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RE Teoria e Casos

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CAPÍTULO 22 
, 
RECURSO EXTRAORDINARIO 
E RECURSO ESPECIAL 
Como visto no capítulo anterior, o Recurso Extraordinário e o Recurso 
Especial são considerados em sentido amplo "recursos extraordinários" 
e não permitem uma ampla análise de fatos, restringindo a matéria ao as-
pecto objetivo, de direito, além de estabelecerem requisitos específicos 
para a sua interposição. 
O recurso extraordinário visa à unidade da aplicação da matéria cons-
titucional, a defesa da supremacia da Constituição e o recurso especial 
busca uniformizar a aplicação do direito federal (infraconstitucional), evi-
tando, assim, regionalização da interpretação da norma federal no país. 
~ RE e o RESP são dirigidos ao STF e ao STJ, exclusivamente nas hipó-
teses disciplinadas nos art. 102, Ili, e 105, Ili, da CRFB/88, após esgotados 
todos os recursos ordinários admissíveis, segundo a súmula 281 do STF: 
"É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na Justiça de ori-
gem, recurso ordinário da decisão impugnada". 
O prazo para interposição dos dois recursos é de 15 dias, seguindo a 
previsão do art. 1.003, § 5°1 do CPC. 
Há necessidade de recolhimento do preparo e das custas com o porte 
de remessa e de retorno, na forma do art. 1.007, do CPC. 
A estrutura dos dois recursos é dividida na peça de interposição e nas 
razões recursais. Na forma do art. 1.029, do CPC, ambos são interpostos 
perante o Presidente ou o Vice-Presidente do tribunal recorrido e, em caso 
de admissão, são remetidos ao STF ou ao STJ-conforme o caso. 
Quanto aos requisitos de admissibilidade, a súmula 282 do STF assim 
dispõe: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, 
1 
1 
OAB 12•fosel - DIREITO CONSTITUCIONAL· Ffavio Bahia Martins 
na decisão recorrida, a questão federal suscitada". O enunciado exige a 
comprovação do prequestionamento, ou seja, o recorrente precisa com-
provar1que o direito discutido no bojo do recurso já-foi ventilado e apre-
ciado pelo Tribunal de origem, ou seja, a matéria não é "nova", não está 
sendo discutida pelos Tribunais Superiores originariamente, mas de forma 
extraordinária. 
~ Recurso Extraordinário 
As hipóteses de cabimento do Recurso Extraordinário estão previstas 
no art. 102, 111, alíneas a, b, e, d, da CRFB/88 que serão a seguir analisadas 
em destaque. 
Compete ao STF: 
Art.102: HI - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decidi-
das em única ou última instância, quando a decisão recorrida: 
A regra geral é a de que o RE tenha por objeto acórdão de Tribunal, 
entretanto, admite-se, eventualmente, a interposição do recurso em face 
de decisão de Turma de Juizado Especial. 
a) contrariar dispositivo desta Constituição; 
"Contrariar" significa não aplicar, aplicar indevidamente a norma 
constitucional e é a hipótese mais comum de cabimento do RE, em defesa 
da Supremacia da Constituição. 
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; 
Nessa hipótese o Tribunal anterior realizou o controle difuso, inciden-
tal de constitucionalidade. "lei federal" deve ser compreendida como a 
norma elaborada pelo Congresso Nacional ou pelo Presidente da Repúbli-
ca, Ex.: lei ordinária federal, lei complementar federal, medida provisória ... 
c) julgar válida lei ou ato de governo loca! contestado em face desta 
Constituição. 
"Lei local" é a norma primária estadual, distrital ou municipal; leis 
ordinárias, complementares ... Já "ato de governo" local significa o ato 
administrativo praticado por agente público no âmbito do Poder Executi-
vo, Legislativo e Judiciário, no plano estadual, distrital ou municipal, tais 
como: decretos, portarias, circulares etc .. 
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. 
Cap. 22. RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL 
Como a decisão sobre o conflito federativo está sob a responsabilida-
de do STF, quando a decisão recorrida confirma a constitucionalidade de 
uma lei estadual, distrital ou municipal em face de uma norma federal, é 
também cabível o recurso extraordinário. É uma hipótese muito comum 
envolvendo os arts. 22 e 24, da CRFB/88. 
Com a reforma promovida pela EC n' 45/2004, além de fundamentar 
o recurso extraordinário em unia das hipóteses do art. 1021 Ili, da CRFB/88 
e de comprovar o prequestionamento, o recorrente deverá, com base no 
§ 3° do art. 102, demonstrar a repercussão geral das questões constitucio-
nais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine 
a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de 
dois terços de seus membros. 
Trata-se de mais um requisito de admissibilidade do recurso, ou como 
dizem alguns doutrinadores, instrumento de filtragem recursai, também 
previsto no art. 1.035, do CPC. 
Importante destacarmos que a preliminar da repercussão gera! é 
ônus do recorrente e deverá ser feita na mesma petição .do recurso, e 
que o órgão competente para apreciá-la é somente o Supremo Tribunal 
Federal. 
Segundo afirma Luis Guilherme Marinoni, 48 a repercussão geral é 
formada pelo binômio: relevância + transcendência, ou seja, a questão 
debatida deverá ser relevante sob o ponto de vista econômico, político, 
social ou jurídico, além de transcender para além do interesse subjetivo 
das partes na causa. Presente o binômio, caracterizada estaria a reper-
cussão geral da controvérsia e o Supremo deveria admitir o recurso e 
apreciá-lo no mérito. 
Não há necessidade, imperioso destacar, que a controvérsia seja im-
portante sob todos os ângulos da análise, basta que seja caracterizada a 
relevância em uma dessas perspectivas. Nesse sentido, entendemos que 
as questões tributárias, previdenciárias, as ações coletivas, relativas à edu-
cação e à saúde, pela.sua própria natureza, deverão estar, em regra, inclu-
ídas na relevância da repercussão geral, mas de qualquer forma compete 
ª<? STF a aferição efetiva em cada caso concreto.49 
48 MARlNON!, Luís Guilherme. Repercussão Geral no Recurso Extraordinário, 1• ed., São 
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. 
49 A título de exemplo, são algumas das matérias com repercussão geral, de acordo 
com a jurisprudência do STF: 
-
OAB <2•fasel - DIREITO CONSTlfÚCIONAL • Flavia Bahia Martins 
Como o Procurador-Geral da República atua em todos os processos 
de competência do STF, devemos pleitear a sua oitiva (ou intimação) no 
Recurso Extraordinár-io. 
... Súmulas STF 
..,. Súmula 279: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário 
,._ Súmula 280: Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário. 
,._ Súmula 281: É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na justiça de ori" 
gem, recurso ordinário da decisão impugnada. 
,... Súmula 282: É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na deci· 
são recorrida, a questão federal suscitada. 
.... Súmula 283: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida as-
senta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles. 
.... Súmula 64.0: É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de pri-
meiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursai de juizado especial cível e 
cri mina!. 
._. Súmula 735: Não cabe recurso extràordinário contra acórdão que defere medida !:-
minar. 
... Recurso Especial 
As hipóteses de cabimento do Recurso Especial estão previstas no art. 
1051 Ili, alíneas a, b, e, da CRFB/88 que serão a seguir analisadas em desta-
que. 
"IMUNIDADE. EXPORTAÇÕES. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. Surgi::' co:" 
repercussão geral definir o alcance de imunidade quanto à Contribuição So{:id! SL' 
bre o Lucro no que a Corte de origem refutou a não incidência do tributo" (STí, Rl: 
564.413/SC, Plenário, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 12.12.2007, DJ 14.12.2007); 
"DIREITO INTERTEMPORAL. APLICAÇÃO RETROATIVA DE LEIS SOBRE PLANOS DESAÚDE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. Há repercussão geral na questão so 
bre a aplicação retroativa de leis sobre planos de saúde aos contratos 'firmados an-
tes da sua vigência, à luz do art. 5°, inc. XXXVJ, da Constituição da República" (STF, 
RE 578.801 RG/RS, Rel." Min.• Cármen Lúcia, i· 16.10.2008, DJ 31.10.2008). 
Cap. 22 •RECURSO EXTRAORDINÁR10 E RECURSO ESPECIAL 
Compete ao STJ: 
Art. 105: Ili - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em 
única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pe-
los tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a 
decisão recorrida: 
Somente acórdãos proferidos por Tribunais (T J ou TRF) podem ser 
objeto do RESP. As decisões das Turmas de Juizados especiais estão ex-
cluídas de apreciação. SÚMULA Nº 203, STJ: Não cabe recurso especial 
contra decisão proferida, nos limites sua competência, por órgão de se-
gundo grau dos Juizados Especiais. 
a) contrariar tratado ou lei federa!, ou negar-lhes vigência; 
Essa é a hipótese mais comum de cabimento do RESP. A decisão re-
corrida viola o direito federal, aplicando-o indevidamente ou negando-
-lhe vigência. "Lei federal" deve ser compreendida como a norma elabo-
rada pelo Congresso Nacional ou pelo Presidente da República, Ex.: lei 
ordinária federal, lei complementar federal, medida provisória ... 
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; 
"Ato de governo local" é aquele praticado por agentes públicos dota-
dos de certa parcela de poder, independentemente se Poder Executivo, 
Legislativo ou Judiciário desde que no plano estadual, distrital ou munici-
pal. "Lei federal" deve ser compreendida de forma ampla, como já expli-
cado. Atenção! Aqui é ato de governo local e não lei local (que dá ensejo 
ao RE). 
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído 
outro tribunal. 
Aqui a divergência no tocante a aplicação do direito federal é entre 
Tribunais distintos. Súmula 13, do STJ: "A divergência entre julgados do 
mesmo Tribunal não enseja recurso especial". 
O requisito da repercussão gera! íá estudado não se aplica ao recurso 
especial. 
~ Sún1uias STJ 
_., Súmula 7: A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. 
_., Súmula 83: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orienta-
ção do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida. 
1 
l 
188 OAB <2·ta~e) - DIREITO CONSTITUCIONAL• Flavla Bahia Martins 
~ Súmula 86: Cabe recurso especial contra acórdão proferido no julgamento de agravo 
de instrumento. 
-~ •. • ·~·ü;;.·~j~· ~~~~f ~. ;~~~~i·;~i;~·I · ~~~~-;~~· ~~~~~i~!:. ~~~·~d~ ·~.;~Ó ~d~~. ;~·~~·r·;id ~ ~~~~ ~·~~. ~ ~ 
fundamentos constitucional e infraconstitucional, q~alquerdeles suficiente, por si só, 
para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário. 
• Súmula 203: Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segun-
do grau dos juizados especiais. 
I>- Caso concreto 
(OAB X Exame) 
O Tribunal de Justiça do Estado J julgou improcedente ação direta 
de inconstitucionalidade proposta pelo Prefeito do município W, tendo 
o acórdão declarado constitucional norma da lei orgânica municipal que 
dispôs que o Prefeito e o Vice·Prefeito não poderiam ausentar~se do país, 
por qualquer período sem autorização da Câmara Municipal. No prazo 
recursai foram ofertados embargos declaratórios, improvidos. 
Contratado como advogado pelo Prefeito do Município, após a 
decisão proferida nos embargos declaratórios, apresente a peça cabível. 
(Valor: 5,0 ). 
Elaboração e identificação do recurso 
3 Passos: 
Passo t identificação da decisão objeto do recurso 
Passo 2 verificar o recurso cabível para impugnar a decisão 
Passo 3 verificar se há ou não peça de interposição 
Cap. 22 •RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL 
~ Peça Processual 
~!página (peça de interposição) :~~".::. 
. -,_ "' --" -:;_._,_>_,, ---,'.. __ ;,,_, ____ ------._._,,._., _____ ,,, __________ _._ - -- ""~·--,,,_,__~ 
EXMº.SR. DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE íUSTIÇA) ,'!'(;. 
(3 linhas) 
Processo n~ ... 
(2 li~Im) 
· ~tE!~~_itp"' ~O M~nicípio_ VV,. fá de_v!d<Jtnente ,µáUficado nos autos do pr ~,em reterê'ndã, P'óf seu,''~~a\r(lgado infra-assfriàdO," cOnfonnê procuração all 
e~critq_!i-Ó;M, ~11dereç~ -_q~!.}_ndica para _QS fins do _art.._ ??·.V, d~ CPC, nos_, 
Aç_ãp T>,fretà d~!_In,constitii,ci~nalída_de.-Estadual, v,ern. int_err?r, tempes 
RECURSQ EJ{TllAOl\Dl!{ÂRIO, com páse no art. 10t,·ín, ~;·a.a ÇRFB/BB;é 
àC.Qrdãó- qlitf d~-daroü CohStitútiórtàl ·:norma da ·1e1·org~i!t_~-~---1:1'1ur1Jci'pal, e 
que seja canhecid_o_:e recebida,.juntada a guia de rec-0l~i_nte,nto·~neXa e, 
cumpridas as forfilaliP,adeS ,_processuais necessárias, 'sl?J!W. oS autos rerii 
Supremo T:i;ibun:al Federal. · · _. , -·f( :::-· : __ _- , ' 
\ 
Termos em que, 'ftA~__c;- ;;-·1 
Pe~~ ~deX:.f~jnento~: .,,~!l~~: __ 
Local.:.: .. e data.:. :":-~rJ:&,-.:p{l--
~Advoga~9 .. , 
OAB n2 ... 
.,., 
<---.. -'' ;_:--J;;_;-..>: _. : ; :· - : _, ';,;~~ft":·----
\ Na fo.~-!~~?:' .. _ ""''fr">'~!.>~" &J-~~s~~{~8,.c~~-~--~-t;e~!~ ~.!,~~ t~~r, med~~f:J?:'~º extraord_1_nárJ._().-.-:~caU$as·-~eçid1d_<t_ser,n, unlca ou ~lt1ma 1nsWnc1a, quando"a--decisao 
;ecorrida cô'n~iif'CliSP"ôsfiiVO ·d.l"CônS'tituição'Federal. _::.; '· 
._ --·:---;,-.-- , •• -,--- ! ,,.__,-,;:,-;,-,;.- -. \ .;., - - ·'-'-'' 
O Ac~2P-!~-~--c~,~~--~~hte. r~c_u~_o vi~lou__cla~mente o ~rt 83, da C~-~J.~_8 ao 
declarar cons'ti?;_ll_cibiffll ~naJ1tl3. da lei orgânica municipal que dispõe que o::P;r~:f~ito e 
o Vice·P~t::itóJJ:â,O_p_od~J:-i~m _ausentar·se do _país, por qualquer perío_do sei,1_a_µtori· 
zação da Cârilmi'~~tlhicipat - - -1 · /--;,_--';/.:_;-~-;,. - --
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cm- OAB 12• foseJ - DIREITO CONSTFfúCIONAL ·Fia via Bahia Martins 
O recurso extraordinário também se encontra preVisto no art. 1.029 e ss., do C~C. 
Ili - DO PREPARO _ 
A guia de recolhimentO das custas processuais e do porte de remessa e de retorno 
acompanha o presente recurso, satisfazendo o requisito do art. 1.007, do CPC. 
IV - DO PREQUESTIONAMENTO 
A matéria objeto do recurso foi prequestionada na origem, tendo em vista que o 
objetivo da ADI estadual e"ra a declaração de inconstiti.lclonalidade da norma muni· 
cipal, preenchendo assim o requisito do prequestionamento previsto na súmula 282, 
do STF. 
V - DA REPERCUSSÃO GERAL 
A matéria possui repercussão geral, pois é relevante sob o p6nto de vista da 
supremacia constitucional e transcende os interesses subjetivos da parte na causa, 
pois o tema pode ser espalhado para as demaiS leis orgâ,nicas municipais. Portanto, 
satisfeito o requisito da repercussão geral, previsto no art. 102, § 32, da CRFB/88 e 
no art. 1.035, do CPC. 
VI - DA SÍNTESE DOS FATOS. 
VII - DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS 
Menção ao· princípio da simetria ou norma de observância obrígatória (0,50) 
CRFB, Art. 29, caput (0,50). 
CRFB. Art. 49. III OU CRFB, Art 83 [Q,SO). 
VIII - DOS PEDIDOS 
Face ao acima exposto, o Recorrente pede seja dado provímento ao presente 
Recurso para reformar a decisão e confirmar a inconstitucionalidade da Lei Orgânica 
impugnada, a intimação do Procurador-Geral da República, além da condenação do 
Recorrido nos ôtjus sucumbenciais. 
Te.rmos em que, 
Pede deferimento. 
Local. .. e data ... 
Advogado ... 
OAB n2 ••. 
' 
Cap. 22 ·RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL 
.,.. Peça cobrada no XII Exame 
Após mais de 40 (quarenta) dias de intensa movimentação popular, 
em protestos que chegaram a reunir mais de um milhão de pessoas nas 
ruas de diversas cidades do Estado, e que culminaram em atos de violên-
cia, vandalismo e depredação de patrimônio público e particular, o Gover-
nador do Estado X edita o Decreto nº 1968. 
A pretextode disciplinar a participação da população em protestos 
de caráter público, e de garantir a finalidade pacífica dos movimentos, o 
Decreto dispõe que, além da prévia comunicação às autoridades, o aviso 
deve conter a identificação completa de todos os participantes do evento, 
sob pena de desfazimento da manifestação. Além disso, prevê a revista 
pessoal de todos, como forma de preservar a segurança dos participantes 
e do restante da população. 
Na qualidade de advogado do Partido Político "Frente Brasileira Uni-
da", de oposição ao Governador, você ajuizou uma Ação Direta de Incons-
titucionalidade, perante o Tribunal de Justiça do Estado X, alegando avio-
lação a normas da Constituição do Estado referentes a direitos e garantias 
individuais e coletivos (que reproduzem disposições constantes da Cons-
tituição da República). 
O Plenário do Tribunal de Justiça local, entretanto, por maioria, jul-
gou improcedente o pedido formulado, de declaração de inconstituciona-
lidade dos dispositivos do Decreto estadual, por entender compatíveis as 
preYisões constantes daquele ato com a Constituição do Estado, na inter-
pretação que restou prevalecente na corte. Alguns dos Desembargado-
res registraram em seus votos, ainda, a impossibilidade de propositura de 
ação direta tendo por objeto um decreto estadual. 
Entendendo que a decisão da corte estadual, apesar de não conter 
obscuridade, emissão ou contradição, foi equivocada 1 e que não apenas 
as disposições do Decreto são incor.stitucionais como também a própria 
interpretação dada pelo Tribunal de Justiça é incompatível com o ordena-
mento jurídico nacional, os dirigentes do Partido pedem que você propo-
nha a medida judicial cabível a impugnar aquela decisão. 
Elabore a peça judicial adequada. 
192 OAB (2•fase) - DIREITO CONSTITUCIONAL· F/avia Bahia Martins 
.,. Comentários da Banca [Comentários feitos quando ainda 
vigente o CPC/1973.) 
A peça a ser elai'Jorada consiste em um Recurso Extraordinário contra 
decisão proferida ehi sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, nos 
termos do Art.102, Ili, c da CRFB/88. 
No caso, a ação direta de controle tendo como parâmetro a Consti-
tuição do Estado, tem previsão no Art. 125, § 2° da Constituição da Repú-
blica. É possível a interposição de Recurso Extraordin~rio contra decisão 
proferida pelo Tribunal de Justiça no julgamento da mesma, a fim de que 
seja apreciada, pelo Supremo Tribunal Federal, a norma da Constituição da 
República repetida na Constituição Estadual, mas interpretada, pelo Tri-
bunal de Justiça local, em sentido incompatível com o da Constituição da 
República. 
O Recurso deve ser endereçado ao Presidente do Tribunal de Justiça 
local, com as razões recursais dirigidas ao Supremo Tribunal Federal. 
O Partido Político é o recorrente. Recorrido é o órgão do qual ema-
nou a norma impugnada (isto é, o Governador do Estado). Apesar de 
não constar do voto vencedor a impossibilidade de controle de consti-
tucionalidade de decreto por meio de ação direta, o examinando deve 
demonstrar o cabimento da via eleita para a impugnação do Decreto 
estadual, pois, a despeito de se tratar de um Decreto, não é um ato de 
regulamentação da lei, mas ato normativo primário, que inova autono~ 
mamente na ordem jurídica. O examinando deve indicar, em sua peça, 
todos os elementos que permitam o seu conhecimento e também o seu 
provimento, afastando, desde o início, argumentos desfavoráveis à pre-
tensão que defende. 
O examinando deve demonstrar o cumprimento do requisito da Re-
percussão Geral, que encontra previsão no Art. 102, § 3° da Constituição, 
e que deve ser demonstrado pela existência de questões relevantes do 
ponto de vlsta econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os 
interesses subjetivos da causa, ou seja, a questão suscitada não pode ser 
benéfica somente para o caso concreto proposto, mas para o interesse da 
coletividade, na forma do Art. 543-A, § 1°, do CPC. No caso apresentado, a 
repercussão geral pode ser demonstrada pela ofens2 a direitos fundamen-
tais titularizados por toda a coletividade, uma vez que a norma cria restri-
ção excessiva ao exercício de direito constitucionalmente assegurado, e o 
-faz sem previsão em lei. 
Cap. 22 • RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL 
No mérito, o examinando deve demonstrar que o decreto impugnado 
viola o princípio da legalidade, na formulação do Art. 5', li da Constituição 
da República, uma vez que não se pode criar restrição a direito senão em 
virtude de lei. 
O decreto viola o Art. 5°, XVI, da Constituição, que assegura o direito 
de reunião em locais abertos ao público, independentemente de autoriza-
ção, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para 
o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade compe-
tente. Ou seja, qualquer outra exigência que venha a ser formulada como 
condição de exercício do direito é inconstitucional. 
Ainda ocorre a violação ao Art. 5°, da CRFB, que trata do princípio da 
liberdade de expressão. 
Por fim, deve ser indicada a violação ao princípio da razoabilidade/ 
proporcionalidade, pois, ainda que se entendesse possível a restrição ao 
direito de reunião, a restrição veiculada pelo decreto, no caso analisado, 
falha nos subprincípios da necessidade (que impõe a utilização, dentre as 
possíveis, da medida menos gravosa para atingir determinado objetivo) e 
da proporcionalidade em sentido estrito (que impõe a análise da relação 
custo/benefício da norma avaliada, de modo que o ônus imposto pela nor-
ma seja inferior ao benefício por ela engendrado, sob pena de inconstitu-
cionalidade). 
O examinando, ao· final, deve formular pedido de reforma da decisão 
recorrida, para fim de ver declarada a inconstitucionalidade do Decreto 
editado pelo Governador do Estado, bem como requerer a notificação do 
Ministério Público.

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