Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A discreta revolução do mundo empresarial Por ROSABETH MOSS CANTER Preparese para um futuro onde o conceito de corporação — como ela é estruturada, como é governada — irá variar amplamente. Mas o comportamento das corporações convergirá para poucos padrões e regras universais. Considere esse exemplo. Para um recente programa da Universidade Harvard sobre liderança de negócios na China, eu convoquei um painel de diretorespresidentes de quatro empresas muito diferentes: China Mobile, estatal e maior operadora de telefonia celular do mundo; Esquel Group, empresa familiar de roupas que trocou a China por Hong Kong e depois voltou; IBM Greater China, unidade da multinacional IBM na China; e uma novata de software, incorporada no Estado americano de Delaware, que na época estava operando em Xangai, tinha investidores na Ásia e nos Estados Unidos e usava um banco no Vale do Silício. Os tipos de controle de capital e governança dessas companhias variavam num amplo espectro. Mas, à medida que as discussões do painel progrediam, tornavase claro que todas elas eram notavelmente semelhantes em seus fundamentos e aspirações. Cada diretorpresidente falou sobre competir por talentos em uma geração de profissionais que valorizam trabalhos significativos e um bom salário, criam uma cultura de inovação constante, lutam por uma comunicação mais aberta, consideram horizontes de longo prazo e servem as comunidades locais. Os Modelos do Próximo Ano O fato de essa conversa ter acontecido na China já é um prenúncio do futuro. Perto de 100 empresas chinesas estão hoje entre as 500 maiores do mundo em receita, o que já é próximo do número de gigantes americanas. Grandes companhias de países emergentes estão comprando ícones ocidentais. (A indiana Mittal comprou a francesa Arcelor, a Tata Motors comprou a Jaguar e a Land Rover, e a brasileira AmBev adquiriu a AnheuserBusch e a belga InBev ). Isso promete uma proliferação maior de formatos de empresas, especialmente quando os conceitos americanos não são mais considerados modelos dominantes. Essas novas formas de controle de capital e governança incluirão empresas de estilo asiático — estatais ou ligadas ao governo — como a Temasek, de Cingapura; as com dois conselhos, de supervisão e administração, como as alemãs; cooperativas de produção, de varejo ou financeiras de propriedade de clientes ou funcionários, como o Crédit Agricole, da França, ou a Desjardins, do Canadá; empresas benfeitoras criadas para gerar lucros e benefícios sociais; alianças e consórcios, como a Visa e a MasterCard; instituições de caridade que operam empresas, como a alemã Fundação Robert Bosch; empresas de propriedade familiar, mantidas por private equity ou fundadas com capital de risco; e o fator X de parcerias ainda a ser inventado. Ainda assim, corporações de todos os tipos possuirão coisas em comum onde quer que operem ou sejam originadas. Elas serão globalmente conectadas, tecnologicamente capazes, humanamente diversas e socialmente responsáveis. Elas terão que ser. Clientes, a mídia e o público irão cada vez mais exigir tudo isso. Revolução Silenciosa Embora seja inevitável que se trave batalhas, por exemplo, sobre quais governos vão estabelecer os padrões de segurança alimentar, ou concordar com um tratado de proteção ambiental global, muitas grandes empresas vão engendrar uma convergência silenciosa de padrões que gradualmente afetará todos os negócios. A Cemex, por exemplo, fabricante mundial de cimento sediada no México, decidiu, depois de sua primeira incursão na Espanha, ser "uma Cemex" e operar através de um único conjunto de normas em todos os lugares, abrindo caminho para um crescimento significativo através de aquisições nos Estados Unidos, Egito, Europa e Austrália. Quando o Grupo Financeiro Shinhan, da Coreia do Sul, solicitou a abertura de capital na Bolsa de Valores de Nova York, logo depois de uma fusão, ele estava buscando legitimidade, não apenas capital, mostrando que respeita a lei SarbanesOxley, que é considerada a de mais alto padrão do mundo quando o assunto é governança corporativa. A administração da internet será globalizada, assim como os esforços continuados de interoperabilidade entre as empresas de telecomunicação. A convergência aumentará porque as empresas se comparam umas com as outras através de vastos territórios, e assim será com seus clientes, cada vez mais conectados via smartphones e a internet. Ser essencialmente local será uma escolha, não uma posição normal e inconsciente. Uma padaria da vizinhança servindo produtos locais deve competir com cadeias de supermercados internacionais que oferecem alimentos vindos do outro lado do planeta. Ao mesmo tempo, grandes corporações devem estar atentas a novatas que provocam rupturas e a pequenas empresas com produtos inovadores; a CocaCola comprou a Honest Tea, transformando a marca de sucesso em sua entrada nos mercados de bebidas saudáveis engarrafadas do futuro. À medida que a tecnologia evoluir e a computação em nuvem começar a pairar sobre tudo, as pequenas empresas terão acesso às mesmas informações que as grandes. Se as companhias não iniciarem uma cultura de propósito e princípios, seus membros internacionais e etnicamente diversos irão exigila, com valores universais e códigos de ética facilitando a comunicação, coordenação e cooperação. Mais empresas estarão formatando conjuntos de atividades, projetadas mais para serem flexíveis do que estáveis e previsíveis. Para lidar com um ambiente que está mudando rapidamente e com as fronteiras fluidas das unidades de negócio que vão e vêm, mais trabalho será feito por equipes de projeto multiáreas e haverá mais autoorganização a partir da base. As empresas abraçarão a comunicação sempre ligada, sempre acessível e democrática das redes sociais, ou ficarão para trás. Elas estarão menos centradas na matriz, porque toda a sabedoria não virá mais de Armonk, Cincinnati, Bangalore ou Pequim. Como o Google e Facebook, sua força virá não de seu número de empregados, mas do tamanho de sua rede de parceiros. Um pequeno núcleo com um conjunto amplo de parceiros afiliados livremente é, em si próprio, uma nova forma de organização. LadoNegativo Existe um lado negativo. Ser globalmente integrada pode se transformar em ser globalmente manipuladora. A "ganância corporativa" não vai desaparecer. Grandes companhias podem colocar um país contra o outro, procurando por abrigos fiscais ou subsídios fiscais, prontas para se mudar e deixar um cenário de destruição para trás. Mas, queiram ou não, a transparência vai estar no centro das atenções. O ativismo da mídia deve crescer junto com os "lucros de três dígitos". Além dos dados financeiros, relatórios ambientais e sociais começam a ser exigidos na União Europeia, Brasil e Austrália, entre outros lugares. Assim, empresas do futuro terão que construir um novo contrato social com a sociedade. A conduta delas importará mais que seu formato legal. Os interessados, incluindo acionistas, estão observando. Para obter confiança e legitimidade, as empresas devem ser cidadãs responsáveis em todos os lugares onde operarem. Isso significa mais que empregados se voluntariarem em projetos comunitários; isso significa pagar seus impostos e pagar pelo seu progresso, incluindo o preço das "externalidades", como as emissões de carbono. E elas devem descobrir, talvez antes que os países o façam, como encontrar valores universais que as ajudem a trabalhar cooperativamente além das fronteiras. Afinal, a paz mundial e a prosperidade também são boas para os negócios. Rosabeth Moss Kanter é professora da cátedra Ernest L. Arbuckle da Escola de Administração Harvard e autora dos livros "SuperCorp" e "Confidence" (Confiança).
Compartilhar