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laplantine Introdução O campo e a abordagem Antropológicos

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ANíLAlovoç19 /- / ll ^ /lVa; -Vcv",lb, lú 
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IPsrÍodo
irrj-"- r 11 3'-8
INTRODUÇÃO
OCÂMPOEÂ.ABORDAGEM
ÂÌ\I'IROPOIóGrcOS
í, t,o,p t-Arn í tr,te
O homem nunca parou de interrogar-se sobre si mesmo.
lìm todas as sociedades existiram homens que obseryava;n
homcns. I'louvo.âté alguns que eram teóricos e forjaram,
como diz l.óvi-Strauss. modelos elaborados "em casa". A
rcflcxão do homem sobrc o homem e sua sociedade, e a
elaboração dc um sabcr são, portanto, ião antigos quanto
a humanidade, c sc dcrant tanto na Ásia como na ÁÍrica,
na América, na Oceania ou na Europa. Mas o projeto de
fundar uma ciência do homem 
- 
uma sntrcpologie 
- 
é,
ao contrário, muito rÈccnte. De íeto, Bpenos no final do
século XVIII é que começa a se constituir um saber cienlÍ-
lico (ou pretensâmente científico) que toma o homem como
objeto de conhecimento, e não mais a naturezs; aPcnas
nessa época é que o esPírito científico pènsa' pela ptimeira
vez, em aplicar ao póprio homem os métodos até então
utilizados na área física ou da biologia.
Isso constitui um evento considerável na história do
pensamenlo do homem sobre o homem. Um evento do qual
talvez ainda hojc não estejamos medindo todas as conse-
Eau-.È-l-cà/lÈ R$ '4 r'fJ
t{ o c^MPO E 
^ ^tsORD^GEM ^NTROPOIiGI@S
(l(ierìcius. lìssc pensamento tinha sido até entâo mitológico,
rrrtíslico, tcológico, filosófico, mas nunca científico no q.ue
<lizir rcspcito ao homent em si. Trata-se, desta vez, de fazer
passlr oslc últirno do cstauto de sujeito do conhecimento ao
dc objcto da ciôncia. Finâlme[te, a antropologia, ou mais
precisnnrcntc, o projcto antropológico que se esboça nessa
dpoca nrLrito tardia na História 
- 
não podia existir o con-
ccito dc homem'enquanto regiões da humanidade perÌnane-
ciam inexploradas 
- 
surge em uma região muito pequena
clo mundo: a Europa. Isso trará, evidentemente, como vere-
mos mais adiante, conseqüênciâs importantes.
l)nrn qtrc essc projeto alcance suas primeiras realiza-
çòes, para que o novo saber comece a adquirir um início
de legitimidade entre outras disciplinas científicas, será pre-
ciso esperar a segunda metade do século XlX, durante o
qual a antropologia se atribui objetos empíricos autônomos:
as sociedades então ditas "primitivas", ou seja, exteriores às
área.s de civilização européias ou norte-americânas. A ciên-
cia, áò íenoi iui ào*o é concebida na época, süpõe uma
dualidade radical entre o observador e seu objeto. Enquanto
que a separação (sem a quaÌ não há experimentação possÍ-
vel) entre o sujeito observante e o objcto obscrvado é obtidn
na íísica (como na biologia, botânicn, ou zoologia) pcla
natureza suficientemente diversa dos dois termos prcscntes,
na história, pela distância no tempo que septrrÌ o historildor
da sociedade estudada, ela consistirá na antropologin, ncssn
épocn 
- 
c por muito tempo 
- 
em umn distílncil dcfiniti-
vamente geográfica. As sociedades estudadas pelos primeiros
antropólogos são sociedades longínquus às quais são atribuí-
das as seguintes características: sociedades de dimensões res-
tritas; que tiveram poucos contatos com os grupos vizinhos;
cuja tecnologia é pouco desenvolvida em relação à nossa;.e
nas quáis há uma menor especialização das atividades e
funções sociais. São também qualificadas de "simples"; em
conseqiiência. elas irão permitir a compreensão, como numa
AP?EìIIIER ANTROPOLOGIÀ 15
situação de laboratório, da organização "complexa" rJc nos-
sas próprias sociedades.
lir*
A antropologia acaba, portanto' de atribuir-sc um obje-
to que lhe é próprio: o estúdo das populações que não per-
tencem à civilização ocidental. Serão necessárias ainda algu-
mas décadas para elaborar ferramentas de investigação que
permitam â coletâ direta no campo das observações e infor-
mações. Mas logo após ter firmado seus próprios métodos
de pesquisa 
- 
no início do século XX 
- 
a antropologia
percebe que o objeto empírico que tinha escolhido (as sg-
ciedades ;'primitivas") está desaparecendo; pois o próprio
universo dàs "selvagens" não é de forma alguma poupado
pela evolução sotial. Ela se vô, portanto, confrontada a uma
crise de identidade. Muito rapidamente, uma questão se co-
loca, a qual, como veremos neste livro, permanece desde
seu nascimento; o fim do "selvagem" ou, como diz Paul
Mercier (1966), será quc n "mortc do primitivo" há de
causar a mortc taqueles quc haviam sc dado como tarefa
o scu estudo? A cssâ pcÍguntíl vórios tipos de resposta pu-
<lcrnm c potlcnr aindtt scr clados Detcnhamo-nos em três
dclcs.
l) O nntropólogo accita' por assim dizet, sua morte,
c volta para o ânrbito das outras ciências humanas' Ele
rcsolvc a qucstão da autonomia ptoblemática de sua disci-
plina rccncontrando, especialmente a sociologia,. e notada-
mcntc o quc ó chumltlo <lc "sociologia conìparÍrda",
2) Ele sai em busca de uma outra área de investigação:
o camponôs, este selvagem de dentro, objeto ideâl de seu
estrrdo, particularmente bem adequado, já que Íoi deixado
de lado ielos outros ramos das ciências do homemr
l. Â p€squisâ etnográfica cujo obieto peltence à mesrna sociedade-que
o observaàor- foi, de inícìo, qualificada pelo nolne de lolklore' Foi Yan
Gennep que elaborou os métodos próprios desse campo de estudo empe'
't' iìIÌ ' i
'-'lt. 
.,:larrio .-. 
-
. ..:.:,, rijidâiic <ic sua prática, rãoi.i;!,,r .,,i:.r . r Jirjcto ern1,írico constituído (o seivagem,
/ o_ camponôs), rnas atravós dc uma abordagem epistemoló-
ì Sica constituinte. Essa é a tsrccira via que começaremos a\ esooçar nas paglnas quc sc scgucm, c quc scrá desenvolvida
/ no conjunto dcstc trabalho. O objcto túrico da antropole.
I eia nao está ligâdo, na pcrspctiva na qual começam-os a
nos situar a partir dc agorrt, { unl cspaço geogrófico, cultu_
ral ou histórico prrticuhr. lDoir n onrropologia nío é senão
uÍn certo olhar, um ccrto cn[o<1uc <;uc consistc cm:
' a) o estudo do honrcnr inlcìro;
lrJ o estudo do holncnr cm toíld., as scrcicdadcs, sob
lodcs Bs latitudcs em lodos os scus cstüdos c cm ío</cs asépocas. ,ìr
O ESTUDO DO IIOMEM TNTEIRO
Só pode ser considcrada como lntropológico uma abor-
dagem integrativa que objetive levar em mnsideração as
múltiplas dimensões do ser humano em sociedade. Certa-
mgnte, o acúmulo dos dados colhidos a partir de observa-
ções diretas, bem como o aperfeiçoamento das técnicas de
investigaçãô, conduzem necessariamente a uma especializâ-
çõo do sober. Porém, uma daa vocações moiores de no6oa
abordagem consiste em não parcelar o homem mas, ao con-
trário, em tentar r€lacionar campos de investigação freqüen-
temente separados- Ora, existem cinco áreas principais da
antropologia, que nenhum pesquisador pode, evidentemente,
dominar hoje em dia, mas às quais ele deve estar sensibili
nhandosc em explorar exclusivamenle (mss de uma forrna magistral) as
tradições populares con4nes.B, a disl-ôncia social e cultural quJ 
""p"o oobjcto do sujeito, substituindo nesse çâ60 â distâscia 8eo8Ìáfic{ da Ârltro.pologia'exótica'.
, .- ,. . qur l;È j_i ;iri:c ártas ffàntênì relaçóes d,.stt,eítas
entfc::,-
A antropologia biológica (designada antigamente sob o
nome de antropologia física) consiste nc estudo das varia-
@s dos câracteres biológicos do homem no espaço e no
tempo, Sua problemática é a das relações entre o pâtrim&
nio genético e o meio (geográfico, ecológim, social), ela
analisa as particularidades morfológicas e fisiológicas liga-
das a um meio ambiente, bem como a evolução destas par-
ticularidades. O que deve, especialmente, a cultura a este
patrimônio, mas tarnbém, o que esse patrimônio (que se
transforma) deve à culhrra? Assim, o antropólogo biologis-
ta levará em cgnsideração os fatores atlturais que influen-ciam o cerscimênto e I maturação do,indivÍduo. Ele ee per-
guntará, por exemplo: por que o desenvolvimento psicomotor
dn criança lfricrna é mais adiantado do que o da criança
cunrpéil?
lÌ.ssu partc da arìtropologia, longe de consistir apenas
no cstudo dns formas dc crânios, mensurâções do esqueleto,
ttnrnnlìo, pcso, cor da pele, anatomia comparada as raças
c dos scxos, intcrcssa-sc em especial 
- 
desde 6s gn95 JQ 
-pcla gcnéticu das populoçõcs, que permite discernir o que
diz rcspcito so inoto c ao adquirido, sendo que um e outro
estão intcragindo continuamente. Ela tem, a meu ver, um
papel particularmcnte importante a exercer para que não
sejam Ìompidal oB rcloçõ€8 cntre ss pesquiras das ciênciag
da vida e as das ciências humanas.
A anlropologia pÉ-hìstóríca é o estudo do homem atra-
vés dos vestígios materiais enterrados no solo (ossadas, mas
também quaisquer marcâs da atividade humana). Seu pro-jeto, que se liga à arquealogia, rrisa reconstituir as socieda-
des desaparccidas, tanto em suas técnicas e organizaÉes
sociais, quanto em suas produções culturais e ârtísticas. NG.
tamos gue e*;e ramo da antropologia trabalha com uma
.abordagem idêntica às da antropologia histórica e da qntro-
t9t8 O CAMPO E 
^ 
ÁIORDAGEM AÌ.TROFOTóOICOS
pologia social e cultural de que tratâremos mais adiante' O
historiador é antes de tudo um hisloriógralo, isto é, um
pesqrrisador que trabâlha a paltir do acesso direto aos lextos.
O especialista em pré-história recolhe, pessoa/rrenle, objctos
no solo. Ele realiza urn trabalho de campo, como o realizado
na antropologia social na qual se beneÍicia de depoimentos
vivos.z
,! antropolo[ia lìngüística. A linguagem é, com toda
evidência, parte do patrimônio cultural de uma sociedade.
É através dela que os indivíduos que compôem uma socie-
dade se expressam e expressam seus valores, suas preocupa-
çõcs, sor.rs pcnsaÍncntos. Apcnns o cstudo da língua permite
compreender:
. como os homens pensam o que vivem € o que sen-
tem, isto é, suas categorias psicoafetivas e psicocognitivas
(etnolingüística):
r como eles expressam o universo e o social (estudo
da Ìiteratura, não apenas escrita, mas também de tradição
oral)i
. como, finalmente, eles interpretam seus próprios
saber e saber-fazer (área das chamadas etnociências).
A antropologia lingúística, que é uma disciplina que
se situa no encontÍo de várias outras,l não diz respeito ape-
nas, e de longe. ao estudo dos dialetos (dialetologia). Ela
2. Foi notadamente graças a pesquisadores como Paul Rivet e André
l-croi-Courhsn (1964) que a ! iculnção entte ss árcas d! ântropologiâ físi
rn, blol(iglcr r: sdclu'cttlturrl trttrtct íttl rontpldn ntt lìtançn. M[l oonlloui
sempre amcâçsds dc ÍupluÍa dcvido a um movimcnto dc erpccializaçõo
Íacilmente compreensívcl. Assim, colocando-se do ponto de vista da antro_
pologia social, Edmund Leach (1980) fala da'desagradável obrigação de
Íazer ménage à l.ois com os aeprcsentantes da arqueologia pr€-hislóricâ e
da antropologia física', comparandoa à coabitação dos psicólogos e dos
especialistâs da observação de ratos em laboratório.
3. Foi o antropólogo Edwdrd Sapir (1967) quem, além de introduzir o
estudo da linguagem entre os matetiais antropológicos, começou tâmbém a
mostrar que um estudo antropológico da língua (a lín8ua como objeto de
pesquisa inscrevendo-se na cultura) condtrzia a um estudo lingüístico da
culturo (a lingua como modelo de coohecimento da cultura).
APRENDB AIITROPOIICIA
sc intcrcssa também pclas imensas áreas abertas pclts trovas
tócnicrs ntodcrnrts tlc comunicação (mass nreúlio c cullur;l
do uudiovisull).
A onlrolnlogíu psícológíca- Aos três prirnciros pólos
clc pcsquisrr qttc fttrttm mcncionndos, e quc siio habittral-
nÌcntc os titticos ctxtsitlcrntlos como constitutivos (oom rì
onlr()pololir socinl c tt cttltttrttl, tltts tlunis falarcmos a sc-
guir) tlo ctrnrpo gloltnl tltr trttlropologia, ftzcrrtos qucstiio
pcssoalmcnlc tlc ttcrcsccttlnr tlln (lttinto pólo: o dl rntropo-
logia psicológicn, quc coltsistc ttrt cslttrlo dos proccssos c do
funcionamento do psiqrrisnlo lttttrtttttrl. I)c ftto, o nntropó-
logo é em primcira instíìncir cottÍr<tlttntlo niio n conjuntos
sociais, e sim a indivíduos. Otr scjl, sollÌcntc ntrÍÌvós dos
comportamentos 
- 
conscicntcs c inconscicnlcs 
- 
dos scrcs
humanos paÍicdlares podemos nprccntlcr css[ totrli(lIld0 scnl
a qual não é antropologia. Ê n raziio Pcltl qtltÌl n tlimcnsão
psicológica (e também psicopatológico) é nbsoltt(umcntc in-
dissociável do campo do qual procurnnlos nqtti tlnr conta
Ela é parte integrante dele'
A antropolôgía socia! e cu\ural (ou elnología) nos dc'
terá por muito mais tempo. Apenas nessa írel tcmos tlgttma
competência, e este livro tratará esscncialmentc dcla. Àssim
sendo, toda vez que utilizarmos a Partir dc ngora o tcrmo
antropologia mais genericamente; estaremos nos refcrindo
à antropologia social e cultural (ou etnologia), mas pro-
curaremos nunca esquecer quc ela é aPenas um dos aspcctos
da antropologia. Um dos aspectos cuia abrangêncin é consi-
dcrdvcl, id quc diz rcspcito u ludo quc collstltul ullltt Boclc
dade: seus modos de produção econômica, suaÈ técnicas,
sua organizaçáo política e jurídica, seus sistemâs di Parcn'
tesco, seus sistemas de conhecimento, suas crcnçÍÌs rcligio
sas, sua língüa, sua Psicologia, suas criações artísticas.
lsso posto, esclareçâmos desdc .iá quc a antropologin
consiste menos no levantamento sistcmático tlcsscs ttspcctos
do que em mostrâr a maneirâ ptrrticulÍÌr coÌÌl ÍÌ qoÍrl cslrio
relacionados entre si c atravds da qtlrl aparct:t: n t:slxrifici
20 O C,\t{pO E 
^ ^BORDÁcEra ÂìaTR@OLóCrG
dade de uma sociedade. É precisamente esse ponto de vistada totalidade, e o fato de que o antropólogo procura com-
preender, como diz lévistrauss, aquilo que os iomens .,não
pensam habitualmente em fixar na pedra ou no papcl,, (nos_
sos gestos, nossas trocas simbólicas, os mcnorcs dctalhes dos
nossos comportamentos), que faz dcssa abordagcm um trâta_
mento fundamentalmcntc difcrcntc dos utilizados sctorial_
mente pelos geógrafos, csonomistrìs, luristas, sociólogos, psi_
cólogos...
o Es't'uDo DO OMIìM tÌM s(JA t)tv[RstD^DtÌ
A antropologil nio ó n1rcnls o cslurlo tlc ttrrlo rlrrc conr_
põc uma socicdarlc. Iìla ó o cstudo dc trxlls rs so,cictlldcs
hunranas (a nossa irrclusivc.), ou scjn, rlls culturus dt hunrl-
nidudc conro rrm todo ctnnsults tlivcrsirlnrk:s lrlskrrir.:ls t:
gcogróficas.
-Visando constituir os "rn;rrivos" du lturntrrirlrtrlc crn
suas diferenças significativts, clu, inicialmcrrtc privilcgiou
claramente as áreas dc civilização cxtcriorcs À nossa. Mrs
a antropologia não podcria scr dcfinida por um objcto cmp!
rico qualquer (e, em especial, pelo tipo de sociedaJe ao qual
ela a princípio se dedicou preferencialmente ou mesmo ex-
clusivamente). Se seu campo de observação consistisse no
estudo das sociedades preservadas do contato com o Oci-
dente, ela se encontraria hoje, como já comentamos. sem
obieto.
. 
Ocorrc, porém, que se a cspecificidadc da contribuição
dos antroÉlogos em relação aos outros pesquisadores em
ciências humanas não pode ser confundida com a natureza
4. Os ân(ropólogos comcçâmm ã sc dcdicar âo estudo da.s socicdades
industriais avançadas apcnas mui{o recenteÍncnte. Âs primeiras pesquises
lrataram primeiro, como vimos, dos ãspc€Ios 'tradicionais. das socicàades
'não tradicionais' (as comunidadcs camponesãs er_rropéias), cm scguida,
dos grupos margìnais. e finalmente, há alguns anos up"nas na Franç"a, do
selor urbâno
APRENDIF AìI:IROI'OI,oõIA 2I
das primeiras sociedades estudãdas (as sociedadr:s extra€uro-
péias), ela é a meu ver indissociavelmente ligada so modo
de conhecimento que foi elaborado a parlìr do estudo dessas
sociedades: a observação dìreta, por impregnação lenta e
contínua de grupos humanos minúsculos com os quais man_
temos uma relação pessoal-Além disso, apenas a distância em relação a nossa socie-
dade (mas uma distância que fazlÒm que nos tornemos ex_
tremamente próximos daquilo que é longínquo) nos permite
fazer estâ descoberta: aquilo que tomáyamos por natural em
nós mesmos é, de fato, culturâl; aquilo que era evidente é
infinitamcnte problemático. Disso decorre a necessidade, na
formação antropológica, daquilo que não hesitarei em chamar
dc "cstranhamenlo" Qlepaysement), a perplexidade provo-
cfl(la pclo cncorúro das culturas que são para nós as mais
distllrtcs, c cujo encontro vai levar a uma modificação do
ollnr ql.a sc tinha sobrc si mesmo. De fato, presos a uma
tirricn crrllrrnr. sonros niro apcnas ccgos à dos outros, mas
nríopcs tlullrdo sc trrÌtü (la nossa. A experiência da alteri-
tlnrlc (c n cltltorlçÍo dcssn cxpcriôncia) leva-nos a ver aqr.silo(lr.rc lclì tcrÍurnos consclltritlo inraginar, dada a nossa difi-
cultltrlc cnt Íixur rrosst rÌtcnçlo no quc nos é habitual, fami-
linr, cotirlitno, c tluc considcrrmos "cyidcnte',. Aos poucos,
notalllos (luc o tÌÌcnor dos rrossos conìporÌamcntos (gcstos,
nrÍmicas, posturls, rcaçÕcs afctivas) Dão tcnÌ rcalmcntc nada
de "natural". Conrcçanros, cntõo, a nos surprcendcr com
aquilo que diz rcspcito a nós nrcsrnos, a nos cspiar. O co
nhccirÌrcnto (nntropológico) rln nosso cul(uro l)ns$ÍÌ iucvilrì"
velmente pelo conhccinrcn to.dâs outrss culturos; c dcvemos
especialmente reconhecer que somos uma cultura possível
entre tantas outras, mas não a única.
Aquilo que, de fato, caractcriza a unidadc do homem,
de que a antropologia, como já o disscmoi è voltaremos a
dizer, faz tanta questão, é sua aptidão praticamente infinita
para inventar modos de vida e foimàì de òrgãnização social
extremamente diversos. E, a meu ver, apenas a nossa disci-
^r'llÌ:Nrn,rr ÀN tlÌ(trol,(xìl^o c^MPo *l 
^ ^ÍlonD^ct';M ^N lìÌol\)l,lxll(,os
plinl permitc notar. cotÌt o nÌrrior proxinli(lndc possível, que
essas formas de comportlrncnto c dc vida cm sociedade
que tomávamos totlí,s r:spott t tt ttctllÌì cÍì lc por inatas (nossas
maneiras dc andar, tl<trrttit, tttls cncotìtrar, nos cmocionar'
comemorar os cvctìtos tls lrttssil cxistOncia . ') são, na reali-
dade, o produtr.r tlc cscttlhrts ctrltttrais. Otr seja, aquilo que
os seres lìurniìno$ tôttt crt ctttntnt é sua capacidade para
sc r[ílercncíur tttts dos tuttros, para elaborar costumes, lín-
guas, nro<los rle corrhccimcnto, ilrstituições, jogos profunda-
nrcntc tlivcrsos: pois se há algo nalural nessa espécie parti-
ctrlar qtrc ú a espécic htrnrana. é sua aptidão à variação
cullurul.
O projcto antropológico consiste, portanto, no reconhe-
cinrcnto. conhecimento, iuntamente com a compreensão de
rrrna htrrnanidade plural. Isso supõe ao mesmo tempo a rup-
ruríÌ com a figura da monotonia do duplo, do igual, do
idôntico. e com a exclusão num irtedutível "alhures". As
socicrlirtlcs rncis difcrenles da nossa, que consideramos espon-
tlnearrrente como indifercnciadas, são na realidade tão dife'
rentes entre si quanto o são da nossa. E, mais ainda, elas são
para cada uma delas muito raramente homogêneas (como
scria de se esperar) mas, pelo contrário, extremamente diver-
sificadas, participando ao mesmo temPo de uma comum
humanidade.
A abordagem antropológica provoca, assim, uma ver-
--dadeira revolução epistemológica, que começa por uma re-
voltrçiio do olhrr. F.la implica um desccntramento rndical,
ums ruptura com a idéia de que existe um "centro do
mundo", e, correlativamente, uma ampliação do saberi e
5. VeÍemos quc a anlropologia supóe não âpenas esse desmembramen'
to léclalemenl) do saber, que se exptessa no relativismo (de um icrn de
Léíy) ou no celicismo (de um Montâigne), ligados ao questionamento da
cullurâ à quÂl sc perlence. mas lambém uma novo pesquisa e vma teaotls'
!ìtuição òeste saber. Mas nesse ponto coloca-se uma questãoi será que â
antropologi é o discurso do Ocidente (e somente dele) sobre a alteridade?
Evidentemenle, o europeu não Íoi o único â interessâr-se pelos hábilos
c pelâs inslitUiçõ€s do não+uropeu. A ÌecípÍoca também é verdadeira.
unÌfl rnutttçi-to tlc si lttcsttltt. Cttttlo csctcvc lìogcl lÌnrilidc
em suu /rll(,,,ri.t tlr tlnlrtl (iirlr: "lì.tr sott tnil ltossÍvciri cttt
nrimi nttts tttltt ltosstt rttu tcsigtlnr lÌ (ltlcrcr lll)cllllli tttrl rlclcs"'
 dcscoltcrltt tlrr lllt:r'irlntlt: ó tt tlc tttttn rcltlçtttt qltr: ttot;
pcrnritc tlcixlr dc itlcrrtillclr Íl()!{5tl l)c(ltlcllll lttttvítlcitt dc
iruntanitlutlc coln tr lttttttltlt itltltlc, tr cttrrcltttivrttttctltc tlcixtlt'
clc rcjcitnr o prcstttttitltt "sclvngcrtt" [ttrtt tk: ltt'ts tncstttos
Confrontaclos à nrtrltipÌicitltrclc, a 2riori crrlgrnítitrn, tltts cttl-
turas, sonìos aos poucos lcvados n l'oÌÌìl)0r colÌì n nlrttltlltllcttt
comum que opera senìPrc a nflturlÌlizüçlio tlo socinl (cotno
se nossos comPortamentos estivessem insi:rit<ts ctrr rtírs tlcstlc
o nascimento, e não fossem adquiridos no colìtllto colÌì ll
cultura na qual nascemos). A rompet igualntctttc cottt '':
humanismo clásslco que também consistc nl iclcntificnçiio
do suieito.o*.lt r..ao, e do cultura cont a ttr':'"ir cttltttrn
De fato, a filosofia clássica (á'ntológica com São'fontÍs' re
flexiva com Descartes, criticista com Kânt, históricn com
Hegel), mesmo sendo Íilosofia social, bem como as grandcs
reÌigiões, nunca se cleram como objetivo o de pcnsar rr tlifc-
como atestam .noladâmente os relatos de viagens realizadas no Europa
ãesd. u tdua" Média, por viajântes Yindos da Ásia E os índios Flathcld
ã" qu"rn no, Íala Lévi'strauss eram tão curiosos do qrrr: orrvinnr rlizcr
dos bran"os que lomaÍam um dia a iniciativa de organizar cxpcdições 0
tirn j. 
"n"ont.a-lot 
Poderíamos multiplicai os exemplos lsso não impcJc
oue a consliluição de um saber de vocação cienlÍÍicá sobre a llleÍìdtrdt
...p.e tenhu sé desenvolvido a parlir da cultura errropéia [slâ claboro(r
rrrn orienlalismo, um americonismo, lm oÍricanìsmo, unl occnrìirilÌÍ1' clì'
ouüntu otrc rtuncl ouvittros Íulor rlc unt'europclsnltt' (lllc lt'llü it ,:oltill
tuído como campo dc saber teórico a partir da Ásia d:r ÁÍricn orr rlrr
Oceânia.
lsso posto, as condições de produção hislóricrs gcogrÁÍicrrs $ocilis c
cultutais da antropoÌogia conslituem um aspecto quc scrirr ri[oroÍrrrÌr(:rrl('
antianlropológico perder de visla, mts que nÃo dcvcrrr ocrrltnr n vocnçito
(evidentemcnie próblemática) de nossa disciplina qtrc visrr strpcnrr l ìrrrrlrr
tibilidade das cultutas. Como cs(rcve Lévi_Slrrìusr: 'NIio sc lttrttr nltttttts
de elevar-se acima dos valores píóprios da socicdudc otr do grrrpo tlo
observador. e sim dc scus nétoLlos da pcìtsonrc !o" é prcciso rrlcrrnçttt tttlltt
formulação válida, não rp'rn; s prìr! unr otrservtrdor horÌt:sto |: ol)jl'livo'
mas pâra todos os observadorcs poYsívcis'.
: r.tsiyi url,;. , , ,
,t';.. ìì , ilr{iLrç(}cs do rntrndo,
J 
, ur,oamentu arrtropológico, por suo vcz, consitlcruque, assim como uma civilização adulta dcvc accitar quc
seus membros se tornem adultos, ela devc igualmcntc acciìar
a diversidade das culturas, também adultas.istamos, evidcn_
temente, no direito de nos perguntar como a humanidadc
pôde permanécer por tanto tempo cega para consigo mesma,
amputando.parte de si própria e fazenão, de tudã que não
eram suas ideologias dominantes sucessivas, um objeto dc
exclusão. DesconÍiemos porém do pensamento _ que seriu
o cúmulo em se tratando de antropologia _ de que estumos
finalmente mais "lúcidos", mais ,,consciente.',, 1nái, ..1irr".,,,
mais "adultos", como acabamos de escrever, do que 
"- 
u-a
época da qual seria errôneo pensar que está defi;itivamente
encerrada. Pois essa transgresìão de uma das tendências de.
minantes de nossa sociedade 
- 
o expansionismo ocidental
sob todas as suas íormas econômicas, políticas, intelectuais
- 
deve ser sempre retomada. O que sigìifica de forma algu-
mâ que 
_o 
antropólogo esteja destinado, seja levado por ãl-gumacrise de identidade, ao adotar ípso lacto a lógica das
outras sociedades e a censurar a sua. procuraremãs, pelo
contrário, mostrar nesse livro que a dúvida. u 
".íti"á d"si mesmo só são cientificamente fundamentadas se forem
acompanhadas da interpelação crítica dos de outrem.
DIFICULDADES
. 
Se os antropólogos estão hoje convencidos de que uma
das características maiores de sua prática reside no confron-
to pessoal com a alteridade, isto é, conyencidos do fato deque os fenômenos sociais que estudamos são fenômenos que
observamos em seres humanos, com os quais estivemos ìi_
vendo; se eles são também unânimes 
"* 
p"nru. que há uni_
dade da família humana, a família dos aìtropólógos é, por.
in,.,:ii-ii.,riì.lo:, aos irrLs ioiag'is, !rJS !'ií'u{iaììiesj a s. ,ú,ijJi:rrj,
e de forma geral a todos aqueles que têm o direito de saber
o que verdadeiramente fazem os antropólogos) dessa unida-
dc múltipla, desses materiais e dessa experiência.
l) A primeira dificuldade se manifesta, como sempre,
no nível das palavras. Mas ela é, também aqui, particular-
rncntc rcvcladora da juventude de nossa disciplina,6 que não
scndcl, como a física, uma ciência constituída, continua não
tcrrdo ninda optado definitivamente pela sua própria desig-
ntrçïto. Elrtologia ou antropologia? No primeiro caso (que
corrcspontlc à tradigão terminológica dos Íranceses), insiste-
sc srrbrc n pluraridade irredutível das etnias, isto é, das cultu-
nrs, No scgundq (que é mais usado nos países anglo.saxô
rricos), sobrc a unidade do gênero humano. E optando-se por
rntropololiia, dcvc-sc falar (com os autores britânicos) em
tu ropol<tgia sociul 
- 
cuio objeto privilegiado é o estudo
dss i|lstituiça)cs 
- 
ou (com os autores americanos) de antro-
polollirt cullural -- rluc consiste mais no estudo dos com-
porlrnrcntos.?
6, l,c ìbrcrn(ìn (lúd n llDlropologia só começou a ser ensinada nas uni"
vcrsidltlcr hí nlgrrnrlls décodas. Ns Cr6-Brclsnha a partir de 1908 (Frazer
am LiycrD )l), c nr l:rnnçrt Í pôrlir dc 194J (Griaule na Sorbonne, seSuido
por Lcroi.Corrrhnn).
7. Itoro ql|c o lcilor quc llõo lcnhe ncnhuma ÍamiÌiâridsde com e$er
conccitos possn locÍrlizrr-sc, vnlc a pcna especificar bem o signiÍicado
dclsr: pnlnvrnl, llslIbclcçrmos, como llviStrauss, que ! ctnografia, a
clnologlI t r rnlropologln conrlllúcrÍ oc troa rl{)rncnloa dc uma ntclmt
abordngcm. 
^ 
dho$olia é ü colcta dircta, e o mais minr.rciosa possívcl, doo
Íenômcnos qtrc obscrvrnros, por üms impreSnação duradoura e codtÍnus
c um pÍo.ccsso quc sc rcnlizn pot aproximsçóes sucessivas. Esses fenômenos
podcnr scr ÍccolhidoJ tonrsndcsc notas, mas lambém por 8rav6ção sonora,
fotogrÍlicü ou cincnratogrÁfica. A etnologia consiste em um primeiro nível
dc sbslraçõor rnnlisnnrlo os mâteriâis colhidos, íazer aparecer a lógica
cspccífica dr socicdadc quc ae estuda. A onltopoloçio, Íin[lrnente, consistc
em um scgundo nívcl dc inteligibilidade: construir modelos qúc pcrmitsm
comparar ss sociedadcs cntrr si. Como escreve l-évi-StÈüss, 'seu objetivo é
alcançar, além da imagcm conscienle e remprc difeÉnte que os homens
formam dc scu devir, um invcntdrio das Possibilid&des inconscientes' que
não eristem em número ilimitado'.
^I'ÊENDE? AÌÍTNOPOT'CI'io c^Mt(, Í: 
^ ^rìoÍtD^cEM ^NTÍìoPoÍóCtlCOS
2) A scgunda dificuldadc <Iiz rcspeito ao grau de cien-
tiIicidaclc rluc convém atribuir.r\ {Ìntropologin. O homem cstá
cm condiçõcs dc cstutlar cicntiIicarnentc o homcm, isto é,
turn obictcl quc é dc Ìtìcsnì nltlurcza quc o sujcito? E nossa
prÍtica sc cncotìtnt novltÌtcntc rlividida entrc os quc pcnsam,
com lìarlclilfc-lìrown (196tÌ), quc as socicdade são sistemrs
rrclrrrrris t1r.rc rlsvcrrt scr cstutlados scgtrndo os métodos com-
plovados pcllìs ci0ncirs tla natureza,s c os que pensam, com
Ilvans-l)ritchard (1969), quc é preciso tratar as sociedades
niìo conro sistcmas orgânicos, mas como sistenias sih-bólicos.
l)iìra cslcs tiltimos, longe de ser uma "ciência natural da
socicdadc" ( lìadclifÍe-Brown), a antropologia deve antes ser
considerada como rma "ârte" (Evans-Pritchard).
l, Unìa terceira dificuldade provém da relação ambígua
que a antropologia mantóm desde sua gênese com a História.
Estreitamente vinculadas nos séculos XVIII e XIX, as duas
práticas vão rapidamente se emançipar uma da outra no
século XX, procurando ao mesmo tempo se reencontrar pe-
riodicamente. As rupturas maniÍestas se devem essencialmente
a ântropólogos. Evans-Pritchard: "O conhecimento da his-
tória das sociedades não é de nenhuma utilidade quando se
procura compreender o funcionamento das instituições".
lvíais categórico ainda, Leach escreve: "4 geração de antro-
pólogos à qual pertenço tira seu orgulho de sempre ter-se
recusado a tomar a História em consideração". Convém
também lembrar aqui a dislinção agora famosa de Lévi.
Struuss opondo us "socicdutlcs frias", isto é, "próximas <1o
grau zero dc temperatura histórica", que são menos "socie-
8. Ao nrotlclo orgônico dos Íuncionalistas inglescs, Lévi-strauss subsli-
tuiu, como vercmos, um modelo lingüístico, e mostroü que trabalhando no
ponto dc encontro da natureza (o inslo) e da cultura (tudo o que não é
hcícditariâmente progrrrmado e deve ser inventado pelos homens onde s
nature2s nõo programou nada), a ôntropologis deve aspirar a tornar,se úma
ciência nqtursl: 'A entropologia pertence às ciênciâs humanÂs, seu nome
o proclama suficienteÍÌren(ci müs sc se Ìesigna cm fazer seu purgalótio
.ntrc âs ciêncìüs sociris, é poÍqúe nõo desespera dc despcrtar cn(re es
ciências narurâis na horo do julSâmenlo finol' (Lévi-Strauss, l97j).
dades sem história", do que "socieCades quo não qucrcrrì tcr
estórias" (únicos objetos da antropologia clássicâ) I nossÍìs
pràfrias .o"iedrdes qualificadas de "sociedades qucntcs"
Essa preocupação de separação entre as abordagcns
histórica e antroiológica está longe, como veremos' dc scr
unani-., e a hiiterià recente da ãntroPologia testem-unhâ
iu.bet'ut deseio de coabitação entre as duas disciplinas'
Aqui, no Nordeste do Brasil, onde começo a escrever este
livìo, desde 1933, um âutor como Gilberto Freyre' empe-
"nr"ã"-t. em comPreender 
a formação da sociedade brasi-
ilira, mosnou o pioveito que a antropologia podia tirar do
conhecimento histórico.
4) Uma quarta dificuldade provóm- do fato de que
nossa orática oscila sem parar, e isso desde seu nascimento'
1.i,. I p*q"it"'que se pode qualificar de fundamental,e
aquilo que é designado sob o termo de "antropologla aPlr-
cada".
Começaremos examinando o segundo termo da-alter-
nativa aqui colocada e que continua dìvidindo Profunda-
*an," or'patquitàores. Durkheim considerava que a socio-
lãgia não'valeria sequeÌ uma hora de dedicação se ela não
puï.rt" t., útil, e múitos antropólogos compartilham sua opi-
nião. Murgu.", Mead, por exemplo, estudando o.comPorta-
mento do; adolescentes das ilhas Samoa (1969)' pensava
que seus estudos deveriam permitir a instauÍação de uma
J;.1.da1. melhor, e, mais ãspecificamente a aplicação- de
um0 pedâgogi0 mcnos ÍrustrBntc à sociedade americana Ho;c
;;;i"; ;"Ëg;t nossos consideram que B 
'ntropologi' 
dcvc
.oio"ur-..';a serviço da revolução" (segundo especialmcntc
i"un Copunt, 1975i. o pesquisador torna-se' entío' unì nìi-
íii""ti it. ;'antropólogo Ìevolucionário" ' contribttindo nrr
construção de uma "antropologia da libe*ação" Ntttttcxtsos
"".ìuiràao..t ainda reivindicam 
a qullidude dc cspccialisttrs'
ã.-Ëo"t.f ft";-., participando em esPccirl dos prollrnrttls tlc
desenvolvimento e das dccisõcs polÍlìcns rcltrcionacltrs À r:ln
úãruiao a"tt". programas QtlerÍrnros sinr plcstrtc tt lc obrt:tvrtt
o cÁl!Ípo E 
^ 
À!o&D^cEd 
^ì{TROpOIóCÌCqS A??EIIDEE Àì.TROPOLOCTA
aqui que a "antropologia aplicada"e não é uma grande novi-
dade. É por ela que, com a colonização, a antro]rologia teve
início.ro
Foi com ela, inclusive, quc se dcu o início da Antro
pologia, durantea colonização. No cxtrcmo oposto das eti_
tudes "engajadas" das quais acabamos dc falar, encontrâmos
a posiçâo determinada dc um Claude Lévi-strauss quc, após
tcr lembrado quc o sabcr cicntífico sobrc o homcm ainda se
encontrava num cstígio cxtrcnì{Ìtncntc primitivo em rclação
ao sabcr sobrc u nattrrczrr. cscrcvc:
"Suporrdo (luc nossus ci0rrcirrs trnr dil possnrn scr
colocarlns n scrviço du rrçiìo príticu, clas nÍo tênr, no
momcnto, rrrdn ou rlrrusc rntln t oÍcrcccr. O vcrdurlciro
mcio dc pcrnrilir sua cxistêtrciu, é dnr ntrrito rr clts, nrnr
sobrctudo nÍo lhcs pcdir.nudu".
. . 
Á.s dual stitudcs quc ìubu,nu" dc cittr .,. lì rntropo-
logi:i "pura" ou a antropologia .,diluÍdu,' como <_liz aindn
Lévi-Strauss 
- 
encontram na rcalidadc suas primciras for-
mulações desde os primórdios da confrontaçãà do curopcu
com o "selvagem". Desde o século XVI, de fato, começa a
se implantar aquilo o que alguns chamariam de ..arquétiios,,
do.discurso etnológico, que podem ser ilustrados pela. po_
sições respectivas de um fean de Lery e de um Sahalln. Jeande Lery foi um huguenote* francês que pe.*un""Ju alium
tempo no Brasil entre os Tupinambás. Longe de procurar con-
vcnccÌ-scus hóspcdcs dn supcrioridadc ds culturu curopéis
e da religião reformada, ele os interroga e, sobretudo, se inter_
roga. Sahagun foi um franciscano espanhol que alguns anos
mais tarde realizou uma verdadeira investigação nã Mé*i*.
9. Sobre a antropologiâ aplicada, cf. R. Bâstide, 197t,
10. A mâioriâ dos entropólogos ingleses, especialmente, reslizou susspesquisss a pedido dss âdministrações: Os Níers de Evans-pritchard fo.am
encomcndados pelo govemo brÍânico, Fodes estüdou os Tallensi a pedidodo govetno dâ Costs do Ouro. Nadel foi conselheiro ao gor"Ào ão
Sudão, etc.
. PÍg(estante. íN.T.)
Perfeitamente à vontade entre os astecas, ele estava lá en-
quanto missionário a fim de converter a População que es-
tuda.rl
O fato da diversidade das ideologias suc€ssivamente
defendidas (a converúo religiosa, ã "revolução", a ajuda ao
"Terceiro Mundo", as estratégias daquilo que é hoie cha-
mado "desenvolvimento" ou ainda "mudança social") não
altera nada quanto ao âmago do Problema, que é o seguinte:
o antropólogo deve contribuir, enquanto antropólogo, para
n transÍormBção das sociedades que ele estuda?
litr rcsponderia, no que me diz respeito, da seguinte
forma: nossa abordagem, que consiste antes em nos sufpre'
cntlcr con aquilo que nos é mais lamiliar (aquilo que vive-
nros co(idiannnrürtc na sociedade na qual nâscemos) e €m
toÍrror rnsis fanriliar rquilo que nos é estranho (os compor'
tonrcÍllos. u$ cnctìços, os costúmes das sociedades que não
sÍo ns nossns, nras nus quais poderíamos ter nascido), está
tlirclurncntc confrontuda hojc a um movimento de homoge-
rrcizrçrìo, ro nlcu vcr, scm PÍcccdcnte na História: o desen-
volvirucuto dc untu forma dc cultura industrial-urbana e de
unru Íormu dc pnsanrcnto quc é a do racionalismo social'
liu pudc, no tlccorrcr dc minhas estadias sucessivas entre os
llcrÍrcrcs tlo Múdio Âtlas c cntre os Baulés da Costa do
MrrrÍirn, pclccbcr rcalntcnlc o fascínio que exerce este mo-
dclo, pcrtrrrbando complctamcnte os modos de vida (a ma-
rrcira,lc ec alirncntâr, de se vestir, de se distrair, de se en-
contror, dc pcttEüru c lcvtndo a novos comportamentos que
não dccorrcm tlc trma cscolha).
ll. Esstr duplo abortlagcm da rclãçâo ao ouiro pode muito bem..ser
rcalizsds por um irnico Pcsquisador. Assim Malinowski chcgando às ilhas
TrobriÍÌnd' (lÍÍd- Í.anc-, tc6J) rc deixa litcralmente levar p€la cultuta que
dcscobrc c qüc o cncrnlã. Mtrs vário6 anos dcpois (trtrd_ Írsnc'' 1968)
participn do quc cho-o'uma cxPcriência controlada' do descnvolvirneÍlto'
' tZ'. As 
-utoçõ.. d. comportamcntos geradas por cssa Íorma de civili_
zrrcão mundialisla podcm ramMm evidenlemenle s€Í encontradas nas no6sa5
.io.ius cultutas nrmis e utbanas. Em comPcnssção' pareccrn-mc bastanle
iru.u, 
"q,ri, no Nordeóle 
do Brasil' onde coÍnf r r€di8ir estc livio'
ì
l0 o c^MFo E Á 
^aoRD^cEM 
rtNTROnOlóCIG
A questão que está hoje colocadâ para qualquer antro-
pólogo é a seguinte: há uma possibilidade em minha socie-
dade (qualquer que seia) permitindo-lhe o acesso a um está-
gio de sociedade industrial (ou pós-industrial) sem conflito
dramático, sem risco de despersonalização?
Minha convicção é de que o antropólogo, para aiudar
os atores sociais á responder a essa qucstão, não deve, pelo
menos enquanto antropólogo, trnbalhar para a transformação
das sociedades que estuda. Caso contrório, seria conveniente,
de fato, que se conveÌtcssc enì economists, agrônomo, mé-
dico, político. a nio scr quc clc ncja motivndo por nlguma
concepção messiânict tJn unlroJxtlogin. Âuxilinr uml dctcr-
minada ctrltura nn cxplicitnçiio p0nì clI mcsnìrt dc sun pró-
pria diferença C umn coisn; orgnrriznr JxrlÍticl, cconônricn c
socialmente a cvoluçuo dcssn difcrcnçt d umn outrfl coist.
Ou sejo, a participnçõo do lntroyúlogo nuquilo quc é holc
a vanguarda do uni icolonillisruo c dn lutn porr os diÍcltos
humanos e das minorias étnicts é, tr mcu vcr, unltt consc-
qiiência de nossa proÍissío, mos nío é a nossa profissõo
propriamentc ditl.
Somos, por outro lndo, diretamente confrontados a uma
dupla urgência ì qunl tcmos o dever de responder.
a) Urgência de preservação dos patrímônios cuhurais
locaís ameaçados (e a respeito disso a etnologia está desde
o seu nascimento lutando contra o tempo pore que e tr8ns.
criçâo dos arquivos orais e visuais possa ser realizada a
tempo, enquanto os últimos depositários das tradiFes ainda
estão vivos) e, sobretudo, de restitiição aos habitantes das
diversas regiões nas quais trabalhamos, de seu próprio saber
e saber-fazer. Isso supõe uma ruptura com a concepção assi-
métrica da pesquisa, baseada na captação de informa@s.'
Não há, de fato, antropologia sem tÍoca, isto é, sem itine-
rário no decorÌer do qual as partes envolvidas chegam a se
^PRE'I{DE 
r 
^NTÍÌOÍ{J!,OõI^ ll
convencer reciProcâmente da necessidade dc trão dcixar se
perrler formas de pensamento e atividade únicas'
b) ur&ência de análíse das mutações culturais impostas
pelo desenvolvimento extÍemamente rápido cie lodas as so-
"i"d"d"a "ontarnporâneas, 
que não são mais "sociedades tra-
dicionais", e sim sociedades que estão passando por um de-
senvolvimento tecnológico absolutamente inédito, por muta'
ções de suas relações sociais, por movimentos de migração
interna, e por um processo de urbanização acelerado' Através
da especifìcidade de sua abordagem, nossa disciplina dwe'
não fàrnccer rcsPostas no lugar dos interessados, e sim for-
nrulrr tlttcstõcs com 
"les' elaborar 
com eles uma reflexão
rncional (c niio ntuis mágica) sobre os problemas colocldgs
rrcln crisc nttrntlinJ 
- 
tluc é lambém ttma crise de identidade
' 
,,rt ,titt,ln :,,,1,í, ,, piurnristtto cttltttral, isto é' o cncontro
dc lÍnguls, técnicns, tncntulidodcs' Dtrr suma, a pcsquisa an-
tropolãgicn, qtrc niit.r ó dc fornttr llgttmtt, conro Podemos
noiur, untu uiiui,tucl, tls luxo' scm lluncs sc srtbstituir aos
nroictos c às dccisões rlos próprios llorcs socinis' tcnr hojc
.o-o 
"o.oção -ìo, o de propor não soluçõcs 
mas instnt-
mentos de investigação que poderão scr utilizâdos em espe-
cial para reâgir ao choque da aculturâção, isto é' ao risco
de um desenvolvimento conflituoso levando à violôncia ne-
gadora das particularidades econômicas' sociais, culturais dc
um povo.
5) Uma quinta dificuldade diz respeito, finalmente'.à
n0turczn dcsl8 obra que dcve apr€sent0r, em um número de
páginas reduzido, um camPo de pesquisa imenso' cuio dcscn'
tol-"i-.nto recente é extremamente especializado' No final
do século XlX, um único pesquisador podia, no limite' do-
minar o campo global da antropologia (Boas fez pesquisas
em antropoloÈia social, cultural, lingüística, pré-histórica' e
também mais recentemente o caso deKtôeber, provavel-
mente o último antropólogo que explorou
uma áÌea tão extensa). Não é' evidentemente, o câso hoje
em dia. O antroPólogo considera aSora 
- 
com razão 
- 
que
I
I
Ì
i
t
ì
I
I
I
l, , t, ír^14fit Í 
^ ^ttrllrürltra lNTlú,ttÌrlcl(tÌt
d co tlxllflnlc rl)cltxi (l(ìlllto (lc utrrrr
IrrrlItln (lli(.llll it I I,Ir.ll llltÌll lÍrcfl
TrroÍ\:)rrrlt^ i
Eu qucria finalmcnte acrcsccntar quc cste livro dirigc-se
ao mais amplo público possÍvcl. Niio àquclcs que tôm por
profissão a antropologiu 
- 
tluvido quc cncontrcm nclc um
grande interesse 
- 
mÍìs n totlos <;r.rc, crn algum nìonìcnto
de sua vida (profissional, nrns tnnrbónr pcssonl), possnm scr
levados a utilizat o modo dc conhccirncnto tÍo csroclcrÍstico
da antropologia. Esta é a rszão pcla qunl, cntrq o inconvc-
niente de utilizar uma linguagcnr técniclr 0 o tlc rdotar uma
linguagem menos especializada, optei voluntnriamcntc pela
segunda. Pois a antropologia, quc ó a ciência do homcm por
excelência, pertence a todo o mundo. Ela diz rcspcito a
todos nós.
Írcfl rcstritr tt dc suu
gcogrdÍicn dclinritadn.
llrl rrrn lrorlrrrrlo irrrlxrssÍvcl, dcntro rlc rrnr lcxto dc di-Itrllôorn lilo tcnltllllt, (lflt conlll, rÌlcsmo dc unra fornra par-tlrrl, tl, ,lc*rrr:c r rln rirl'r:zrr dos cnlnpos 
"b"rto* p;ì;;nï;;p()krglrr. Mrrllo rrr1lirr rrr0dcslÌrrrclllc, lcntci colocar um certo
rrrirrrcro rlc rcÍcr0nciln, dt:íinir nlguns conccitos 
" 
p"rti;;;;
rlrrris o lcitor lxxlcrí, cspcnr, intcrcssar_sc em ir msis adiante.
Vcr-tò"rÍ quc cstc livro cnminha em espiral. As preocu-p1çix-s rluc cstiio no ccntro dc qualquer 
"Uo.a"g"a ".rtãpológicÍr c quc acnbom db scr mencionadas serão -retomadas,
mrs tlc divcrsos pontos de vista- Eu lembrài ern prineiro
logar quais 
-foram as principais etapas da constituição denossn disciplina e como, através dessa história da 
"ntropo_logia, foram sc colocando grogressivamente as questões oue
contin-uam nos interessando até hoje. Em seguidì, esboça;i
os pólos teóricos 
- 
a meu ver cinco _ em volta dos quais
oscilam o pensamento e a prática antropológica. feria 'sido,
de Íato, surpreendente, se, procurando Ja, conta da plurari-
dade, a antropologia permanecesse monolítica. ela g ao con-
trário claramente plural- Veremos no decorrer deste livroque existem perspectivas mmplementares, mas também rnu_
tuamente exclusivas, entre as quais é precirc escolher. E, em
vez de Íingir ter adotado o ponto de 
"i.t" d" Si;ur,,.'u."de pretender uma neutralidade, que nas ciências humanas é
um engodo, esforçando-me ao mcsmo tcmpo p8rü apÌescntsr
com- o máximo de objetividade o p€nsamen(o àos outros, não
dissimu.larei as minhas púprias opçõcs. Finalmente, em umaúltima parte, os principais eixos anteÍiorÍnente examinados
serão, em um movimento por assim dizer rctÍoativo, reava_
llados com o objetivo de deÍinir aquilo que constitui, I
meu ver, a especificidade da anhopologia.
lJ..A 
-€ntÌopologia d€s técDicss, s antlopologis econômica, polÍtic_a, a
:ll::p"t:FT do p€rÊnr€sco, das organizações 
"".aa,, 
, 
"ri,.Ëïüir-JriÍro5€. arlis(ice. a antropologis dos sistcmas dc comunic{fF.s..'.

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