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Etapas do Metabolismo Aquático 7 Francisco de Assis Esteves José Francisco Gonçalves Júnior Cachoeira do Rio Pandeiros,Bonito de Minas, MG Foto: J. F A. Gonçalves Jr. 7.1 PRODUÇÃO O Metabolismo dos ecossistemas aquáticos pode ser definido como o movimen- to dos nutrientes entre os compartimentos bióticos e abióticos e o fluxo de energia, indicando a forma, eficiência e integridade ecológica do seu funcionamento. Segun- do Thienemann (1925) este constitui o objetivo central das pesquisas limnológicas. O metabolismo de um ecossistema aquático compreende três etapas principais: produção, consumo e decomposição (figura 7.1). FIGURA 7.1 Principais etapas do metabolismo de um ecossistema aquático. 120 F U N D A M E N T O S D E L I M N O L O G I A 2 a Prova / Wi lma A produção de um ecossistema aquático é realizada por aqueles organismos capa- zes de sintetizar a própria matéria orgânica, ou seja, transformar a energia luminosa em energia química (fotossíntese), através da seguinte reação química: 6CO2 + 6H2O + 675 kcal = C6H12O6 + O2. Estes organismos são chamados de produtores primários. Entre eles estão as algas (ver capítulo 21), o perifíton (organismos que crescem aderidos ou associados a substratos, ver capítulo 22), as macrófitas aquáticas (ver cap.23) e al- gumas espécies de bactérias (ver capítulo 20). Uma parte da produção total (produção primária bruta) destes organismos é gasta na manutenção de seu próprio metabolismo, enquanto a outra parte é transformada em biomassa ou utilizada na sua reprodução (produção primária líquida), que constitui a fonte de energia para a rede trófica do ecossistema. Nos ecossistemas lênticos (de água “parada”), a produção primária é principalmen- te autóctone, ocorrendo basicamente na zona eufótica (iluminada) e na região litorânea (ver detalhes nos capítulos 21, 22 e 23), que caracteriza um metabolismo autotrófico do sistema, onde produção > respiração, indicando que a produção da matéria orgânica é maior que a respiração de todo ecossistema (figura 7.1). Existem dois tipos de produtores primários: a) produtores primários fotoautróficos – organismos que utilizam energia solar para a síntese de matéria orgânica. São os mais importantes na maioria dos ecossistemas aquáticos. Exemplos: algas, macrófitas aquática e sulfobactérias. Detalhes sobre estes organismos são encontrados nos capítulos 21, 23 e 15, respectivamente. b) produtores primários quimiotróficos – utilizam energia das reações de oxidação e redução para a síntese de matéria orgânica. Exemplos: bactérias nitrificantes, algumas espécies de sulfobactérias (Beggiatoa e Thithrix). Em alguns lagos, a produção destes organismos pode assumir papel importante na produção de matéria orgânica. Nos ecossistemas lóticos (de água corrente), onde a vegetação riparia (também co- nhecida como mata de galeria ou ciliar) é bem desenvolvida e a penetração da radiação solar é geralmente, reduzida, dificultando a realização do processo fotossintético. Nestes casos a principal fonte de energia para o metabolismo destes ecossistemas é a matéria orgânica de origem alóctone. No entanto, em ecossistemas lóticos onde a vegetação ri- paria é escassa ou ausente, como os córregos localizados em montanhas (acima de 1 200 m, p. ex. campos rupestres; trechos de 1a e 2a ordens), a produção primária do perifíton assume um importante papel na produção de matéria orgânica autóctone e no fluxo de energia (ver capítulo 22). A entrada de matéria orgânica alóctone nos ecossistemas lóticos merece especial atenção, principalmente nas regiões de cabeceira de córregos de montanha, onde o C A P Í T U L O 7 • E TA PA S D O M E TA B O L I S M O A Q U Á T I C O 121 2 a Prova / Wi lma metabolismo heterotrófico é dominante (Produção < Respiração), ou seja, a produção autóctone é menor que a respiração do ecossistema, indicando a necessidade de com- plementação de matéria orgânica alóctone. A matéria orgânica alóctone nos ecossistemas lóticos é basicamente formada pela matéria orgânica particulada grossa que pode ser composta por troncos, galhos, folhas, flores e frutos (partículas > 1 mm); mais de 60% desta matéria orgânica provém das folhas. No entanto, existem outras categorias de matéria orgânica que como, por exem- plo, galhos e frutos, se destacam em períodos específicos (p. ex. galhos aumentam em períodos de chuvas e flores e frutos em períodos reprodutivos/primavera). Matéria or- gânica particulada fina (MOPF) originada por abrasão física e da ação de organismos decompositores, que degradam a MOPG em partículas (< 1 mm > 0,05 mm). Matéria orgânica dissolvida (MOD) formada por compostos químicos refratários, principalmen- te ácidos húmicos e fúlvicos, proteínas, aminoácidos, lipídeos e carboidratos. 7.2 CONSUMO Os consumidores são organismos que obtêm sua energia direta ou indiretamen- te, a partir da matéria orgânica sintetizada pelos produtores primários. Aqueles que se utilizam diretamente da biomassa vegetal são chamados herbívoros, consumidores primários ou consumidores de primeira ordem. Estes organismos participam, portanto, da cadeia de herbívoria e dela fazem parte várias espécies de zooplâncton, peixes e inse- tos aquáticos. Aqueles que não utilizam a produção primária diretamente, obtendo sua energia a partir dos consumidores primários, são chamados de carnívoros, consumidores secundários, terciários, e assim sucessivamente, como, por exemplo, as espécies de mi- crocrustáceos planctônicos (ver capítulo 24) e de peixes (ver capítulo 26). Há também os organismos detritívoros que se alimentam de restos de plantas e animais e, portanto, participam da cadeia de detritos. Estes organismos localizam-se principalmente no sedi- mento, onde alguns grupos também compõem a comunidade bentônica, por exemplo: larvas de quironomídeos e várias espécies de oligoquetas (ver capítulo 25). Quando os herbívoros se alimentam dos produtores primários e em seguida preda- dos pelos carnívoros, ocorre a transferência de energia entre os níveis tróficos formando uma cadeia alimentar. As cadeias alimentares podem ter dois ou vários níveis tróficos (figura 7.2). As transferências energéticas dentro de uma cadeia alimentar obedecem estritamente às leis da termodinâmica, ou seja, parte dela é perdida no próprio nível trófico (estas perdas variam de 5 a 20%). As diversas cadeias de herbivoria e de detritos se conectam, aumentando o grau de conectividade dentro do compartimento biótico do sistema formando a rede ou teia alimentar maiores em função da energia adicional vinda da cadeia de detritos. 122 F U N D A M E N T O S D E L I M N O L O G I A 2 a Prova / Wi lma FIGURA 7.2 Modelo simplificado de cadeia alimentar em um ecossistema aquático continental, e. g., represa do Lobo (SP). O ecossistema aquático melhor estudado do ponto de vista energético é a nascente Silver Spring na Flórida (EUA), que foi objeto de intensos estudos por Odum (1957). A energia solar disponível (1,7 x 106 kcal m–2 a–1), somente 4,1 x 105 kcal, 24% são absorvidas pelos produtores (principalmente macrófitas aquáticas), das quais somente 20 810 kcal correspondem à produção primária bruta. Desta energia assimilada, 57,5% foram gastos nos processos respiratórios da comunidade produtora e 8 833 kcal ficam disponíveis como produção líquida para os consumidores. Da produção líquida, a maior parte foi perdida e transportada para fora da nascente (exportação) e somente 3 368 kcal foram assimilados pelos consumidores primários. O fluxo energético dos produ- tores primários para os consumidores primários foi 16%, destes para os consumidores secundários de 11% e destes para os consumidores terciários (final de cadeia) de 6%. No total, pode-se observar que 88% da produção primária bruta foram consumidos no próprio ecossistema e 12% foram transportados pela águae eliminados do ecossistema Silver Spring, como detrito orgânico (Fig. 7.3). C A P Í T U L O 7 • E TA PA S D O M E TA B O L I S M O A Q U Á T I C O 123 2 a Prova / Wi lma FIGURA 7.3 Fluxo de energia em um ecossistema aquático. Segundo REICHELT & SCHWÖRBEL (1977). Modificado de ODUM (1957). 7.3 DECOMPOSIÇÃO Em ecossistemas aquáticos existem três vias básicas de fluxo energético: a cadeia de herbivoria, o circuito microbiano (ver capítulo 20) e a cadeia de detritos. A cadeia de detritos é formada pela matéria orgânica de origem autóctone e alóctone de origem animal e vegetal em decomposição. No entanto, a matéria orgânica de origem animal é proporcionalmente insignificante nos ecossistemas aquáticos, quando comparada a necromassa de origem vegetal ou matéria orgânica particulada grossa. Comparativamente às demais formas de matéria orgânica, a MOPG é a principal fonte de energia e nutrientes em ecossistemas aquáticos continentais. Diante disso, o estudo da decomposição da MOPG (basicamente formada por detritos foliares) é fundamental para a compreensão do fluxo de energia e manutenção do metabolismo destes ecossistemas aquáticos continentais, especialmente os ecossistemas lóticos. O modelo tradicional de decomposição matéria orgânica particulada grossa pode ser des- crito como: 1) lixiviação: perda rápida das moléculas solúveis após a imersão, fase que pode durar algumas horas a alguns dias; 2) condicionamento: modificação da matéria orgânica pela atividade de microrganismos (fungos e bactérias), tornando-o palatável para invertebrados aquáticos e fisicamente mais inconsistentes; 3) fragmentação: resul- tado da abrasão física do fluxo da água e da atividade alimentar de invertebrados. Esta sequência de fases não deve ser vista apenas como um processo sucessional ou temporal, mas também como eventos simultâneos que interagem entre si. Diversos fatores podem acelerar ou não a decomposição dos detritos, como: 1) fatores ambientais como tem-decomposição dos detritos, como: 1) fatores ambientais como tem- 124 F U N D A M E N T O S D E L I M N O L O G I A 2 a Prova / Wi lma peratura, vazão e pH; 2) fatores químicos como: concentrações de nitrogênio e fósforo na água e teores de lignina, fósforo, nitrogênio, polifenóis e carboidratos nos detritos foliares; 3) fatores biológicos: invertebrados e microrganismos. No ecossistema aquático continental, a decomposição é realizada principalmente por fungos, que decompõem a matéria orgânica mineralizando os nutrientes (p. ex. transformando a matéria orgânica em gás carbônico) e transferindo a energia acumu- lada. O papel dos decompositores é fundamental nestes ecossistemas, pois através de sua atividade, eles promovem a circulação dos nutrientes possibiltando que estes sejam reaproveitados pelo organismos produtores. A matéria orgânica de difícil decomposição é formada por compostos ricos em celulose e lignina, e é acumulada, contribuindo para a formação do sedimento permanente, não mais fazendo parte do metabolismo direto do ecossistema aquático (ver capítulo 19). Nos ecossistemas aquáticos, produção, consumo e decomposição não ocorrem iso- ladamente, mas sim de maneira integrada, com elevado grau de interdependência. Em alguns casos, se observa predomínio do processo de produção sobre o de consumo e o de decomposição, fenômeno frequentemente observado em lagoas eutróficos de região temperada. Em outros casos, ocorre o predomínio dos processos de consumo e decom- posição, como ocorre em lagos oligotróficos e riachos de cabeceiras ou nascentes.
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