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AULUS CAVALIERI CARCIOFI CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ALIMENTAÇÃO DA ARARA-AZUL (Anodorhynchus hyacinthinus, Psittacidae, aves) NO PANTANAL-MS. I - ANÁLISE QUÍMICA DO ACURÍ (Sheelea phalerata) E DA BOCAIÚVA (Acrocomia totai). II - APLICABILIDADE DO MÉTODO DE INDICADORES NATURAIS PARA CÁLCULO DA DIGESTIBILIDADE. III - ENERGIA METABOLIZÁVEL E INGESTÃO DE ALIMENTOS. Tese apresentada à Faculdade de Medicina Veterinária e Zooctenia da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor. Departamento de Clínica Médica. Área de Concentração: Clínica Veterinária - Doenças Nutricionais. Orientador: Prof. Dr. Flávio Prada São Paulo 2000 Unitermos: Arara-azul; Anodorhynchus; alimentação; digestibilidade; energia metabolizável. RESUMO CARCIOFI, A. C. Contribuição ao estudo da alimentação da Arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus, Psittacidae, aves) no Pantanal - MS. I- Análise química do Acurí (Scheelea phalerata) e da Bocaiúva (Acrocomia totai). II- Aplicabilidade do método dos indicadores naturais para o cálculo da digestibilidade. III- Energia metabolizável e ingestão de alimentos. [Contribution to the study of Hyacinth macaw (Anodorhynchus hyacinthinus, Psittacidae, birds) nutrition in Pantanal - MS. I- Chemical analysis of Acuri (Scheelea phalerata) and Bocaiúva (Acrocomia totai). II- Applicability of the internal indicators method for digestibility calculation. III- Metabolizable energy and food ingestion.] São Paulo, 2.000. 137p. Tese (Doutorado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo. A Arara-azul encontra-se ameaçada de extinção devido à caça para abastecer o mercado de animais de estimação e à destruição de seu habitat. A maior parte das aves existentes encontra-se em cativeiro e vem sendo alimentada de maneira inadequada. No Pantanal ela se alimenta apenas do endosperma de Acurí e Bocaiúva. O estudo da nutrição de animais em vida livre torna possível o cálculo da capacidade de suporte alimentar de uma área, direcionando as ações de manejo. O trabalho foi desenvolvido no Pantanal de Nhecolândia - MS, em viagens para avaliação do comportamento alimentar e colheita de amostras de alimentos e excretas. A Bocaiúva apresentou mais proteína bruta (PB) e metionina que o Acurí, e este maior teor de energia metabolizável (EM) e Mn. Em média o endosperma dos cocos apresentou (n = 21), sobre a matéria seca (MS), 10,4% de PB, 63,7% de extrato etéreo (EE), 3,8% de ácido linolêico, 19,3% de extrativos não nitrogenados (ENN), 0,08% de Ca, 0,54% de P, 0,28% de Mg, 38ppm de Fe, 13ppm de Cu, 51ppm de Mn, 37ppm de Zn. Mostrou, ainda, baixos níveis de vitaminas A e E e de aminoácidos sulfurados. A fibra em detergente ácido e a lignina mostraram-se indicadores internos de digestibilidade adequados. A Arara-azul adulta apresentou alto coeficiente de digestibilidade (CD) dos alimentos, com média de 77,4% para a MS, 83% para a PB, 97% para o EE, 77,7% para os ENN e um coeficiente de metabolização da energia bruta (CMEB) de 86,5%. Os filhotes, em relação aos adultos, apresentaram CD do EE 30% menor, CMEB 26% menor e um CD da PB mais ENN mais matéria mineral 7% menor, o que define uma estratégia digestiva caracterizada por baixa utilização da energia e melhor aproveitamento proporcional de nutrientes plásticos, aumentando a taxa de assimilação corporal destes últimos. No período de manutenção - abril a junho - as araras apresentam um gasto energético diário (GED) de 343 kcal EM/dia, o que leva a ingestão de 107 cocos de Bocaiúva ou 38 de Acurí por dia. Entre as fases fisiológicas, a de maior demanda energética para os elementos que se reproduzem, é a de criação de filhotes no ninho, com GED de 494 kcal EM/dia, e, para a população geral de araras, a muda de penas nos meses de fevereiro e março, com o consumo de 139 Bocaiúvas ou 49 Acurís por dia, período que coincide com o amadurecimento do Acurí e a maior quantidade de alimento no ecossistema. A ingestão de PB dos períodos de oviposição e crescimento dos filhotes no ninho foi baixa. Verificou-se, inclusive, a ocorrência de linhas de estresse no empenamento dos ninhegos. Como o consumo de Bocaiúvas proporciona maior ingestão de PB e metionina que o de Acurí, existe vantagem nutricional na coincidência do período de reprodução das araras e o de amadurecimento das Bocaiúvas, espécie vegetal que parece desempenhar importante função nutricional na reprodução. Em cativeiro, a ingestão de EM é 2,14 vezes menor que a de vida livre, o que faz com que a dieta natural não seja adequada para esta situação. A ingestão de nutriente na natureza, por outro lado, serve de parâmetro para o estabelecimento do perfil nutricional da dieta para cativeiro. Unitermos: Arara-azul; Anodorhynchus; alimentação; digestibilidade; energia metabolizável. SUMMARY CARCIOFI, A. C. Contribution to the study of Hyacinth macaw (Anodorhynchus hyacinthinus, Psittacidae, birds) nutrition at Pantanal - Brazil. I- Chemical analysis of Acuri (Scheelea phalerata) and Bocaiúva (Acrocomia totai). II- Applicability of the internal indicators method for digestibility calculation. III- Metabolizable energy and food ingestion. [Contribuição ao estudo da alimentação da Arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus, Psittacidae, aves) no Pantanal - MS. I- Análise química do Acurí (Scheelea phalerata) e da Bocaiúva (Acrocomia totai). II- Aplicabilidade do método dos indicadores naturais para o cálculo da digestibilidade. III- Energia metabolizável e ingestão de alimentos.] São Paulo, 2.000. 137p. Tese (Doutorado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo. The Hyacinth macaw is an endangered species, due to capture for pet trade and habitat destruction. Most of the remaining individuals are held in captivity, and are not fed appropriately. Their diet at Pantanal - Brazil consists of Acuri and Bocaiúva endosperm. The study of the nutrition of wild animals makes possible the assessment of food supply of an area, pointing to correct management actions. The study was developed at Pantanal de Nhecolândia - MS in expeditions for feeding behavior observations and food and feaces sample collections. Bocaiúva endosperm has more crude protein (CP) and methionine than Acuri endosperm, which has larger amounts of metabolizable energy (ME) and Mn than the former. On the average, the foods has, on dry matter (DM) bases (n = 21), 10.4% of CP, 63.7% of ether extract (EE), 3.8% of linoleic acid, 19.3% of nitrogen free extract (NFE), 0.08% of Ca, 0.54% of P, 0.28% of Mg, 38ppm of Fe, 13ppm of Cu, 51ppm of Mn, 37ppm of Zn, low levels of vitamins A and E, and low levels of methionine plus cistine. We found that acid detergent fiber and lignin were good indicators of digestibility. The adult Hyacinth macaw present high food digestibility coefficient (DC), whit 77.4% of DM digestibility, 83% of CP digestibility, 97% of EE digestibility, 77.7% of NFE digestibility and 86.5% of coefficient of energy metabolization (CEM). Compared with adults, the offsprings have DM metabolization 23% lower, DC of EE 30% lower, CEM 26% lower and DC of CP plus NFE plus mineral matter 7% lower. This demonstrates that the digestive strategy of the offsprings is characterized by a low profit of the energy and better proportional utilization of plastic nutrients, which increases the body assimilation rate of this nutrients. In the maintenance period - april to june - the daily energy expenditure (DEE) of the macaws is 343 kcal ME/day, corresponding to the ingestion of 107 Bocaiúva coconut or 38 Acuri coconut a day. During the raise of the offspring in the nest, the DEE is 494 kcal ME/day, the largest amongst the physiological states. For the general macawpopulation, the feather molting season - february and march - is the period of largest energy demand, which the ingestion of 139 Bocaiuva coconuts or 49 Acuri coconuts a day. This period coincides with the ripening of the Acuri coconut, which results in more food available in the ecosystem. The CP ingestion in the laying and raising period was low. Furthermore, stress lines were observed in the feathers of the nestings. There is an nutritional advantage on the coincidence of the reproduction period of Hyacinth macaw with the ripening of Bocaiúva coconuts, because their consume enhances CP and methionine ingestion. In captivity, the daily ingestion of ME is 2.14 times lower than in the wild, which makes the natural diet inappropriate. However, the nutrient ingestion in the wild is a good parameter to define the nutrient profile for captivity. Key words: Hyacinth macaw; Anodorhynchus; feeding; digestibility; metabolizable energy. 1 INTRODUÇÃO O estudo da nutrição de animais silvestres procura compreender as interações bioquímicas e biofísicas específicas entre o meio interno destes organismos e o meio ambiente, críticas para a sobrevivência e reprodução dos animais, bem como as interações que definem, por pressão de seleção natural, perfis comportamentais e morfológicos das espécies. Estas interações podem ser aparentemente simples, como as que se estabelecem dentro de um recinto com os animais ingerindo os alimentos oferecidos, ou muito mais complexas, como as que se desenvolvem dentro de um ecossistema, no hábitat do animal. A produção, oferta, ingestão e assimilação de mais de 40 nutrientes vão determinar, sob o ponto de vista nutricional, o sucesso e manutenção de uma população natural. Isso depende de intrincadas e complexas interrelações entre a parte abiótica e biótica do meio ambiente, envolvendo clima, insolação, temperatura, composição do solo, pluviosidade, oferta de alimentos, presença de competidores, existência de parasitas, ocorrência de competidores, etc. Neste contexto a Arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus) representa um interessante modelo, pois se alimenta, nos três locais geográficos onde vive, apenas do endosperma de frutos de Palmae (MUNN, et al., 1990; YAMASHITA, 1992; GUEDES, 1993). Isto simplifica o modelo de estudo, controlando variáveis, diminuindo erros e possibilitando uma melhor avaliação de vários aspectos da interação nutricional entre o animal e seu hábitat. A Arara-azul é o maior psitacídeo do mundo, com quase 1 metro de comprimento e 1,5 kg de peso. Apresenta bico negro e de grande tamanho, plumagem azul cobalto, anel perioftálmico amarelo, pálpebra e fita em torno da base da mandíbula amarelos (SICK, 1988). Ocorre em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Piauí, Bahia, Pará e Maranhão (MUNN, et al., 1990). Com a abertura de novas frentes de desenvolvimento econômico nas áreas de ocorrência das Araras Azuis, seu hábitat tem sido substituído pela agricultura e principalmente por pastagens da pecuária de corte. O aumento dos custos de produção e o modelo de desenvolvimento econômico adotado nas propriedades rurais exigindo mais e mais espaço, porém com pouca produtividade, tem conduzido a um aumento da velocidade de degradação dos hábitats da Arara-azul (YAMASHITA, 1992). Isto se torna especialmente crítico para uma população já bastante reduzida por um processo anterior intenso de caça para obtenção de penas usadas em ornamentos indígenas, carne e, muito mais importante, para abastecer o mercado ilegal de aves de estimação. A dimensão do processo pode ser evidenciada contrapondo-se a população original estimada de Araras-azuis, de mais de 100.000 indivíduos, com as atuais 2.500 a 5.000 aves restantes na natureza (MUNN, et al., 1990), fatos que levaram a ave a ser listada como espécie ameaçada de extinção (KING, 1981). Curiosamente, acredita-se que mais de 10.000 Araras-azuis estejam sendo criadas em cativeiro em vários países da Europa e Estados Unidos (COLLAR, et al., 1992), o que eqüivale a dizer que ao redor de 80% da população existente encontra-se confinada pelo homem. Ressalta-se que esta população cativa, em sua maioria, é composta por indivíduos capturados na natureza. Para que se tenha idéia de como estão sendo cridas em cativeiro, o senso da Sociedade de Zoológicos do Brasil de 1992, indica nos zoológicos do país a existência de 79 Araras Azuis. A taxa de natalidade para o ano foi 0 (zero), não nascendo nenhum indivíduo, e a taxa geral de mortalidade de 11,43%. Isto demonstra uma inabilidade em criar a espécie, e considerando-se que a maior parte das Araras- azuis existentes estão em cativeiro, pode-se perceber a delicada situação que vive esta espécie animal. Sob o ponto de vista conservacionista, a reprodução de psitacídeos em cativeiro apresenta-se como uma alternativa (FORSHAW, 1978), embora ainda não se possa considerar que esta venha sendo efetiva e de importância realmente relevante (BERTANOGLIO, 1981). Como programas de reprodução em cativeiro não prescindem de conhecimentos adequados sobre alimentação, experimentos sobre nutrição em cativeiro são necessários para a preservação da Arara-azul. De maneira geral, a criação de psitacídeos em cativeiro tem sido limitada, até o momento, por dificuldades como: não obtenção de taxas consistentes de reprodução; dificuldades no controle de doenças; alterações comportamentais e genéticas deletérias; ausência de suporte financeiro e logístico à longo prazo (DERRICKSON e SNYDER, 1992), tornando os estudos e esforços de preservação em vida livre prioritários. Neste sentido, informações sobre a nutrição natural da Arara-azul e sobre a capacidade de suporte alimentar das áreas onde ocorre são necessárias tanto para a conservação como para a recuperação de hábitats. 1.1 A Arara-azul A Arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus), também conhecida por Araraúna, é o maior psitacídeo do mundo, com comprimento total aproximado entre 93 e 100 cm, plumagem azul cobalto, anel perioftálmico e uma barra de pele na lateral da mandíbula desnudos e com coloração amarela. Seu bico, de coloração negra, é extremamente grande, chegando a parecer desproporcional em relação ao crânio da ave e muito maior, proporcionalmente, ao de outras araras (SICK, 1988). O gênero Anodorhynchus inclui ainda outras duas espécies conhecidas: 1) Arara-azul-pequena (Anodorhynchus glaucus), a menor das araras- azuis, medindo 68 cm. Antes descrita como comum no rio Paraná, atualmente já está extinta. Seu declínio foi provocado, provavelmente, pelo impacto da colonização humana, que ocasionou a destruição das florestas de galeria (COLLAR, et al., 1992) e pela criação de bovinos, que se alimentam das plântulas, impedindo o recrutamento de mudas e a regeneração das árvores de palmae, seu principal alimento (YAMASHITA e VALLE, 1993). 2) Arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari), com comprimento total de 71 cm e pesando 940 g. Apresenta cabeça e pescoço azul-esverdeado, barriga azul-desbotado, anel perioftálmico e fita na base da mandíbula de coloração amarelo relativamente claro. Tem sua distribuição geográfica restrita à região denominada Raso da Catarina, nordeste da Bahia, onde estima-se que existam somente 130 indivíduos, os últimos remanescentes da espécie em vida livre. Estudos sobre sua alimentação apontam que a oferta de alimentos é um sério problema para a espécie. O Licurí (Syagrus coronata) parece não existir mais em quantidade suficiente, obrigando as aves a buscar outros recursos alimentares (BRANDT e MACHADO, 1990). Estes fatos colocam a espécie em sério risco de extinção. Há ainda uma outra arara brasileira de coloraçãoazul, a Arararinha-azul. Esta pertence ao gênero Cyanopsitta, espécie C. spixii. Bem menor que as anteriores, mede 57 cm de comprimento total, apresenta coloração azul acinzentada e sem amarelo algum na face. Em situação muito crítica, existe atualmente um único indivíduo da espécie na natureza, enquanto estima-se a existência de mais de 50 em cativeiro. 1.1.1 Distribuição geográfica e situação na natureza Atualmente a Arara-azul encontra-se distribuída em três locais separados, formando populações distintas e aparentemente isoladas umas das outras, não havendo permuta de indivíduos e fluxo genético entre elas (MUNN, et al., 1990). Estas regiões representam partes de sua área original de ocorrência que sofreram menor impacto humano, representado pela captura de animais e pelo desenvolvimento agropecuário. Uma população vive no Pará, nos estuários dos rios Xingu, Araguaia e Tocantins, outra no nordeste do Brasil, na intersecção dos estados de Tocantins, Piauí, Maranhão e Bahia, e a maior delas no Pantanal, incluindo os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Existem três hábitats básicos onde vive a Arara-azul: palmares úmidos no Pantanal; bosques estacionalmente muito secos em vales rochosos no norte do Brasil; e bosques semi-úmidos com árvores de Castanha-do-Pará (Bertolettia excelasa), árvores baixas e bambus na área de Carajás, sul do Pará. Não é possível saber o tamanho exato da população original de Araras- azuis. Estimativas indicam números entre 100.000 e 3.000.000 de aves. Relatos do início do século 20 reportam o encontro de bandos com centenas de Araras-azuis em regiões no Piauí, no nordeste do Brasil, onde hoje ela é extinta (MUNN, et al.,1990). A soma de fatores como destruição de hábitat para ceder lugar à atividade agropecuária, caça para consumo da carne e confecções de ornamentos indígenas com suas penas e captura para atender o mercado de animais de estimação, reduziu esta população a aproximadamente 3.000 indivíduos. Apesar de oficialmente declarada como espécie em extinção desde 1981 (KING, 1981), o comércio internacional de aves vivas como animal de estimação, nas décadas de 70 e 80 foi o principal responsável pelo seu declínio populacional. As estimativas são de que pelo menos 10.000 aves foram compradas por países do continente Europeu, Canadá, Estados Unidos, Filipinas, Japão, etc., (COLLAR, et al., 1992), onde indivíduos podem ser vendidos por até US$ 10.000,00 (dez mil dólares americanos). O fato se agrava ainda mais quando se adiciona a este número, pelas estimativas favoráveis, a perda de 2 ou 3 aves que morrem pelo caminho devido às condições inadequadas de manutenção e alimentação, para cada uma que chega ao destino final. Segundo MUNN et al. (1990) a população de Araras-azuis do nordeste brasileiro vem sofrendo grande pressão de caça. Parece existir ainda alimento disponível, pela extensão das formações de palmeiras, de modo que este não parece ser um fator limitante. Para a população do sul do Pará, os maiores problemas têm sido a caça e, mais recentemente, o rápido avanço da agropecuária no estado, com a derrubada de grande parte da cobertura vegetal natural de seu território. No Pantanal, mais especificamente na sub-região denominada Nhecolândia, a ave e seu hábitat foram muito bem estudados e descritos pela Bióloga Neiva Maria Robaldo Guedes, em sua Dissertação de Mestrado intitulada “Biologia Reprodutiva da Arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus) no Pantanal-MS, Brasil” (GUEDES, 1993). O Acurí (Sheelea phalerata, palmae), que compõem a maior parte de sua alimentação, é abundante, chegando em alguns pontos a dominar o sub-bosque da mata originando o “acurizal”. A Bocaiúva (Acrocomia totai, palmae), o outro alimento consumido, também ocorre é bem representado na composição florística. A caça diminuiu, parecendo não ser mais um fator de pressão importante. O que limita a manutenção, reprodução e expansão da população é a oferta de ninhos. Devido ao seu grande tamanho, as Araras-azuis necessitam de grandes ocos de árvores para que possam chocar e criar seus filhotes. Apenas duas espécies arbóreas servem de ninho no pantanal da Nhecolândia: o Manduví (Sterculia striata) e o Angico-branco (Pithecellobium edwallii). Do total de ninhos, 95% localizam-se no Manduví. Estes ninhos, no entanto, apresentam-se em baixa densidade, em uma distribuição dispersa agrupada com densidade variando de 0,021 a 0,15 ninhos por 100 hectares. As Araras-azuis enfrentam, ainda, problemas de competição por ninhos com a Arara- vermelha (Ara chloroptera), abelhas (Apis mellifera), Gavião-relógio (Micrastur semitorquatus), Urubu (Coragyps atratus) e Pato-do-mato (Cairina moschata). O uso de queimadas, superpastejo com os bovinos que consomem as plântulas de Manduví e interferem na renovação natural da árvore e a derrubada das matas para a formação de pastagens artificiais têm conduzido a uma taxa de destruição anual de 5% dos ninhos existentes, sendo este o principal problema enfrentado pelas araras na região. 1.1.2 Alimentação 1.1.2.1 Na natureza De maneira geral os psitacídeos procuram seu alimento na copa de árvores e em arbustos frutíferos. Subindo pelos galhos mais finos usam o bico como um terceiro pé, utilizam as patas para segurar a comida e leva-la até a boca (SICK, 1988). Na natureza têm sido encontrados consumindo uma grande variedade de alimentos, incluindo frutas, bagas, flores, brotos de plantas, legumes, insetos, larvas e sementes (FORSHAW, 1981). A dieta natural de duas Roselas, o Platicercus eximius e o Platicercus adscitus, na Austrália, inclui respectivamente 82 e 47 espécies de plantas. Ambas ingerem principalmente frutos e sementes e em menor extensão flores e insetos (CANNON, 1981). Já o Periquito-australiano (Melopsittacus undulatus) ingere apenas sementes, não tendo sido identificadas plantas em estado vegetativo nem insetos no conteúdo do papo das aves examinadas. Dependendo da área onde vive consome de 21 e 39 espécies de plantas, sendo a escolha de sua dieta amplamente controlada pela disponibilidade dos alimentos (WYNDHAM, 1980). Ingestão de pólen e néctar também perfazem frações significativas da dieta de algumas espécies, que apresentam inclusive adaptações anatômicas como a língua mais estreita e comprida, o que facilita a apreensão destes alimentos. Como exemplo temos a Caturrita (Myiopsitta monachus) e os Lóris (Glossopsitta sp, Trichoglossus sp), estes últimos apresentam moela com musculatura menos desenvolvida e intestino mais curto que outros psitacídeos de mesmo tamanho, o que facilita o aproveitamento desses alimentos (RICHARDSON e WOOLER, 1990). O gênero Anodorhynchus, por outro lado, é integrado por espécies altamente especializadas que ingerem apenas o endosperma de frutos de palmae, representando um interessante exemplo de coevolução entre animais e plantas. Por processos de seleção natural, com o passar do tempo as palmeiras acabaram apresentando frutos cada vez maiores e mais duros, para escapar da predação das aves, e estas, por sua vez, tiveram seu bico cada vez maior e mais possante, para garantir a possibilidade de alimentação (MUNN et al., 1990). De acordo com sua área de ocorrência, a Arara-azul se alimenta do endosperma da semente de uma ou duas espécies de palmae. No sul do Pará se alimenta das sementes de Babaçú (Orbignya phalerata) e Tucumán (Atrocaryum sp), na região compreendida por Tocantins, Piauí, Bahia e Maranhão, alimenta-se de Catolé (Syagrus coronata) e Piaçava (Atalea funifera) e no Pantanal, de Acurí e Bocaiúva (MUNN, et al., 1990). Estes frutos apresentam uma polpa externa, ou mesocarpo, nutritiva e consumida pormuitos animais, inclusive psitacídeos como o Principe-negro (Nandayus nenday), Papagaio-galego (Amazona xamthops) e o Periquito-de-cabeça- azul (Aratinga acuticaudata). A Arara-azul, no entanto, despreza totalmente o mesocarpo do fruto, retirando-o apenas para possibilitar a quebra do perisperma e a ingestão do endosperma (YAMASHITA, 1992; GUEDES, 1993; YAMASHITA, 1997). Sua especialização em consumir o endosperma de cocos pode ser constatada pelas dimensões de seu bico. O gênero Anodorhynchus apresenta o maior e mais forte “cinzel” em sua gnatoteca, a porção queratinizada de sua mandíbula, dentre todos os psitacídeos. A Arara-azul apresenta “cinzel” com 30,6mm de largura, o dobro do da Arara-vermelha, com apenas 15,4mm (YAMASHITA e VALLE, 1993), apesar das duas aves terem pesos próximos. Esta especialização estende-se também para os locais de nidificação. As Araras-azuis que vivem no sul do Pará se reproduzem em ocos naturais formados no tronco da Castanha-do-pará, as da confluência dos estados de Piauí, Bahia, Maranhão e Tocantins, em ocos formados nos paredões rochosos e nos troncos de Buriti (Mauritia vinifera) (MUNN, et al., 1990) e no Pantanal de Nhecolândia, 95% do ninhos ocorrem no Manduvi (GUEDES, 1993). Estes dados caracterizam uma espécie com necessidades muito específicas de hábitat, pois apenas 3 espécies vegetais, nas três localidades de ocorrência, fornecem tanto o alimento como o local de reprodução das aves. O forrageamento é também particular. Enquanto as grandes araras geralmente se alimentam no topo das árvores, a Arara-azul é observada se alimentando sobre o solo, em bandos mais ou menos grandes. Elas preferem locais onde os cocos são concentrados pelo gado, que ingerem no campo os frutos, mascam o mesocarpo e durante a ruminação regurgitam sobre o solo montículos de 20 a 30 frutos “limpos”, sem mesocarpo, o que facilita a quebra e ingestão do alimento (GUEDES, 1993; YAMASHITA, 1997). Assim, são freqüentemente vistas ao lado dos currais, cochos de sal e malhadouros, locais onde o gado se concentra para descansar, dormir e ruminar, quando regurgitam os cocos em maior quantidade. 1.1.2.2 Em Cativeiro Como as estimativas indicam que 80% das Araras-azuis hoje existentes no mundo encontram-se em cativeiro, é necessário saber como elas vêm sendo alimentadas e os reflexos da alimentação na saúde, longevidade, bem-estar e reprodução desta população. Para se estabelecer, no Brasil, um plano de manejo em cativeiro para a Arara-azul, foi organizado um questionário para se conhecer a população de aves, seu manejo, recintos, alimentação, taxas de reprodução, mortalidade, etc. Este foi respondido por 20 instituições brasileiras, entre Zoológicos e Criatórios particulares, sendo os dados compilados por MACHADO (1993). Durante o ano de 1991 foram mantidas 54 Araras-azuis em cativeiro, e durante 1992 um número maior, de 72 indivíduos. Não houve reprodução em nenhum destes anos, de onde se presume que as 18 araras novas ou foram confiscadas pelo IBAMA e portanto vieram da natureza, ou correspondem a novas instituições que entraram nas estatísticas. No ano de 1993 apenas 3 instituições relataram atividade reprodutiva com o nascimento de filhotes. No entanto, em duas delas estes morreram e apenas uma instituição, das 20 que participaram do processo, conseguiu criar com sucesso 2 filhotes. Neste ano a população total em cativeiro foi de 65 indivíduos, tendo sido registradas 4 mortes. Isto indica uma taxa geral de mortalidade de 6,15% e uma população não sustentável, com um saldo negativo de 2 indivíduos. Somando-se estes dados aos do senso da Sociedade de Zoológicos do Brasil de 1992, que indica nos zoológicos do país a existência de 79 Araras Azuis, uma taxa de natalidade zero para o ano, e uma taxa geral de mortalidade de 11,43%, vê-se que a população de Araras-azuis em cativeiro no Brasil vem diminuindo com o passar dos anos. Ela é infelizmente mantida ou “renovada” pelas apreensões esporádicas da polícia florestal e do IBAMA de animais vindos da natureza que estavam sendo traficados ilegalmente. A alimentação não é o único fator a pesar sobre estes números. Recintos inadequados, falta de sexagem dos animais, manejo sanitário impróprio, ninhos inadequados e em número insuficiente, manejo de filhotes, etc., são outros pontos que necessitam, também, de aprimoramento. Quanto a alimentação das araras, os itens alimentares oferecidos e sua freqüência de administração encontram-se no quadro 1. Dentre os alimentos listados, tem-se como fontes de energia: abóbora, amendoim, araçá, arroz integral, banana, batata-doce, beterraba, bolachas, caqui, castanha, cenoura, coco, fubá, girassol, goiaba, jiló, maça, mamão, mandioca, manga, melão, milho, neston, pão, pepino e trigo. Comparadas à oferta de energia, as fontes de proteína são poucas: feijão, ração para cães e aves. Os alimentos mais oferecidos são banana, coco, girassol, laranja, mamão e milho. Avaliando as respostas do questionário, vê-se que não há controle sobre a alimentação das aves. Os alimentos são oferecidos em quantidades maiores do que o consumo, permitindo a seleção dos mais palatáveis, de modo que não se conhece a composição nutricional ou a ingestão efetiva de nutrientes pelos animais. As implicações disso para a saúde e reprodução dos psitacídeos serão colocadas mais adiante, no item 1.3. Quadro 1: Itens Alimentares Oferecidos para a Arara-azul em Cativeiro no Brasil. Item Alimentar Número de Instituições que oferecem 1 Item Alimentar Número de Instituições que oferecem 1 Abóbora 3 Amendoim 6 Araçá 1 Arroz integral 1 Banana 15 Batata-doce 3 Beterraba 3 Bolacha salgada 1 Bolacha doce 1 Cana-de-açucar 4 Caqui 1 Castanha 1 Cenoura 3 Coco 10 Danoninho 1 Feijão 1 Frango cozido 1 Frango, dorso 1 Fubá 3 Gesso+Sais Minerais+Tijolo 1 Girassol 16 Goiaba 4 Jiló 1 Laranja 13 Maça 5 Mamão 14 Mandioca 1 Manga 1 Melão 1 Milho 16 Neston 1 Ovo cozido 1 Pão 5 Pepino 1 Ração de cão 9 Ração de ave 2 Repolho 1 Sal Mineralizado 2 Tangerina 1 Trigo 1 Verdura 7 Vionate L 2 2 Vitamina E 1 1- A quantidade de instituições que oferecem refere-se a um total de 20 instituições. 2- Suplemento vitamínico (MACHADO, 1993) 1.2 Estudos Sobre Alimentação Animal em Vida Livre Charles T. Robbins em seu livro “Wildlife Feeding and Nutrition” (1983) apresenta uma impressionante conceituação e revisão sobre a nutrição de animais em vida livre. O autor define que o estudo da nutrição de animais silvestres deve buscar compreender as interações bioquímicas e biofísicas específicas entre o animal e seu meio-ambiente, bem como seu resultado sobre a sobrevivência de indivíduos e populações. Neste contexto, nutrição é o mecanismo pelo qual o animal adquire e processa partes do ambiente químico externo para o funcionamento de seu metabolismo interno. Energia, vitaminas, proteínas, minerais e água são diferentes categorias de nutrientes que devem ser extraídos do meio ambiente e alocados no meio interno de forma a estabelecer um balanço positivo. O período para se estabelecer este balanço pode ser de algumas horas, como no caso de um beija-flor, ou de meses, como no caso do Urso-negro que hiberna 4 meses seguidos, período no qual não ingere nem água nem alimento e não urina. Numa visão histórica, no seu início o estudo da alimentação de aves silvestres estava correlacionado ao bem estar humano. Investigava-se o consumo de safras agrícolas e de insetos pelas aves e seu benefício ou prejuízo final à agricultura. Marcavam esta época enfoques econômicos e legislativos, sendo os estudos dehábito alimentar o principal objetivo da maioria destes trabalhos iniciais (ROBBINS, 1983). Uma analise das publicações relacionadas à nutrição de animais silvestres de 1935 a 1980 pode ser visualizada no gráfico 1, adiante. Gráfico 1: Avaliação Percentual das Publicações Relacionadas a Nutrição de Animais Silvestres (1935 - 1980) 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 19 35 19 40 19 45 19 50 19 55 19 60 19 65 19 70 19 75 19 80 Anos Es tu do s so br e n u tri çã o de a n im a is si lv e st re s (% ) Habitos alimentares - preferências alimentares Manejo de vida selvagem (baseado em nutrição) Análise de alimentos - utilização de alimentos Necessidade, ingestão ou metabolismo: energia-proteína Necessidade, ingestão ou metabolismo: minerais-vitaminas Necessidade, ingestão ou metabolismo: água (ROBBINS, 1983) Observa-se que pesquisas sobre hábitos alimentares e manejo de vida selvagem baseado em perspectivas nutricionais compreendem 73% de todos os trabalhos. Necessidades de água, sua ingestão e metabolismo compreendem em média 3%, minerais e vitaminas, 4% e a análise de alimentos e estudos de sua utilização, 7%. Estudos sobre necessidade de energia e proteína tem alcançado, após a década de 1950, a média de 19 % (ROBBINS, 1983). Apesar das técnicas e do enfoque das pesquisas de hábito alimentar terem mudado ao longo dos anos, tais estudos têm continuado a perfazer a maior parte de toda a investigação nutricional de animais silvestres. Todavia, estudos clássicos de hábito alimentar informam apenas o que é ingerido, raramente quanto, por que razão, a composição química ou a importância e o papel fisiológico dos diferentes alimentos consumidos. Assim, o uso apenas destas informações para o desenvolvimento de esquemas de manejo resulta quase sempre em falhas, em razão da absoluta necessidade de se compreender as interações nutricionais, muito maiores e mais complexas, dentro de perspectivas ecológicas (ROBBINS, 1983). A pesquisa nutricional com animais em vida livre oferece desafios particulares, muito diferentes dos encontrados pela pesquisa nutricional em animais domésticos. Em vida livre o animal permanece interagindo de maneira dinâmica e constante com o meio ambiente, pois os estudos precisam manter a perspectiva ecológica. Assim o pesquisador tem muito pouco controle sobre a interação entre o animal e o meio externo, e o esforço de monitorar as atividades alimentares básicas do objeto de estudo representa boa parte do custo experimental. Animais silvestres têm sido estudados em cativeiro, geralmente como modelo de estudo para compreender-se a nutrição humana. Se conhece muito, por exemplo, sobre a nutrição do macaco Rhesus (Macaca mulatta) ou do rato de laboratório. Estes estudos são diretamente aplicáveis para se conhecer a nutrição em cativeiro destes animais, mas a falta de perspectivas ecológicas não permite que tais resultados aumentem os conhecimentos sobre a nutrição destas espécies em vida livre (ROBBINS, 1983). Em seu hábitat o animal está intimamente unido ao meio ambiente por meio do fluxo energético que se estabelece entre ambos. Este fato torna possível que, a partir de dados sobre suas necessidades energéticas e da composição e aproveitamento dos alimentos consumidos, se calcule sua ingestão de alimentos. Complementando-se este dado com a quantidade de alimento disponível no ecossistema e o tamanho da população, pode-se inferir sobre a capacidade de suporte alimentar da área e sobre as diretrizes de manejo, visando maximizar recursos nutricionais. As estimativas da necessidade energética diárias do animal, no entanto, devem basear-se em uma perspectiva ecológica de seu modo de vida, onde interagem inúmeras variáveis bióticas e abióticas, imprimindo ao estudo bastante complexidade. Algumas das interações que afetam as necessidades energéticas de aves em vida livre podem ser vistas na figura 1 (KING, 1974). O gasto energético de manutenção é definido como a energia química que deve ser ingerida pelo animal para manter o funcionamento corporal básico, ou metabolismo basal, mais a atividade física diária e a termorregulação (POND, et al., 1995). A energia química utilizada nestes três processos advém da oxidação de gorduras, proteínas e carboidratos, com subsequente produção de calor. Já a Taxa Metabólica Basal (TMB) é a energia gasta por um animal em: repouso muscular e físico, mas não dormindo, em um ambiente termoneutro, no estado pós-absortivo (SIBBALD, 1982). Este é o valor básico mínimo considerado para o indivíduo, apesar de não ser necessariamente o menor para a espécie pois condições de jejum, hibernação, torpor e sono reduzem ainda mais a taxa metabólica (ROBBINS, 1983). Desta energia, 80% é gasta na manutenção dos gradientes elétricos das membranas celulares e nos processos de síntese de macromoléculas, sendo o restante representado pela circulação e respiração. O uso da TMB permite grandes generalizações e o estabelecimento de comparações entre diferentes espécies, sendo esta cotejada como uma função exponencial do peso corporal. Em relação às aves, existem variações importantes da TMB, tornando ainda controversa a constante a ser aceita. Para alguns pesquisadores estas dever ser dividas conforme o tamanho corporal, para outros segundo o grupo taxonômico, sendo separadas no último caso em passeriformes e não passeriformes. Figura 1: Algumas das interações que afetam a necessidade energética de aves em vida livre. meio-ambiente físico fatores meteorológicos clima temperatura fatores topográficos e espaciais micro-hábitat meio-ambiente biótico competidores predadores variação espacial variação temporal atributos da espécie comportamentais fisiológicos morfológicos necessidades de tempo energia auto manutenção reprodução forrageamento competição alimento e abrigo alimento e ninho necessidade basal de existência gametogênese ovogênese corte construção do ninho etc. proteção contra predadores dos adultos dos filhotes en tr ad a in te gr aç ão sa íd a (KING, 1974) As equações mais aceitas para predizer a TMB de aves foram descritas por ASCHOFF e POHL (1970), que dividiram as aves em passeriformes e não passeriformes. A família psittacidae, no entanto, parece não acompanhar esta divisão, pois as necessidades energéticas verificadas para o Periquito-australiano por DREPPER et al. (1988) foram 42% superiores que as verificadas para Papagaio- verdadeiro (CARCIOFI, 1996), indicando uma possível variação relacionada ao tamanho das aves. Este fato, no entanto, necessita de maiores estudos e os resultados encontrados com o Papagaio-verdadeiro pelo autor supracitado coincidiram com a fórmula de ASCHOFF e POHL (1970): TMB = 91 kg 0,729, onde: TMB = taxa metabólica basal em kcal de energia metabolizável por dia, e kg 0,729 é o peso vivo em quilogramas elevado a 0,729. Como o animal não permanece indefinidamente numa condição basal, é necessário calcular a energia gasta com a atividade física. Estes gastos têm sido utilizados para se conhecer aspectos fisiológicos básicos, interpretar as estratégias naturais das espécies e para se conhecer as necessidades alimentares dos animais, em estudos sobre capacidade de suporte de áreas naturais nos programas de manejo (ROBBINS, 1983). A determinação do gasto energético com a atividade física depende da quantificação da energia gasta por unidade de tempo para cada uma das atividades realizadas e sua posterior multiplicação pelo tempo total envolvidoem cada uma delas. A atividade física mas básica dos animais é permanecer em estação. Para aves isto representa um acréscimo médio de 13,6% sobre a TMB (ROBBINS, 1983). O vôo das aves ou morcegos é uma atividade física que apresenta um alto gasto energético por unidade de tempo, mas um baixo gasto energético por unidade de espaço percorrido. Interferem no custo energético de vôo o tamanho da ave, o tipo de vôo (ascendente, descendente, horizontal, etc.) e a conformação da asa. Estudando o Periquito-australiano, TUCKER (1969) encontrou um aumento do gasto energético de 11 a 20 vezes, dependendo da velocidade do vôo e se este era ascendente, descendente ou no mesmo nível. Outros custos adicionais para a manutenção dos animais incluem atividades como alimentação, defesa e termorregulação. O gasto energético diário do animal, no entanto, não é constante. Alterações na taxa metabólica basal, níveis de atividade física e nos gastos com termorregulação, dependentes da temperatura ambiental, interferem nos gastos energéticos de manutenção. Os resultados obtidos com estes cálculos são, então, generalizações válidas para as comparações interespecíficas, e não uma constante aplicável a todos os membros de um grupo o tempo todo. O gasto energético de animais em cativeiro, a Taxa Metabólica Diária, é composta pela soma da TMB, atividade física, termorregulação mais o incremento calórico. Este último constitui-se no calor de digestão e absorção, representando a ineficiência do processo de utilização dos alimentos (POND et al., 1995). Para aves em cativeiro, como a atividade física de vôo está limitada, as necessidades energéticas diárias são dependentes, principalmente, da temperatura ambiente. Em uma zona de termoneutralidade (30oC) ela é, em média, 31% maior que a TMB, enquanto que a 0oC, varia de 3,2 a 1,57 vezes a TMB. Na natureza, apesar das necessidades energéticas serem compostas pelos mesmos quatro fatores (TMB, atividade física, termorregulação e incremento calórico), de acordo com a estratégia de vida da espécie e o meio ambiente onde está inserida existe grande variação quanto ao peso e a importância de cada um destes componentes. As principais fontes de variação nas necessidades energéticas de uma ave em vida livre são o taxon, peso, estágio de vida, método de caça, duração do dia, temperatura ambiente e tempo de vôo (BRYANT, 1997). Estas têm sido estudadas por dois métodos básicos, o cômputo dos parâmetros fisiológicos mais o total de atividades desenvolvidas, e o uso de isótopos radioativos (ROBBINS, 1983). De maneira geral, na natureza as aves operam em uma taxa 2 a 4 vezes maior que a TMB, portanto muito acima das necessidades energéticas de cativeiro. Os pontos que mais influenciam estes valores são o ciclo reprodutivo e a forma de forrageamento. Por exemplo, durante o período de manutenção as aves podem gastar apenas 1,2 a 2,1 vezes a TMB, mas durante o período reprodutivo os gastos elevam- se para 2,4 a 4,0 vezes a TMB, devido ao custo de atividades como confecção do ninho, corte, gametogênsese, choco, alimentação e proteção dos filhotes, etc. Quanto ao forrageamento, aves que procuram e ingerem o alimento durante o vôo apresentam um gasto energético muito maior. WALSBERG (1980) estimou o gasto energético diário das aves, em kcal/dia, como 189,3 kg0,61 para as aves em geral, mas as que procuram o alimento e se alimentam em vôo gastam em média 318,1 kg0,66. Todos estes cálculos permitem a compreensão e visualização das estratégias comportamentais da espécie, de uma maneira mais profunda que os estudos de história natural. WALSBERG (1983), por exemplo, discute as teorias de seleção sexual e comportamento reprodutivo em relação ao investimento energético dos pais durante a criação dos filhotes. O autor comenta que em espécies monogâmicas existe um equilíbrio no investimento energético do casal, do mesmo modo que as adaptações comportamentais para assegurarem a paternidade são acompanhadas de um maior investimento energético do pai nos filhotes. 1.2.1 Composição dos Alimentos e Digestibilidade O avanço científico da nutrição animal e a expansão dos conhecimentos sobre necessidades nutricionais e metabolismo dos diferentes nutrientes, só foi possível graças ao desenvolvimento de métodos de avaliação quantitativa dos nutrientes dos alimentos, tanto dos nutrientes totais como dos disponíveis. (CHURCH e POND, 1988). Como ciência, a nutrição envolve vários fatores interligados. Estes incluem o conteúdo de nutrientes, a energia, a digestibilidade e a apetibilidade de um alimento em particular (NOTT e TAYLOR, 1994). Não é possível a determinação nem a aplicação dos conhecimentos sobre as necessidades nutricionais dos animais sem um adequado conhecimento da biodisponibilidade de nutrientes dos alimentos que são utilizados (CHURCH e POND, 1988). Muitos modelos experimentais têm sido propostos para se determinar a biodisponibilidade de nutrientes específicos, variando segundo o autor e apresentando aspectos positivos e negativos decorrentes de sua utilização. Tais experimentos têm como pressuposto que a excreta eliminada corresponde ao alimento ingerido no mesmo período, sendo portanto balanços de ingestão e excreção (ANDREASI, 1955). Como as aves eliminam as fezes e a urina conjuntamente pela cloaca, elas apresentam uma situação especial em relação aos estudos de digestão. O simples balanço entre a ingestão e a excreção refere-se aos nutrientes metabolizados pelo animal. Para se estudar seus aspectos digestivos é necessário separar a urina das fezes (SIBBALD, 1982), o que pode ser feito pela determinação dos teores de ácido úrico - principal componente nitrogenado excretado pelas aves - que é posteriormente descontado das excretas eliminadas pela subtração de sua massa e nitrogênio correspondentes (ALUMOT e BRELORIA, 1979). Existem dois métodos básicos para cálculo da digestibilidade, o Método Convencional ou Clássico e o Método dos Indicadores. No primeiro o animal é alimentado com uma dieta de composição conhecida, sendo quantificada a ingestão de nutrientes e recolhido todas as excretas. Desta forma é realizado um balanço entre o que foi ingerido e o que foi eliminado e a diferença corresponde aos nutrientes efetivamente digeridos e absorvidos. O Método dos Indicadores é uma opção quando é impossível ou inconveniente mensurar-se a ingestão ou coletar-se totalmente as excretas. O método depende do uso de uma substância de referência, denominada indicador. Este deve ser indigerível, inabsorvível, atóxico, dispersar-se uniformemente no alimento e nas fezes, passar pelo trato gastrointestinal na mesma velocidade que o alimento e ser de fácil determinação, tanto no alimento como nas excretas (ANDREASI, 1956). Este método estima a digestibilidade de qualquer nutriente, sem a necessidade de se conhecer a quantidade de alimento consumido e de excretas eliminadas. Os indicadores se dividem em dois grupos. Os indicadores externos, ou adicionados ao alimento, como o óxido crômico, e os internos, ou presentes naturalmente no alimento. Os indicadores internos correspondem a compostos químicos que não são digeridos, passando inalterados pelo trato digestivo. Dentre os indicadores internos de digestibilidade destacam-se os carboidratos estruturais e a sílica. Os carboidratos estruturais, na análise bromatológica básica, são denominados de Fibra Bruta (FB), que consiste no resíduo obtido após a fervura do alimento em ácido e base diluídos com subsequente queima da amostra a 550oC. Esta é composta basicamente por celulose, hemicelulose e alguma lignina e materiais indigeríveis associados. Devido às dificuldadesna análise da FB, VAN SOEST (1994) propôs um método analítico baseado na extração por detergentes: Fibra em Detergente Neutro (FDN) - solubiliza o conteúdo celular, de grande disponibilidade para os animais (açúcares, gorduras, proteína, ácidos orgânicos, amido), sendo o resíduo insolúvel constituído basicamente pela parede da célula vegetal (celulose, hemicelulose e lignina); Fibra em Detergente Ácido (FDA) - solubiliza o conteúdo celular, hemicelulose e protéinas da parede celular, sendo o resíduo composto por celulose, lignina, cutina e sílica. MUELLER (1956) avaliou a lignina e concluiu que este composto fenólico integrante da parede da célula vegetal se presta como indicador de digestão para galinhas. A FB é também apontada como uma alternativa para aves de produção por SIBBALD (1982), apesar do autor defender a necessidade de mais estudos. Não se localizou trabalhos avaliando a FDA como indicador para aves. Seu uso é promissor por esta ser de determinação laboratorial mais precisa e apresentar menor variação que a FB, e por representar apenas a parede da célula vegetal, naturalmente de menor digestibilidade. Infelizmente, a literatura consultada aponta a existência, para aves em vida livre, de levantamentos de itens ingeridos, mas muito poucos estudos sobre a composição química dos alimentos consumidos. Não é possível, sem estes dados, se estabelecer o perfil nutricional, muito mais importante, da dieta natural (ROBBINS, 1983). Não se localizou para psitacídeos, também, nenhum estudo de digestão em vida livre, que permitisse avaliar a interação química da ave com seu alimento e ambiente externo, bem como compreender processos adaptativos e necessidades alimentares. 1.3 Estudos Sobre Alimentação de Psitacídeos em Cativeiro A alimentação de psitacídeos em cativeiro tem sido feita até o momento, em sua maior parte, de maneira empírica. Pouco são os dados levantados sobre suas necessidades nutricionais (KAMPHUES, 1993; NOTT e TAYLOR, 1994 e ROUDYBUSH, 1996) e raras são as dietas tecnicamente elaboradas e balanceadas (KAMPHUES, 1993). A literatura é vasta em dietas e cardápios preconizados por vários autores mas, com raras exceções, eles não contemplam uma avaliação dos nutrientes oferecidos, não levam em conta os hábitos alimentares naturais, sendo algumas vezes nutricionalmente desbalanceados. Muito do que se utiliza na sua alimentação resulta de dietas e cardápios que comprovaram êxito com seu uso, mais do que de dados provenientes de estudos científicos (NOTT e TAYLOR, 1994). Um erro freqüente é o cálculo da alimentação feito a partir dos alimentos oferecidos, não sendo considerados quais são realmente consumidos e que parte destes é efetivamente ingerida (KAMPHUES, 1993 e CARCIOFI, 1996). Geralmente a alimentação é oferecida ad libtum e em quantidades superiores à ingestão das aves (EARLE, 1993). A menos que seja feito um rigoroso controle, através da pesagem do que é oferecido e recusado, não se tem como saber quais itens são realmente consumidos e em qual proporção (KOLLIAS, 1995). Erros nos cálculos de consumo acontecem ainda por considerar-se a ingestão sobre a matéria original. Como frutas e verduras são muito ricas em água (mais de 80%) e sementes apresentam apenas 10% de água em média, muitos criadores e proprietários acabam por supervalorizar o consumo real dos primeiros e sua participação efetiva no fornecimento de nutrientes às aves (CARCIOFI, 1996). Como os psitacídeos coevoluiram com o seu suprimento natural de alimentos, em ambientes não degradados existe uma "sabedoria" natural transmitida através das gerações que lhes garante uma correta nutrição em vida livre. Esta premissa tem sido utilizada como base para o sistema de alimentação usual, que consiste no oferecimento de uma dieta variada para que a ave selecione o que ingerir. Todavia, estudos com psitacídeos em cativeiro sugerem que esta "sabedoria" dos animais selvagens não é bem aproveitada em cativeiro, onde estes são alimentados principalmente com alimentos cultivados pelo homem (ULLREY et al., 1991). O alimento é colocado à disposição em período integral e em quantidades superiores à ingestão, levando os animais a consumirem apenas os mais palatáveis, advindo daí grande número de doenças carenciais e uma difícil reprodução. Este fato levou o autor supracitado à conclusão de que é necessário desenvolverem-se estudos sobre as limitações nutricionais dos alimentos correntemente oferecidos e o desenvolvimento de dietas balanceadas, nutricionalmente completas. A maioria dos alimentos utilizados são estranhos às aves, não sendo os consumidos na natureza. Deve-se então comparar o valor nutritivo de tais alimentos com as necessidades nutricionais das aves que deles se alimentarão, e desta forma detectar e corrigir deficiências em nutrientes (ULLREY, et al., 1991). Mas, para isto, há dois problemas: a) o desconhecimento dos requerimentos nutricionais dos psitacídeos (NOTT; TAYLOR, 1994); b) o desconhecimento da composição nutricional e do aproveitamento dos alimentos oferecidos (American Association of Feed Control Officials - AAFCO, 1998). Como se tem poucos estudos desenvolvidos com psitacídeos, para se compreender suas necessidades nutricionais tem sido necessário extrapolar-se informações disponíveis da avicultura comercial. Todavia esta compreende as ordens Anseriformes e Galliformes, muito diferentes dos Psittaciformes (NOTT e TAYLOR, 1993 e NOTT e TAYLOR, 1994). Como exemplo da cautela que se deve ter nestas extrapolações têm-se os resultados de um estudo sobre nutrição de Calopsita (Nymphicus hollandicus). Foram demostradas diferenças não somente nas necessidades nutricionais, mas também a existência de diferentes manifestações clínicas associadas a deficiência de nutrientes específicos. Por exemplo, a deficiência de Riboflavina em pintos manifesta-se clinicamente pelo entortamento dos dedos, o que não é observado em Calopsitas. Estas apresentam acromatose nas penas primárias como resultado desta deficiência, o que por sua vez é causado na galinha pela deficiência de lisina (ROUDYBUSH, 1996). Um passo importante para a nutrição de aves de estimação foi dado pela AAFCO em 1998. Reunindo especialistas e fabricantes de alimentos, propuseram níveis recomendados pela associação para a manutenção de psitacídeos e passeriformes em cativeiro. Os níveis propostos são conservadores, baseados nas necessidades de aves domésticas (National Research Council - NRC, 1994) e na experiência e vivência prática dos integrantes do grupo. Pela ausência de dados, adotaram a energia bruta e o fósforo total. Os níveis sugeridos para psitacídeos encontram-se no quadro 2. Quadro 2: Perfil Nutricional Recomendado de Dieta para Manutenção de Psitacídeos Adultos em Cativeiro. Nutriente Mínimo Máximo Nutriente Mínimo Máximo Energia bruta, kcal/g 3.200 4.200 Piridoxina, ppm 6,0 Ácido linoleico, % 1,0 Riboflavina, ppm 6,0 Proteína bruta, % 12,0 Tiamina, ppm 4,0 arginina, % 0,65 Vit B12, ppm 0,01 lisina, % 0,65 Minerais metionina, % 0,30 Cálcio, % 0,30 1,20 metionina + cistina, % 0,50 Fósforo, total % 0,30 treonina, % 0,40 Ca:P total 1:1 2:1 Vitaminas Cloro, % 0,12 Vitamina A, IU/kg 8.000 Magnésio, % 0,06 Vitamina D3, IU/kg 500.0 2.000 Potássio, % 0,40 Vitamina E, ppm 50,0 Sódio, % 0,12 Vitamina K, ppm 1,0 Cobre, ppm 8,0 Biotina, ppm 0,25 Iodo, ppm 0,40 Colina, ppm 1.500 Ferro, ppm 80,0 Folato, ppm 1,50 Manganês, ppm 65,0 Niacina, ppm 50,0 Selenio, ppm 0,10 Ac. Pantotênico, ppm 20,0 Zinco, ppm 50,0 (AAFCO, 1998) As recomendações propostas não são a palavra final, precisam ser adaptadas para as diferenças existentesentre as mais de 340 espécies de psitacídeos e muitos estudos precisam ser feitos para confirmar ou adequar os níveis indicados. Elas têm o mérito de ser o ponto de partida. Seu uso irá indicar, com o tempo, a necessidade ou não de adequações. Necessidades para a reprodução e muda de penas não foram propostas. A necessidade protéica para crescimento de psitacídeos foi estudada por ROUDYBUSH e GRAU (1986), que estabeleceram como mínimo para crescimento de Calopsitas 20% de proteína bruta e 0,8% de lisina. CARCIOFI et al. (1999), utilizando dieta purificada (amido de milho, celulose, proteína isolada de soja, óleo de soja, minerais e vitaminas) e 40 filhotes de Papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva), concluíram que as necessidades protéicas para crescimento da espécie estão entre 20 e 22% de proteína bruta. Estudos referentes à muda de penas são muito escassos. As penas são constituídas por 93 a 98% de proteína sendo a principal delas a queratina. A queratina apresenta uma composição particular de aminoácidos, com uma concentração de aminoácidos sulfurados muito maior do que outros tecidos animais e tecidos vegetais, apresentando entre 6,7 e 8,2% de cistina em sua composição (ROBBINS, 1983). Considerando o período completo de muda de penas, de aproximadamente 60 dias, tem-se um aumento das necessidades energéticas dependendo da espécie de 5 a 40% e um aumento de pelo menos 17% das necessidades protéicas. Minerais e vitaminas também têm suas necessidades aumentadas para a ave durante a muda de penas. Por exemplo, 35% do cobre e do zinco retidos pelo organismo são depositados nas penas das aves, levando a problemas de empenamento se insuficientes (WOLF et al., 1998). Faltam, ainda, dados sobre as necessidades energéticas para manutenção e reprodução de psitacídeos. Para aves não passeriformes valores entre 130 e 160 kcal de energia metabolizável (EM) por kg0,75 por dia têm sido indicados. O valor mais amplamente utilizado é a TMB, de 91 kcal/kg0,729/dia (ASCHOFF e POHL, 1970) adicionada de 31% referente ao calor de digestão e absorção, termorregulação e atividade física (ROBBINS, 1983), originando uma taxa metabólica diária (TMD) de 118 kcal/kg0,729/dia. Em uma série de experimentos sobre consumo de alimentos por Papagaio-verdadeiro, CARCIOFI et al. (1999) verificaram uma ingestão diária de EM (média de 10 dias) de 138 kcal/ kg0,75/dia no inverno e 107 kcal/ kg0,75/dia no verão. DREPPER et al. (1988), no entanto, definiram como 200,8 kcal/ kg0,75/dia a necessidade de EM para manutenção de Periquito-australiano (Melopsittacus undulatus) em cativeiro, valor significativamente maior. Até que mais dados sejam produzidos, parece razoável adotar-se uma TMD de 118 kcal/kg0,729/dia para psitacídeos médios e grandes, e a fórmula de DREPPER et al. (1988) para psitacídeos pequenos em cativeiro. Existe pouca informação, também, sobre a composição nutricional das sementes utilizadas na alimentação de psitacídeos em cativeiro (AAFCO, 1998). Apenas as sementes que participam da alimentação de animais de produção já foram estudadas, mas os dados referentes a seu conteúdo energético, protéico ou mineral são referentes à semente com a casca, como ela é normalmente empregada. Psitacídeos, no entanto, apresentam grande capacidade motora em seu bico e língua, descascando as sementes e ingerindo apenas seu endosperma. WOLF et al. (1998) estudaram o efeito da retirada da casca sobre a composição mineral das sementes mais comumente utilizadas, encontrando uma diminuição de 34% dos teores de cálcio e sódio, e um aumento de 40% dos teores de fósforo, 26% dos teores de potássio e 40% dos teores de magnésio. A casca é também muito rica em fibra, e sua retirada significa um aumento do valor nutritivo das sementes, com aumento proporcional dos teores de amido, energia, vitaminas e de sua digestibilidade (CARCIOFI, 1996). Como conseqüência da falta de conhecimentos sobre nutrição de psitacídeos em cativeiro e da desinformação dos proprietários quanto a princípios básicos que os orientem na alimentação de suas aves, as doenças nutricionais são um dos problemas mais prevalentes na clinica de aves atualmente (HIMMELSTEIN e BERNSTEIN, 1978; VILLM e O’BRIEN, 1988; DORRESTEIN et al., 1987; NOTT e TAYLOR, 1994; ALLEN e MONTALI, 1995 e LUMEIJ et al., 1996). Proteínas, gorduras, carboidratos, vitaminas e minerais são elementos essenciais à dieta de animais saudáveis. Quando ocorre alguma deficiência, a capacidade orgânica de resistir às doenças fica prejudicada. Como exemplo deste fato tem-se o trabalho de DORRESTEIN, et al. (1985), onde em 466 necrópsia de psitacídeos o autor verificou que 85 % dos casos de aspergilose estavam correlacionados com alterações metaplásticas das glândulas salivares, ocasionada por deficiência crônica de vitamina A. Deficiências nutricionais podem também ser uma seqüela de doenças sistêmicas. Quando uma ave está doente, sua ingestão de alimentos diminui, e suas necessidades básicas de nutrientes não é suprida. Então, uma adequada nutrição da ave doente é também essencial para uma pronta recuperação de outras doenças sistêmicas. Desta forma, doença sistêmica primária e deficiência nutricional muitas vezes ocorrem simultaneamente (VILLM e O’BRIEN, 1988; ULLREY, 1993 e CHANDRA e KUMARI, 1994). KOLLIAS (1995) coloca quatro razões que levam ao alto índice de ocorrência de doenças nutricionais em psitacídeos em cativeiro: 1) pouco conhecimento das necessidades nutricionais reais dos psitacídeos. Por esta razão tem-se a tendência de se extrapolar das necessidades nutricionais das aves de produção, já bem conhecidas. Todavia isto deve ser feito com cautela, pois além dos motivos expostos anteriormente, aves comerciais são alimentadas para obterem a máxima taxa de crescimento e ótima composição de carcaça ou produção de ovos. Já os proprietários de aves de estimação, ou a criação de aves em programas de conservação, como no caso da Arara-azul, buscam longevidade, saúde, bem-estar e reprodução (NOTT e TAYLOR, 1993); 2) Muitos proprietários acreditam erroneamente que as dietas à base de grãos são completas para os psitacídeos. As sementes disponíveis comercialmente para estas aves são não somente deficientes em nutrientes como aminoácidos, vitaminas, macro e micro-minerais, como não são a dieta consumida na natureza. No caso da Arara-azul, sua dieta natural é baseada no endosperma de cocos; 3) O terceiro motivo que os leva a desenvolver deficiências nutricionais é a tendência individual de certas aves de selecionarem alimentos específicos, dentre a variedade oferecida. Isto leva ao descrédito do conceito de que as aves são capazes de balancear suas dietas em cativeiro. Como resultado, indivíduos podem ficar habituados ou fixados em alimentos específicos, como o girassol, e estes podem ser deficientes em alguns nutrientes. Desta forma, necessita- se de pesquisas que determinem melhores sistemas de alimentação de psitacídeos, corrigindo tais distúrbios (CARCIOFI, 1996); 4) Os proprietários acreditam que a ave está saudável quando está comendo e possui peso normal. Mas ele não sabe exatamente o que ela está ingerindo, a menos que faça uma análise detalhada do alimento oferecido antes e depois dela se alimentar. Além disso, quando esta consome sementes ricas em gordura, ou alimentos ricos em calorias, podem ter peso normal mas estarem desnutridas. Como se vê, as sementes acabam perfazendo a maior parte da dieta de cativeiro de psitacídeos. Todavia, baseando-se em dados de aves comerciais, pode-se considerar que os grãos são deficientes em proteína, ou com uma relação energia- proteína desfavorável (girassol, amendoim, abóbora), apresentando deficiência dealguns aminoácidos essenciais para crescimento e reprodução, como metionina e cistina. São ainda marginais ou deficientes em cálcio, fósforo disponível, sódio, manganês, zinco, ferro, vitamina A, riboflavina, ácido pantotênico, niacina disponível, vitamina B12 e colina. O selênio e o iodo variam grandemente, segundo seus teores no solo, necessitando de suplementação (ULLREY, et al., 1991). A maioria das deficiências nutricionais são de natureza crônica, mas algumas podem apresentar sintomas extremamente agudos (VILLM e O’BRIEN, 1988). As deficiências nutricionais mais comumente encontradas em psitacídeos são a hipovitaminose A, deficiência de aminoácidos (VILLM e O’BRIEN, 1988), e as deficiências de minerais (WOLF et al., 1998). Outro problema comum é a obesidade. Esta ocorre por uma interação entre a energia da dieta, pouca possibilidade de locomoção e exercício com consequente baixo gasto de energia e falta de ocupação, quando a ave fica entediada e acaba por ingerir alimentos em excesso (KAMPHUES, 1993). A hipovitaminose A é uma doença comum em psitacídeos na Europa (ZWART et al., 1979; DORRESTEIN et al., 1985; DORRESTEIN et al., 1987 e CLIPSHAM, 1994). Os níveis hepáticos normais de vitamina A em psitacídeos estão entre 500 a 1.200 U.I. por grama. Valores entre 50 e 2 U.I. de vitamina A por grama estão fortemente relacionados a alterações metaplásticas das glândulas salivares linguais (ZWART et al., 1979 e DORRESTEIN et al., 1987). Em estudos histológico envolvendo 112 psitacídeos de grande porte (papagaios, araras e cacatuas) DORRESTEIN et al. (1987) encontraram que 55 % das cacatuas, 48 % dos papagaios cinzentos e 51 % dos papagaios verdes (gênero Amazona) apresentavam alterações em suas glândulas salivares. Isto significa que no total, 51 % dos psitacídeos examinados apresentavam menos de 50 U.I. de vitamina A por grama de fígado, quantos apresentavam menos de 500 U.I., não se sabe. O problema já foi descrito em um filhote de Arara-azul de 1 ano e idade alimentado basicamente com Coco-da-bahia (HOCHLEITHNER et al., 1987). Esta grande incidência, como anteriormente mencionado, deve-se ao fato destas aves serem alimentadas com uma grande quantidade de sementes, que são, de maneira geral, pobres em vitamina A, em especial o girassol que é bastante consumido. Infestações parasitárias, como por Giardia spp, Capillaria spp e coccidia, predispõem a ave a hipovitaminose A, pois o ß-caroteno é biotransformado em vitamina A nos enterócitos durante sua absorção. A infestação por estes parasitas diminui a capacidade orgânica desta biotransformação. Os sintomas clínicos da hipovitaminose A incluem: infecções do trato respiratório, problemas reprodutivos, dificuldade para descascar e deglutir alimentos, arrancamento de penas, pododermatite plantar e gota - devido a lesões nos túbulos renais e dificuldade de excreção de acido úrico (RYAN, 1988 e ALLEN e MONTALI, 1995). Deficiência de proteína, em especial do aminoácido arginina, leva ao empenamento pobre nas aves. Aparecem linhas transversais, formando 90 graus com o eixo da pena, chamadas linhas de estresse, mudas incompletas, penas em "alfinete" (sem as barbas) e penas facilmente quebráveis na asa e cauda (RYAN, 1985). A má nutrição é também uma das causas da síndrome do arrancamento das penas, quando as aves passam a retirar as penas do próprio corpo (GOULD, 1995). Deficiência de lisina leva a problemas de pigmentação, penas azuis e verdes tornam-se amarelas ou pretas. Penas quebradiças e pele com descamação podem ser seqüelas de deficiência de Ca, Zn, Se, Mn, Mg e biotina, já a de niacina e a ácido pantotênico levam ao empenamento pobre de filhotes, quando deficientes (VILLM e O’BRIEN, 1988). A superfície epitelial da pele, bico, penas e unhas apresenta-se seca e com descamações. Bicos e unhas longos e disformes. Bico apresentando camadas, decorrentes da incapacidade do crescimento normal do tecido queratinizado. A pele das pernas e pés, com padrão escamoso, fica espessada. Estes sintomas são decorrentes da deficiência de vitamina A, proteína, zinco, biotina ou ácido pantotênico (RYAN, 1985). Deficiências de macro e micro-elementos são muito comuns em psitacídeos (HIMMELSTEIN e BERNSTEIN, 1978). Estas se devem, de um lado, aos baixos níveis de cálcio, alto fósforo, presença de fitato e níveis variados de micro-elementos nas sementes, e de outro pela não suplementação ou a suplementação incorreta e ineficaz das mesmas (WOLF et al., 1998). Outras doenças de origem nutricional encontradas na clínica de psitacídeos são: a deficiência de iodo, que leva ao bócio ou hipotireoidismo; deficiência de cálcio, fósforo e vitamina D, que leva a alterações angulares dos ossos longos, entortamento do bico ocasionando sua má oclusão e a convulsões tetânicas; hemocromatose e degeneração gordurosa do fígado (KOLLIAS, 1995). Disso decorre que a primeira consideração em psitacídeos doentes deve ser a avaliação de sua nutrição, com a prescrição das alterações necessárias (DORRESTEIN, et al., 1987). Na prescrição de uma nova dieta, deve-se atentar para a escolha de alimentos que aliem boa palatabilidade e valor nutricional. Estes devem ser oferecidos de maneira a assegurar seu consumo, que deve sempre ser monitorado pelo proprietário (CARCIOFI, 1996). Esta situação levou NOTT e TAYLOR (1994) a afirmarem que "é clara a necessidade de mais estudos sobre as necessidades nutricionais de psitacídeos." Como o desenvolvimento de tecnologia para sua manutenção e reprodução em cativeiro pode ser um importante mecanismo de preservação destas espécies, saber alimenta-las é um primeiro passo. 2 OBJETIVOS Tendo em vista a importância do assunto apresentado, os objetivos do presente trabalho foram: 1) Analisar a composição química dos alimentos consumidos pela Arara- azul no Pantanal da Nhecolândia, Mato Grosso do Sul, a Bocaiúva (Acrocomia totai) e o Acurí (Sheelea phalerata); 2) Avaliar a aplicabilidade da Fibra Bruta, Fibra em Detergente Ácido e da Lignina como indicadores para o cálculo da digestibilidade e metabolização dos alimentos para a Arara-azul em vida livre; 3) Calcular a digestibilidade e metabolização do Acurí e da Bocaiúva; 4) Estimar as necessidades de energia metabolizável e de alimentos da Arara-azul em vida livre; 5) Indicar, com base nos dados de alimentação natural, princípios nutricionais para a Arara-azul em cativeiro. 3 MATERIAL E MÉTODO 3.1 Colheita das Amostras e Estudos de Campo. O trabalho foi conduzido na sub-região da Nhecolândia, no Pantanal de Mato Grosso do Sul. A área envolvida foi de aproximadamente 40.000 ha, compreendendo parte de 4 fazendas: Nhumirim (fazenda da EMBRAPA), Cáceres, Alegria e Campo Dora. Nesta área existem mais de 40 ninhos de Araras-azuis que foram ativos, em pelos menos um dos anos de 1991, 1992 ou 1993 (GUEDES, 1993). A Nhecolândia apresenta grandes áreas intocadas, baixa densidade humana, relativamente longos períodos de inundação e dificuldade de acesso. É possível que estes fatores juntos tenham colaborado para que nela exista a maior concentração de Araras-azuis do Pantanal, ao redor de 1.500 indivíduos. Uma completa caracterização e descrição deste hábitat pode ser encontrada em GUEDES (1993). A escolha do local para a realização deste trabalho considerou, também, o apoio logístico recebido da Bióloga Neiva Maria Robaldo Guedes, coordenadora do Projeto Arara-azul-UNIDERP, e do Centro de Pesquisas Agropecuárias do Pantanal - CPAP/EMBRAPA, cuja sede de campo é a Fazenda Nhumirim. O estudo foi desenvolvido em 4 viagens de campo. Para cada expediçãode colheita de dados e amostras foi estabelecido um plano de viagem. Tanto a fazenda Nhumirim/CPAP como o Projeto Arara-azul foram os pontos de apoio. O tempo médio de permanência na área de estudo foi de 3 semanas em cada expedição, sendo o pesquisador acompanhado por um ajudante de campo. Devido às grandes distâncias existentes, tanto entre as fazendas como entre os pontos de alimentação dentro das fazendas, e à falta de infra-estrutura do projeto, como a inexistência de um carro com tração 4 x 4 que pudesse transitar pelo Pantanal, optou-se por acampar próximo à sede de fazendas ou retiros, de modo que o percurso para o local de alimentação dos animais pudesse ser percorrido a pé. Deste modo, cada viagem de campo teve início na sede do CPAP/EMBRAPA em Corumbá-MS, quando uma Toyota levava a equipe para o local de observação. Seguindo o plano de viagem os funcionários do CPAP/EMBRAPA transportavam a equipe para outros locais de estudo, previamente determinados. As amostras dos alimentos foram tomadas em quatro pontos da região, sendo respectivamente: 1) Nhumirim; 2) Alegria; 3) Campo Dora; 4) Cáceres. A coleta foi feita seguindo-se rigorosamente o hábito alimentar da Arara-azul, com a seleção dos cocos no mesmo grau de amadurecimento que o consumido e com a retirada para análise apenas da porção do endosperma efetivamente ingerida. Para tanto utilizou-se de binóculo e de uma luneta telescópica, com aumento de 60 vezes, que permitiram um adequado monitoramento à distância das aves com a observação de seu comportamento alimentar. Sempre que as araras eram localizadas anotava-se seu número, hora do dia, local e descrevia-se seu comportamento. Como freqüentemente permanecem agrupadas, as anotações referem-se ao comportamento da maioria do grupo. Para cada uma das sementes foi feito um homogeneizado do material colhido em cada propriedade, em diferentes épocas do ano. Os frutos foram divididos, quanto ao estágio de maturação, em três categorias: a) fruto do cacho, quando retirados diretamente do cacho antes de sua queda natural; b) fruto novo, quando este foi colhido sobre o solo, mas ainda apresentando aderido à sua superfície restos do mesocarpo e matéria vegetal do regurgitado ruminal, com ausência de escarificação ou deterioração pelo tempo; c) fruto velho, quando se apresentava de coloração mais escura, sem resquícios do mesocarpo e já com sinais de escarificação, indicando maior tempo de permanência no solo. A colheita das amostras ficou assim esquematizada: Áreas de coleta - 4 Períodos de colheira (viagens) - 4 Frutos - 2 Estágios de maturação - 3 Para as determinações de micro-minerais, vitaminas, ácidos graxos e aminograma foi confeccionada uma amostra representativa de todo o período de coleta, dividindo-se os frutos em: a) frutos do cacho; b) frutos do chão. 3.2 Análises Laboratoriais As análises foram conduzidas no laboratório de Doenças Nutricionais do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo. Todas elas foram realizadas em duplicata, sendo repetidas caso os resultados variassem mais do que 5%. As determinações de matéria seca, proteína bruta, extrato etéreo, extrativos não nitrogenados, fibra bruta, fibra em detergente ácido e matéria mineral foram realizadas segundo as técnicas da Association of the Official Analitical Chemists - AOAC (1995). A energia das amostras foi determinada em Bomba Calorimétrica Adiabática de Parr, segundo procedimento da ASTM Standards for Bomb Calorimetry, 1971. O ácido úrico das excretas foi determinado por método colorimétrico descrito por ALUMOT e BRELORIA (1979). A Lignina foi determinada segundo método constante de SILVA (1981). O cálcio, fósforo, magnésio, manganês, ferro, cobre e zinco foram determinados por espectroscopia de emissão atômica com plasma acoplado indutivamente (ICP-AES), em equipamento JARRELL-ASH modelo 975 Plasma ATOMCOMP, no Centro de Energia Nuclear na Agricultura - CENA/ESALQ - USP. O aminograma foi realizado em Autoanalyzer Beckman modelo 7.300, por cromatografia de troca iônica. A análise cromatográfica de ácidos graxos foi realizada em cromatógrafo a gás C.G.-500, segundo técnica descrita por HARTMAN e LAGO (1973). Estas duas análises foram realizadas no Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. A determinação de carotenóides foi conduzida segundo CARVALHO, et al. (1992) e a de vitamina E segundo MANZ e PHILIPP (1981), em High Performance Liquid Chromatography no Instituto de Tecnologia de Alimentos - ITAL em Campinas. Foi realizada, também, avaliação do peso, proporção de endosperma e qualidade do Acurí e da Bocaiúva, determinando-se seu peso médio, número de cocos para a obtenção de 100 gramas de endosperma, porcentagens de perisperma e endosperma e a porcentagem de cocos estragados dentre os disponíveis sobre o solo ou no cacho. Para sua avaliação os cocos foram quebrados manualmente um a um com martelo e alicate. Após romper-se o perisperma o endosperma era raspado e recolhido, com cuidado para não se contaminar a amostra com fragmentos de perisperma, um tecido altamente lignificado. Neste processo foi detectado que os cocos são parasitados por larvas de coleópteros, que se alimentam de seu endosperma. O significado nutricional destes besouros foi avaliado por sua composição química e pela análise quantitativa de sua ocorrência, e portanto disponibilidade para as Araras-azuis em seu alimento. Para verificar a possibilidade de ingestão de insetos ou outros tecidos vegetais pelas Araras-azuis, procedeu-se à avaliação microscópica de amostras de excreta. Estas foram tratadas com hidróxido de sódio a 4% por 20 minutos, para se remover o ácido úrico e partículas amorfas, sendo em seguida examinadas em Lupa Micronal em aumento de 10 vezes. Fragmentos pequenos, que se semelhavam ao exoesqueleto de queratina dos insetos, foram examinados em microscópio ótico com aumento de 40 vezes para se confirmar sua origem (GREEN e TYLER, 1989). 3.3 Cálculos de Digestibilidade e Metabolização dos Alimentos Aproveitando-se das características peculiares do comportamento alimentar da Arara-azul, que no Pantanal se alimenta apenas de tecidos vegetais muito semelhantes - o endosperma de duas espécies de palmae - foi proposta a realizado de ensaios de digestibilidade para as aves em vida livre. Avaliou-se três indicadores internos, a fibra bruta (FB), a fibra em detergente ácido (FDA) e a lignina. Os coeficientes de digestão foram calculados pela fórmula: D.A.= 100 - 100 % Ind. Alim. % Ind. Fezes %Nut.Fezes %Nut.Alim.× × � � � � � � Onde D.A. = Digestibilidade Aparente (ANDREASI, 1956). A separação química das fezes e da urina foi realizada pela determinação do ácido úrico e posterior retirada de seu nitrogênio e massa específica da composição das excretas analizadas. A comparação entre os indicadores de digestão empregados envolveu a análise estatística dos valores consignados para cada um deles e a observação do coeficiente de variação entre os resultados de um mesmo indicador, sendo considerado mais seguro aquele com menor variabilidade entre os resultados obtidos com seu emprego. A impossibilidade de se conhecer o consumo exato de alimentos ou de se colher totalmente as excretas torna impossível o cálculo da taxa de recuperação dos indicadores em estudo. O que foi feito, então, foi calcular a digestibilidade aparente de um indicador utilizando para isto os outros dois indicadores avaliados. Assim, foi calculada a
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