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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2014.0000157082 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes JOSE DOS SANTOS FREIRE (JUSTIÇA GRATUITA), JOSE DOS SANTOS FREIRE JUNIOR e LUANA RAQUEL FREIRE, é apelado HOSPITAL ALVORADA SANTO AMARO LTDA. ACORDAM, em 12ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JACOB VALENTE (Presidente sem voto), SANDRA GALHARDO ESTEVES E JOSÉ REYNALDO. São Paulo, 19 de março de 2014. Tasso Duarte de Melo RELATOR Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002 - Voto nº 13286 2 APELAÇÃO Nº 0006045-68.2010.8.26.0002 COMARCA: SÃO PAULO FORO REGIONAL SANTO AMARO (3ª VARA CÍVEL) APELANTES: JOSÉ DOS SANTOS FREIRE E OUTROS APELADO: HOSPITAL ALVORADA SANTO AMARO LTDA. VOTO Nº 13286 AÇÃO DE ANULABILIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO. Serviços médico-hospitalares. Assinatura de termo de responsabilidade pelos familiares. Estado de perigo. Ausência. Validade do negócio. Ausência dos pressupostos para a caracterização do vício. Sentença mantida. Artigo 252 do Regimento Interno. Recurso não provido. Trata-se de recurso de apelação (fls. 252/267) interposto por JOSÉ DOS SANTOS FREIRE E OUTROS nos autos da ação rotulada como “ação de desconstituição de negócio jurídico” por eles ajuizada em face de HOSPITAL ALVORADA SANTO AMARO LTDA., contra a r. sentença (fls. 236/239) proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível do Foro Regional Santo Amaro, Dr. Edson Luiz de Queiroz, que julgou improcedentes os pedidos. Os Apelantes sustentam, em síntese: i) reiteram a tese do estado de perigo, sob o argumento de que estão presentes os requisitos para a caracterização desse vício, quais sejam: a) dolo de aproveitamento por parte do Apelado, pois conhecia o mau que acometia o Apelante José dos Santos Freire Júnior; b) inexigibilidade de conduta diversa pelos Apelantes; c) onerosidade excessiva da prestação, pois as despesas médico-hospitalares ultrapassaram o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais); ii) no que toca ao dolo de aproveitamento, sustentam que o Apelado foi informado previamente de que o Apelante não possuía plano de saúde e, mesmo assim, deixou de providenciar sua remoção para hospital público; iii) a remoção seria possível antes da cirurgia, já que, entre o atendimento de emergência e a realização da intervenção cirúrgica, PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002 - Voto nº 13286 3 decorreram seis dias; iv) ao agir assim, o Apelado violou o dever de lealdade contratual, notadamente o “duty to mitigate”; v) quanto à onerosidade excessiva, a r. sentença se equivocou ao afirmar que o valor cobrado corresponde aos serviços efetivamente prestados, pois não havia provas nos autos que permitissem extrair tal conclusão e porque, de qualquer forma, o valor seria excessivamente oneroso dadas as condições financeiras dos Apelantes. Pugna pelo provimento do recurso, com a reforma da r. sentença para julgar procedentes os pedidos, com a desconstituição do termo de responsabilidade pelos serviços e, por consequência, a desconstituição do crédito correspondente ao valor dos serviços. Recurso tempestivo, recebido no duplo efeito (fls. 268), deixando de ser preparado, pois os Apelantes são beneficiários da justiça gratuita (fls. 150). Não houve contrarrazões (certidão de fls. 270). É o relatório. Trata-se de ação de invalidação de negócio jurídico em que os Apelantes afirmaram que o Apelante José dos Santos Freire Júnior, após ter sido atropelado, foi encaminhado para o Hospital-apelado, ocasião em que teria sido exigida dos Apelantes a assinatura de um termo de responsabilidade pelas despesas com o tratamento. Sustentaram que o termo foi celebrado mediante estado de perigo, dada a condição de emergência em que se encontraram. Aduziram que houve dolo de aproveitamento do Apelado, notadamente por ter deixado de providenciar a remoção do Apelante para um hospital da rede pública, além da onerosidade excessiva da prestação. O Apelado, por sua vez, sustentou que os Apelantes estavam cientes de que os serviços seriam cobrados e, mesmo assim, optaram por realizar o tratamento, em vez da remoção para hospital da rede pública. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002 - Voto nº 13286 4 O recurso não comporta provimento. Incide, na espécie, de forma a cumprir o princípio constitucional da razoável duração do processo, o art. 252 do Regimento Interno deste Tribunal1, conforme precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça, de modo a confirmar a excelente sentença, que analisou profundamente a prova dos autos e concluiu pela improcedência dos pedidos, cujos fundamentos se adotam como razões de decidir. Da conduta do Apelado: “(...) É legítima a cobrança de débito derivado de prestação de serviços médicos e hospitalares, feita por nosocômio da rede privada, não credenciado com o SUS, porquanto a assistência médica gratuita somente é incumbência do Estado, e não de entidades particulares. A respeito, confira-se: CONTRATO - Prestação de serviços - Despesas hospitalares - Réu firmou livre e espontaneamente termo de responsabilidade pelas despesas de seu irmão - Ação de cobrança julgada procedente - Recurso improvido." (Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Apel. Sum. 0948825-9, Comarca São José do Rio Preto, Rel. Antonio Marson, 11ª Câmara de Férias de Janeiro de 2001. j. 01.02.01, v.u) Não se vislumbra qualquer vício de consentimento. Inicialmente, confira-se o depoimento da testemunha Priscila Karen de Lima Faria, cujo depoimento não transparece a ocorrência de qualquer tipo de vício de consentimento: '(...) A ambulância acabou atropelando duas motocicletas, nas quais havia uma e duas pessoas. O motorista socorreu o rapaz que estava sozinho na motocicleta e o levou ate o Hospital Alvorada. A vitima foi atendida rapidamente no Hospital. O Hospital pediu para eu assinar um Termo de Responsabilidade, mas eu disse que não era parente do rapaz. Não sei o que aconteceu 1 Art. 252 Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002 - Voto nº 13286 5 depois (...) Eu avisei uma pessoa da família do rapaz e também avisei o serviço de assistência social do hospital que ele não havia convênio médico. O hospital não informou sobre a necessidade de transferência da vítima. A assistente social disse que já foi agendado uma cirurgia. O hospital informou que seria cobrado o serviço prestado. (...) Não houve negativa de atendimento a vitima ou condicionamento do atendimento ao pagamento ou responsabilidade de familiares. Eu presenciei quando um funcionário do hospital pediu para assinar um documento de responsabilidade pela divida. Nesse momento estavam presentes o pai e duas irmãs do rapaz. Como esse fato não me dizia respeito, eu sai da sala. Quando chegou a o hospital, a vítima foi direcionado para uma sala e eu anão sei dizer quanto tempodemorou o atendimento” (sem grifos ou negritos no original).” Da ausência dos pressupostos do estado de perigo: “(...) Os autores alegam que o contrato está viciado pelo estado de perigo, com fulcro no artigo 156, caput, do Código Civil: "Art. 156, caput, do Código Civil. 'Art. 156, caput. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou à pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa'. A analisar os autos, observe-se que o instituto material mencionado não restou caracterizado. A lei civil exige como um dos requisitos do estado de perigo a assunção de obrigação excessivamente onerosa. Os valores cobrados guardam consonância com a complexidade e qualidade dos serviços efetivamente prestados. Os próprios autores afirmam na petição inicial que 'o quadro clínico do autor era bastante tênue até para uma remoção, diziam os médicos; sua fratura envolvia deslocamentos na bacia e na coluna'. Não se vislumbra qualquer abuso ou excesso na quantia determinada, consoante ao serviço médico prestado pela ré. Esta empregou todas as medidas necessárias a proporcionar tratamento médico PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12ª Câmara de Direito Privado Apelação nº 0006045-68.2010.8.26.0002 - Voto nº 13286 6 adequado ao primeiro autor, não se ponderando razoável o excesso da onerosidade alegado. Ademais, os valores fixados nos títulos de crédito são plausíveis, não se denotando qualquer abusividade. Aliás, os autores sequer os questionaram.”. Dos valores cobrados A esse respeito, os Apelantes sustentam que a afirmação da r. sentença de que os valores cobrados foram proporcionais à complexidade e à qualidade do tratamento realizado estariam desprovidas de lastro probatório nos autos. A alegação não prospera, pois os documentos de fls. 68/147 e 175/178 dos autos demonstram de forma detalhada os procedimentos e exames realizados, materiais empregados e os respectivos custos. Ademais, como bem ressaltado pela r. sentença, os Apelantes não impugnaram especificadamente tais procedimentos e os respectivos valores. Inclusive, intimados a especificar as provas que pretendiam produzir, os Apelantes requereram apenas a produção de prova testemunhal (fls. 200), em vez de eventual prova pericial para apurar a adequação dos valores cobrados. Correta, portanto, a r. sentença de improcedência dos pedidos, posto que ausente o vício do estado de perigo. Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso. TASSO DUARTE DE MELO Relator
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