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Aerodinâmica Básica Grupo 7 78135, Rafael José Costa Freitas 78435, Tiago Duarte Martins Dias 78487, José Maria Pinto Basto Cyrne de Castro 78525, Ana Micaela Lopes Correia e Ferro Nunes 78654, Henrique Manuel Botelho Ferreira 81370, Pedro André dos Santos Pregitzer Seminário Aeroespacial II MEAero Professor: Fernando Lau Realizado em Março de 2015 Aerodinâmica Básica Março de 2015 1/17 Resumo O seguinte relatório, elaborado no âmbito da Unidade Curricular de Seminário Aeroespacial II do Mestrado Integrado em Engenharia Aeroespacial do Instituto Superior Técnico de Lisboa, tem como objetivo apresentar uma breve introdução à aerodinâmica. Numa primeira abordagem são apresentadas informações gerais em relação ao conceito de perfil alar, passando a seguir a uma breve descrição da aerodinâmica deste. Seguidamente estende-se a análise a asas tridimensionais ideais e reais, fazendo ainda uma breve discussão acerca de escoamentos compressíveis a altas velocidades. É concluído que, devido ao seu comportamento caótico e importância tecnológica, a investigação e a compreensão da aerodinâmica é fundamental para a Física da atualidade. Aerodinâmica Básica Março de 2015 2/17 Índice 1. Introdução ............................................................................................................................ 3 2. Perfis Alares ......................................................................................................................... 3 2.1 O que são ................................................................................................................................ 3 2.2 Nomenclatura ......................................................................................................................... 3 2.3 Aerodinâmica aplicada a perfis alares .................................................................................... 5 2.4 Perfis NACA ............................................................................................................................. 9 3. Asas ................................................................................................................................... 10 3.1 Geometria das asas ............................................................................................................... 10 3.2 Comparação aerodinâmica: asas finitas e infinitas ............................................................... 11 4. Aerodinâmica em regime compressível ............................................................................... 14 5. Conclusões ............................................................................................................................. 16 6. Referências ............................................................................................................................ 17 Aerodinâmica Básica Março de 2015 3/17 1. Introdução O ramo da aerodinâmica está a ganhar cada vez mais importância no mundo atual. Na globalização em que se vive, o transporte de alta velocidade entre pontos distantes na Terra torna-se cada vez mais procurado. Como consequência é necessário perceber melhor como aumentar a eficiência dos veículos transportadores, sejam estes aéreos ou terrestres, e os seus sistemas de propulsão. Para além disso, para que se possam efetuar missões espaciais cada vez mais ambiciosas, é necessário desenvolver e aperfeiçoar a tecnologia dos sistemas intervenientes nestas operações, que são, em parte, altamente dependentes deste ramo da Física. Este contexto motivou a elaboração de um trabalho que apresentasse, de forma resumida e sucinta, os conceitos mais básicos da aerodinâmica, como uma iniciação nesta área. São também apresentadas as considerações a ter no desenho de perfis alares e asas, assim como que cuidados ter quando se trabalha a altas velocidades. No final do relatório podem-se encontrar as conclusões retiradas desta pesquisa e as referências consultadas. 2. Perfis Alares 2.1 O que são Asas, estabilizadores, caudas, pás de turbina, rotores e quaisquer outros objetos usados em aerodinâmica têm um perfil alar especificamente concebido para a função que desempenham. O perfil alar de um componente aerodinâmico é obtido através de um corte efetuado num plano paralelo ao plano de movimento desse componente, de onde se conclui que um perfil alar é representado a duas dimensões. O perfil alar é responsável por conferir às asas, complementado pela geometria tridimensional, a sua capacidade de voar, pelo que se torna importante estudar as suas características e como estas dependem das dimensões do perfil. Para tal estuda-se uma asa de perfil uniforme e de envergadura infinita, exceto quando se pretende calcular os valores de sustentação e resistência aerodinâmica gerados, caso esse em que se toma para a envergadura o valor unitário, desprezando os efeitos tridimensionais derivados de se considerar uma asa finita. Tendo em conta que todos os resultados desta análise dependem da geometria do perfil, é necessário estabelecer uma nomenclatura para as medidas que definem completamente a forma de um perfil alar e para as forças que neles atuam. 2.2 Nomenclatura Define-se os bordos de ataque e de fuga como sendo os pontos respetivamente mais à frente e mais atrás do perfil, quando colocado na horizontal, como ilustrado na figura 2. A linha de corda é a linha reta que une estes dois pontos (figura 1) e é a distância entre eles ao longo desta que define a corda c do perfil. Perpendicularmente à linha de corda é medida a espessura do perfil. A linha de flecha é a linha que se encontra a igual distância do intra- e do extradorso da asa, e a flecha em si é a distância entre a linha de flecha e a linha de corda. Conclui-se então que as Aerodinâmica Básica Março de 2015 4/17 linhas de flecha e de corda só coincidem no caso de um perfil simétrico relativamente à sua linha de corda, ou seja quando a flecha é nula. O ângulo de ataque geométrico de um perfil é o ângulo entre o escoamento do ar e a linha de corda (figura 1). Contudo, nos casos de flecha não nula, a sustentação gerada pelo perfil não é nula para um ângulo de ataque geométrico nulo, o que complica as equações que descrevem a relação entre estas duas variáveis. Embora dependam linearmente uma da outra (como se verá mais à frente), é mais conveniente ter uma equação em que a sustentação é nula para um ângulo de ataque nulo. Este facto levou a que se definisse a linha de sustentação nula (l.s.n.), que, como o nome indica, é a linha para a qual a sustentação gerada é nula. Deste modo define-se o ângulo de ataque como o ângulo entre a l.s.n. e o escoamento, simplificando as equações. De modo a poder-se discutir a aerodinâmica de perfis alares, é necessário definir as grandezas que são mais significativas para este efeito. Os coeficientes de sustentação e de resistência aerodinâmica são muito utilizados nesta área, pois permitem relacionar as diversas variáveis que condicionam essas duas forças presentes numa aeronave. Assim, as fórmula destes coeficientes são dadas por (1) e (2): ( corresponde à pressão dinâmica - ) Analisando as fórmulas expostas é fácil verificar que o valor destes coeficientes depende da forma do objeto, neste caso, do perfil alar, da velocidade do ar e, portanto, da viscosidade, compressibilidade e densidade do ar. Além disso, há outros fatores que condicionam estecoeficiente, como o ângulo de ataque e o fenómeno de flap deflection. Em seguida, mostra-se uma figura que ilustra a variação do coeficiente de sustentação, no caso geral, com o ângulo de ataque. Como se pode ver, existe uma gama de valores para os quais a relação é linear. Figura 2: Nomenclatura das dimensões características de um perfil alar Figura 1: Nomenclatura das dimensões características de um perfil alar com ângulo de ataque não nulo Figura 3: Relação entre o coeficiente de sustentação e o ângulo de ataque (Anderson, 1991) Aerodinâmica Básica Março de 2015 5/17 Estes coeficientes são facilmente determinados se estivermos perante um ambiente controlado (túnel de vento), onde se possa manipular todas as variáveis e medir as forças de sustentação e de resistência. Conhecer os valores destes coeficientes é de grande utilidade, uma vez que podem ser utilizados para calcular os valores das forças noutras situações com condições diferentes. No entanto, as condições de teste devem-se aproximar o mais possível às condições reais, caso contrário o valor do coeficiente determinado pode ter uma grande variação. É necessário verificar que os efeitos de viscosidade e de compressibilidade do ar são semelhantes entre o caso medido e o previsto. Para velocidades baixas (<0,3M) os efeitos de compressibilidade são desprezíveis. Para velocidades mais elevadas torna-se importante fazer corresponder números de Mach entre os dois casos. Para além disso, os efeitos de viscosidade do ar são determinantes, sendo por isso fundamental ter em conta o número de Reynolds. Mostra-se de seguida um gráfico que ilustra a relação existente entre o coeficiente de resistência de uma esfera e o número de Reynolds: 2.3 Aerodinâmica aplicada a perfis alares O fenómeno de sustentação despertou o interesse e atenção de diversas gerações e assumiu-se como um caso paradigmático de divulgação de erros de Física. Contrastando com a utilização abusiva do Princípio de Bernoulli, com a aplicação inapropriada das Leis de Newton e outros tantos exemplos falaciosos enraizados no saber geral do cidadão comum, pretende-se nesta secção expor de forma simples e muito resumida – devido à extensão do assunto - o mecanismo por detrás do fenómeno de sustentação aerodinâmica, e é nesta palavra que reside a origem das deturpações: mecanismo, e não efeitos ou quantificação. Para um correto entendimento deste fenómeno, é necessário encarar as propriedades do ar como ponto de partida. O ar tem massa e, consequentemente, pode exercer força, divisível, principalmente, em dois tipos: a força estática, que se forma dentro do campo gravitacional terrestre e se desenvolve verticalmente num gradiente normal à superfície terrestre, e a força dinâmica, que resulta da interação do fluido com um corpo ou perfil e que pressupõe uma condição: o movimento. Esta última é a que está profundamente relacionada com a sustentação, onde temos interação entre ar em movimento e um perfil alar. Figura 4: Relação entre o coeficiente de resistência de uma esfera e o número de Reynolds (Anderson, 1991) Aerodinâmica Básica Março de 2015 6/17 O ar tem ainda massa volúmica, ou massa específica, que varia inversamente com a altitude, proporcionando uma diminuição da pressão atmosférica com o aumento desta última. É fundamental ainda constatar-se que o ar é um fluido. Como tal apresenta viscosidade (embora relativamente reduzida comparativamente a outros fluidos), isto é, tende a escoar colado a uma superfície (como quando se aproxima uma colher de um fluxo de água). Entre as moléculas de fluido há forças de atração que as mantêm unidas, frequentemente designadas de Forças de van der Walls. Denominam-se forças de adesão as que ocorrem entre moléculas diferentes e forças de coesão as interações que ocorrem entre moléculas iguais, como acontece, por exemplo, entre moléculas dum mesmo fluido em escoamento. O fenómeno da adesão de um fluido com escoamento em contorno de uma superfície é tradicionalmente chamado de Efeito Coanda, numa definição abrangente. Desta forma, é fruto da viscosidade do ar o facto de as moléculas do mesmo aderirem à superfície do dorso de um perfil alar, propriedade que possibilita o mecanismo de sustentação. As massas de ar afetadas pelos efeitos da viscosidade à superfície do corpo sólido presente na interação vão sendo desaceleradas. As camadas de ar mais afastadas da superfície do dorso escoam a uma velocidade maior que as mais próximas até um limite a partir do qual a velocidade do escoamento não é reduzida pelos efeitos da viscosidade que atuam nas proximidades da superfície alar. Esta camada de escoamento víscido, perturbado, junto à superfície dorsal, chama- se camada-limite, cuja dinâmica é extremamente importante na sustentação e nos fenómenos de perda (stall), entre outros. Adicionalmente tem-se ainda que o ar, sendo um fluido, é compressível. No entanto, para efeitos práticos, considera-se o ar como sendo incompressível para voos em baixa velocidade, como já referido anteriormente. O mecanismo físico do processo de sustentação é, na sua base, muito simples. A força de sustentação é, de facto, uma força de reação. O mecanismo reside na aceleração radial de fluido. Ora, sendo que o ar é um fluido, há uma força de adesão entre o mesmo e o perfil envolvido. Desta forma, o ar em escoamento vai sofrer uma mudança na sua direção, uma vez que circula em torno do perfil. Assim, conclui-se que é necessária a existência de uma aceleração radial nos elementos do volume de ar, com um determinado raio r: (3) Pela 2ª Lei de Newton, se existe uma aceleração de uma massa, então existe uma força associada, i.e., associada à aceleração radial centrípeta da massa de ar em torno do perfil está uma força centrípeta aplicada nessa massa. Por sua vez, a 3ª Lei de Newton pressupõe um par ação-reação, ou seja, existe uma força de igual módulo e direção oposta – centrífuga - exercida no perfil, que é igual às forças de adesão intermoleculares entre fluido e perfil. A força centrífuga é igual ao produto da massa volúmica dos elementos do volume de fluido com a aceleração centrípeta supracitada: (4) A força centrífuga numa unidade de volume de fluido equivale à força de sustentação produzida pelo escoamento dessa mesma unidade de volume de fluido. Aerodinâmica Básica Março de 2015 7/17 Tendo em conta a equação (4), conclui-se que se pode aumentar a força de sustentação de 3 formas: aumentando a velocidade v de escoamento (forma especialmente eficiente devido à dependência quadrática); aumentando a massa volúmica ρ do fluido: zonas de alta pressão, de ar mais frio ou em altitudes mais baixas; reduzindo o raio de curvatura do escoamento: reduzindo o raio de curvatura do perfil e/ou aumento do ângulo de ataque α com o escoamento. Desta forma é possível haver força de sustentação num perfil plano, simétrico e sem curvatura, desde que seja mantido um ângulo de ataque com o ar que leve a que o escoamento contorne o perfil. No entanto, um perfil simétrico não produz sustentação em ângulo nulo, uma vez que as forças produzidas nos dois dorsos são iguais em módulo mas de sentido oposto. Note-se que, na figura 5, na passagem do escoamento inicial para o “upwash” (ascensão das massas de ar), o escoamento alar segue uma linha côncava, originando uma força contra o perfil, contrária à força de sustentação. Na parte convexa do perfil, por sua vez, a força é centrífuga, favorável à sustentação. Dois conceitos importantes a introduzir neste ponto sãoos de centro de pressão e centro aerodinâmico. O primeiro é o ponto em que a força resultante da distribuição de pressões do perfil alar seria exercida. Este ponto pode ser calculado matematicamente ou obtido experimentalmente através de testes em túnel de vento, mas não é constante e desloca-se consoante a distribuição de pressões. Isto torna a sua utilização extremamente inconveniente, pelo que se definiu o conceito de centro aerodinâmico. Este é o ponto do perfil alar em que o momento causado pelas forças envolventes resultantes da distribuição de pressão é constante para qualquer ângulo de ataque. O cálculo deste ponto é essencial na determinação dos efeitos aerodinâmicos num perfil alar, já que permite facilmente determinar as forças aerodinâmicas para qualquer ângulo de ataque. Os dispositivos aerodinâmicos designados flaps, colocados nos bordos de ataque e de fuga, aumentam a curvatura (diminuem o raio) do escoamento, aumentando a força de sustentação. Muitas vezes, os flaps têm uma fenda, slot, passando a chamar-se de slat. Um slot é um canal de ar que serve de controlo da camada-limite do extradorso, transferindo-lhe energia e atrasando a sua separação e consequente perda (stall), permitindo aumentar o ângulo de ataque. Figura 5: Forças e reações no escoamento (Magalhães, 2008) Aerodinâmica Básica Março de 2015 8/17 Relativamente ao intradorso, este também tem influência na sustentação, embora menos importante e eficiente. Para a generalidade de ângulos de ataque positivos, o escoamento nesta parte do perfil produz força de sustentação pela deflexão do escoamento, ou seja, pela alteração da direção deste. Os gradientes de pressão são um efeito da produção de forças na direção radial. Durante a aceleração radial, pela reação centrífuga, as moléculas de fluido exteriores são comprimidas no exterior da curvatura, provocando um aumento da pressão p com a distância r ao centro c, o que se pode traduzir como: (5) Assim, a variação da pressão na direção radial forma-se em gradiente normal à superfície do dorso, sendo a pressão mais baixa à superfície do que a uma maior distância. Como a produção de força centrífuga varia ao longo da linha do perfil consoante o raio das trajetórias, então a pressão estática também varia à superfície do extradorso em gradiente tangencial. Como efeito da diminuição da pressão estática no extradorso, a velocidade do escoamento tende a aumentar, num gradiente de pressão favorável. Desta forma, a diminuição da pressão estática causa uma aceleração do escoamento inicial. Conclui-se então que existem duas acelerações: a aceleração normal (radial), a que produz maioritariamente a sustentação e os gradientes de baixas-pressões, e a aceleração tangencial, que surge como consequência da diminuição da pressão estática, ou seja, esta ultima é como que uma consequência do mecanismo em si. O Princípio de Bernoulli, que exprime a conservação da energia mecânica, é comummente associado ao mecanismo de sustentação aerodinâmica e traduz-se tradicionalmente por: (6) Esta expressão é válida em escoamento presumido incompressível, invíscido, irrotacional e ao longo de uma linha de corrente (uma linha tangente ao vetor velocidade do escoamento em todos os pontos), desprezando a diferença de elevação. A equação (6) mostra que a diferença da pressão estática entre dois pontos de um fluido situados ao mesmo nível é simétrica da diferença de pressão dinâmica entre eles. Então, sabendo-se a variação de pressão, consegue-se calcular a variação de velocidade, e vice- versa. Não obstante, no que diz respeito à relação de causalidade, em escoamento livre uma Figura 6: Distribuição da força de pressão num perfil alar Eppler E 64, sendo o ângulo de ataque 2°. Fonte: http://www.mh-aerotools.de/airfoils/velocitydistributions.htm Aerodinâmica Básica Março de 2015 9/17 maior velocidade não causa diminuição da pressão estática. Se a velocidade aumenta, não é pressuposto que a pressão estática diminua, uma vez que esta é igual à pressão atmosférica envolvente. Todavia, o inverso já é verdade, isto é, se a pressão é menor a jusante do escoamento livre, a velocidade aumenta. Em suma, o Princípio de Bernoulli serve para quantificar o efeito, mas não como explicação da causalidade do mecanismo de sustentação, uma vez que não explica a diminuição da pressão. Compreendido o mecanismo responsável pela sustentação aerodinâmica, perpassa a ideia de que, para que seja produzida força de sustentação, a direção do escoamento tem de ser alterada. É essencial distinguir-se mecanismo de produção, efeitos da produção e quantificação da produção de sustentação, esta última feita recorrendo a conceitos como momento linear ou outros, que exponham, por equivalência, a matemática do problema de forma simples. Note-se também que não será necessário considerar as diferenças de pressão no extradorso referidas anteriormente para se compreender o mecanismo da sustentação, sendo que estas são consequência da aceleração radial responsável pelo processo. Sintetizando este mecanismo numa só frase, pode-se dizer que “A Força de sustentação dinâmica é igual à Força de reação centrífuga gerada na aceleração (radial) do volume de fluido viscoso escoado em torno de um perfil” (Magalhães, 2008). 2.4 Perfis NACA Devido ao elevado número de variáveis geométricas envolvidas na conceção de um perfil alar, existe uma infinidade de formas possíveis. Por esta razão era comum desenhar perfis recorrendo a conhecimentos empíricos e tendo por base experiências passadas, verificando-se depois se o respetivo desempenho servia as necessidades, o que obrigava a refazer o processo em caso de resultados negativos. De modo a aumentar a eficácia e a eficiência do processo de desenvolvimento de perfis alares, a NACA (National Advisory Committee for Aeronautics), antecessora da atual NASA, decidiu, na década de 1930, elaborar a priori diversos perfis, estudando-os depois em túnel de vento de modo a obter todas as suas propriedades. A partir deste programa foi possível criar um catálogo de asas pré-elaboradas analítica- e geometricamente, permitindo a projetistas escolher um perfil adequado às suas necessidades. Desde então surgiram várias séries de perfis NACA, que são referenciadas com um certo número de algarismos após a sigla “NACA”. A primeira série desenvolvida, a Série 4, tem a forma NACA XYZW, em que X representa a flecha máxima em percentagem da corda, Y representa a localização ao longo da corda (a partir do bordo de ataque) da flecha máxima em décimas da corda, e ZW representa a espessura máxima em percentagem de corda. As outras séries têm outras regras, embora em geral se foquem em definir coeficientes de sustentação, localização do ponto de flecha máxima e a espessura máxima. De acordo com Anderson (1991), a Série 6 é uma das séries mais usadas atualmente. É dedicada a escoamento laminar e tem a forma NACA 6X-YZW, sendo 6 usado para representar a série. X é a localização (a partir do bordo de ataque) do ponto de menor pressão, para sustentação nula, Aerodinâmica Básica Março de 2015 10/17 em décimas da corda. Y representa o coeficiente de sustentação, em décimas, para um ângulo de ataque ideal e os últimos dois têm o mesmo significado que tinham na Série 4. Existem várias outras séries NACA, algumas delas, como as séries 7 e 8, para aplicações muito específicas (a série 8, por exemplo, é para perfis a velocidades supercríticas), mas a sua discussão detalhada transcende o propósito deste relatório. É de notar que existem bases de dados muitoextensas com vários perfis alares já estudados e disponíveis (como por exemplo http://m- selig.ae.illinois.edu/ads/coord_database.html). 3. Asas 3.1 Geometria das asas A análise das asas é muito importante aquando da análise de um avião pois são estas que geram sustentação e permitem ao avião voar. Esta análise já foi abordada anteriormente neste trabalho com a análise do perfil alar, porém, para se avaliar completamente a capacidade de sustentação de um avião, é necessário também recorrer a uma análise tridimensional das suas asas e respectiva geometria. Para a análise da geometria das asas é necessário introduzir novos conceitos, para além dos já apresentados anteriormente. Como se observa na figura 7, define-se a raiz de uma asa como a sua extremidade junto á fuselagem e o seu bordo marginal como a extremidade do lado oposto à anterior. Outro conceito importante a apresentar é ainda a envergadura s, que consiste na distância entre estes dois bordos, medida em linha reta. Assim, a envergadura de uma asa pode ser entendida como o comprimento desta. A partir destes novos conceitos, e recorrendo também aos anteriormente conhecidos do perfil alar, podemos estabelecer novas relações que nos permitem analisar a geometria das asas. Um desses casos é o alongamento (AR): (7) Em (7) s representa a envergadura da asa e A a área da mesma. A equação (7) mostra que o alongamento relaciona o comprimento da asa com a sua área, permitindo concluir quão longa e fina esta é. Assim, quanto maior o alongamento da asa, maior é a envergadura em relação á corda média. Outra relação que podemos definir é o afilamento da asa, que estabelece uma relação entre a corda no bordo marginal, cBM, e a corda na raiz, cR, da asa e estabelece assim um indicador do quanto a corda da asa varia: Figura 7: Nomenclatura das dimensões características de uma asa. Fonte: [20] Aerodinâmica Básica Março de 2015 11/17 (8) Outro parâmetro a avaliar nas asas é o angulo que o seu bordo de ataque ou de fuga faz com a fuselagem ou flecha. Para tal costuma utilizar-se o angulo , como se vê na figura: A flecha das asas de um avião pode ser negativa ou positiva e contribui para a sua estabilidade lateral, sendo muito usada em aviões supersónicos, pois permite menores perturbações a uma velocidade elevada. Todavia, para um avião que normalmente se desloque a baixa velocidade ou velocidade de cruzeiro, uma flecha muito elevada pode ser prejudicial. O último parâmetro a que frequentemente se recorre na avaliação da geometria das asas é o ângulo de diedro. Este é o angulo que a asa faz com a horizontal, como visto na figura 9. A montagem das asas de uma aeronave nesta configuração, embora seja mais complexa, confere-lhe estabilidade lateral, o que faz com que a reação do avião a qualquer rolamento seja regressar á horizontal. Por esta razão, diedro positivo é frequentemente empregue em aviões comerciais. Figura 9: Ilustração do ângulo de diedro. Fonte: [20] 3.2 Comparação aerodinâmica: asas finitas e infinitas Fala-se de asas finitas e infinitas relativamente à sua envergadura, ou seja as primeiras têm bordos marginais. Assim, o ar que se encontra debaixo da asa, a maior pressão, tem tendência a mover-se à volta dos bordos em direção à zona de menor pressão sobre a asa. Este movimento cria vórtices de bordo marginal, ou vórtices na esteira, em cada asa, como se pode verificar nas figuras 10 e 11. Os vórtices induzem uma componente descendente da velocidade do ar perto da asa: turbilhão descendente (downwash, em inglês). Na vizinhança imediata da asa, o fluxo de ar e o turbilhão descendente adicionam-se vectorialmente e produzem um fluxo relativo local, que está mais inclinado para baixo do que o fluxo de ar original (figura 12). Um dos efeitos é a redução do ângulo efetivo de ataque da asa, em comparação com o ângulo de ataque relativo ao fluxo de ar original. Outro dos efeitos é o aumento da resistência, designado por arrasto (ou resistência) induzido(a), que pode ter várias interpretações físicas. Segundo uma delas, os vórtices mudam o campo do fluxo perto da asa de tal maneira que as superfícies de distribuição de pressão são alteradas, Figura 8: Ilustração do ângulo de flecha . Fonte: [20] Aerodinâmica Básica Março de 2015 12/17 ficando com a direção do resistência induzida. Uma explicação alternativa diz que, como o fluxo de ar relativo aponta para baixo, o vetor da sustentação fica inclinado para trás, logo contribui com uma certa componente para a resistência do ar. De acordo com uma terceira interpretação, os vórtices contêm uma certa energia cinética rotacional, fornecida pelo sistema de propulsão da aeronave, o que faz com que seja necessária uma maior potência para superar o incremento da resistência do ar. Figura 10: Vórtices na esteira. Fonte: http://fdrl.mae.cornell.edu/wingvortex.php Figura 11: Esquema da circulação de ar nos vórtices (Anderson, 2005) Figura 12: Fluxo de ar perto da asa (Anderson, 2005) Quando a secção de um perfil aerodinâmico é testada num túnel de vento, esta comporta-se como uma asa infinita se estiver fixa às paredes do túnel, porque estas impedem que o ar se desloque à volta dos bordos marginais. O fluxo de ar encontra uma asa que não tem bordos marginais, ou seja, em princípio, a asa poderia estender-se de menos infinito até mais infinito, na direção da envergadura. O fluxo de ar numa asa infinita varia apenas segundo os outros dois eixos, e por essa razão é designado por bidimensional. As asas reais têm um valor finito de envergadura, logo o fluxo de ar é tridimensional. Os vórtices na esteira reduzem o declive da curva do coeficiente de sustentação (figura 3) em função do ângulo de ataque. Quanto menor for Figura 13: Teste de asa infinita num túnel de vento. Fonte: [22] Aerodinâmica Básica Março de 2015 13/17 o alongamento da asa, menor é o declive referido, porque quanto menor for a envergadura, maior é a porção da asa que os vórtices da esteira conseguem influenciar. A diminuição do alongamento tem como consequência a redução da sustentação total que a asa é capaz de produzir e o aumento da resistência do ar. Os momentos e os coeficientes de sustentação e de resistência aerodinâmica para uma asa infinita, com um determinado perfil aerodinâmico e num determinado ponto, são diferentes dos valores encontrados numa asa finita nas mesmas condições. O coeficiente de sustentação para uma asa finita é menor do que o de uma asa infinita, porque o ângulo de ataque efetivo é menor na primeira. Pelo contrário, o coeficiente de resistência aerodinâmica para uma asa finita é maior do que o de uma asa infinita nas mesmas condições. Em ambas as asas há resistência de fricção e de pressão devidas à separação do fluxo de ar, mas na asa finita também há a resistência induzida. (10) Tabela 1: Correção dos coeficientes de sustentação e de resistência aerodinâmica para asas finitas cd Coeficiente de resistência aerodinâmica para asas infinitas (Drag Coefficient) cl Coeficiente de sustentação para asas infinitas (Lift Coefficient) CD Coeficiente de resistência aerodinâmica para asas finitas (Drag Coefficient) CL Coeficiente de sustentação para asas finitas (Lift Coefficient) CDI Coeficiente de resistência induzida (Induced Drag Coefficient) AR Alongamento (Aspect Ratio) e Fator de Eficiência de Oswald (Oswald Efficiency Factor)O fator de eficiência de Oswald é igual a 1 para asas elípticas e menor que 1 para as outras. Para aeronaves subsónicas típicas, o seu valor está entre 0,85 e 0,95. É do interesse do projetista que este fator esteja o mais próximo possível de 1, de modo a reduzir CDI. Numa aeronave real não é possível construir asas infinitas, mas é possível diminuir os vórtices de esteira e consequentemente os efeitos associados às asas finitas. Quanto maior for o alongamento, menor é o coeficiente de resistência induzida, que é nulo para as asas infinitas. Aviões comerciais, como o Boeing 747, e aeronaves de longa distância, como o B-52 Stratofortress (figura 14), têm asas longas e esguias, ou seja, com elevado alongamento, o que reduz o efeito dos vórtices de bordo marginal. Estas asas são mais eficientes a nível aerodinâmico e permitem que a aeronave maximize a distância que consegue voar. Pelo contrário, aviões de combate, como o F-16 Fighting Falcon ou o MiG-21 (figura 15), têm asas curtas e mais espessas. Estas aeronaves têm de ser rápidas e facilmente manobráveis, o que requer um baixo alongamento. A desvantagem é que em geral têm um menor alcance. Aerodinâmica Básica Março de 2015 14/17 Uma outra solução possível para a diminuição dos vórtices de esteira é a implementação de pequenos estabilizadores verticais nos bordos marginais, chamados winglets. Figura 14: B-52 Fighting Falcon. Fonte: [22] Figura 15: MiG-21. Fonte: [22] 4. Aerodinâmica em regime compressível O tema aerodinâmica é praticamente indissociável do conceito de Número de Mach, que se define como: , em que TAS significa True Air Speed (velocidade da aeronave em relação ao ar) e a é a velocidade do som nesse meio, que depende da temperatura. Isto significa que M=1 indica que o corpo se move à velocidade do som. Como referido na secção 2.3 do presente trabalho, a velocidade de escoamento do ar no extradorso é superior à velocidade de escoamento no bordo de ataque, fruto da aceleração intrínseca à sustentação. Em conseguinte, o ar atingirá uma velocidade correspondente a Mach 1 no extradorso do aerofólio antes de o atingir no bordo de ataque. A velocidade na qual um ponto do avião (normalmente localizado na asa, próximo da fuselagem) atinge, pela primeira vez, a velocidade do som é denominada de Mach crítico. Pelos motivos enunciados, um avião atinge o Mach crítico antes mesmo de se encontrar à velocidade do som, ou seja, em velocidades correspondentes a Mach 0,8, por exemplo, dependendo das características do avião e diversos outros fatores. O valor de Mach crítico pode ser aumentado pelo enflechamento das asas, apesar de este trazer outras desvantagens (como referido em 3.1). De acordo com o número de Mach, os regimes de voo podem ser classificados em: Subsónico: M <0,75; Transónico: 0,75<M <1,2; Supersónico: 1,2<M <5,0; Hipersónico: M> 5,0. Quando um avião circula a uma velocidade inferior à do som (M<1), as perturbações causadas pelo avião no ar propagam-se de forma mais rápida que o próprio avião, dando origem a um escoamento Aerodinâmica Básica Março de 2015 15/17 do ar mais suave. No entanto, quando o avião atinge a velocidade do som, as partículas de ar ajustam-se instantaneamente à forma da asa e da fuselagem, dando origem a um acumulamento de pressão, originando uma onda de choque à frente do avião – onda de proa – cujo ângulo diminui à medida que a velocidade de circulação aumenta. Num regime transónico, a passagem do fluxo subsónico para supersónico é suave, mas a passagem de supersónico para subsónico é sempre acompanhada por uma onda de choque normal, que causa fenómenos indesejados à sustentação, como a mudança do centro de pressão, aumento da resistência, separação da camada-limite devido à perda de energia (dando origem a um escoamento turbulento), entre outros, podendo fazer com que a aeronave entre em perda. Esta onda de choque aparece a uma velocidade correspondente ao Mach crítico. Num regime supersónico temos três tipos de ondas de choque: normal, oblíqua e de expansão (único caso onde há diminuição da pressão). No caso da onda de choque oblíqua a direção do escoamento é alterada, mas este continua, geralmente, a ser supersónico após a onda (apesar do número de Mach diminuir), evitando problemas do regime transónico, sendo que a resistência ao movimento é então menor. Figura 17: atraso do número de Mach crítico com o ângulo de flecha. Fonte: [20] Figura 16: resistência da onda de choque com o aumento da velocidade. Fonte: [20] Aerodinâmica Básica Março de 2015 16/17 5. Conclusões Analisando cada parte do trabalho é possível tirar várias conclusões desta pesquisa. Em primeiro lugar foi visto que o conceito de perfil alar é fundamental na análise do desempenho aerodinâmico de um qualquer componente. Estes perfis estão presentes em várias aplicações, pelo que evidentemente constituem uma ferramenta fundamental na área da aerodinâmica. Como foi visto, o perfil aerodinâmico desempenha um papel vital na criação de sustentação e na eficiência de uma aeronave, para além de proporcionar um método de análise aerodinâmico muito útil. Foi também visto que existe uma certa metodologia para o desenho de perfis alares, sendo o catálogo NACA um excelente ponto de partida para a otimização de asas. Em segundo lugar pode-se concluir que, embora o conceito de perfil alar seja bastante útil, este não representa aquilo que se passa na realidade, visto que as asas são tridimensionais e finitas, pelo que é necessário ter em consideração estas imperfeições aquando do projeto de um componente aerodinâmico, com a implementação de winglets, ângulos de flecha e de diedro, etc. Por fim foi visto que os efeitos de compressibilidade em voo raramente são desprezáveis e que não é necessário voar a velocidades supersónicas para ter pontos da asa a atingir estas velocidades, o que provoca ondas de choque que são prejudiciais à estabilidade da aeronave. Concluiu-se que a implementação de ângulo de flecha tem um grande impacto positivo no atraso destes efeitos indesejáveis. Aerodinâmica Básica Março de 2015 17/17 6. 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