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Antipsicóticos e Esquizofrenia

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Antipsicóticos
Antipsicóticos (ou neurolépticos, antiesquizofrênicos ou tranquilizantes maiores) são fármacos usados para tratar a esquizofrenia, uma das formas mais comuns e debilitantes de doença mental. Eles também podem ser usados para tratar a mania (depressão bipolar) e outras alterações de comportamento.
Natureza da esquizofrenia
A esquizofrenia é uma condição na qual o paciente sofre de sintomas de psicose (delírio, alucinação, comportamento sem sentido, etc.). Os sintomas também podem ser decorrentes do uso de drogas “recreativas” (ex: opióides, etanol, anfetaminas, cocaína, ecstasy, maconha, etc.) ou efeitos colaterais de fármacos usados terapeuticamente (ex: esteroides). Costuma ser crônica e incapacitante. Tem forte fator hereditário.
Suas características clínicas incluem:
Sintomas positivos
Delírios (paranoia);
Alucinações (vozes, por vezes agressivas);
Alterações do pensamento (turbulento, sentenças irracionais);
Comportamentos anormais e desorganizados (desorientação, agressividade);
Catatonia (imobilidade ou atividade motora sem motivo);
Sintomas negativos
Retraimento de relações sociais;
Poucas reações emocionais;
Incapacidade de sentir prazer (Anedonia);
Relutância em realizar tarefas diárias;
Também há disfunções cognitivas (memória, atenção, etc), ansiedade, culpa, depressão e autopunição (podendo haver tentativas de suicídio). Por fim, destaca-se a dificuldade de “atenção seletiva”, ou seja, enquanto um indivíduo normal rapidamente se acostuma com estímulos comuns ou sem consequência, o esquizofrênico tende a ter dificuldade de discriminar entre estímulos significativos e estímulos simples (ex: um tic-tac do relógio pode deman dar muita atenção por parte do esquizofrênico).
O equilíbrio entre sintomas positivos e negativos varia muito, de forma que isso altera a eficácia de antipsicóticos que possam ser usados. Também, pode ter padrão remitente e recivido ou pode ser crônica progressiva.
Etiologia e patogênese da esquizofrenia
Fatores genéticos e fatores ambientais
A causa da esquizofrenia envolve fatores genéticos e fatores ambientais.
Há forte tendência hereditária, mas fatores ambientais também são muito importantes.
Bases neuroanatômicas e neuroquímicas da esquizofrenia
Os diferentes sintomas esquizofrênicos parecem ser resultado do mau funcionamento de diferentes circuitos neuronais.
Via Mesolímbica
Projeção da área tegmentada ventral (VTA) ao núcleo accubens, amídala e hipotálamo.
Hiperatividade dopaminérgica sobre receptores D2 está associada a sintomas positivos.
Via Mesocortical
Projeção da área tegmentada ventral (VTA) a regiões do córtex pré-frontal.
Hipoatividade dopaminérgica sobre receptores D1 está associada a sintomas negativos.
Os principais neurotransmissores envolvidos na esquizofrenia são:
Dopamina
Sabe-se que anfetaminas levam a liberação de dopamina no cérebro, causando sintomas esquizofrênicos.
Antagonistas da dopamina neuronal (ex: reserpina) são eficazes no controle dos sintomas positivos da esquizofrenia e na prevenção das alterações comportamentais semelhantes à esquizofrenia causada por anfetaminas.
Parece ser o principal neurotransmissor das vias Mesolímbica e Mesocortical, onde, na esquizofrenia, está em hiperatividade (receptores D2) e hipoatividade (receptores D1), respectivamente.
Há outras vias dopaminérgicas (nigroestriatal e tuberoinfundibular), mas estas parecem estar normais na esquizofrenia.
Portanto, a terapia antipsicótica requer bloqueio da transmissão dopaminérgica na via mesolímbica e estímulo da transmissão dopaminérgica na via mesocortical.
Glutamato
Antagonistas NMDA (ex: fenciclidina, cetamina, dizocilpina) podem causar sintomas positivos e negativos. Por isso, acredita-se que a esquizofrenia pode ser resultado da interrupção da transmissão glutamatérgica.
Os neurônios glutamatérgicos e GABAérgicos desempenham papéis importantes no controle da atividade neuronal geral, incluindo as vias mesolímbica e mesocortical – acredita-se que receptores NMDA estimulem a atividade de neurônios de forma geral. 
Portanto, na esquizofrenia, haveria hipoativação de receptores NMDA na via dopaminérgica mesocortical, reduzindo o nível de atividade neuronal desta via (não mesolímbicos, já que na esquizofrenia esta via se encontra hiperativada), reduzindo a liberação de dopamina para o córtex pré-frontal e gerando sintomas negativos. A via mesolímbica sofreria hiperativação por que os receptores NMDA estariam predominantemente localizados em neurônios GABAérgicos inibitórios que, na hipoativação de seus receptores NMDA, não liberariam GABA para inibir a transmissão mesolímbica, ocorrendo, por fim, aumento da liberação de dopamina no núcleo accubens e sintomas positivos.
Neurodegeneração
Anomalias estruturais cerebrais, progressão, diminuição de resposta a fármacos e desenvolvimento de demência com o tempo são fatores que indicam que a esquizofrenia acarreta degeneração neuronal. Acredita-se que isso ocorra por hiperexcitação excessiva causada por glutamato.
Fármacos antipsicóticos
Podem ser divididos em dois grupos:
Antipsicóticos de primeira geração (típicos ou convencionais)– clorpromazina, flufenazina, haloperidol, flupentixol, clopentixol
Antipsicóticos atípicos – clozapina, zotepina, quetiapina, amisulprida, risperidona, ziprazidona, sertindol, aripiprazol
Associados a menos efeitos adversos.
Farmacocinética
A administração é, normalmente, oral, mas em emergências, pode ser injetado via intramuscular.
A relação entre concentração plasmática e efeito clínico dos antipsicóticos é muito variável, e a dose precisa ser ajustada na base da “tentativa e erro” – isto é acentuado pois a maioria dos esquizofrênicos não segue estritamente a terapia.
A metabolização é inteiramente hepática por oxidação e glicuronidação.
Propriedades farmacológicas
Receptores de dopamina
	Local
	Função
	Tipo D1
	Tipo D2
	
	
	 D1 D5
	 D2 D3 D4
	Córtex
	Alerta e humor
	3
	-
	2
	-
	1
	Sistema límbico
	Emoção
	3
	1
	2
	1
	1
	Estriado
	Secreção de prolactina
	3
	1
	2
	1
	1
	Hipotálamo e hipófise
	Secreção de prolactina
	-
	-
	2
	1
	-
Os antipsicóticos desempenham seus efeitos principalmente pelo bloqueio D2, e os efeitos antipsicóticos surgem com pelo menos 80% de bloqueio D2.
Os antipsicóticos de primeira geração mostram certa preferência por D2 em relação a D1. Os antipsicóticos atípicos se dissociam rapidamente D2 ou são agonistas parciais destes, e o objetivo disso é evitar efeitos motores extrapiramidais.
Acredita-se que o bloqueio D2 na via mesolímbica alivie os sintomas positivos, mas não há seletividade por receptores D2 cerebrais, e a ativação de receptores D2 fora do cérebro causam efeitos colaterais, principalmente dificuldades motoras (bloqueio de D2 na via nigroestriatal), secreção de prolactina (bloqueio de D2 na via tuberoinfundibular), redução de prazer (bloqueio de certos receptores D2 na via mesolímbica), e aumento dos sintomas negativos da esquizofrenia (bloqueio de receptores D2 na via mesocortical, apesar de serem escassos e os D1 mais abundantes).
Alguns antipsicóticos possuem atividades adicionais (ex: antagonismo de receptores muscarínicos e de serotonina), que podem reduzir efeitos colaterais. Além disso, o antagonismo da serotonina ajuda a aliviar deficiências cognitivas na esquizofrenia.
Receptores serotoninérgicos
A serotonina não está envolvida diretamente com a esquizofreina. Entretanto, a partir do LSD, agonista parcial de 5-HT2a que causa alucinações, que começou a se relacionar esquizofrenia com serotonina.
Dentre os vários receptores serotoninérgicos, 5-HT1a e, principalmente, 5-HT2a são mais importantes na esquizofrenia.
5-HT2a são acoplados a proteína Gi. Sua ativação leva a inibição neuronal – olanzapina, risperidona
Diminuem a liberação de dopamina na via nigroestriatal. Isto reduz efeitos extrapiramidais.
Contribuem, na viamesolímbica, para a redução da liberação de dopamina, aliviando sintomas positivos da esquizofrenia.
Contribuem, na via mesocortical, para a redução da liberação de glutamato em neurônios GABAérgicos que, por sua vez, liberam menos GABA e inibem menos a liberação de dopamina. Desta forma, aumentam a liberação de dopamina na via mesocortical e aliviam sintomas negativos da esquizofrenia.
5-HT1a são autorreceptores que inibem a liberação de serotonina. Fármacos como quetiapina, que são agonistas totais ou parciais dos receptores 5-HT1a inibem a liberação de serotonina, aumentando a liberação de dopamina no estriado e no córtex pré-frontal.
Receptores muscarínicos – Olanzapina, Periciazina
Fármacos antagonistas mais seletivos para receptores muscarínicos induzem menos efeitos adversos extrapiramidais que os demais. 
Acredita-se que no estriado há terminações dopaminérgicas que inervam interneurônios colinérgicos (que possuem receptores D2 inibitórios).
O bloqueio de receptores D2 no estriado causado por um antipsicótico resultará no aumento da liberação de acetilcolina nos receptores muscarínicos, produzindo efeitos extrapiramidais. Estes efeitos extrapiramidais podem ser evitados se o agente antipsicótico possuir boa afinidade por receptores muscarínicos.
Por outro lado, a alta seletividade por receptores muscarínicos podem levar a efeitos colaterais semelhantes aos efeitos da atropina.
Efeitos comportamentais
Antipsicóticos reduzem a atividade motora espontânea e, em doses altas, podem causar catalepsia (imobilidade apesar de estar sob posição estranha).
Também reduzem o estado de apatia, a agressividade e a redução de iniciativa.
Por fim, muitos antipsicóticos são antieméticos, refletindo o bloqueio de receptores de dopamina, muscarínicos, de histamina e de serotonina.
Efeitos colaterais
Alterações motoras extrapiramidais
Há distonia aguda e discinesia tardia – os chamados efeitos extrapiramidais, principais efeitos colaterais dos antipsicóticos atípicos.
Eles resultam diretamente ou indiretamente do bloqueio D2 na via nigroestriatal.
Distonia aguda
São movimentos involuntários (agitação, espasmos musculares, protrusão da língua, olhar fixo para cima, torcicolo e sintomas de Mal de Parkinson). Causado pelo bloqueio de D2 na via nigroestriatal, e pode ser reduzido por bloqueio concomitante de receptores muscarínicos e de serotonina.
Discinesia tardia
È incapacitante e costuma ser irreversível, piorando com a suspensão do tratamento antipsicótico e que é resistente a tratamento. Consiste de movimentos involuntários da língua, tronco e extremidades, provavelmente causados por hiperexpressão de receptores de dopamina pré-sinapticos no estriado.
Efeitos hormonais
Se a dopamina for liberada na eminência mediana da hipófise pela via túbero-hipofisária, causa, fisiologicamente, através de receptores D2, inibição da liberação de prolactina. 
O tratamento com antipsicóticos causa bloqueio dos receptores D2 que inibem a liberação de prolactina na hipófise, causando liberação deste hormônio.
O excesso de prolactina causa edema de mama, dor e lactação, podendo ocorrer também em homens.
Outros
Também há sonolência e sedação, que tendem a desaparecer com administração crônica.
O bloqueio H1 (especialmente por clorpromazina e metotrimeprazina) contribui para o efeito de sedação e antiemético, mas não para o efeito antipsicótico.
Bloqueio de receptores muscarínicos causa vários efeitos periféricos “atropínicos”, como embaçamento visal, aumento da pressão intraocular, hipossalivação, constipação e retenção urinária. Vale lembrar que antagonismo muscarinico pode ser vantajoso na redução de efeitos colaterais extrapiramidais causados por antipsicóticos.
Bloqueio de receptores α pode causar hipotensão postural, e não está relacionada a ação antipsicótica.
Há risco de ganho excessivo de peso.
Há aumento de risco de diabetes e doença cardiovascular, principalmente com uso de antipsicóticos atípicos.
Também podem ocorrer várias reações idiossincrásicas e de hipersensibilidade:
Icterícia (clorpromazina, etc.) – aparência amarelada;
Leucopenia e agranulocitose (clozapina, etc.)(exceto olanzapina);
Reações urticariformes na pele e sensibilidade a luz UV;
Síndrome maligna de antipsicóticos – reação rara e grave. Há rigidez muscular, elevação da temperatura corporal e confusão mental. Pode ser reversível.
Uso clínico dos antipsicóticos
O principal uso dos antipsicóticos é tratamento da esquizofrenia e outras emergências comportamentais agudas (depressão psicótica, depressão bipolar), mas também pode ser usados para tratar comportamento social desviante, tiques motores e soluço intratável.
Alguns têm efeito antiemético.
Haloperidol pode ser usado para Coreia de Huntington.
O uso clínico de antipsicóticos, descartando seus colaterais, ainda possui outras dificuldades:
Nem todo esquizofrênico responde à terapia medicamentosa (sendo recomendada a clozapina em pacientes resistentes a outros fármacos). Não se sabe por que alguns não respondem à terapia, mas acredita-se que seja por mutação nos receptores de dopamina e serotonina.
O alivio de sintomas positivos é notório, mas, normalmente, antidepressivos são ineficazes no alivio dos sintomas negativos.

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