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Resumo “Introdução”. In: “História Econômica e Social da Idade Média”. Henri Pirenne Ruptura do equilíbrio econômico da Antiguidade Os reinos bárbaros fundados no século V, no solo da Europa Ocidental, tinham conservado o caráter mais legítimo e essencial da civilização antiga: o caráter mediterrâneo. Para os bárbaros estabelecidos na Itália, África, Espanha e Gália, o mediterrâneo era ainda via de comunicação com o Império Bizantino, e as relações mantidas através dele permitiam que subsistissem uma vida econômica, que deve ser vista, sem a menor sombra de dúvida como um prolongamento direto da Antiguidade. [ANEXO A e B - MAPA INVASÕES BÁRBARAS SÉCULO V] Foi preciso a súbita irrupção do Islão (invasão muçulmana), na história, durante o século VII, em sua conquista das costas orientais, meridionais e ocidentais do grande lago europeu, para colocá-los em uma situação completamente nova, cujas consequências deveriam influir em todo o curso posterior da história. [ANEXO C - MAPA EXPANSÃO ISLÃMICA SÉCULO VII] Assim, em vez de continuar sendo vínculo milenar entre Oriente e Ocidente, que fora até então, o mediterrâneo transformou-se em barreira. Se é certo que o Império Bizantino (continuação do Império Romano no oriente), graças a sua frota de guerra, conseguira repelir a ofensiva muçulmana do mar Egeu, Adriático e das costas meridionais da Itália, em compensação, todo mar Tirreno cairia em poder dos sarracenos (muçulmanos árabes que dominaram a Península Ibérica). [ANEXO D - IMPÉRIOS E DOMINIOS MUÇULMANOS SÉCULO VII] A partir do início do século VIII, o comércio europeu está condenado a desaparecer nesse extenso quadrilátero marítimo. O movimento econômico, desde então, orienta-se para Bagdá (atual capital do Iraque, Sudoeste Asiático). Nestas costas, que outrora se comunicavam, dividindo os mesmos costumes, necessidades e ideias, defrontam-se, agora, duas civilizações, ou melhor, dois mundos estranhos e hostis, o da Cruz (cristianismo) e o do Crescente (islamismo). O equilíbrio econômico da Antiguidade, que sobreviveram às invasões germânicas, rompe-se ante a invasão do Islão. O Império de Carlos Magno ou Império Carolíngio, por manifesto contraste com a Gália Romana (atual região francesa) e a merovíngia, será puramente terrestre ou, se quiser, continental. Desse fato fundamental, origina-se uma ordem econômica nova, que é, propriamente, a da Alta Idade Média. Desde o século IX, os bizantinos e os seus postos avançados nas costas italianas, Nápoles, Amalfi, Bari e, principalmente, Veneza, comerciavam mais ou menos ativamente com os árabes da Sicília, África, Egito e Ásia Menor. Acontecia, porém algo muito diverso na Europa Ocidental. Ali, o antagonismo destas duas religiões conservou-se em permanente estado de guerra. Do século IX ao XI, o Ocidente, em verdade, permaneceu bloqueado. De vez ou outra enviava-se embaixadores a Constantinopla, mas estes conseguiam chegar ao destino após muitas dificuldades. Porém a navegação mediterrânea ocidental estava totalmente morta. O movimento comercial desapareceu, pois a navegação constituía sua artéria vital. Manteve-se o tráfico entre os portos da Itália, África, Espanha, Gália e seu interior. Até a conquista árabe, uma classe de mercadores profissionais foi um instrumento de um comércio de exportação e importação. Graças a esses mercadores, as cidades romanas continuaram sendo centro de negócios. Mas no século VII, houve uma completa decadência daquela atividade. No decorrer do século VIII, os mercadores desapareceram em virtude da interrupção do comércio. As cidade-estado romanas, contudo, subsistiram, sendo centro de administração diocesana (igreja); mas perdeu todo o significado econômico. Houve então, um empobrecimento geral. O ouro foi substituído pela moeda de prata dos carolíngios. É um erro dizer que houve progresso econômico no Império Carolíngio, no reinado de Carlos Magno. Na verdade, comparado com o período merovíngio, o carolíngio aparece sob o ponto de vista comercial, como um período de decadência e retrocesso. O desaparecimento do tráfico e o fechamento do mar gerou consequências desastrosas. Caráter agrícola da sociedade a partir do século IX A partir do fim do século VIII, a Europa Ocidental regredira ao estado de região exclusivamente agrícola. É a terra a única fonte de subsistência e a única condição de riqueza. Os bens móveis já não tinham qualquer valor econômico. Daí a impossibilidade para o Estado de manter um sistema militar e uma administração que não se baseassem naquela. Em suma, o aparecimento do feudalismo, na Europa Ocidental, no decorrer do século IX, nada mais é do que a repercussão, na ordem política, do retorno da sociedade a uma civilização puramente rural. Os latifúndios e ausência de mercados externos Do ponto de vista econômico, o fenômeno mais notável e característico desta civilização é o latifúndio, que tem origem mais antiga do que se supõe. Permaneceu durante o período das invasões germânicas, a França merovíngia conservou-a e a Igreja introduziu-a além do Reno, a medida que ia convertendo aquelas regiões ao cristianismo. Quando os mercadores e a população municipal deixaram de existir, os detentores de terra tinham que consumir seus próprios produtos. Desse modo, cada latifúndio se dedicou a essa espécie de economia que se designa com pouca exatidão como um estado de economia latifundiária fechada e que é, unicamente, a bem dizer, uma economia sem mercado externos. O latifúndio não se adaptou a esta situação por livre escolha, mas por necessidade. Por isso, estabeleceram aquelas oficinas ou “gineceus”, tão característicos da organização latifundiária da Alta Idade Média, cujo único objetivo era remediar a ausência de comércio e indústria. O comércio ocasional e os mercados locais É óbvio dizer-se que semelhante situação está evidentemente exposta às incertezas do clima. Há, pois, a intervalos, sob influência dos fenômenos atmosféricos, um comércio usual que mantém nos caminhos e nos rios uma circulação intermitente. Entretanto, não representa uma atividade comercial específica nem, principalmente, profissional. É um recurso que se emprega quando a necessidade o impõe. O comércio deixou de ser um dos ramos da atividade social, a tal ponto,que cada latifúndio se esforça no sentido de bastar-se em todas as necessidades. A abundância dos mercados está em contradição com a paralisia comercial da época. Havia pequenas assembléias que consistia em suprir as necessidades econômicas da população, talvez, como se observará, ainda na atualidade, em satisfazer o instinto de sociabilidade, inato nem todos os homens. A proibição que fez Carlos Magno aos servos dos seus domínios “de vagar pelos mercados”, mostra que iam aos mercados mais por diversão do que pelo afã de ganhar dinheiro. Os judeus No idioma daquele tempo, a palavra judaeus e mercator são quase sinônimas. O comércio a que se dedicam é o de especiarias e tecidos preciosos. Importavampimenta, pois esse condimento tornar-se tão raro e tão caro que se usava de moeda, e esmaltes ou marfins de fabricação oriental, que constituíam o luxo da aristocracia. Os lucros por eles obtidos deveriam ser consideráveis, mas, afinal de contas, deve-se considerar que seu papel econômico foi secundário. Nada perderia a ordem social, se tivessem desaparecido. Caráter da sociedade desde o século IX A Europa Ocidental, desde o século IX, oferece um caráter essencialmente rural. A classe mercantil desapareceu nas referidas sociedades. Uma minoria de proprietários eclesiásticos ou leigos detém a propriedade. Quem possui terra, possui, ao mesmo tempo, liberdade e poder; por isso, o proprietário é simultaneamente senhor; quem dela está privado, fica reduzido à servidão. O fato essencial não é a condição jurídica, mas a condição social, e esta reduz a condição de dependentes e de explorador, ao mesmo tempo que protege todos os que vivem na terra senhorial. Preponderância da Igreja Nesse mundo rigorosamente hierárquico, o primeiro lugar, e o mais importante, pertence à Igreja. Seus domínios são superiores a nobreza, tanto por extensão, quanto por instrução. Graças as oferendas e esmolas dos fiéis, ela possui uma fortuna monetária que, em tempos ruins, empresta seu dinheiro aos leigos necessitados. Em sociedade que tornou a cair em geral ignorância, só ela possui ainda estes dois instrumentos indispensáveis a toda cultura: a leitura e a escrita. Do século IX ao XI, toda a alta administração permaneceu, de fato, em suas mãos. A Igreja uma grande autoridade moral e, também, um grande poder financeiro. A terra é dada por Deus para que estes pudessem viver neste mundo pensando na salvação eterna. A finalidade do trabalho não enriquecer, mas conservar-se na condição em que cada um nasceu, até que, desta vida mortal, passe a vida eterna. A pobreza é origem divina e os ricos a função de aliviá-los por meio da caridade. Proibição da usura. “Mutuum date nihil inde sperantes” (latim = emprestar, esperando nada em troca, e de esperança para) O empréstimo a juros teve o significado pejorativo que se conversou até os nossos dias, a usura, é uma abominação. Sempre foi proibida ao clero. O comércio em geral era reprovável assim como o dinheiro. É também perigoso para a alma, pois afasta-a de seus fins últimos. A reprovação da usura, do comércio, do lucro pelo lucro, é muito natural e, naqueles séculos em que cada latifúndio se bastava a si mesmo e constitui normalmente um pequeno mundo fechado. Anexos ANEXO A - MAPA DAS INVASÕES BÁRBARAS NO SÉCULO V ANEXO B - MAPA EUROPEU SÉCULO V ANEXO C - EXPANSÃO ISLÃMICA SÉCULO VII ANEXO D - IMPÉRIOS E DOMÍNIOS MUÇULMANOS
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