Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
2.1 O que é o projeto de edificações e como contratá-lo? – Parte 1 2.1.1 A importância de um bom projeto para a futura atividade de manutenção predial da edificação Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Identificar os principais conceitos para o desenvolvimento de um projeto eficiente. Os projetos da construção civil, nesses incluídos os projetos de edificações, além de serem, por sua natureza, roteiros para as atividades que concorrerão para a execução do objeto, são igualmente ferramentas de análise para as possíveis soluções técnicas a serem aplicadas no processo construtivo. A palavra projeto significa, genericamente, intento, desígnio, empreendimento e, também, um conjunto de ações, caracterizadas e quantificadas, necessárias à concretização de um objetivo. Embora este sentido aplique-se a diversos campos de atividades, em cada um deles o projeto materializa-se de forma específica. O objetivo principal de um projeto é a execução da obra idealizada pelo arquiteto ou engenheiro. Essa obra deve adequar-se aos contextos naturais e culturais em que se insere e responde às necessidades do cliente e dos futuros usuários do objeto construído. As exigências do cliente e dos usuários exprimem-se por meio do programa de necessidades que define metodologicamente o produto final. Diante disso, as soluções técnicas que deverão ser empregadas para a consecução da obra devem atender aos princípios da racionalidade, da economicidade, da funcionalidade e do desempenho. Considerando os conceitos de Vitrúvio (2007, p. 82),14 os projetos de arquitetura devem atender cumulativamente aos princípios básicos “utilitas” (utilidade, uso, funcionalidade, proveito, vantagem), “firmitas” (solidez, firmeza, consistência, robustez) e “venustas” (beleza, elegância, estética). Tais conceitos resumem as qualidades que se pretende para o projeto arquitetônico, demonstrando que o objeto construído deve conciliar desempenho, economia e estética. Pode-se, assim, concluir que o edifício ou a obra deve ter características que atendam à sua durabilidade e conservação. Com esse objetivo, o projeto deverá também servir à correta escolha de soluções que determinem o melhor funcionamento do objeto construído, muito além da sua concepção ou construção. No projeto é que são definidos os conceitos e as técnicas que garantirão a permanência da construção, principalmente no quesito manutenção. Recentemente, a ABNT editou um conjunto de normas aplicado ao desempenho das edificações. Muito embora tal norma traga na sua origem a destinação às edificações habitacionais, pode-se tomá-la como referência para qualquer tipo de edifício em que se pretenda condições de bom desempenho. Uma das premissas básicas dessa normativa é a durabilidade dos elementos da construção, denotando grande preocupação com a manutenção do edifício. A Administração Pública, por suas características (necessidade de racionalização dos custos, orçamentos limitados e inconstantes, falta de equipes permanentes para conservação), tem como um dos grandes desafios a manutenção do seu patrimônio construído. Por essa razão, boas escolhas na fase de projeto definirão o custo para a Administração na conservação e na manutenção das suas construções por longo período. Percebe-se, dessa condição, que o projeto, muito além de ser um roteiro para a construção do objeto, é, antes de tudo, uma ferramenta para experimentação das soluções para o bom desempenho da obra ou do edifício, possibilitando a escolha das melhores soluções técnicas, aquelas que trarão o equilíbrio entre custo de construção, custo de manutenção e funcionalidade, aí considerados a eficiência e o conforto. Você, como gestor do contrato de projeto, ao elaborar o seu Termo de Referência ou Projeto Básico, deve observar com cautela tais premissas, de forma a conduzir a sua elaboração pelo caminho da racionalidade, da economia e do desempenho. As definições e as exigências dadas no Termo de Referência ou Projeto Básico devem ser tais que condicionem a elaboração do projeto, para que esse atenda aos objetivos aqui já mencionados. Essas escolhas recairão sobre os tipos de materiais, a forma de ordenação dos espaços, a morfologia dos elementos etc. Assim, é importante que se observe a vantagem que se terá sobre a escolha de um material em detrimento de outro, do tamanho da edificação frente às necessidades do órgão, ou até mesmo da observância ao índice de compacidade ou da forma do edifício. Como exemplo, citamos a escolha de esquadrias de ferro para a vedação das fachadas externas de um edifício em zona litorânea. Certamente toma-se aqui a condição extrema e até mesmo inadmissível, visto que, nas condições atmosféricas daqueles ambientes, jamais se optaria pela escolha de elementos ferrosos para tal uso. A escolha correta nesse caso seria, por exemplo, esquadrias de alumínio, com pintura por anodização ou eletrostática, com durabilidade adequada àquelas condições ambientais. Muito embora seja senso comum no meio da arquitetura e da engenharia, a obviedade por tal escolha (esquadrias de alumínio para a vedação de fachadas em edificações de ambientes litorâneos), ainda assim é possível encontrar projetos (mal) especificados trazendo aquela condição (especificação de esquadrias de ferro naqueles ambientes). Nos órgãos públicos, os setores que são responsáveis pelos projetos normalmente são diversos daqueles responsáveis pela manutenção das edificações (ou outras obras da construção civil ou de infraestrutura viária). A boa especificação, quando da elaboração desses projetos, poderá contribuir para a desoneração do trabalho e do custo despendidos futuramente pelos seus setores de manutenção. Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Reconhecer a importância do projeto no ciclo de vida de uma edificação. No tópico anterior, foram apresentadas as relações existentes entre a boa especificação de um projeto e o custo de manutenção do objeto construído. Veja que as escolhas corretas no momento das especificações têm, entre outros quesitos, a função de desonerar o custo de manutenção futura das edificações ou outras obras. O custo de um projeto é sensivelmente menor do que os custos envolvidos na execução da obra. Por essa razão, perceba que é mais lógico e sensato concentrar esforços nessa importante etapa, evitando, por exemplo, economias irresponsáveis e permitindo que nessa ocasião possam ser avaliadas todas as possibilidades técnicas para a consecução do objeto pretendido. Afinal, é infinitamente mais fácil alterar um desenho, ou até mesmo descartar-se um conjunto de elementos impressos, do que demolir uma estrutura de concreto. O projeto, portanto, é o momento para a experimentação e o teste de possibilidades. Para ilustrar a importância que tem um projeto na construção civil, veja a imagem a seguir. Perceba, portanto, algumas verdades sobre o projeto: Diante disso, você, na condição de gestor público, deve observar criteriosamente alguns aspectos na sua contratação: Em relação à manutenção do futuro objeto construído, a questão ganha ainda mais importância. De acordo com a Lei de Sitter,15 ou “Lei dos 5”, tomando-se novamente como exemplo uma estrutura de concreto, o custo para uma intervenção de correção, desde o projeto até a manutenção corretiva, aumenta em progressão geométrica, de razão 5 (SITTER, 1984 apud HELENE, 1992)16. Assim, pode-se dizer que, arbitrando que o custo para uma eventual correção de erro no objeto seja 1, durante a fase de elaboração do projeto, a mesma correção na fase de execução da obra terá custo 5, na fase de manutenção preventiva terá custo 25 e, finalmente,na fase de manutenção corretiva alcançará o custo de 125. Esse mesmo princípio pode ser aplicado, por extensão, às outras disciplinas (instalações) das obras ou edificações. 2.1.2 Como um bom projeto determina o custo de uma obra ao longo de toda a sua vida útil? Neste tópico, identificaremos quais são as principais escolhas que podem concorrer para a racionalização do ambiente construído ao longo da sua vida útil, em consonância com as boas práticas construtivas, à normativa técnica ou legislação vigente. Conforme o art. 2º, item III, do Decreto nº 2.271, de 7 de julho de 1997 (dispõe sobre a contratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional e dá outras providências), as contratações da Administração devem demonstrar os resultados que serão alcançados em termos de economicidade e de melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais ou financeiros disponíveis. No caso das especificações de projetos, as soluções adotadas terão íntima relação com o comando dado nesse artigo do referido decreto. Ainda que o conceito de um bom projeto seja de difícil definição, visto tratar-se de percepção subjetiva, para a qual contribuem diversas variáveis e referências, pode-se delimitar os requisitos mínimos que devem ser atendidos para que o resultado seja adequado aos objetivos da Administração Pública. É nesse sentido que recentemente os Poderes Legislativo e Executivo têm editado leis e normas que buscam o aumento da eficiência da máquina pública, refletida inclusive na construção das suas instalações. Instruções Normativas que definem eficiência energética, otimização de recursos e critérios de sustentabilidade ambiental são normas que atualmente devem ter observância obrigatória pela Administração. Dentro dessa condição, seguem algumas iniciativas específicas aplicadas à elaboração de projetos da construção civil pelo poder público: Escolha de materiais locais, de fácil obtenção no entorno da construção: essa iniciativa atende aos critérios de sustentabilidade ambiental, visto que possibilita menor impacto na natureza, pela diminuição das distâncias de transporte – atividade poluidora – para os insumos da obra, com reflexo no seu custo; 1) Escolha de materiais produzidos no país, por empresas nacionais ou nacionalizadas: essa iniciativa traz reflexos diretos na economia do objeto construído, visto que diminui o custo para a sua contratação e manutenção; 2) Escolha de materiais com melhor eficiência energética, como, por exemplo, luminárias em LED (light emitting diode – ou diodo emissor de luz), sistema de iluminação com baixo consumo de energia e que, consequentemente, diminui os gastos com energia elétrica ao longo da vida útil do edifício ou obra; 3) Escolha de sistemas de ar condicionado com alta eficiência energética, que, a exemplo das instalações de iluminação em LED, proporcionam economia de energia, e, com isso, menor gasto com energia elétrica; 4) Reúso de água, iniciativa que atende principalmente a dois requisitos básicos: a sustentabilidade ambiental e o menor consumo de água tratada, refletindo diretamente no custo do seu fornecimento; 5) Escolha de espécies vegetais nativas nos projetos de urbanização ou paisagismo: essa iniciativa possibilita a melhor adaptação e a baixa manutenção dos espaços ajardinados das edificações ou obras, refletindo na economia dos recursos despendidos pela Administração Pública; 6) Escolha de materiais duráveis e com baixa manutenção quando da especificação dos projetos (exemplo: escolha de esquadrias de alumínio ou PVC para a vedação de fachadas): essa condição evita a necessidade de retificação e repintura dos elementos (quando especificados em madeira ou ferro), economizando recursos financeiros para os órgãos públicos. Somam-se a essas considerações inúmeras outras possíveis e que ampliariam bastante a lista acima. Essas escolhas e definições podem encontrar iniciativa por ação de bons projetistas. É vital, no entanto, que tais exigências emanem da contratante, a Administração Pública, quando da elaboração dos seus editais de contratação. Essa é uma das razões pelas quais é importante – e recomendável – que os órgãos públicos contem nos seus quadros com profissionais habilitados, engenheiros e arquitetos, com qualificação permanente, para a contratação de projetos e obras da construção civil e de infraestrutura viária, tema já abordado no Módulo 1. 2.1.3 O projeto começa pela contratante. Quais objetivos desejo alcançar? Como deverá ser o edifício que pretendo construir? Quais preceitos deve atender? Premissas de projeto Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Identificar os itens obrigatórios a serem observados quando da elaboração do programa de necessidades para a contratação de um projeto de edificações. Complementando as ideias trazidas nos tópicos anteriores, neste tópico serão abordadas as iniciativas por parte do gestor do contrato quando da contratação de um projeto da construção civil. É de grande responsabilidade a atuação do gestor, não somente por sua condição de agente público, e que, portanto, deve obedecer às regras e condutas predeterminadas, mas também pela condição de responsável pela contratação de objeto que terá longa vida útil e que poderá gerar grande impacto socioambiental. Objetos da construção civil são concebidos para durarem dezenas de anos, e, por essa razão, devem ser muito bem pensados, antes do início da primeira escavação. Note que a definição do resultado esperado é tarefa que requer complexo estudo e envolvimento. Certamente projetistas podem dar essa resposta. A medida dessa resposta, no entanto, está intrinsecamente condicionada às orientações e premissas definidas pela contratante, nesse caso o poder público. Mais uma vez, a figura do arquiteto ou engenheiro como gestor desses contratos é fundamental. Inicialmente, pode-se dizer que as edificações ou obras contratadas pela Administração Pública devem considerar o seu custo e o seu resultado final. Não devem ser onerosas, dada a limitação de recursos e a responsabilidade social do poder público, mas também não devem ter custo de construção excessivamente baixo, que venha a onerar o custo do seu uso, conservação e manutenção, conforme já explicitado anteriormente. O valor de uma obra deve ser medido por todo o período da sua vida útil, o que inclui a sua concepção, execução, usufruto e eventual demolição. Conforme a ABNT NBR 15575-1:2013 – Edificações habitacionais – Desempenho – Parte 1: Requisitos gerais, a durabilidade do edifício e de seus sistemas é um requisito econômico do usuário, pois está diretamente associado ao custo global do bem imóvel.17 Esse conceito, embora seja dado por norma especificamente aplicada a edificações, e do tipo habitacional, pode, como já foi aqui ilustrado, ser aplicado a qualquer objeto da construção civil. Essa, infelizmente, não é a orientação obtida a partir da legislação que rege as contratações da Administração Pública, em que comumente se observa para essas apenas o critério do custo do seu projeto e construção. O gestor do contrato não deve, porém, limitar-se a tal regra, mas buscar o equilíbrio entre o custo do projeto e da execução e o custo da sua manutenção, desembolso que será permanente e que onerará os gastos da Administração Pública durante muitos exercícios financeiros. Profissionais habilitados – arquitetos e engenheiros – são os únicos capazes de dar tal resposta. Devem ser considerados requisitos de desempenho e funcionalidade, que concedam ao ambiente construído boas condições de uso e habitabilidade, proporcionando aos seus usuários (agentes públicose população em geral) bem-estar e conforto. Como agente incentivador da transformação social e econômica, a Administração tem papel na inovação tecnológica quando da elaboração dos seus projetos da construção civil. Iniciativas que não são tomadas pelo setor privado, senão pelo lucro, têm no setor público o seu fomento. O poder público, como contratante de obras, tem potencialmente grande capacidade de transformação das nossas cidades. Veja que, por essa razão, as obras contratadas pela Administração devem trazer entre as suas características a adequação ao entorno e o baixo impacto ambiental. Os requisitos que devem ser buscados são o baixo consumo energético, a baixa geração de resíduos o bom desempenho térmico e acústico e a durabilidade. Condicionando a atuação da Administração Pública nas contratações de projeto, há vasta legislação. Uma das normativas mais recentes é a Lei n° 13.647, de 9 de abril de 2018, que obriga a instalação de equipamentos economizadores de água nos sanitários públicos de todas as novas edificações públicas a partir da data da sua vigência. Outro requisito igualmente importante é a preocupação com o aspecto visual da obra, em relação à sua inserção no ambiente e ao seu impacto estético. Como agente transformador do ambiente construído, o poder público, na condição de contratante, deve também considerar a harmonia e a beleza das suas obras, elementos que serão permanentes na paisagem. Devem ser evitados, por exemplo, os chamados “projetos- monumento”, assim entendidos como aqueles que têm apelo temático ou simbólico, cuja forma possa gerar polêmica ou dificuldade de aceitação (ver figura 3), ou que não tenha relação com a função do objeto,18 um dos princípios norteadores da arquitetura. Objetos de arquitetura que optem por trazer apelo simbólico podem fazê-lo de forma sutil e indireta, remetendo à diretriz da sua concepção. Exemplos bem-sucedidos dessas iniciativas são o edifício-sede do Banco Central do Brasil (Bacen), em Brasília, do arquiteto Hélio Ferreira Pinto19 (ver figura 4), e a ponte da mulher (el puente de la mujer), de autoria do arquiteto espanhol Santiago Calatrava (ver figura 5), no bairro Puerto Madero, em Buenos Aires. O primeiro é inspirado em imagem gravada no dobrão, moeda do período imperial, de 1725. O segundo representa um casal dançando tango, manifestação artístico-cultural típica da Argentina, considerada patrimônio oral e imaterial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Considere que as edificações e as demais obras da Administração Pública devem ser sóbrias, para que transmitam as ideias de racionalidade e imparcialidade, ou inovadoras, por meio do emprego de novas técnicas, conceitos ou materiais, para que transmitam a preocupação com a evolução social ou tecnológica do homem. Essas duas características devem estar sempre acompanhadas do princípio da economicidade. Assim, diante dos conceitos apresentados, pode-se resumir os objetivos e as premissas para as obras contratadas pela Administração Pública e que deverão fazer parte do programa de necessidades dos projetos: 2.1.4 Familiarizando-se com a terminologia aplicada ao projeto. Quais as diferenças entre Memorial Descritivo, (Caderno de) Especificações Técnicas e Caderno de Encargos? Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Destacar quais documentos exigir conforme os tipos específicos de projeto; • Relembrar os conceitos aplicados ao tema “projeto de edificações”. Na contratação dos projetos da construção civil, é importante que o gestor do contrato tenha clareza quanto ao significado da terminologia aplicada, permitindo, assim, que os editais tragam correta apresentação dos conceitos e das definições. É comum entre os profissionais de engenharia e arquitetura a confusão entre os conceitos de Memorial Descritivo, (Caderno de) Especificações Técnicas e Caderno de Encargos, razão pela qual compete à contratante o seu esclarecimento, por meio do documento editalício. Essa condição não somente evita a eventual impugnação do edital como traz segurança jurídica ao órgão público. Esses conceitos são definidos abaixo, de acordo com o TCU:20 Observe, portanto, dados os conceitos do TCU, que o Caderno de Encargos é a consolidação do Memorial Descritivo e das especificações técnicas, documento este também chamado de Caderno de Encargos e Especificações Técnicas. Esse documento é complementar às pranchas de desenho do projeto e tem por função a descrição completa do objeto, textualmente, e as orientações de como serão executados os serviços. O Caderno de Encargos ainda pode apresentar outras orientações, como a forma de medição dos serviços, a forma de descarte de resíduos, a forma de apresentação dos documentos finais, etc. O Caderno de Encargos, para os projetos de edificações, não é documento facultativo, dele devendo fazer parte obrigatoriamente, visto ser elemento que elucida dúvidas advindas da leitura das suas pranchas de desenho, sendo instrumento de arbitragem nas eventuais dúvidas técnicas advindas da execução do objeto. Outro conceito amplamente aplicado à área e que também gera dúvidas quanto ao seu significado é o Memorial Justificativo. Alerte-se para o fato que esse documento é tão somente, como o próprio nome diz, um texto que justifica o projeto. Nele estará contida a exposição das razões pelas quais foram adotadas determinadas soluções e decisões de projeto, o porquê de se ter utilizado determinados materiais, traçados, dimensionamentos, etc., em detrimento de outras escolhas. O Memorial Justificativo é, portanto, a peça textual que explica o projeto. É importante que desse documento conste com clareza a explicação para os seguintes itens: Localização - Descrição sucinta do entorno (quando se tratar de projeto de edificação ou intervenção urbanística), e a forma como o objeto relaciona-se com ele, indicando as soluções adotadas para o tratamento dos ruídos, insolação, regime de ventos, etc.; Programa de necessidades - Identificação das razões que levaram o projetista a adotar determinada solução para os elementos do objeto. Exemplo: em um projeto que contenha um auditório, a explicação das razões pelas quais determinada forma foi adotada para tal auditório, a configuração da plateia, etc.; Planta baixa (quando se tratar de projeto de edificação ou intervenção urbanística) - Explicação para a distribuição funcional dos elementos, sua relação, ordenamento, integração, hierarquia, etc.; Volumetria - Descrição da forma como se obteve a solução plástica (quando se tratar principalmente de projeto de edificação), processo criativo, enfatizando procedimentos que foram adotados, tais como subtrações, adições, composição de cheios e vazios, luz e sombras, texturas e materiais, linhas predominantes, etc.; Tecnologia - Apresentação da escolha construtiva e suas vantagens. Descrição do benefício que será atingido com a opção pela forma de construção adotada, em relação à economia, ao desempenho, à rapidez de execução, etc. Exemplo: por que foi adotada a forma construtiva “estaiado para o projeto de um viaduto, em detrimento da forma “simplesmente apoiado”. O Memorial Justificativo não é item obrigatório na elaboração dos projetos (conforme ABNT NBR 16636-2:2017 – Elaboração e desenvolvimento de serviços técnicos especializados de projetos arquitetônicos e urbanísticos – Parte 2: Projeto arquitetônico), e não é comumente adotado ou exigido nas contratações da Administração Pública. É imprescindível, no entanto, quando for adotada a modalidade de licitação “concurso”, que será abordada no próximotópico. 2.1.5 A contratação do projeto: qual é a modalidade de licitação mais indicada? Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Avaliar qual a melhor modalidade de licitação a ser adotada nos diferentes tipos de objeto. A Lei n° 10.520/2002 (institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras providências) traz ainda a modalidade de pregão. Antes de abordarmos as formas de licitação, é importante comentarmos a formação do preço referencial no processo licitatório para a contratação de um projeto, item que fará parte do edital. Como já mencionado neste curso, a Administração Pública deve sempre ter o seu preço referencial para contratações. Isso é válido para projetos, obras e também para serviços continuados. Aplicam-se aos projetos e aos serviços continuados as determinações constantes da IN nº 5, de 27 de junho de 2014 (dispõe sobre os procedimentos administrativos básicos para a realização de pesquisa de preços para a aquisição de bens e contratação de serviços em geral) da SLTI/MP. Naquela IN está determinada a seguinte sequência, em ordem preferencial, para a pesquisa de preços para contratação de serviços em geral: I - Portal de Compras Governamentais; II - Pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenha a data e a hora de acesso; III - Contratações similares de outros entes públicos, em execução ou concluídos nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores à data da pesquisa de preços; IV - Pesquisa com os fornecedores. Outras formas de pesquisa também são possíveis, desde que devidamente justificadas pela autoridade competente, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 2º: “§ 3° A utilização de outro método para obtenção do resultado da pesquisa de preços, que não o disposto no parágrafo 2°, deverá ser devidamente justificada pela autoridade competente”.21 Essa possibilidade deve-se ao fato de que, pelo serviço de projeto ter a sua mensuração de forma subjetiva, por vezes é difícil encontrar referenciais criteriosos para a formação do seu preço. Deve-se considerar que, para um mesmo objeto, pode haver sensíveis diferenças de preços em função da escala, da área de edificação considerada etc. O item IV apontado pela IN SLTI/MP n° 5/2014 poderia, nesses casos, trazer maior segurança na formação do preço. Sua confiabilidade seria dada pela tomada de ao menos três orçamentos, de onde se deve tirar o preço médio. Ainda assim, nem sempre tal expediente traz resposta indiscutível à questão. Nesses casos, pode-se tomar como referência os preços das bases de dados dos órgãos de classe (CAU/BR, Confea/Crea, Sindicato dos Engenheiros, Sindicato dos Arquitetos etc.). Atualmente, está em fase de elaboração dentro da ABNT a NBR 16633 (Elaboração de orçamentos e formação de preços de empreendimentos de infraestrutura), dividida em quatro partes, por meio de projeto sob o mesmo nome. Com previsão de edição para o ano de 2018, esse conjunto de normas trará grande auxílio na análise e na formação dos preços referenciais para os serviços de projeto.22 Analisada a questão da formação do preço referencial, é possível então avaliar as modalidades de licitação aplicadas aos tipos de objetos, já que, normalmente, o preço é um dos critérios para a sua escolha. Os limites definidos na Lei nº 8.666/1993 determinam a modalidade que deve ser adotada conforme o valor do objeto. Não se impede, no entanto, que se adote a modalidade cujo limite do valor que a define é elevado para licitações de limite de valor menor.23 Essa escolha, porém, deve levar em conta a racionalidade do próprio certame e o objetivo buscado, além da supremacia do interesse público, em que se deve considerar também o próprio custo do processo de licitação. Como resultado dessa busca pela racionalidade e otimização dos custos, muitas licitações para contratação de projeto vêm sendo contratadas na modalidade pregão. Sobre tal modalidade, devemos inicialmente analisar a sua aplicação, conforme definido na lei que a instituiu. O art. 1º da Lei nº 10.520/2002 assim determina: Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta lei. Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efeitos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado (BRASIL, 2002, grifo nosso).24 A Advocacia-Geral da União (AGU), por meio da Orientação Normativa n° 54/2014, pondera: Compete ao agente ou setor técnico da Administração declarar que o objeto licitatório é de natureza comum para efeito de utilização da modalidade pregão e definir se o objeto corresponde a obra ou serviço de engenharia, sendo atribuição do órgão jurídico analisar o devido enquadramento da modalidade licitatória aplicável (BRASIL, 2014).25 A dúvida recai sobre o fato de um projeto poder ser considerado ou não como serviço comum de engenharia. O auditor do TCU, André Mendes (2013, p. 149-152)26, argumenta, exemplificando a aplicação do conceito de serviços comuns de engenharia. Na opinião do autor, considerando como orientação a Lei nº 8.666/1993, para que as contratações de serviços de engenharia sejam exclusivamente com licitação dos tipos “melhor técnica” ou “técnica e preço”, seria inapropriado o uso da licitação do tipo “menor preço” para tais serviços, o que impediria também o uso da modalidade pregão, visto essa ter como critério de julgamento exclusivamente o menor preço. O autor continua, fazendo uma comparação entre um serviço notadamente comum de engenharia, a impermeabilização de uma laje de uma edificação e um serviço de projeto. Somente pelo fato de o projeto necessitar de um responsável técnico, ou seja, configurar-se como um serviço intelectual, não poderia ser classificado como serviço comum. Além disso, em um projeto, tomando-se como exemplo um projeto de arquitetura, não é possível definir objetivamente sua forma, aparência e características arquitetônicas finais, confirmando a impossibilidade de seu enquadramento como serviço comum. No entanto, conforme jurisprudência do TCU, por meio do Acórdão n° 601/2011 – TCU – Plenário, se houver entendimento de que o objeto final de uma licitação de projeto não terá diferença, independentemente de quem o fará, este pode ser classificado como comum: (...) se o projeto ou estudo a ser obtido pela realização do serviço por uma empresa ou profissional for similar ao projeto desenvolvido por outra empresa, dotada com as mesmas informações da primeira, esse objeto, no caso “estudos e projetos”, pode ser caracterizado como “comuns”. Caso contrário, se a similaridade dos produtos a serem entregues não puder ser assegurada, o objeto é incomum (BRASIL, 2011).27 Perceba a controvérsia que envolve a questão e que, diante da incerteza do caminho a seguir, muitos gestores acabam optando pela adoção dessa modalidade (pregão) para a contratação dos serviços de projeto, quando de pequeno vulto. Opta-se, dessa forma, pelo caminho mais seguro, se considerarmos a segurança jurídica. Perde-se, no entanto, pela qualidade do objeto ofertado, visto que o custo e a qualidade do projeto tendem a ser grandezas opostas, conforme demonstrado no tópico 2.1.2 deste módulo, por meio da figura 1, abaixo relembrada. É importante comentar que a modalidade “pregão” pode tornar-se antieconômicapara a Administração Pública, as chamadas licitações deficitárias, visto que há casos em que o desconto obtido em um certame com esse tipo de modalidade – comparando-se o preço contratado com o preço inicial dos lances (orçamento referencial da Administração) – não alcançou o gasto despendido com o contingente de mão de obra envolvido no seu procedimento. Estudos nesse sentido vêm sendo feitos pela Controladoria-Geral da União (CGU), que concluiu que 85% dos órgãos da Administração direta realizam pregões deficitários.28 Para que se jogue mais luz sobre o debate, tome-se o posicionamento do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) e suas recentes ações quanto à adoção do pregão para a contratação de projetos pela Administração Pública. A unidade do CAU do estado do Rio Grande do Sul posicionou-se sobre o tema e tem alcançado repetidos êxitos nas ações judiciais ou ações de impugnação impetradas contra a modalidade pregão nesse tipo de contratação.29 Deve ser considerado que, ainda que o serviço de projeto a ser contratado seja de pequeno vulto, o tipo de licitação a ser escolhido deve ser o de “técnica e preço” nas modalidades “concorrência” ou “tomada de preços”, no caso da RFB, por definição da Portaria RFB/Sucor/Copol n° 566/2011, no seu art. 11: Art. 11. Nos procedimentos licitatórios para contratação de elaboração de projetos, deverá ser adotada licitação do tipo técnica e preço, podendo ser adotada licitação do tipo menor preço para as contratações com custo estimado até R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sem prejuízo da faculdade legal de contratação direta por dispensa de licitação (BRASIL, 2011, grifo nosso).Sabe-se que contratações de projeto têm pouca representatividade numérica no universo de contratações da Administração Pública. Não traria ônus à supremacia do interesse público o maior dispêndio de tempo e de recursos humanos da Administração para essa forma de contratação (licitações nas modalidades que não sejam o pregão), frente ao benefício que se teria com o resultado final do objeto fruto de um bom projeto, conforme já mencionado nos tópicos 2.1.1 e 2.1.2 deste módulo. Para projetos de maior vulto, no entanto, a modalidade ideal é o concurso. Esse é o entendimento da academia e dos órgãos de classe da engenharia e arquitetura. Notadamente, os grandes projetos em nível mundial, aqui definidos grandiosos pela sua qualidade, destaque e importância, aliados à quintessência da manifestação artística e tecnológica, foram desenvolvidos por meio de concurso. Exemplos desses projetos são a Ópera de Sidney, Austrália (figura 6); o Plano Piloto da cidade de Brasília, Brasil (figuras 7 e 8); o Museu Guggenheim, Bilbao/Espanha (figura 9); o Estádio “Ninho de Pássaro”, Pequim/China (figura 10); e a remodelação da Estação Central de Trens, Berlim/Alemanha (figura 11). André Baeta, auditor federal de Controle Externo do TCU, em artigo publicado em novembro/2014 na revista “Infraestrutura Urbana”,30 defende a contratação de projetos pela modalidade concurso. Segundo o auditor, há vantagens para a Administração Pública quando desse tipo de contratação, abaixo transcritas: 1) Com o concurso, contrata-se o melhor projeto, e não a melhor empresa. 2) A Administração Pública sabe qual é o projeto que está comprando, visto que, ao receber as propostas, a contratante avaliará desenhos conceituais, memoriais etc., ainda em fase preliminar. 3) O projeto é entregue no prazo, sem aditivos ou aumento de custos. 4) Há aumento da competitividade entre as empresas projetistas. 5) O melhor projeto é selecionado por especialistas da área. 6) Há isonomia e impessoalidade na seleção do melhor projeto. Assim, considerando-se as questões apresentadas no debate em torno do tema, é possível concluir que há grande vantagem para a Administração Pública na escolha da modalidade concurso ou licitações do tipo “técnica e preço” para a contratação de projetos. 2.1.6 A diferença entre direito autoral e direito patrimonial: autores e coautores – Parte 1 Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Reconhecer a proteção dos direitos autorais e a sua aplicação no âmbito do poder público como contratante. Surgida na Renascença, no início do século XIV, a questão dos direitos autorais trazia no seu conceito original a proteção aos editores, o que, na Inglaterra, foi chamado de copyright. Essa condição, fomentada pela então recente invenção da imprensa, tinha por objetivo garantir àqueles editores e livreiros a remuneração dos altos custos de impressão aos quais estavam submetidos, devido ao uso de gravuras (muito comuns nos primórdios da imprensa) ou outras informações adicionais. A proteção para os direitos do autor surgiria somente mais tarde, nos ares da Revolução Francesa, em oposição à condição protetiva inglesa, o que se chamou droit d’auteur. Essa condição trazia outra inovação: a divisão dos direitos em direitos patrimoniais e direitos morais, concedendo ao autor não só a proteção sobre a sua autoria, como também à propriedade da sua obra.31 No Brasil, a legislação sobre direitos autorais teve início ainda no período imperial, por meio da edição de normas vinculadas à proteção de obras jurídicas, com a criação dos primeiros cursos de direito, com alguma evolução ao longo do período republicano e sua consolidação, por meio da Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973, que reunia a legislação sobre o tema. Na Constituição da República de 1988 surge, pela primeira vez em um texto constitucional, a proteção dos direitos de autor como uma garantia individual. Vejamos o seu art. 5º: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar (BRASIL, 1988).32Dez anos depois é editada a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que revoga a lei de 1973 sobre o tema e que está em vigor atualmente, com recente alteração pela Lei nº 12.853, de 14 de agosto de 2013, incluindo a gestão coletiva dos direitos autorais, as duas regulamentadas pelo Decreto nº 8.469, de 22 de junho de 2015. No âmbito da Administração Pública e sua relação com os autores, aqui enfatizados os autores de obras intelectuais de projetos, um dos temas no nosso curso, é limitada a possibilidade de transferência daqueles direitos. Como contratante, a Administração tem a possibilidade de transferência para si apenas da parte relativa aos direitos patrimoniais do autor. Para tratarmos a questão, é necessário primeiramente que entendamos a divisão dos direitos autorais. Conforme a Lei nº 9.610/1998, esses dividem-se em patrimoniais e morais, a exemplo das primeiras manifestações do modelo legislativo francês sobre o tema. O seu art. 22 diz que ambos os direitos pertencem ao autor da obra intelectual. O direito moral, inalienável e irrenunciável, por tratar-se de direito que protege a criação de espírito, não pode ser transferido, e confere, ao autor, as seguintes prerrogativas, dadas no art. 24 da Lei n° 9.610/1998: Art. 24. São direitos morais do autor: I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra; III – o de conservar a obra inédita; IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-sea quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra; V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada; VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem; VII – o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado (BRASIL, 1988).33 Para os incisos V e VI, são ressalvadas as indenizações aos terceiros atingidos: “§ 3º Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se as prévias indenizações a terceiros, quando couberem” (BRASIL, 1998). O art. 26 traz importante informação: Art. 26. O autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado sem o seu consentimento durante a execução ou após a conclusão da construção. Parágrafo único. O proprietário da construção responde pelos danos que causar ao autor sempre que, após o repúdio, der como sendo daquele a autoria do projeto repudiado (BRASIL, 1998). Esse comando limita, portanto, a discricionariedade do contratante quanto à alteração da obra intelectual, e deve ser muito bem observado pela Administração Pública, aqui enfatizados os projetos contratados pelo poder público, sob pena de gerar ao autor, em eventuais alterações do objeto, o direito a indenizações. O segundo grupo de direitos do autor são os patrimoniais, relativos à propriedade da obra. Vejamos o que diz a Lei nº 9.610/1998 quanto a essa questão: Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica. Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: (...) X – quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas (...) Art. 37. A aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em contrário entre as partes e os casos previstos nesta lei (BRASIL, 1998). A leitura dos artigos acima indica a necessidade de transferência daqueles direitos patrimoniais pelo autor ao adquirente, para que esse possa fazer a utilização e o usufruto da obra. Quanto a isso, há previsão expressa na Lei nº 9.610/1998: Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em direito, obedecidas as seguintes limitações: I – a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os expressamente excluídos por lei; II – somente se admitirá transmissão total e definitiva dos direitos mediante estipulação contratual escrita (BRASIL, 1998). Assim, é necessário que a Administração Pública, como adquirente do direito patrimonial do autor (por meio da devida remuneração pela obra adquirida), faça constar no edital da licitação cláusula expressa, conforme demonstrado no inciso II do art. 49 da Lei n° 9.610/1998. Veja que, diante do que estabelece aquela lei, é importante também o cuidado da Administração Pública quanto à eventual alteração do objeto contratado. Na execução de obras, a partir da contratação de um Projeto Básico, conforme permitido pela Lei n° 8.666/1993, deve ser observado com elevado critério a elaboração do Projeto Executivo concomitante à obra, também autorizado pela referida lei. O Projeto Executivo em questão – com o significado que tem – já discutido no tópico 1.1.2, do Módulo 1 deste curso, deve configurar-se em mero detalhamento complementar, jamais podendo alterar a concepção original dada no Projeto Básico. Alterações naquela concepção geram a possibilidade de o autor buscar indenizações ou mesmo reparação judicial contra a ofensa ao seu direito moral. A coautoria, por conseguinte, é instituto que prevê a assunção da paternidade de uma obra artística ou trabalho técnico por dois ou mais autores. A sua manifestação é direta, por meio do acordo entre os participantes quando da composição do objeto, em que cada um dos autores contribui com a sua ideia na elaboração do intento, trazendo como resultado ideia única da combinação dessas. Os coautores têm igual peso na responsabilidade pelo objeto constituído e também iguais direitos. Essa é uma das razões pelas quais se deve tomar cuidado quando da revisão dos projetos contratados pela Administração Pública por meio da elaboração do Projeto Executivo concomitante à obra. Essa também é uma das razões para a contrariedade dos conselhos de classe (CAU/BR e sistema Confea/Crea) quanto a essa prática. Permitida pela Lei nº 8.666/1993, no seu art. 7º, essa condição prevê a possibilidade de complementação do Projeto Básico por meio do chamado Projeto Executivo, que pode vir a transfigurar o objeto original, o que se caracterizaria uma clara afronta ao direito autoral. Lembre-se de que a Lei nº 8.666/1993, conforme já exposto neste curso, no tópico 1.1.4, traz confusão nos conceitos de Projeto Básico e Projeto Executivo. Para que se afaste o risco de ofensa à autoria do projeto, a ação permitida para o momento da obra, em relação à revisão do projeto, deveria ser tão somente a de detalhamento complementar. Essa complementação teria apenas o caráter de esclarecimento da ideia advinda do projeto original (o Projeto Básico da licitação) eventualmente não detalhada, ou que possa ter gerado dúvida quanto à sua forma de execução, preservando a autoria do objeto, impedindo o risco de desobediência ao direito autoral e, desta forma, dando segurança à conduta do gestor do contrato. 2.2 Como receber um projeto de edificações? 2.2.1 O recebimento do projeto: o que deve ser observado? Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Indicar a necessidade de verificação das normativas técnicas e demais normativas legais citadas no projeto, sua vigência, a data da sua edição etc. Nos processos licitatórios, o edital de licitação e o seu Termo de Referência ou Projeto Básico são os elementos que definem os procedimentos para as contratações da Administração Pública. Dessa forma, ao ser recebido o projeto, toma-se como primeira ação do gestor a necessidade de análise do objeto quanto à observância das diretrizes expostas no Termo de Referência ou Projeto Básico do edital. Nessa ocasião, a revisão deve pautar-se na observação do atendimento ao programa de necessidades, à legislação, às diretrizes técnicas e aos objetivos expostos naquela peça processual. Simultaneamente a essa revisão preliminar, o gestor mergulhará na documentação do projeto para a identificação do atendimento aos itens de entrega obrigatória para o tipo de objeto. A relação desses itens deve sempre estar expressa no Termo de Referência ou Projeto Básico para que o gestor tenha a legitimidade na sua cobrança. Para a sua elaboração, no momento da montagem do edital, a Administração deve fazer constar as orientações das normas técnicas, a bibliografia sobre o assunto e as determinações dos conselhos profissionais. Complementarmente, e como rica fonte de consulta, pode-se observar as orientações do TCU, por meio da Portaria da Secretaria-Geral de Controle Externo (Segecex)nº 33, de 7 de dezembro de 2012, no seu item I.1.2.1 e no seu Anexo II. Os elementos mínimos a serem apresentados para o projeto de uma edificação de porte médio, conforme esse item da portaria, são: a) Levantamento topográfico; b) Sondagens; c) Projeto arquitetônico; d) Projeto de terraplanagem; e) Projeto de fundações; f) Projeto estrutural; g) Projeto de instalações hidrossanitárias; h) Projeto de instalações elétricas; i) Projeto de instalações telefônicas; j) Projeto de instalações de detecção e alarme e de combate a incêndio; k) Projeto de instalações lógicas; l) Projeto de instalações de climatização e ventilação mecânica; m) Projeto de instalação de transporte vertical. O conjunto de documentos do projeto deve contemplar as peças gráficas (pranchas de projeto), com a indicação da sua revisão e data, o Caderno de Encargos, o cronograma físico-financeiro e o orçamento detalhado, com a indicação da data-base para os preços tomados. No Caderno de Encargos, deve estar descrita a lista das pranchas de desenho integrantes do projeto, com a sua revisão e data. No cronograma físico-financeiro e no orçamento detalhado deve ser mostrado o título do projeto para a sua fácil identificação. As pranchas de desenho devem ser apresentadas dentro das normas da ABNT, condição que deve estar expressa no edital. Essa condição vale também para o Caderno de Encargos. Esse documento, conforme o tamanho do objeto, atinge o volume de 400 páginas ou mais, razão pela qual deva ser apresentado com sumário. Recomenda-se que o sumário siga a mesma sequência numérica que será apresentada na planilha orçamentária, o orçamento detalhado. Essa forma de ordenação não somente torna mais coesa a informação apresentada pelo autor do projeto, como possibilita a facilitação do trabalho futuro do executor da obra e, principalmente, do seu fiscal. Para a conferência da documentação entregue, o gestor do contrato pode valer-se da adoção de lista de checagem, documento que poderá ser anexado ao processo. As observações quanto ao recebimento do objeto devem ser registradas em relatório de análise, que servirá de documento de comunicação com a licitante e também será integrado ao processo. Deve também ser observada pelo gestor do contrato a indicação da data de edição das leis ou normas técnicas referenciadas pelo autor do projeto. É comum a citação de normas técnicas sem vigência ou que tenham sido substituídas por outras normas, mais atualizadas, bem como a referência a leis que tenham sido revogadas. Esse é um dos principais erros cometidos nos projetos, assunto que será retomado em tópico deste módulo. 2.2.2 A responsabilidade do gestor de contrato Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Enfatizar a responsabilidade do gestor do contrato de elaboração do projeto frente ao objeto entregue, em relação a soluções, quantitativos, custos etc. Na Administração Pública, o gestor de contrato responde solidariamente pelos danos causados à Fazenda Pública (arts. 25, 50 e 71 da Lei n° 8.666/1993) ou por atos praticados no exercício das suas funções (arts. 121 e 122 da Lei nº 8.112/1990). Vejamos os exemplos: Art. 25. (...) § 2º Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis (BRASIL, 1993, art. 25, § 2º). Art. 121. O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições (BRASIL, 1990, art. 21).34 Perceba que as ações dos agentes públicos devem, portanto, estar sempre amparadas em normativas legais que as legitimem. Essa condição estende-se às ações de contratação e recebimento de um objeto, aqui especificamente tratado o projeto. A mesma observação aos critérios legais que deve ter o gestor de contrato quando da elaboração dos editais de contratação deve ser aplicada quando do recebimento do projeto e da sua consequente revisão e aceitação. Jurisprudência recente do TCU traz o entendimento da matéria por aquela corte. Vejamos o que dizem os acórdãos: 1. A aprovação de Projeto Básico inadequado, com grandes implicações nos custos e prazos de execução do empreendimento, reveste-se de gravidade suficiente para justificar a apenação pecuniária do gestor responsável e a sua inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança no âmbito da Administração Pública Federal (BRASIL, 2015).35 1. A aprovação de Projeto Básico que não atenda ao disposto no art. 6º, inciso IX, e no art. 12 da Lei 8.666/1993 pode ensejar a responsabilização dos pareceristas da área técnica que endossaram o projeto. (...) Ressaltou o relator não ser “essa a conduta que se esperava dos pareceristas do DEG, que poderiam ao menos ter questionado a empresa projetista acerca dos parâmetros utilizados para elaboração do projeto, efetuando estudos comparativos com outras obras semelhantes e de mesmo porte” e, no tocante ao volume de concreto das estruturas, “a conferência da memória de cálculo da empresa projetista ou dos levantamentos realizados pela licitante poderia atestar com precisão a necessidade de eventuais ajustes no projeto”, mas, ainda que formalmente avisados das supostas falhas no projeto, os pareceristas não tomaram as medidas adequadas para sanar as pendências. Enfatizou ainda o relator que, além dos expressivos acréscimos verificados no custo da obra, “a deficiência do Projeto Básico trouxe um atraso de quase um ano no andamento do empreendimento em vista das negociações que pautaram a celebração do primeiro termo aditivo”. Por isso, no voto que veio a ser aprovado pelo Colegiado, propôs aplicação da multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992, individualmente a cada um dos pareceristas, e o acolhimento das razões do diretor de engenharia, que assinara o contrato amparado no parecer técnico (BRASIL, 2016).36 Analisando-se os pressupostos legais citados, percebe-se claramente a responsabilidade do gestor quanto aos seus atos administrativos. Essa estende-se por consequência às questões específicas da sua função e habilitação, por meio da escolha das soluções técnicas a serem adotadas na elaboração do objeto – o projeto, por exemplo – e a criteriosa análise daquelas soluções propostas pelos projetistas. Essa condição está amplamente amparada no Acórdão nº 915/2015 – TCU – Plenário, acima citado, visto que dada a discricionariedade do gestor de contrato na aprovação do projeto, pode-se configurar a desobediência aos princípios da economicidade e da razoabilidade. Por todas as razões citadas, ainda que a Administração Pública contrate o projeto ou a obra com profissional ou empresa qualificados e habilitados, ou que tenha igualmente o assessoramento técnico de empresa ou profissional habilitados e qualificados, é também de sua responsabilidade qualquer erro formal, imperícia ou negligência, por meio dos seus agentes públicos. Essa condição confirma a ideia de que é altamente recomendável que os órgãos públicos que tenham no seu organograma setores responsáveis pela contratação de projetos, obras ou quaisquer serviços de engenharia, contem com profissionais legalmente habilitados e com constante processo de qualificação. No âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRF), do MF, a Portaria RFB/Sucor/Copol nº 566, de 30 de novembro de 2011 – dispõe sobre os procedimentos relativos à elaboração de Projetos Básicos e Executivos, bem como à execução de obras, serviços de engenharia, reparos e adaptações no âmbito da SRF – determina o seguinte, no art. 3º, parágrafo1º, do seu Anexo I: Art. 3º Após a definição do Programa de Necessidades deverá ser elaborado o anteprojeto. Este documento constitui a configuração inicial da solução arquitetônica para a obra, considerando as principais exigências contidas no Programa de Necessidades. § 1º O anteprojeto, sempre que possível, deverá ser elaborado por servidor devidamente habilitado do Ministério da Fazenda, preferencialmente da Secretaria da Receita Federal do Brasil (BRASIL, 2011). 2.2.3 A importância da observação da representação gráfica na apresentação de projetos Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Identificar os erros mais comuns observados nos projetos; • Reconhecer a consequência gerada pelo recebimento de um projeto com deficiência na sua representação gráfica e os prejuízos daí advindos. Você sabia que o desenho de projetos, que resulta na sua representação gráfica, assume notadamente dupla função? A primeira está diretamente ligada ao processo criativo, à geração da ideia, ao significado e ao teste das possibilidades, tema tratado dentro do campo da semiótica e intensamente desenvolvido por autores dedicados ao estudo do pensamento complexo. Nessa ação, a forma de representação certamente terá influência sobre o resultado final, condicionando inclusive a fluidez das ideias do projetista. A escolha do instrumento de representação gráfica condicionará a síntese do seu pensamento criativo e o sucesso da intenção de projeto.37 Não nos deteremos nessa questão neste curso; ela é citada apenas como referência ao potencial apresentado pelos diversos instrumentos de representação gráfica. A segunda função remete à comunicação, como o próprio nome demonstra, à correta representação da intenção do seu autor. Melhor comunicação haverá entre o comunicante do projeto (o seu autor) e o seu leitor, quanto maior for a precisão e a correção da representação. Bertin (1986)38 esclarece essa condição por meio da relação da ação inventiva das ideias, com a sua representação: ETAPAS DA DECISÃO REPRESENTAÇÃO GRÁFICA • Definir o problema; • Construir o quadro de dados. • Análise matricial do problema (definição de questões). • Adotar uma linguagem de tratamento; • Tratar os dados categorizando os dados exaustivos. • Tratamento gráfico da informação (descobrir as respostas). • Interpretar para decidir e para comunicar os dados simplificados. • Representação gráfica de comunicação (comunicar as respostas encontradas). Observando-se o quadro acima, percebe-se a complexidade do processo que resulta na correta representação gráfica do objeto. Assim, o desenho final deverá ser esclarecedor da intenção do seu autor, sob pena de falhar na comunicação do objetivo pretendido. Durante muito tempo a representação gráfica teve por objetivo apenas o registro dos objetos. A partir do século XV, iniciou-se a transformação da forma comunicativa, incorporando ações criteriosas de análise qualitativa do objeto representado por meio da riqueza de elementos dos instrumentos da sua representação. Essa mudança deu-se por intermédio de Filippo Brunelleschi, arquiteto italiano da Renascença, e a potencialidade comunicativa dos seus desenhos e esboços. Ao vencer o concurso para o projeto da cúpula da Catedral Santa Maria Del Fiore, em Florença, Brunelleschi utilizou instrumentos de representação gráfica que mostravam notável compreensão do funcionamento estrutural da cúpula e a criteriosa análise do sistema construtivo, por meio da representação figurada.39 Na mesma época, Leon Battista Alberti, arquiteto e pintor italiano renascentista, complementando o trabalho iniciado por Brunelleschi, assinalou outro marco na arquitetura e na engenharia, utilizando na representação de seus desenhos a análise científica da perspectiva, o que consolidou a forma de apresentação de perspectivas utilizadas atualmente, as perspectivas cônicas. A ABNT apresenta a NBR 6294/1994, atualmente em revisão, como normativa para a representação gráfica em projetos de arquitetura. Muito embora específica para essa disciplina, por analogia pode-se adotá-la como orientação para a representação gráfica de todas as demais disciplinas que concorrem para o projeto de uma edificação (estrutural, elétrico, ar condicionado, hidrossanitário, etc.). Essa norma determina a correta forma de apresentação do projeto de arquitetura, por meio da escolha das linhas de representação, dos elementos mínimos necessários, do formato das pranchas de desenho, das técnicas de representação, etc. Compete ao gestor de contrato a exigência de atendimento a tal norma quando da contratação dos projetos da Administração Pública. A incorreção e a imprecisão na representação gráfica dos projetos contratados podem possibilitar erros de interpretação dos desenhos por parte das licitantes, e, com isso, permitir conclusões equivocadas quanto à técnica construtiva ou em relação aos quantitativos do projeto, refletindo diretamente na formação do preço da obra. Os principais erros de representação gráfica encontrados nos projetos são: (vídeo explicativo no portal) 1. Não correspondência entre o corte do desenho e a sua marcação em planta baixa. Essa condição pode levar à interpretação errada do comando construtivo quando da execução da obra, onerando o seu custo pela necessidade de correção (demolições e ajustes), quando detectada pelo fiscal. 2. Não correspondência entre a legenda e os desenhos do projeto. Essa situação pode causar, nos projetos de instalações, a interpretação errada dos tipos de elementos (tubulações, fiação etc.), ocasionando a quantificação equivocada de materiais. 3. Cotagem errada dos elementos de desenho, o que pode levar à incorreta interpretação das medidas e à consequente execução equivocada da obra ou quantificação de materiais. 4. Erro na representação das linhas de desenhos, especialmente nos cortes e vistas, ocasionando a interpretação incorreta dos elementos e levando à execução em desacordo com o projeto, o que gera a necessidade de demolição e nova execução, onerando o custo da obra. 5. Falta de indicação das bitolas das tubulações nas instalações hidrossanitárias, em plantas baixas, ou sua indicação parcial. Essa situação gera dúvidas quanto às bitolas corretas, de acordo com o trecho e a hierarquia da rede, levando à eventual quantificação errada das diferentes bitolas. A figura demonstra a falta de informação quanto ao diâmetro da tubulação da instalação de chuveiros automáticos para prevenção de incêndio no seu trecho terminal, o que gera a dúvida sobre qual é o diâmetro correto que deve ser adotado. Perceba, portanto, caro aluno, que muito mais do que uma forma simplificada de registro das intenções de projeto, a representação gráfica tem importante função, por ser a ação responsável principalmente pela comunicação e pelo consequente entendimento da ideia a ser transmitida. Projetos, muitas vezes simplificada e depreciativamente chamados de meros “desenhos”, especialmente por leigos, são, na verdade, complexas ações de desenvolvimento e manifestação das intenções e ideias do seu autor, podendo condicionar o sucesso ou o fracasso do seu objeto. 2.3 Coordenando um projeto de edificações 2.3.1 A coordenação do projeto de edificações Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Observar a interdependência dos projetos que compõem uma edificação, a interferência de um projeto em outro e as consequências das decisões isoladas. Dentro da atividade de projeto, a coordenação assume condição de destaque, configurando-se em uma das iniciativas de maior importância a partir do seu projetista.Nos editais da Administração Pública para a contratação desse tipo de serviço, a coordenação de projetos deve estar listada como uma das atividades que comporão o serviço prestado e que deve ser tratada com ênfase, dada a sua importância. A despeito da discussão jurídica existente entre os conselhos profissionais (Sistema Confea/Crea e CAU/BR)40 sobre a legitimidade para o desenvolvimento dessa atividade, saiba que a sua responsabilidade é exclusiva daquele profissional que concebe o projeto. Assim, espera- se que, nos projetos desenvolvidos por engenheiros, a sua coordenação a eles seja vinculada, e que nos projetos desenvolvidos por arquitetos imponha-se a mesma lógica. Naturalmente, nos projetos relacionados à infraestrutura (pontes, estradas, barragens etc.), normalmente desenvolvidos por engenheiros, estes também assumirão a figura de coordenadores. Por outro lado, nos projetos de edificações, normalmente desenvolvidos por arquitetos, a responsabilidade recai sobre tais profissionais. Este curso não tem por objetivo acalorar a polêmica sobre as competências privativas ou compartilhadas de tais profissionais, mas é importante esclarecer a necessária atuação do responsável pelo projeto, seja ele arquiteto, seja engenheiro, na sua coordenação. Afinal, a coordenação do projeto garantirá a sua qualidade e somente o seu criador, que o concebe, tem condições plenas de tomada de decisões sobre a sua forma de elaboração. Ainda que essa atividade possa ser desenvolvida por outro profissional, dos quadros do órgão público, ou contratado para tal, na forma de atividade de revisão do projeto, é incomparável o domínio do processo pelo seu projetista. Mas o que é a coordenação do projeto? Para responder a essa questão, deve ser inicialmente entendido como um projeto é concebido. Especialmente em projetos de arquitetura, a soma das variáveis envolvidas apresenta questões de ordem formal (formas arquitetônicas), teórica (teorias de arquitetura), estética, análise de estruturas (sustentação do edifício, no caso de edificações), análise de instalações (subdisciplinas como instalações elétricas, hidrossanitárias, de climatização e ventilação mecânica etc., no caso de edificações) e completa normativa técnica e legal aplicada ao campo de atuação. Para consolidar todas essas variáveis há várias formas de abordagens, o que requer a atuação do coordenador, em um processo de grande complexidade.41 A coordenação é então o teste contínuo e sistemático de integração, interdependência e consolidação de influências dessas variáveis, de forma a buscar o melhor resultado possível na concepção final do objeto. Dada a ideia acima, conclui-se que o profissional legítimo para a ação de coordenação do projeto deve efetivamente ser o seu criador. Comumente confundida com gerenciamento de projetos, a coordenação representa atividade inerente ao processo criativo e não pode ser delegada. Enquanto o gerenciamento atua no controle de prazos e processos, promovendo a intermediação entre os profissionais ou as atividades envolvidas na elaboração de um projeto, a coordenação promove a integração do projeto, é inata do seu processo e exclusiva do seu agente. A falta da coordenação nos projetos possibilita o surgimento de lacunas ou questões não respondidas, que resultam na imprevisão de soluções, acarretando o incremento dos custos da execução das obras dele advindas. Na Administração Pública, cujo roteiro a ser seguido encontra variadas regras e procedimentos, a falta dessa iniciativa causa prejuízos financeiros significativos. Uma boa coordenação de projetos a partir do seu projetista minimiza a necessidade de revisão dos projetos por parte do órgão público, economizando tempo e mão de obra. Minimiza também os erros de orçamento, visto que a coordenação identifica incompatibilidades que possam existir entre as diversas subdisciplinas integrantes de um projeto. Finalmente, e não menos importante, pode-se dizer que a coordenação do projeto atua no resultado formal e estético do objeto, ao controlar as interferências intrínsecas do processo projetivo, de uma disciplina em outra, cuja falta de controle poderia condenar a beleza, a funcionalidade e o desempenho do produto final. A atuação do projetista não se limita, então, ao domínio da sua especialidade. A sua responsabilidade estende-se à amarração das informações que consolidem o objetivo pretendido, representado pelo objeto de arquitetura ou engenharia, seja ele uma edificação, seja elemento de infraestrutura urbana ou viária. Ao arquiteto, desenvolvedor do projeto de arquitetura de uma edificação, cabe a tomada de decisão, assessorado pela sua equipe de projetistas complementares, sobre o sistema ideal de condicionamento do ar, alimentação de água fria ou quente, esgoto pluvial e sanitário, elementos estruturais ou qualquer outra infraestrutura que integre o objeto. Ao engenheiro, desenvolvedor de um projeto de infraestrutura urbana ou viária, cabe a tomada de decisão, igualmente assessorado pela sua equipe de projetistas complementares, sobre o sistema ideal a ser adotado pelas demais disciplinas que integrem aquele projeto. Nos dois casos, os únicos profissionais que têm plenas condições de dar as melhores soluções globais e integradas para o produto final são os responsáveis pela sua concepção, pois somente eles detêm com clareza a ideia formal sobre o objeto desenvolvido. 2.3.2 A compatibilização dos projetos Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Distinguir o conceito de projeto (desenhos, orçamento e Caderno de Especificações); • Reconhecer a necessidade de uma análise completa de todos os documentos que compõem um projeto e a sua inter-relação. No tópico anterior, procurou-se identificar o conceito de coordenação de projetos, examinando as ações envolvidas no processo criativo do projeto e a sua distinção do conceito de gerenciamento de projetos, atividade que atua notadamente no controle dos processos, prazos e intermediação dos atores envolvidos na elaboração de um projeto. Por ser termo de amplo significado, o gerenciamento de projetos aplica-se a várias áreas do conhecimento humano, e não somente à construção civil. A compatibilização de projetos, seguindo-se tal linha de raciocínio, pode ser entendida como um nível mais específico de atuação do projetista na elaboração do seu projeto. Os termos “coordenação” e “compatibilização” de projetos têm conceitos similares, muitas vezes se confundindo. O primeiro, no entanto, é mais abrangente, conforme apresentado no tópico anterior. A compatibilização de projetos dedica-se a um nível mais imediato da sua análise e está refletida principalmente na sua representação gráfica e nas suas interferências. Note-se que, na apresentação desses conceitos (coordenação, gerenciamento e compatibilização de projetos), a figura do projetista toma grande importância. A Administração Pública como gestora do contrato (conceito apresentado no tópico 2.2.2 deste módulo) tem a responsabilidade sobre o projeto, pelo qual responde, subsidiariamente, a projetista, sendo inclusive passível de denúncia por órgão de auditoria ao conselho profissional, quando da sua má atuação e quando causadora de prejuízos à Administração. O projeto de uma edificação (ou de elemento de infraestrutura urbana ou viária) é composto obrigatoriamente de alguns elementos, a saber: os desenhos gráficos, o Caderno de Encargos e a planilha orçamentária com cronograma físico-financeiro. É recorrente o entendimento, especialmente pelos leigos, de que um projeto é representado pelo conjunto de pranchas de desenho que o representam. Muitas vezes equivocadamentechamadas de “plantas”, as folhas integrantes desse conjunto são apenas o item “desenhos gráficos” do pacote do projeto. A esse somam-se o documento descritivo da sua materialização (Caderno de Encargos) e os documentos quantificadores e formadores de preço do seu objeto (planilha orçamentária e cronograma físico- financeiro). Cada um desses elementos deve estar perfeitamente integrado aos demais, sendo obrigação precípua do projetista a sua coesão, coerência e consolidação. Subsidiariamente compete à Administração Pública, por meio do gestor de contrato, a completa revisão desses elementos para a verificação da sua integração. A compatibilização de projetos deficiente promove a dúvida sobre a decisão a ser tomada, na eventualidade de contradição de informações entre os documentos de um mesmo projeto, podendo gerar prejuízos financeiros à Administração Pública. Um mesmo item do projeto deve ter idêntica especificação nas pranchas de desenho, no Caderno de Encargos e na planilha orçamentária, e essa consolidação é obrigação do projetista, o autor e criador do projeto. Ao gestor do contrato, arquiteto ou engenheiro, é obrigatória a revisão desses elementos para que se identifiquem eventuais incompatibilidades de informações, tornando-se essa uma responsabilidade solidária, em jurisprudência pacificada pelos Tribunais Superiores e órgãos de controle, conforme já demonstrado ao longo deste curso. Caso ocorra tal situação, deve ser gerado relatório ao projetista, para que este promova as devidas correções e esclareça as dúvidas e contradições. Na hipótese de não identificação de incompatibilidades existentes nesse conjunto de documentos no momento da contratação do projeto e após o seu aceite, caberá ao fiscal da obra, durante a execução, a mediação da solução, buscando sempre o esclarecimento das dúvidas junto ao projetista. Eventuais alterações em quantitativos e valores daí advindos deverão ser realizadas. Dentro do conjunto das pranchas de desenho, os seus diversos elementos gráficos devem igualmente apresentar coerência e relação entre si. Essa condição, tratada no tópico 2.2.3 deste módulo, evita o surgimento de dúvidas por eventuais informações desencontradas que possam haver entre os diversos desenhos integrantes do conjunto de pranchas gráficas. Erros dessa ordem são muito comuns nos projetos da construção civil, em função da falibilidade do procedimento de composição de desenhos pelo método atualmente adotado, o uso de softwares de CAD (Computer Aided Design – ou Projeto Assistido por Computador). A necessidade de geração dos seus diversos elementos em momentos distintos muitas vezes possibilita esse desencontro de informações. As novas tecnologias, especialmente o conceito BIM, trazem alto grau de precisão na produção integrada dos diversos desenhos de um projeto, assunto que será tratado no tópico 2.3.4. Os elementos “Caderno de Encargos” e “planilha orçamentária”, tanto quanto possível, devem ter estrutura de organização similar. Assim, a listagem dos itens da planilha orçamentária deve buscar obedecer à distribuição dos itens trazida no sumário do Caderno de Encargos, com numeração sequencial hierarquizada para os diversos elementos do projeto. 2.3.3 O “projeto-mãe” em projetos de edificações Ao final deste tópico, o aluno será capaz de: • Identificar a importância do projeto de arquitetura no projeto de edificações, como referência para todos os demais projetos. Como você já pôde ver em tópicos anteriores, o projeto de uma edificação envolve um grande número de disciplinas de acordo com as instalações específicas que serão necessárias no edifício. Como também já destacado, esses projetos devem guardar estreita e coerente relação entre si. Em um edifício de porte médio, convencional, com vários pavimentos, destinado a escritórios ou instalações administrativas, no atual estágio da construção civil, serão necessários os seguintes projetos, minimamente: • Projeto de arquitetura; • Projeto estrutural (concreto armado, metálico ou madeira); • Projeto de instalações hidrossanitárias (água fria e/ou quente, esgoto sanitário, esgoto pluvial, água de reúso); • Projeto de instalações elétricas (tomadas, pontos de força e iluminação); • Projeto de instalações de rede lógica (dados e voz); • Projeto de instalações de CFTV (circuito fechado de televisão); • Projeto de controle de acesso; • Projeto de instalações de climatização e ventilação mecânica; • Projeto de prevenção e proteção contra incêndios (sistemas passivos e ativos – saídas de emergência, iluminação de emergência, hidrantes, chuveiros automáticos etc.); • Projeto de elevadores; • Projeto de GMG (grupo motogerador); • Projeto de urbanização e paisagismo. E ainda, conforme o detalhamento do projeto: • Projeto de esquadrias; • Projeto de revestimento de fachadas; • Projeto de cogeração de energia; • Projeto de tratamento de efluentes. Essas disciplinas, com seus desenhos finalizados integrando o conjunto impresso da documentação de projeto, da forma como é praticado atualmente, resultam em centenas de pranchas de desenho, chegando facilmente a 500 pranchas, nos formatos A1 ou A0, para edifícios de médio porte (dez pavimentos, com área construída entre 20.000 e 30.000 m²). Esse complexo conjunto de desenhos tem como ordenador inicial o projeto de arquitetura. Embora tal informação possa parecer óbvia, é comum a sua incompreensão, em que se verifica muitas vezes a adoção da premissa errada para a elaboração de uma determinada disciplina, ao basear-se em projeto diferente do projeto de arquitetura. Para que se consolide o entendimento, vejamos o que determinava a ABNT NBR 13531:1995 – Elaboração de projetos de edificações – Atividades técnicas: Essa norma técnica foi cancelada em 2017, estando em processo de revisão, tendo sido substituída pelo conjunto de normas ABNT NBR 16636:2017 – Elaboração e desenvolvimento de serviços técnicos especializados de projetos arquitetônicos e urbanísticos.42 O texto da norma em vigor traz, na sua parte introdutória, a seguinte orientação: Naturalmente, a interação dos projetos faz com que tal lógica seja contrariada em casos específicos. Pode-se citar como exemplo a necessidade de dimensionamento, no projeto elétrico, dos pontos de força que alimentarão as máquinas climatizadoras ou ventiladoras, informação advinda do projeto de climatização e ventilação mecânica. Certamente, nesse caso específico, a melhor fonte de informação é realmente aquele projeto de instalações de climatização, visto que o projeto de arquitetura não apresenta tal informação, tampouco se propondo a apresentá-la. Excetuando-se essas condições específicas, que deverão ser coordenadas pelo autor do projeto, todas as disciplinas devem remeter-se às orientações dadas no projeto de arquitetura, sob pena de a representação gráfica da disciplina em questão não ser clara, sendo por vezes confusa e ilegível, conforme for a base de desenho equivocadamente escolhida para a sua elaboração. A figura 15 mostra o resultado indesejado gerado pela escolha da base de desenho do projeto de climatização e ventilação mecânica para a elaboração do projeto de prevenção de incêndio. Note-se que o desenho não está legível, causando dificuldade na identificação dos elementos que efetivamente interessam naquele desenho, as instalações de prevenção de incêndio. Dentro do retângulo vermelho é mostrada a área que foi ampliada na figura 16, em que se pode identificar em destaque os elementos do projeto de climatização e ventilação mecânica (tubulação de insuflamento de ar exterior e evaporadoras), em detrimento da representação
Compartilhar