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Culturas infantis e música: diálogo criativo

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Culturas infantis e produção de música para crianças: construindo 
possibilidades de diálogo* 
 
 
Viviane Beineke 
vivibk@gmail.com 
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) 
 
 
Resumo: 
Esta comunicação procura refletir sobre alguns entrelaçamentos e possibilidades de diálogo 
entre estudos sobre as culturas lúdicas da infância e a produção de música para crianças, a 
partir de intersecções marcadas pelas preocupações com a infância, a educação e a criação 
musical. No campo das culturas infantis, Sarmento (2003) explica que é necessário 
compreendê-las a partir da forma como as crianças recebem e interagem com as formas 
culturais produzidas para as crianças pelos adultos, como também, pelas formas culturais 
produzidas pelas próprias crianças. Nesse sentido, a produção de música para crianças exige 
que músicos e educadores construam uma atitude de escuta e compreensão das culturas 
infantis na produção de músicas para crianças. Com o desafio de produzir um trabalho que 
conjugasse a qualidade artística e educativa na elaboração de uma proposta de música para 
crianças, foi desenvolvido o conjunto de livro, CD e CD-ROM Lenga la Lenga: jogo de mãos e 
copos (Beineke e Freitas, 2006). Partindo de músicas tradicionais brasileiras, os autores 
procuraram dialogar de forma lúdica com as canções, criando jogos sonoros que estão 
presentes nos arranjos e podem ser realizados pelas crianças. Foram pesquisadas canções e 
brincadeiras que permitissem a interação com elementos presentes nas mais diversas culturas 
musicais brasileiras, refletindo elementos culturais que as caracterizam. Criando jogos de 
mãos, jogos de copos, explorando sonoridades percussivas de diferentes materiais e 
musicando parlendas e trava-línguas, foram inventadas novas formas de brincar e tocar as 
músicas, favorecendo a expressão criativa e prazerosa da criança no fazer musical coletivo. 
 
Palavras-chave: educação musical; produção musical; culturas musicais infantis; jogos de 
mãos e copos. 
 
 
Brincadeira, jogo e culturas lúdicas da infância 
Se brinca um eu com um tu, que brinca com um outro eu, abre-se a janela 
do encontro, deixando entrar uma fresta que nos leva a um universo diverso 
daquele em que costumamos estar, embora estejamos no mesmo lugar. 
Eugênio Tadeu Pereira 
 
O uso de jogos e brincadeiras no ensino de música é uma prática legitimada em 
educação musical pelas mais diversas tendências educacionais. É comum ouvirmos que as 
crianças “aprendem brincando”, sendo esse argumento utilizado para justificar as mais 
diversificadas metodologias. Observando as crianças brincarem livremente, fica evidente a 
importância dessas atividades para o seu desenvolvimento, mas quando a brincadeira infantil é 
pensada do ponto de vista pedagógico, os usos são bastante distintos. Muitas vezes, essa 
idéia é transposta para o ensino de forma reducionista, colocando a brincadeira a serviço do 
desenvolvimento cognitivo, motor ou rítmico, entre outros. Assistimos então a uma 
 
* Trabalho publicado nas Actas do I Congresso em Estudos da Criança ? Infâncias Possíveis Mundos Reais, realizado 
na Universidade do Minho, Portugal, em fevereiro de 2008. 
 
 2 
“pedagogização” da brincadeira, quando ela perde seu caráter de experiência significativa, 
sendo reduzida a atividades dirigidas (Leite, 2002). 
A incorporação do brincar na escola de forma irrefletida pode gerar um esvaziamento 
da compreensão de que as relações e os valores atribuídos à brincadeira são ideológicos e 
contraditórios (Debortoli, 2005), sendo utilizados os mais variados e antigos jargões, como a 
brincadeira pedagógica, recreativa, brincadeira livre ou brincadeiras dirigidas. As brincadeiras 
pedagógicas, também chamadas de jogos educativos (Kishimoto, 2001), são aquelas que 
valorizam a escolarização, como a alfabetização, jogos matemáticos ou de memória. Embutida 
nessa modalidade de brincadeira está a idéia de tornar as aprendizagens mais agradáveis para 
as crianças, como se a aprendizagem, por si só, não pudesse ser uma atividade prazerosa. 
A brincadeira como recreação, por outro lado, reflete uma função das brincadeiras, que 
são incorporadas ao dia a dia da escola, sem previsão das novas relações ou significados que 
dela possam emergir (Debortoli, 2005). A efetividade desse espaço para o brincar depende, 
quase que exclusivamente, das crianças. O momento da brincadeira livre é aquele em que as 
crianças brincam sem a interferência do professor que, nos seus discursos, revelam uma 
preocupação com o desenvolvimento da autonomia das crianças. O problema, apontado por 
Debortoli (ibid.), é que não há clareza quanto à concepção embutida nessa compreensão, que 
pode reforçar formas individualizadas de expressão das crianças. As interações entre a 
professora e as crianças são fundamentais no processo educativo, mas “de tão reguladas, 
normatizadas, objetivadas, instrumentalizadas, de tanto buscar objetivos preestabelecidos, 
externos e anteriores à própria relação, criou-se a necessidade de adjetivas as brincadeiras” (p. 
69). 
As brincadeiras dirigidas, por outro lado, partem da idéia de que há maneiras “certas” 
de brincar que precisam ser ensinadas pelos adultos, muitas vezes desconsiderando as formas 
como as crianças brincam. O objetivo dessas atividades, segundo Debortoli (2005), é mais 
centrado em ensinar a brincadeira do que realmente no brincar, sendo ensinadas muitas 
brincadeiras, uma após a outra, sem que as crianças tenham a oportunidade de viver o jogo, 
bem como elaborar os seus conflitos e tensões. 
Segundo Brougère (2004), é preciso romper com o mito da brincadeira como natural e 
considerar que a criança está inserida num contexto social desde o nascimento. Discutindo a 
dimensão social do jogo1, o autor (2002) explica que o jogo só existe dentro de um sistema de 
interpretação das atividades humanas, porque não há, de fato, algum comportamento que 
permita definir claramente quando se está brincando ou não. Segundo o autor, o que 
caracteriza o jogo é o estado de espírito com que se brinca. Assim, a noção de interpretação é 
fundamental quando se considera uma atividade como lúdica, o que supõe um contexto cultural 
subjacente que dê sentido às atividades. 
A cultura lúdica das crianças emerge e se desenvolve no próprio jogo, sendo 
necessário partilhar dessa cultura para poder jogar (Brougère, 2002). O autor destaca a 
dimensão social da atividade humana contida no jogo, uma atividade que necessita de 
aprendizagem. Ao contrário da literatura psicológica, que insiste na idéia de que brincar 
 
 3 
depende do processo de aprendizagem da criança, Brougère (ibid.) propõe a idéia de uma 
cultura lúdica, um “conjunto de regras e significações próprias do jogo que o jogador adquire e 
domina no contexto de seu jogo”. Assim, as crianças aprendem a jogar enquanto jogam, 
produzindo suas próprias significações em interação com as significações atribuídas pelos 
outros jogadores. 
A partir desse conceito, Brougère (2002) procura definir as características da cultura 
lúdica infantil, que se origina das interações sociais. O desenvolvimento da criança não produz 
a cultura lúdica por si mesmo, mas determina as experiências possíveis. Nessa perspectiva, a 
criança é co-construtora da cultura lúdica e as interações supõem sempre uma interpretação 
das significações que vão sendo atribuídas pelos participantes, que vão se adaptando e 
produzindo novas significações. Da mesma forma, a cultura lúdica se relaciona com produções 
externas, da cultura geral, como as influências do ambiente ou proibições de pais e 
professores, em um processo indireto, porque se trata de uma interação simbólica que passa 
pela interpretação da criança.Brougère (2002) considera também a existência da cultura lúdica do adulto, que 
precisa ser situada dentro da cultura infantil, dentro de um conjunto de significações que o 
adulto produz para e pela criança, tais como livros, filmes, brinquedos, músicas. “Esses 
produtos integram as representações que os adultos fazem das crianças, bem como os 
conhecimentos sobre a criança disponíveis numa determinada época” (p. 29). A riqueza do 
processo de construção da cultura lúdica, bem como a sua complexidade, consiste no fato de 
que a criança interage e produz seus próprios significados em relação às produções culturais 
dos adultos para as crianças. 
Sarmento (2003) explica que é necessário compreender as culturas infantis a partir da 
forma como as crianças recebem e interagem com as formas culturais produzidas para as 
crianças pelos adultos, como também, pelas formas culturais produzidas pelas próprias 
crianças. Segundo o autor, “é no vai-vém entre culturas geradas, conduzidas e dirigidas pelos 
adultos para as crianças e culturas construídas nas interacções entre as crianças que se 
constituem os mundos culturais da infância” (p. 5). Nesse sentido, é fundamental interpretar a 
relativa autonomia das crianças em relação aos adultos, considerando que “a identidade das 
crianças é também a identidade cultural, isto é, a capacidade de as crianças constituírem 
culturas não redutíveis totalmente às culturas dos adultos” (Sarmento, 2004, p. 20). 
A ludicidade, segundo Sarmento (2004), constitui um traço fundamental das culturas 
infantis, apesar de que “brincar não é exclusivo das crianças; é próprio do homem e uma das 
suas actividades sociais mais significativas” (p. 25). Porém, para as crianças não há distinção 
entre brincar e fazer coisas sérias. O brincar, para as crianças, é a condição da aprendizagem 
e da sociabilidade, razão pela qual o brinquedo as acompanha nas diferentes fases da 
construção das suas relações sociais (ibid.). 
A cultura infantil é uma esfera onde o entretenimento, a defesa de idéias políticas e o 
prazer se encontram para construir concepções do que significa ser criança – uma 
combinação de posições de gênero, raciais e de classe, através das quais elas se 
definem em relação a uma diversidade de encontros (Giroux, 1995, p. 49). 
 
 4 
 
A brincadeira permite, a todo momento, a criação de novos significados e 
interpretações, uma “demonstração da mobilidade humana de reelaborar e estabelecer novas 
conexões entre as ações que fazemos” (Pereira, 2005a, p. 23). Para o autor (ibid.), ela 
acontece numa realidade imaginativa, repleta de significados para quem brinca e permitindo 
que a criança cresça como sujeito de cultura, buscando atribuir significados à sua vida e novas 
maneiras de experiênciá-la. 
 
Escola e brincadeira na sala de aula 
 
Se desejamos formar seres criativos, críticos e aptos para tomar decisões, 
um dos requisitos é o enriquecimento do cotidiano infantil com a inserção de 
contos, lendas, brinquedos e brincadeiras. 
Tizuko M. Kishimoto 
 
Por outro lado, é importante diferenciar a brincadeira que acontece na sala de aula da 
brincadeira do jogo espontâneo, praticado pelas crianças sem a intervenção ou orientação dos 
adultos. Neste, as crianças têm a chance, segundo Maffioletti (2004, p. 38), de “compreender a 
vida por si mesmas", evitando que o seu desenvolvimento seja orientado exclusivamente pela 
perspectiva dos adultos. Estes jogos podem ser facilmente observados quando as crianças 
brincam em espaços não escolarizados, o que não diminui a importância do papel do educador 
em estabelecer e participar do brincar na escola. Por isso, é fundamental que os educadores 
reconheçam o seu papel como mediadores do brincar na educação. Segundo Assunção et al., 
a inserção das brincadeiras na prática pedagógica passa pelo conjunto de mediações 
do adulto nas interações com as crianças, referentes às suas necessidades e àquilo que 
elas sabem fazer em relação ao mundo dos objetos e às outras crianças. Nesse sentido, 
é fundamental que o professor considere, no seu planejamento, recursos e estratégias 
específicas, visando facilitar e enriquecer a experiência lúdica da criança” (Assunção et 
al., 2005, p. 84). 
 
Debortoli (2005) observa que muitas vezes os educadores têm dificuldade em situar 
sua ação perante o brincar, concluindo que isso pode acontecer facilmente quando não estão 
claros os princípios pedagógicos que guiam e sustentam suas práticas pedagógicas, 
resultando, muitas vezes, no retorno à idéia de aprendizagens naturais-espontâneas. 
Apresentar novas brincadeiras às crianças é uma forma de contribuir com o seu brincar, à 
medida que elas têm a possibilidade de construir e reelaborar seu repertório de brinquedos, 
mas enquanto ação educativa, é insuficiente. Além disso, “as interações entre crianças e 
professoras são fundamentais no processo de desenvolvimento e formação humana” 
(Debortoli, 2005, p. 69). Como destaca Faria (apud Leite, 2002), é necessário conhecer os 
suportes teóricos sobre o brincar, aprender a observar as crianças, sem interferir, e ter 
disponibilidade para (re)aprender a brincar. 
Incorporar as culturas das crianças como possibilidades das aprendizagens escolares 
pode, como sintetiza Sarmento: 
 
 5 
...firmar a educação no desvelamento do mundo e na construção do saber pelas 
crianças, assistidas pelos professores nessa tarefa de que são protagonistas – pode ser 
também o modo de construir novos espaços educativos que reinventem a escola pública 
como a casa das crianças, reencontrando a sua vocação primordial, isto é, o lugar onde 
as crianças se constituem, pela acção cultural, em seres dotados do direito de 
participação cidadã no espaço coletivo (Sarmento, 2003, p. 16). 
 
As crianças não precisam saber por que brincam e o que estão aprendendo em suas 
brincadeiras, mas os professores precisam compreender como o brincar pode fazer parte do 
seu trabalho. Brincando com as crianças, o educador tem um papel e uma função diferente da 
criança que brinca. É necessário que o educador se aproprie do gesto de brincar e perceba 
como ele é importante para a criança, para que possa dar significado e direção ao próprio fazer 
de educador (Pereira, 2005a). Para a criança, a brincadeira é uma forma de expressão, e esse 
significado precisa estar presente também nas brincadeiras estabelecidas na escola. Se o 
brincar se estabelece na sala de aula apenas como uma ferramenta para o ensino, ele perde 
seu potencial criador, imaginativo, de possibilidade de expressão, reinvenção e ressignificação 
das suas ações. As crianças é que devem estar em primeiro plano, não os conteúdos a serem 
ensinados (ibid.). Segundo o autor, 
... se entendo o brincar como uma possibilidade de expressão, reconhecendo-o como 
cultura, como forma do ser humano de tornar-se presente no mundo com sua 
peculiaridade de indivíduo e de integrante de um grupo social, há uma chance de o 
brincar se instalar como uma das ações de formação de identidade da criança e, aí sim, 
exercer um papel importante na aprendizagem (Pereira, 2005a, p. 26). 
 
O brincar entre o adulto e a criança permite que se estabeleça, na esfera do imaginário, 
como explica Pereira (2005a), um universo de relações, de possibilidades de comunicação que 
não é nada mais do que brincar, num contexto de significados que são compreendidos 
somente entre aqueles que participam da brincadeira. Ultrapassando a linguagem falada, “a 
brincadeira é, então, repleta de gestos e sons que se inter-relacionam, formando um fenômeno 
que, movido pelo desejo pela intencionalidade de quem brinca, deixa entrar aquilo que é 
reconhecido sem falas, sem letras” (ibid., p. 18). 
Leite (2002) salienta que os professores também precisam brincar,para que possam 
assumir um caráter mediador com as crianças, ampliando o seu acervo de experiências, 
apresentando novos jogos ou outras regras para as brincadeiras. O adulto também brinca, não 
como uma criança, mas pode se conectar ao universo infantil. “Podemos, adultos como somos, 
nos reconectar com uma atitude de infância, e não infantilizada, ao deixarmos a nossa 
capacidade imaginativa atuar sobre nossos atos e assim ressignificar, ao modo lúdico, a nossa 
maneira de exercer nosso papel no mundo” (Pereira, 2005a, p. 25). Brincar de maneira 
infantilizada reflete uma concepção ingênua de infância, que contradiz a “atitude da criança que 
brinca” (ibid.). 
Considerando o modo de vida dos tempos atuais, que dificulta ou impede a 
transmissão oral dentro de espaços públicos, Kishimoto (2004) destaca que cabe à escola a 
tarefa de tornar disponível o acervo cultural que dá conteúdo à expressão imaginativa da 
criança e abrir espaço para que a escola receba outros elementos da cultura não escolarizada, 
beneficiando e enriquecendo o repertório imaginativo da criança. Segundo a autora, as 
 
 6 
instituições infantis selecionam aspectos da cultura relacionados com o saber instituído da 
escola elementar: a escrita e os números, excluindo elementos caracterizadores da cultura do 
país, como o carnaval, rituais do bumba meu boi, festa de coroação dos reis, capoeira, futebol, 
as lendas. Nesse sentido, quando não são valorizadas as lendas e contos, contribuições de 
indígenas, negros e brancos, que resultam na pluralidade cultural da população brasileira, os 
conteúdos escolares separam a escola da cultura (ibid.). Este é mais um desafio que o jogo e o 
brincar apresentam à educação e, mais especificamente, à educação musical e produção de 
música para crianças. 
 
Produção de música para crianças 
 
E se quisermos verdadeiramente fazer justiça às crianças, teremos que 
desafiá-las em sua graça e poder, através de sua própria cultura. 
Lydia Hortélio 
 
No campo de estudo da música para crianças, diversos autores (Bosch, 2007; Brum 
2003, 2005, Burba, 2005; Gullco, 2005; Pescetti, 2005; Queiroz & Tadeu, 2003; Rescala, 2007; 
Sossa, 2005; Tadeu, 2005), vêm pesquisando as relações entre a produção, circulação, 
recepção e o consumo da música para crianças, um trabalho que precisa ser ampliado, de 
modo a incluir a participação de compositores, intérpretes, pedagogos e educadores musicais 
(Gullco, 2005). Segundo Gullco (2005), a música para crianças e, em especial, a produção de 
canções para crianças na atualidade, aparece na intersecção entre as preocupações com a 
infância, a educação, a criação musical e literária e a identidade. Sobre isso, Jorge Enrique 
Sossa (2005) reflete sobre a necessidade de serem conceitualizadas e problematizadas as 
propostas musicais para crianças desenvolvidas nos países caribeo-latino-americanos2. 
Uma discussão central para quem produz música para crianças é o que diferencia a 
música para crianças da música dos adultos. Sobre isso, Bosch (2007) sustenta que, 
independente de quem é o destinatário da sua música, o cuidado, o rigor do trabalho e a 
exigência devem ser as mesmas. O que é diferente são as necessidades de cada destinatário; 
e se o destinatário são crianças, é fundamental que quem faz essa música conheça crianças e 
o universo infantil. Segundo a autora, qualquer um pode cantar ou tocar bem uma canção 
infantil, mas isso fica mais difícil quando não se conhece o universo infantil. 
Procurando mapear o que faz com que as canções se tornem “infantis”, Pescetti (2005) 
destaca três elementos: (1) as letras que se referem ao mundo infantil; (2) o trabalho com 
elementos musicais reduzidos/essenciais e (3) a presença do jogo. O autor destaca que não é 
necessário que se cumpram essas três características ao mesmo tempo, com a mesma 
densidade ou importância, porque a presença mais significativa de uma delas pode permitir que 
a outra receba um tratamento mais complexo. 
Para Pescetti (2005), o elemento mais importante na caracterização da canção infantil 
é a presença do jogo. O autor explica que a canção não precisa ser um jogo em si, mas que o 
 
 7 
compositor, o arranjador ou o intérprete tenham jogado e joguem ao compor, arranjar ou 
interpretar a música; que “tenham jogado com as palavras, com a linguagem musical, com as 
possibilidades timbrísticas e interpretativas” (2005, p. 24). Para Pescetti (ibid.), é o caráter 
lúdico de uma música, ou de uma aula, ou de um programa de rádio, que permite que se 
mantenha o “clima infantil”, mesmo quando se apresentam materiais complexos que não são 
dirigidos exclusivamente às crianças. 
Há muitas canções infantis cuja música poderia ser de uma canção para 
adultos, como aquelas que reconhecemos como tais somente porque a letra 
se refere ao universo infantil. Também há outros casos de canções em que a 
letra e a música são para adultos, no entanto, ao permitirem jogos musicais 
nos arranjos e na interpretação, podem ser assimiladas pelo mundo infantil 
(Pescetti, 2005, p. 26). 
 
Brum (2005) ressalta a riqueza das qualidades recreativas, interpretativas e musicais 
presentes nos jogos das crianças, que mostram sua própria identidade musical, um patrimônio 
exclusivo delas, na hora de jogar e cantar. O autor reflete sobre a necessidade de que músicos 
e educadores construam uma real atitude de escuta e respeito no momento de conhecer os 
jogos e brincadeiras das crianças, respeitando e valorizando a cultura infantil. Segundo ele, 
“nossos espetáculos e canções deveriam ser concebidos como geradores lúdicos de vivências 
e instâncias estéticas de comunicação que resgatem e reelaborem ritmos, jogos e gestos 
melódicos tradicionais” (ibid., p. 70). 
A cultura infantil, como define Hortélio, deve ser entendida como o conjunto de 
experiências, descobertas e o fazer das crianças entre elas mesmas, de maneira que a música 
da cultura infantil deve ser compreendida dentro desse mesmo contexto, incluindo a inter-
relação de palavra, música, movimento e o outro” (apud Brito, 2003, p. 95). Nessa perspectiva, 
as músicas só fazem sentido quando vistas e vividas de forma mais ampla, o que inclui todo o 
contexto do brincar. Na escola, muitas vezes esta prerrogativa não é considerada, como 
quando são cantadas canções “do folclore”, sem que se estabeleçam relações entre o contexto 
cultural e social no qual ela está inserida, como ela é cantada, tocada ou brincada e quem são 
as pessoas que dela participam. Cantar canções tradicionais, no ensino de música, muitas 
vezes significa cantar temas melódicos, desconsiderando a música e o brincar como produções 
culturais. 
Além disso, é importante lembrar que as músicas das crianças não são apenas as 
canções chamadas “infantis”, tradicionais ou não. Além daquelas músicas que os adultos 
consideram como infantis, as crianças revelam modos próprios de fazer e inventar músicas. 
Ouvindo atentamente e procurando compreender sua produção musical, podemos nos 
surpreender com as “linhas de fuga” (Brito, 2007) aos modos tradicionalmente entendidos pelos 
adultos como “música de criança”. Como afirma Brito (2003), 
O brincar musical da criança, sua forma de experienciar, de desenvolver recursos e de 
construir conhecimento nessa área, encaminha as experiências para níveis mais 
elaborados, num processo que se enriquece e assume maior significado quando o 
verdadeiro e efetivo fazer musical infantil está no espaço escolar (Brito, 2003, p. 2). 
 
 
 8 
Com essas questões em mente, produzimos o livro, CD e CD-ROM “Lenga la lenga: 
jogos de mãos e copos” (Beineke & Freitas, 2006)3, um trabalho construído coletivamente em 
um processo constante de criação e reinvenção de brincadeiras e jogosinfantis. Como 
recomenda Pereira (2002, p. 2), acreditamos que o primeiro passo é “redescobrir e reconstruir, 
em nós mesmos, o gosto pelo fazer lúdico, buscando em nossas experiências remotas ou não, 
brincadeiras de infância e de adolescência, ampliando nosso repertório de brinquedos”. 
 
Produção de “Lenga la Lenga: jogos de mãos e copos” 
 
Acreditamos que a surpresa e o estranhamento causados por sons ainda 
não banalizados e gastos pelo uso excessivo e repetitivo são capazes de 
apurar a sensibilidade das crianças, sempre tão abertas e receptivas. 
Miguel Queiroz e Eugênio Tadeu 
 
O caráter lúdico, a presença do jogo e a recriação de ritmos, jogos e canções 
tradicionais são alguns dos elementos que marcaram todo o processo de criação e produção 
do livro, CD e CD-ROM “Lenga la lenga: jogos de mãos e copos”4. O trabalho foi desenvolvido 
no Curso de Licenciatura em Música da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), 
contando com a participação de alunos e ex-alunos, em um projeto que visa a produção de 
materiais didáticos para uso do professor no contexto escolar5. Neste projeto, procuramos 
conhecer melhor a produção musical infantil, as brincadeiras cantadas, jogos de mãos, 
parlendas, adivinhas e trava-línguas que animam o universo infantil para, a partir desses 
recursos, produzir arranjos e composições musicais para uso dos próprios estudantes de 
música em suas práticas de ensino e pela área de educação musical. 
O trabalho começou a ganhar forma quando focalizamos nosso olhar nos brinquedos 
tradicionais infantis, em especial aqueles apresentados nos trabalhos de Eugenio Tadeu e 
Miguel Queiroz (Duo Rodapião) e Lydia Hortélio, além de jogos de mãos brincados em 
Florianópolis (Silva, 2004). Conhecendo esses trabalhos, fomos, cada vez mais, nos tornando 
brincantes e, como tais, nos sentindo gradativamente mais livres e capacitados para criar e 
recriar os jogos musicais infantis. Como adultos que brincam, passamos a interagir com essas 
manifestações, reinventando-as de diversas formas. Criando jogos de mãos e copos, 
explorando sonoridades percussivas com a flauta doce ou com o corpo, elaboramos 
acompanhamentos rítmicos, musicamos parlendas, trava-línguas e adivinhas e 
experimentamos outras maneiras de brincar e tocar as músicas. 
Outro compromisso que assumimos na produção do trabalho diz respeito ao repertório, 
que foi cuidadosamente pesquisado, buscando o resgate de canções pouco registradas em 
livros ou CDs para crianças. Além disso, procuramos pesquisar canções ou elaborar 
acompanhamentos e brincadeiras que nos permitissem interagir com as mais diversas culturas 
musicais brasileiras, infantis ou não. Nessa perspectiva, o repertório inclui canções de 
capoeira, maracatu, bumba-meu-boi e boi-de-mamão, além de ritmos e gêneros musicais como 
o xote, baião, choro e samba. Mais do que um sentido de resgate do folclore, procuramos 
 
 9 
refletir, nas canções, nos arranjos e na interpretação, elementos da cultura popular brasileira. 
Dialogamos de uma forma lúdica com essas canções, sempre as entendendo como produções 
culturais situadas histórica e socialmente. 
Os elementos para a construção do repertório foram buscados no conhecimento sobre 
o fazer musical da criança, reconhecendo-a como produtora de música. Brincando, criando e 
refletindo sobre o potencial pedagógico do que estava sendo produzido, esse repertório foi se 
tornando cada vez mais vivo e significativo musicalmente para o nosso grupo. Consideramos 
essas vivências muito importantes para o educador musical, à medida que, como ressalta 
Pescetti (2005), são mais ricas as canções que são significativas para aqueles que as criaram, 
interpretaram ou arranjaram. Segundo o autor, é fundamental que o músico ou o professor 
busquem um repertório do qual realmente gostem, “porque quando o professor ou o músico se 
exclui da sua criação, o resultado é evidentemente pobre” (ibid., p. 35). 
Para cada música do livro e do CD, elaboramos um jogo musical que permitisse às 
crianças, além de cantar, participar do arranjo e brincar coletivamente, interagindo com a 
música de diversas formas: tocando em grupo, criando e recriando arranjos, improvisando, 
ouvindo e analisando6. Nestas propostas, utilizamos materiais simples e acessíveis, 
procurando favorecer a expressão criativa e prazerosa da criança no fazer musical coletivo. Em 
um processo lúdico de criação, objetos do cotidiano tiveram seus usos modificados: copos 
plásticos e cabos de vassoura se tornaram instrumentos musicais, a flauta doce se tornou um 
instrumento de percussão e sonoridades corporais foram exploradas. Experimentando novas 
maneiras de brincar, fomos construindo um universo de possibilidades sonoras e musicais que 
permitiram ressignificar os jogos tradicionais. Assim, os movimentos da capoeira foram 
representados por improvisos utilizando sons do corpo; jogos de mãos imitam o toque do 
berimbau e os tambores do maracatu; a flauta doce, percutida, marca o tic-tac do relógio em 
“Tumbalacatumba”; e um jogo de copos representa as batidas do pilão na canção “Bate o 
monjolo”. 
As gravações produzidas para o CD7 partiram das composições e arranjos 
dimensionados para as interações típicas das brincadeiras infantis, procurando recriá-los, 
agora respeitando o potencial e as características do suporte gravado. Nesse sentido, as 
gravações do CD não são registros prévios que “ensinam” às crianças aquilo que elas deverão 
tocar na sala de aula; não se trata de uma intenção “cover”, onde a música gravada seria uma 
“partitura sonora” a ser literalmente copiada pelas crianças (Beineke & Freitas, 2007). Os 
arranjos da gravação foram elaborados pelos músicos que participaram de cada faixa, em um 
processo totalmente acústico e artesanal, sempre procurando que eles soassem muito claros e 
expressivos, com uma riqueza de timbres e sonoridades. Na sala de aula, as gravações, 
reinvenções do material produzido para as crianças, podem servir também como pretexto para 
novas reinvenção pelas crianças, à medida que elas interagem com os elementos sonoros 
utilizados na gravação. Nesse processo, ao ouvir as gravações, as crianças que participaram 
das brincadeiras e jogos podem reconhecer algumas passagens, encontrando ali elementos do 
 
 10 
seu próprio fazer musical. Vivenciando a música de outra forma, as crianças também se 
identificam mais facilmente com a proposta da gravação, como se fizessem parte dela. 
Refletindo também sobre a forma como os jogos poderiam ser apresentados no livro, 
colocamos as propostas de forma bastante aberta, sem definir detalhes de execução musical 
ou de arranjo. Com uma concepção de escrita musical das práticas comumente utilizadas na 
música popular, apresentamos melodia, texto e acompanhamento das músicas, como 
elementos que podem desencadear o jogo, a criação de arranjos ou sua reinvenção em sala de 
aula, mas sem predefinir como esses elementos poderiam ser trabalhados. Nessa perspectiva, 
as brincadeiras que criamos são apenas pontos de partida ou referências para o trabalho do 
professor em sala de aula. Não estamos propondo experiências metódicas ou sistemáticas 
através dos jogos que propusemos, porque assim estaríamos indo contra os princípios que 
geraram o trabalho, o caráter lúdico e brincante que o caracteriza. Como afirma Patrício (2001, 
p. 243), “e como tal, o jogo não pode ter uma estrutura fechada, que não permita aos 
participantes um espaço para criarem”. 
Elaborar materiais didáticos é sempre dilemático, quando não se deseja oferecer 
“receitas” para serem “aplicadas” pelo professor. Pelo contrário, nosso objetivo foi deflagrar um 
processo de criação e recriação, abrindo possibilidades de trabalho. Comorefletem Debortoli et 
al (2005), a proposição de materiais para uso dos professores é desejável do ponto de vista 
que possibilita a troca de experiências que pode lançar luzes e sensibilidades ao seu trabalho 
cotidiano. “Mas tudo isso deve ser permanentemente reinventado, desconstruído, reconstruído 
de outras maneiras, invertido, absorvendo a identidade dos professores e das crianças que 
usufuem dos diferentes tempos e espaços pedagógicos” (ibid., p. 106). Interessante seria se, 
como diz Pescetti, a experiência musical com as crianças pudesse “incluir o professor como um 
ser humano com gostos e vivências para compartilhar” (2005, p. 39). Para isso, o professor 
também precisa apropriar-se criativamente das canções, dos jogos e brincadeiras. 
 
“Lenga la Lenga” na sala de aula 
 
Trabalhando as canções do projeto com as crianças na escola durante a realização do 
mesmo, foi possível aprender com elas, que nos deram um retorno vivo e repleto de 
significações sobre o trabalho que estávamos desenvolvendo. Como exemplo, podemos citar 
uma aula na qual trabalhávamos o jogo de copos da canção “Escatumbararibê” para um grupo 
de crianças e uma delas disse: “professora, mas tem que passar o copo, senão não tem graça”. 
E percebemos que a passagem dos copos de um para outro na roda fazia toda a diferença: o 
deslocamento de um trabalho que focaliza o desafio individual, virtuosístico, tão valorizado na 
área da música, para um fazer coletivo, que depende da colaboração no grupo para funcionar. 
É justamente nessa passagem do copo entre os brincantes que pode se estabelecer o jogo, 
que depende tanto do desempenho individual como coletivo, com regras estabelecidas pelo 
grupo que joga. Sobre isso, podemos refletir também que na relação brincadeira e escola, é 
preciso considerar que nem sempre o que propomos para a criança como uma brincadeira, 
 
 11 
significa uma brincadeira para ela. Elas precisam “se tornar donas” (Pereira, 2005b, p. 149) do 
trabalho para que se estabeleça o brincar em sala de aula. E este é um grande desafio na 
elaboração de materiais didáticos para o ensino de música e a produção musical para crianças. 
Os jogos de mãos e copos também favorecem uma outra relação com o fazer musical, 
na qual errar é permitido, porque o que convencionalmente seria um “erro”, passou a fazer 
parte da brincadeira. No jogo do “Rabo do Tatu”, por exemplo, no qual a percussão com copos 
vai sendo acelerada no final, até que não é mais possível sustentar o ritmo. A brincadeira “dá 
certo” quando o jogo começa a “dar errado” e não é mais possível acompanhar a música, 
quebrando a métrica estabelecida no jogo. Qual a graça de brincar se tudo sempre “dá certo”? 
A gargalhada dos participantes no final da música, com copos espalhados por todo o lado, 
totalmente envolvidos, nos revela que a brincadeira realmente aconteceu, em um fazer musical 
movido pela alegria plena de quem brinca “por brincar” e sem medo de errar. Como diria 
Pereira (2005a, p. 20), estão todos em “estado de brinquedo”. Vale destacar que na área de 
música, ainda tão cheia de tradicionalismos e preconceitos sobre quem pode/sabe ou não fazer 
música, isso é muito importante. Claro que o jogo não é isento de tensões, porque os conflitos 
também fazem parte da brincadeira, como quando os participantes “abreviam” o ritmo 
estabelecido a ser feito com os copos, mantendo somente a passagem para os colegas, 
burlando a regra. 
Observando as crianças realizando os jogos, pudemos observar como as crianças 
menores se relacionam com as brincadeiras musicais. Elas olham as crianças mais velhas 
realizando as músicas e, com toda a naturalidade, inventam outras formas de realizar os jogos 
rítmicos, entrando na brincadeira. Para o professor, poderia surgir uma preocupação sobre o 
nível de dificuldade dos jogos de copos, mas as crianças nos mostram que este não é um 
problema, à medida que elas mesmas encontram uma forma de brincar adequada à sua 
habilidade musical e instrumental. Essa é uma idéia que deveria sempre permear a realização 
das músicas, pois observando como as crianças se apropriam das brincadeiras poderemos, 
com cada grupo, de diferentes faixas etárias, criar novas formas de jogar e fazer música em 
conjunto. 
Nesse sentido, não nos preocupamos em estabelecer a faixa etária a que o material se 
destina, entendendo que o jogo e a brincadeira não são práticas exclusivas das crianças ou da 
infância. Em qualquer idade, podemos brincar, atribuir significados próprios e transformar os 
jogos, nos apropriando de diferentes formas de brincar e fazer música coletivamente. Sobre 
isso, Pescetti (2005), chama a atenção para o fato de que o grau de dificuldade depende do 
tipo de participação ou resposta que esperamos das crianças, ouvindo, cantando, tocando um 
instrumento, dançando, batendo palmas livremente ou simplesmente ouvindo. O professor não 
pode confundir habilidades com capacidade de fruição, de gozo, de prazer, de desfrutar; 
mesmo que não tenhamos a capacidade de compreender ou realizar tudo (ibid.). 
Dessa forma, o material proposto possibilita maneiras variadas de participar do fazer 
musical e muitos níveis de leitura das canções, permitindo múltiplas formas de escuta e 
utilização do material em sala de aula. Nas práticas educacionais desenvolvidas a partir do 
 
 12 
trabalho, pudemos comprovar essa posição, havendo situações em que alunos adolescentes 
viram as crianças menores realizando os jogos de copos e pediram para participar. 
Posteriormente, eles expandiram as idéias, criando outros jogos para músicas de sua 
preferência. O mais importante, como salienta Pereira (2005b) é a forma como brincamos, 
mantendo uma atitude não infantilizada perante o brincar. Nessa perspectiva, cada professor, 
cada criança ou grupo poderá interagir de forma diferente com as canções, dependendo dos 
seus interesses, conhecimentos ou habilidades musicais. 
 
Considerações finais 
 
Acreditamos que o uso de elementos que fazem parte do próprio universo das crianças 
nas brincadeiras para a sala de aula é uma forma de valorizar o saber infantil, ampliar os 
valores estéticos, fantasias e o imaginário, tornando o aprendizado mais significativo para a 
criança. Além disso, as gravações das músicas ampliam as possibilidades de reinvenção do 
material, estimulam outras faculdades sensoriais, perceptivas, criativas e musicais, 
transcendem o tempo e o espaço da sala de aula, e favorecem a interação com a família e os 
amigos, professores e alunos, em situações e ambientes diversos. 
No âmbito da formação de educadores, discutir os princípios educativos que 
fundamentam os trabalhos do projeto, vivenciar e reconstruir esses conhecimentos através da 
criação de propostas concretas de educação musical vem contribuindo para uma formação 
mais consciente e criativa dos alunos do Curso de Licenciatura em Música. Participando do 
projeto, os acadêmicos têm a oportunidade de articular seus conhecimentos musicais e 
pedagógicos, ao mesmo tempo em que contextualizam esses saberes com os diferentes 
espaços de atuação docente dos quais participam. Nessa perspectiva, foi possível produzir um 
material musical gerado a partir da prática e para ela, em um processo guiado por reflexões 
teóricas e saberes advindos da experiência vivida pelo grupo na Universidade e nas escolas. 
Através deste projeto, em um processo mediado pela ação e reflexão sobre a prática 
docente, criamos um ciclo de criação musical e pedagógica, que pode contribuir também na 
produção de saberes teóricos, de novas bases conceituais e musicais para prática pedagógica. 
O próprio processo de elaboração do material é constantemente realimentado pela prática em 
sala de aula, que gera umanova demanda e possibilidades de uso dos materiais. E vamos 
criando um ciclo que, acreditamos, pode promover uma constante renovação e 
desenvolvimento das práticas musicais escolares e da produção de música para crianças. 
 
Notas: 
1 Nesse texto de Brougère, a palavra “jogo” é utilizada em um sentido amplo do “brincar”, não supondo jogo com 
regras. 
2 Essas reflexões fazem parte do Movimento Latino-americano e Caribenho da Canção Infantil, Movimento gestado nos 
encontros que se realizam desde 1995, em diferentes países, com a finalidade de elevar o nível conceitual e de 
qualidade artística das propostas musicais para a infância no continente. Buscando o desenvolvimento das identidades 
culturais dos participantes através do intercâmbio de experiências, do conhecimento mútuo entre educadores e 
compositores, são elaboradas reflexões conjuntas sobre os trabalhos realizados, sempre com a preocupação em 
respeitar a enorme diversidade de propostas. Este movimento caracteriza-se como resultante de uma convocatória 
criada por artistas, educadores, produtores e diferentes personalidades preocupadas com a qualidade musical dos 
 
 13 
trabalhos desde um enfoque educativo responsável e que não deixe de lado os direitos das crianças em construir uma 
identidade cultural própria (Brum, 2005). 
3 O conjunto de livro, CD e CD-ROM foi publicado no Brasil pela Editora Ciranda Cultural (2006) e em Portugal pela 
Editora Foco Musical (2007). No Uruguai, o CD e CD-ROM foram editados pelo selo Papagayo Azul (2007). 
4 Para ouvir algumas músicas, visite www.lengalalenga.com.br. Para assistir o vídeo de um jogo de copos ou conhecer 
os jogos do CD-ROM, entre em www.lengalalenga.blogspot.com. 
5 O projeto “Produção de material didático para o ensino da música na escola” integra o Programa NEM – Núcleo de 
Educação Musical da Universidade do Estado de Santa Catarina (www.ceart.udesc.br/nem), um Programa de Ensino, 
Pesquisa e Extensão que visa a formação de professores de música para a escola pública. O projeto objetiva a 
produção de material didático para o ensino de música na escola fundamental e, ao mesmo tempo, é uma atividade 
que complementa a formação do acadêmico participante, tornando-o mais crítico em relação ao material didático que 
utiliza e capaz de produzir seu próprio material. O projeto iniciou em 2001 e é de caráter permanente, sob coordenação 
dos professores Viviane Beineke e Sérgio Paulo Ribeiro de Freitas. 
6 As brincadeiras musicais que deram origem aos arranjos do CD foram criadas por: Áurea Demaria Silva, Deodósio 
Juvenal Alves Júnior, Gabriela Flor Visnadi e Silva, Gisele Garcia Vianna, Lourdes Saraiva, Ronaldo Steiner, Thiago 
Paulo Mützenberg, Vanilda L. F. Macedo Godoy e Viviane Beineke. 
7 Participaram do trabalho de gravação do CD os músicos: Áurea Demaria Silva, Deodósio Juvenal Alves Júnior, 
Fernanda Rosa da Silva, Francisco Emilio Neis, Gabriela Flor Visnadi e Silva, Luiz Sebastião Juttel, Sérgio Paulo 
Ribeiro de Freitas, Vanilda L. F. Macedo Godoy e Viviane Beineke, além das participações infantis de Bruno, Janis, 
João Vinícius e Yolanda. 
 
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