpretadas pela jurisprudência e doutrina, os valores prestigiados pela sociedade, bem assim o funcionamento dos aparatos estatal e paraes- tatal, na superação desses conflitos de interesses, formam o objeto da disciplina (COELHO, 2011, p. 22, grifos do autor). O Direito Empresarial (anteriormente chamado de Direito Comercial) nasceu como um ramo autônomo do Direito Civil, possuindo princípios e características próprias. Contudo, apesar da adoção da teoria das empresas, corrente que modificou a perspectiva relacionada ao Direito Empresarial (substituiu a figura do comerciante para 12 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial a da empresa), não se incutiu o desaparecimento da autonomia desta disciplina. Este ramo se apresenta como uma matéria cujo objetivo é regular as atividades empresariais. Podemos notar que o objetivo do Direito Empresarial é regularizar as atividades empresariais e dos agentes que, direta ou indiretamente, são considerados agentes econômicos. Os limites da disciplina de Direito Empresarial estão ligados ao exercício das atividades empresariais. Todos os indivíduos em sociedade necessitam de bens e serviços, sendo estes prestados por sociedades organizadas eco- nomicamente. As atividades empresariais podem ser subdividas em diversos fatores, sendo eles: capital, mão de obra, insumo e tecnologia. Nas palavras de Fabio Ulhôa Coelho: As organizações em que se produzem os bens e serviços necessários ou úteis à vida humana são resultado da ação dos empresários, ou seja, nascem do aporte de capital — próprio ou alheio —, compra de insumos, contratação de mão de obra e desenvolvimento ou aquisição de tecnologia que realizam. [...] Estruturar a produção ou circulação de bens ou serviços significa reunir os recursos financeiros (capital), humanos (mão de obra), Omateriais (insumo) e tecnológicos que viabilizem oferecê-los ao mercado consumidor com preços e qualidade competitivos (COELHO, 2011, p. 22). O agente econômico incumbido de organizar as atividades empresariais da sociedade é denominado como empresário, cuja definição está prevista no art. 966 do Código Civil: “Considera-se empresário quem exerce pro- fissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Destacamos as palavras a seguir para melhor compreensão do dispositivo legal. Vejamos: Profissionalismo: para o exercício profissional de uma atividade empresarial, deverá existir habitualidade do agente. De mais a mais, outro ponto importante refere-se à pessoalidade: o agente no seu exercício empresarial, deve contratar empregados. São estes que, materialmente falando, produzem ou fazem circular bens ou serviços. Isto é, não se considera profissional quem realiza tarefas de modo esporádico (COELHO, 2011, p. 30). Enunciado 199 do CJF – art. 967: “A inscrição do empresário ou sociedade empresária é requisito delineador de sua regularidade, e não da sua caracterização”. Atividade econômica: refere-se à busca de lucro pelas atividades empresariais, seja de meio ou fim, da ativi- dade econômica. Para Fabio Ulhôa Coelho: Note -se que o lucro pode ser o objetivo da produção ou circulação de bens ou serviços, ou apenas o instrumento para alcançar outras finalidades. Religiosos podem prestar serviços educacionais (numa escola ou universidade) sem visar especificamente o lucro. [...] a escola ou universidade religiosas podem ter objetivos não lucrativos, como a difusão de valores ou criação de postos de emprego para os seus sacerdotes. Neste caso, o lucro é meio e não fim da atividade econômica (COELHO, 2011, p. 32, grifos do autor). Destacamos que o ordenamento jurídico traz exceções para a conceituação de empresário. O art. 966, parágrafo único do Código Civil, informa que: 13 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. Estes profissionais, mesmo que contratem outros empregados, não são considerados empresários: advogados, médicos, dentistas, arquitetos etc. Salientamos que ressalvam-se os casos em que esta atividade se constitua como elemento de empresa, ou seja, seja parte da atividade, e não a atividade empresarial em si. Podemos citar como exemplo de elemento de empresa o caso de um médico que exerce suas atividades como profissional em seu consultório, com auxílio de enfermeiras. Contudo, no decorrer dos anos, o consultório transforma-se em um hospital, empregando diversos profissionais. Neste contexto, o exercício da atividade empresarial organizada de exploração no ramo de saúde pode ser entendido como elemento de empresa? Organizada: é aquela que tem os fatores de produção (capital, mão de obra, insumos e tecnologia) explo- rados de forma articulada pelo empresário. A organização da atividade empresarial é um dos principais ele- mentos da empresa. Produção ou circulação de bens ou de serviços: ocorre quando as atividades econômicas preenchem os requi- sitos citados anteriormente, sendo que a produção é a fabricação de produtos ou mercadorias, e a circulação decorre da atividade de prestar serviços ao consumidor, ou seja, é uma atividade intermediaria entre o produtor e o consumidor. Para mais conhecimento acerca dos enunciados do Conselho da Justiça Federal, acesse: <http://www.cjf.jus.br/enunciados/> Concluímos, assim, que o exercício empresarial decorre do desenvolvimento das atividades, seja por pessoas físicas ou jurídicas, desde que organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, tendo como suas características: habitualidade, atividade de produção, circulação de bens ou serviços, finalidade lucrativa e organizada. 14 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Figura 1.4 – Exercício empresarial. Características: habitualidade, atividade de produção, circulação de bens ou serviços, finalidade lucrativa e organizada. Fonte: 48359892 (123RF). 1.4.1 Direito empresarial: autonomia, fontes e princípios Compete, por oportuno, mencionar que a autonomia do Direito Empresarial decorre da existência de fontes, características e princípios próprios. Dentre outros aspectos, notamos a existência de objetivos próprios, bem comométodos interpretativos inerentes à disciplina, sobretudo diante da existência de atividades que não são reguladas pelas normas civis, mas sim por disposições do Direito Empresarial, tais como registro público de empresas etc. Destacamos como características que diferenciam o Direito Empresarial dos outros ramos do Direito o fato de ele ser cosmopolita, oneroso, informal e fragmentário: cosmopolita por tratar de questões comerciais abrangentes, que transpassam a nacionalidade; oneroso, pois sua principal característica é o cunho econômico, ou seja, o lucro; informal, pois visa à celeridade das transações mercantis; fragmentário, em razão da sua formação advir de diversas origens jurídicas e costumeiras. Por sua vez, fonte do Direito, em linhas gerais, pode ser conceituada como os modos em que surgem as normas e os princípios jurídicos, ou seja, são os componentes que compõem o processo, sistêmico e lógico, de criação do Direito. Nesse contexto, as fontes do Direito Empresarial são aquelas que surgem das praxes comerciais. O Decreto-Lei nº 4.657/1942, alterado pela Lei nº 12.376/2010, em seu art. 4º, informa que: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. As fontes primárias do Direito Empresarial são: a Constituição Federal, o Código Civil, o Código Comercial, os tratados internacionais, os decretos e as leis especiais e os princípios gerais do Direito Empresarial. 15 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial As fontes secundárias do Direito Empresarial são: usos, costumes, analogia, jurisprudência e princípios gerais do Direito. Os usos e costumes decorrem da prática hodierna de determinados atos aceitos por todos no âmbito comercial. A analogia toma como base parâmetros utilizados em outro caso para suprir a lacuna do caso sob análise. Jurisprudência é o conjunto de decisões uniformes dos tribunais sobre determinada matéria. Por fim, os princípios gerais do Direito são os alicerces do ordenamento jurídico, haja vista que preveem enuncia- dos de valor genérico e orientam a compreensão do próprio sistema jurídico. Com a adoção de forma indireta, no Código Civil, da definição do termo jurídico empresa, podemos entender que, não havendo o preenchimento dos requisitos previstos, inexistirá pessoa jurídica? Anteriormente citamos como fonte secundária do Direito Empresarial “os princípios gerais do direito”. Contudo, é de suma importância destacarmos os princípios gerais do Direito Empresarial, que são: (I) Liberdade de inicia- tiva, (II) Liberdade de Concorrência (ou Competição), (III) Preservação da empresa, e (IV) Função social da empresa. O princípio da livre iniciativa possui previsão constitucional (art. 170, caput, da Constituição Federal), sendo considerado como direito fundamental, ao passo que garante o direito de acesso ao mercado de produção de bens e serviços. Por este princípio, é resguardada a valorização do trabalho humano como a base da ordem econômica, cujo obje- tivo é assegurar a existência digna do ser humano. O da liberdade de concorrência (ou competição) se traduz no dever de lealdade de competição, ou seja, busca- -se estipular parâmetros para a repressão de possíveis abusos de poder econômico. A concorrência abusiva ocor- rerá todas as vezes em que a atividade econômica gerar um domínio de mercado, com a eliminação da concor- rência ou dos lucros arbitrários. Entrementes, o da preservação da empresa visa proteger a empresa de possíveis percalços que possam estar suportando, facilitando sua recuperação e mantendo sua função social junto à sociedade. Por fim, o da função social da empresa decorre da necessidade de se respeitar os direitos e interesses decorren- tes da atividade empresarial exercida. Em outras palavras, trata-se da superação do individualismo em prol do interesse da coletividade. 1.5. Teoria dos atos de comércio e Teoria da empresa A criação do nome desta disciplina sofreu algumas alterações ao longo dos anos. Inicialmente foi chamada de Direito Comercial, pois entendemos que ela estaria vinculada às práticas relacionadas ao comércio. Hoje em dia é chamada de Direito Empresarial, uma vez que a noção de comércio está mais ampla. Em outras palavras, a nomenclatura de Direito Comercial era utilizada em razão de a disciplina se relacionar à análise dos atos praticados puramente de âmbito comercial, motivo pelo qual foi denominada como Teoria dos Atos do Comércio. 16 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial Esta teoria estava ligada intrinsecamente com as atividades cotidianas dos comerciantes. Assim, qualquer indiví- duo que praticasse um ato de comércio estaria vinculado às normas do Direito Comercial, e não do Direito Civil. Para Fabio Ulhôa Coelho: “[...] pela teoria dos atos de comércio. Sempre que alguém explorava atividade eco- nômica que o direito considera ato de comércio (mercancia), submetia-se às obrigações do Código Comercial” (COELHO, 2011, p. 22). Com a promulgação do Código Civil de 2002, houve a unificação do Direito Civil e Comercial, substituindo a teo- ria dos atos de comércio para a teoria da empresa. A teoria dos atos de comércio tinha como critério o subjetivismo, ou seja, as atividades econômicas estavam ligadas ao agente que as praticava, uma vez que bastava que tais atos fossem enquadrados como atividades relacionadas ao comércio para que o negócio jurídico fosse submetido às regras do Direito Comercial. A teoria dos atos do comércio, de construção francesa, teve vigência até a promulgação do Código Civil de 2002. A teoria da empresa, presente no Código Civil, entende que as atividades econômicas devem ser analisadas com base na sociedade organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços. Conforme escreve Fabio Ulhôa Coelho: Em 1942, na Itália, surge um novo sistema de regulação das atividades econômicas dos particula- res. Nele, alarga- se o âmbito de incidência do Direito Comercial, passando as atividades de pres- tação de serviços e ligadas à terra a se submeterem às mesmas normas aplicáveis às comerciais, bancárias, securitárias e industriais. Chamou-se o novo sistema de disciplina das atividades pri- vadas de teoria da empresa. O Direito Comercial, em sua terceira etapa evolutiva, deixa de cuidar de determinadas atividades (as de mercancia) e passa a disciplinar uma forma específica de produzir ou circular bens ou serviços, a empresarial (COELHO, 2011, p. 26-27, grifos do autor). Em outras palavras, a teoria adotada no Código Civil prevê que o importante é que a atividade econômica seja organizada para a produção e circulação de bens ou serviços. A base legal que representa a adoção da teoria da empresa se encontra no art. 966 do Código Civil e transcre- vemos a seguir: Art. 966 Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organi- zada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. De acordo com a norma legal, não basta o indivíduo praticar atos de cunho comercial, pois esta mesma ativi- dade econômica deverá preencher os requisitos previstos na lei. 17 Direito | Unidade 1: Introdução ao Direito Empresarial A atividade empresarial deve ser organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Empresário é aquele que exerce profissionalmente esta atividade. Neste sentido, qualquer profissional que exerça atividade organizada será um empresário? Assim, para que seja entendido que existe uma atividade comercial, devemos constatar a ocorrência de uma ati- vidade econômica exercida com habitualidade e organização, visandoà produção e circulação de bens e serviços, seja por pessoa física ou pessoa jurídica. Percebemos, na atual codificação, que não existe divisão entre atos civis e comerciais, uma vez que o importante é a forma em que a atividade econômica é exercida. Contudo, é de suma importância destacar que os atos de comércio não desapareceram, mas sim a sua dimensão jurídica, ou seja, o ato de comprar e vender permanecem os mesmos, contudo, houve uma dicotomia entre atos comerciais civis e mercantis. Esta conclusão podemos extrair do art. 2.037 do Código Civil sobre autorização à aplicação das normas que não foram revogadas, do Código anterior. Vejamos: Art. 2.037. Salvo disposição em contrário, aplicam-se aos empresários e sociedades empresárias as disposições de lei não revogadas por este Código, referentes a comerciantes, ou a sociedades comerciais, bem como a atividades mercantis. Ou seja, as sociedades empresariais estão submissas ao regramento mercantil, quando constatado o exercício de atividade econômica de forma profissional e organizada, visando à produção e circulação de bens e serviços (ainda que não fosse enquadrada como atividade mercantil pela teoria dos atos de comércio). Nas palavras de Fabio Ulhôa Coelho: [...] pela teoria dos atos de comércio. Sempre que alguém explorava atividade econômica que o direito considera ato de comércio (mercancia), submetia-se às obrigações do Código Comercial (escrituração de livros, por exemplo) e passava a usufruir da proteção por ele liberada (direito à prorrogação dos prazos de vencimento das obrigações em caso de necessidade, instituto deno- minado concordata). A insuficiência da teoria dos atos do comércio forçou o surgimento de outro critério identificador do âmbito de incidência do Direito Comercial: a teoria da empresa. [...] O Direito Comercial, em sua terceira etapa evolutiva, deixa de cuidar de determinadas atividades (as de mercancia) e passa a disciplinar uma forma específica de produção e circular bens ou serviços (COELHO, 2011, p. 25-27, grifos do autor). Concluímos esta unidade e, em especial, o tema das teorias das atividades econômicas. Pela leitura dos artigos relacionados às atividades mercantis e constatando-nos sobre a superação da teoria dos atos de comércio pela teoria da empresa, verificamos que esta privilegia a sociedade empresarial (teoria objetiva), em vez do agente que pratica as atividades econômica (teoria subjetiva). Essa evolução vem ao encontro da própria transformação global das relações comerciais. 18 Considerações finais Nesta unidade de estudo, você pôde conhecer e aprofundar seus conheci- mentos sobre as noções gerais do Direito Empresarial. Vamos recapitular: • Compreendemos o conceito de Direito Empresarial e seu respec- tivo objetivo: fomentar e regulamentar as práticas comerciais. • Passamos, em seguida, a estudar suas características e peculia- ridades, dentre elas a sua autonomia prática e acadêmica frente aos outros ramos do Direito, suas fontes (primeiras e secundárias) e, finalmente, seus princípios gerais. • Vimos ainda a origem e o conceito da teoria dos atos de comércio e sua superação pela teoria da empresa pelo Código Civil de 2002. Referências bibliográficas 19 BRASIL. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto Lei nº 4.657/1942, alterado pela Lei nº 12.376/2010. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em: 7 jun. 2017. ______. Lei nº 8.906/1994. Estatuto da Advocacia e da OAB. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm>. Acesso em: 7 jun. 2017. COELHO, F. U. Curso de Direito Comercial: Direito de Empresa. v. 1. 11. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. ______. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. REQUIÃO, R. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Forense, 1998.
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