Buscar

A técnica da Leitura Labial

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

A técnica da Leitura Labial. 
Uma prática muito comum entre quem possui deficiência auditiva é “ouvir com os olhos”. Não nos 
referimos aqui ao uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras, mas sim à técnica da Leitura Labial 
(também chamada de Leitura Orofacial), muito usada entre os adeptos do Oralismo, isto é, 
deficientes auditivos cuja língua materna é o Português e que usam sua fala e resíduos auditivos 
para se comunicar oralmente. A Leitura Labial consiste na observação do posicionamento dos lábios 
do falante para que, junto com os sons ouvidos (ou não), a pessoa com deficiência auditiva consiga 
ter uma maior facilidade para compreender a mensagem falada pelo outro. 
Élen Muzy, portadora de surdez profunda devido à meningite e implantada há mais de 15 anos, 
conta sobre a importância da Leitura Labial em sua vida. “Quando perdi minha audição aos 11 anos 
de idade, no começo foi muito difícil. Eu estava com uma nova vida e não conseguia entender 
ninguém. Tinha que ficar andando com um caderno para que as pessoas escrevessem o que falaram 
quando eu não entendesse. Isso era muito chato e me deixava para baixo. Então eu fui aprendendo 
sozinha a Leitura Labial, na escola e no dia a dia. Mas como eu não ouvia mais, e minha fala estava 
mudando, tive que ir para a fono. Lá, fazia exercícios para não deixar a fala de lado e treinava 
também a Leitura Labial. Hoje, com o Implante Coclear, eu escuto muito bem, mas não consegui 
deixar o hábito de ler lábios. Eu pratico os dois, a audição e a leitura. É como um vício mesmo”, 
conclui. 
Não são apenas os indivíduos com surdez que utilizam esta técnica. Em 
ambientes barulhentos, as pessoas ouvintes também podem buscar apoio na Leitura Labial para 
ajudar na compreensão da fala alheia. Pesquisadores do Instituto Max Planck para Cognição 
Humana e Ciências Cerebrais (Alemanha) descobriram, em 2012, que o sulco temporal superior 
esquerdo (região do lobo temporal cerebral) é a área do cérebro, presente em todos os humanos, 
responsável por entender o que uma pessoa diz sem escutá-la direito. Quanto maior a ativação do 
sulco temporal superior esquerdo, melhor será a habilidade de Leitura Labial de cada pessoa. 
Também em 2012, outro estudo realizado no Florida Atlantic University (Estados Unidos) revelou 
que os bebês fazem uso da Leitura Labial nos seus pais para aprender a falar. Com o 
desenvolvimento da audição e da linguagem da criança, por volta do primeiro ano de vida ela 
abandona o uso desta técnica. Porém, nas crianças com deficiência auditiva, dependendo dos 
estímulos recebidos e do grau da perda da audição, a Leitura Labial poderá continuar sendo usada 
ao longo da vida. 
Este foi o caso de Melissa Peres, de 14 anos e implantada desde fevereiro de 2013. “A Leitura Labial 
foi uma coisa que eu aprendi naturalmente, pois sem isso não conseguiria viver no mundo dos sons 
hoje. Mas eu acho que começou quando eu aprendi a falar, pois para falar, temos que conhecer as 
palavras, e para conhecê-las, temos que ouvi-las. Como, no meu caso, eu não ouvia, então comecei 
a observar de onde as palavras saíam, e assim aprendi a captar as palavras”, conta ela. 
As limitações da Leitura Labial 
Sabe-se que esta técnica auxilia muito na adaptação do indivíduo com surdez aos seus Aparelhos de 
Amplificação Sonora Individual (AASI) ou Implante Coclear (IC). Recomenda-se o uso da leitura dos 
lábios junto com os resíduos auditivos do paciente porque a Leitura Labial não é um método 
infalível. Diz-se que até o melhor leitor labial só consegue compreender em torno de 50% das 
palavras articuladas sem som, pois muitos fonemas (unidades mínimas das palavras) possuem uma 
articulação invisível ou a mesma articulação que outros. A pronúncia de sons como “p” e “m”, “d” e 
“n” e “s” e “z”, pode ser facilmente confundidas entre si. 
Daí observa-se que o contexto da mensagem, assim como a intuição e a experiência do leitor labial, 
influencia muito no sucesso da comunicação através desta técnica. O mesmo vale para a Leitura 
Labial em outros idiomas. No Inglês, por exemplo, estima-se que apenas 30% a 40% dos sons são 
distinguíveis de vista. Renata Orsi, recém-implantada este ano e residente nos EUA, nos conta um 
pouco sobre suas experiências por lá. 
“Creio que aprendi esta técnica instintivamente, desde a infância, e agora faço Leitura Labial 
também em inglês, porque moro nos EUA. O inglês é mais difícil, já que não é minha primeira 
língua, e tem mais palavras labialmente parecidas do que no português. Como tenho um residual 
auditivo razoável, que faz com que eu tenha um ganho bom com o AASI no outro ouvido, consigo 
diferenciar. Claro que tenho muitas dificuldades, e peço para falarem mais devagar, mas estou 
fazendo a reabilitação auditiva nos dois idiomas: em inglês e também em português”, diz Renata. 
A Leitura Labial exige muito mais esforço do que a comunicação apenas por meio da audição. As 
mensagens podem levar alguns segundos a mais para serem entendidas pelos praticantes da 
técnica, que, pela concentração visual que devem manter, sentem-se com a visão mais fatigada ao 
final do dia. Empecilhos também podem ocorrer e dificultar a comunicação, como quando o 
interlocutor tampa inconscientemente a boca com a mão ou outro objeto, o formato dos lábios ou se 
a pessoa articula bem eles, o movimento ou desvio da cabeça do falante, a iluminação do local e se 
há mais de uma pessoa falando ao mesmo tempo. 
Como aprender a ler lábios? 
A grande maioria dos leitores labiais aprende a técnica sozinhos, com o 
treino diário. Segundo a fonoaudióloga da ADAP, Marcella Giust, a prática no dia-a-dia, observando 
os lábios das pessoas durante as situações comunicativas, é a melhor forma de se adquirir esta 
técnica. Mas as crianças, principalmente, costumam treinar a Leitura Labial com o apoio do 
profissional fonoaudiólogo, que neste caso pode se utilizar de uma sequência gradativa de 
reconhecimento das palavras (fonemas, vocábulos e frases), bem como material de suporte, como 
espelhos e vídeos legendados. Também muitas vezes é importante avisar à pessoa com quem se 
conversa para ela falar em um ritmo mediano, não muito rápido, mas também não muito lento, e 
articular bem as palavras. Para obter as dicas e o passo-a-passo de um bom treino em Leitura 
Labial, clique aqui. 
A implantada Cindia Tomasi Panciera comenta sobre como sua fonoaudióloga lhe ensinou a ler 
lábios. “Aprendi logo depois que fiquei surda, com oito anos de idade. Foi difícil no começo, mas logo 
me adaptei. A fono fazia comigo exercícios de pronúncia de fala olhando no espelho, encostando a 
mão na garganta para eu sentir como deveria falar também. Aí, em casa, minha mãe me ajudava a 
continuar os exercícios”, explica. 
Já Luismar Alves de Souza conta que aprendeu sozinho a técnica da Leitura Labial. “Na época da 
perda auditiva, aos 12 anos de idade, usei de várias artimanhas para treinar ler lábios. Fazia 
perguntas que eu mesmo já sabia a resposta, com a intenção de confirmar. Inventava palavras, 
frases e textos. Escrevia e pedia para minha irmã recitar para mim sem eu saber qual era a frase, e 
ficava olhando em sua boca, lendo os lábios dela. Tive um resultado satisfatório, alcançando a 
excelência de acordo com a melhora de minhas condições clínicas. Agora, depois do IC, continuo na 
mesma prática, porém, houve uma alteração considerável, pois preciso aprender a conciliar o 
barulho da voz, que ainda é só um arranhado, com a leitura labial. Esta dificuldade se torna mais 
amena nas fonoterapias, porque as fonoaudiólogas tem conhecimento, são treinadas em suas 
atividades profissionais”, relata. 
Uma curiosidade extra: em 2009, pesquisadores da Universidade Britânica East Anglia, em parceria 
com outras instituições, desenvolveram o protótipo de um software de Leitura Labial para auxiliar no 
reconhecimento de discursos captados em vídeos. Assim como em algunsprocessadores de textos, 
basta a pessoa começar a falar e o programa identifica automaticamente o idioma e o transforma 
em palavras escritas. Até o momento, o software consegue detectar os seguintes idiomas: inglês, 
francês, alemão, árabe, mandarim, cantonês, italiano, polaco e russo. 
 
Por Ana Raquel Périco Mangili.

Continue navegando