Buscar

Identidade profissional de docentes da educação infantil: a re/construção na e pela prática pedagógica

Prévia do material em texto

IDENTIDADE PROFISSIONAL DE DOCENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: 
A RE/CONSTRUÇÃO NA E PELA PRÁTICA PEDAGÓGICA 
 
 
Gislaine Azevedo da Cruz 
PPGEDU/UFGD 
 
Eixo Temático 3- Identidade e formação docente 
 
 
Resumo: 
O trabalho busca realizar uma breve reflexão com base num recorte de monografia 
sobre a identidade de professoras da educação infantil do Município de Dourados/MS, a 
partir das práticas pedagógicas desenvolvidas pelas docentes diariamente nos Centros de 
Educação Infantil, sendo a regente e a assistente. O foco será sobre realização docente, 
a definição profissional e as representações de “boas” professoras da educação, 
características essas que influenciam na construção e reconstrução das identidades das 
professoras da educação infantil, para tanto traremos ao texto alguns dos relatos obtidos. 
A partir da perspectiva da pesquisa qualitativa tendo como base os depoimentos 
coletados por meio de entrevistas semi-estruturas. Tendo ainda, como aporte teórico 
autores/as que abordam sobre: formação e trabalho docente, educação infantil e 
especificamente sobre identidade profissional. Deste modo, esperamos contribuir com a 
reflexão vigente acerca da valorização das profissionais da infância. 
 
Palavras-chave: Identidade docente. Práticas Pedagógicas. Educação Infantil. 
 
 
Introdução: a origem da pesquisa 
 
A pesquisa justificou-se pela necessidade de estudos a respeito da 
identidade de profissionais que trabalham com a educação infantil e a profissão docente, 
visando assim, contribuir para o avanço nas discussões vigentes a respeito do papel e 
valorização das profissionais que trabalham com as crianças de 0 a 5 anos de idade no 
sistema de ensino brasileiro, em um momento no Brasil em que se busca afirmar e 
conquistar os direitos das crianças pequenas e do trabalho docente de qualidade, no qual 
foi relegado durante muito tempo, ou mesmo, colocado em segundo plano em quase 
todos os âmbitos da sociedade brasileira. 
A escolha do tema proposto surgiu a partir de um trabalho realizado no 
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Estadual de 
Mato Grosso do Sul (UEMS) de 2009 a 2010 a respeito da identidade das profissionais 
da educação infantil na cidade de Dourados. 
2 
 
Refletindo sobre os depoimentos das professoras participantes da pesquisa, 
que eram responsáveis pelas crianças menores do Centro de Educação Infantil 
Municipal (CEIM), passei a perceber que estas, não se enxergavam como docentes, por 
não possuírem “uma sala de aula” com todas as suas características e implicações de 
uma escola
1
, e principalmente pelas professoras de educação infantil, terem a função do 
cuidado, aproximando-as das funções maternas e também de papéis que muitas vezes 
não lhes caberia como, por exemplo: tia, enfermeira, psicóloga, entre outras. 
No CEIM as distinções são maiores, e existem mais diferenças de funções 
quando relacionamos a relação entre assistente e regente. Existe a partir destas 
nomenclaturas distintas, atribuídas as responsáveis pelo atendimento das crianças, onde 
cada profissional desenvolve funções distintas, a regente cabendo o planejamento e a 
assistente principalmente o cuidar. Atribuições diferentes que interferem assim, 
diretamente na construção e reconstrução da identidade profissional. 
Neste sentido proponho refletir sobre: Quais são as identidades profissionais 
construídas entre a regente e a assistente na prática pedagógica de professoras da 
educação infantil? Quem são essas profissionais? Como elas se reconhecem? Existem 
diferenças na identidade profissional entre regente e assistente? As duas se reconhecem 
como profissionais e professoras? 
Trabalho este, desenvolvido como monografia, defendido no ano de 2011, 
no entanto abordaremos especificamente sobre a realização docente, a definição 
profissional e as representações de “boas” professoras da educação, configurações essas 
que influenciam na construção e reconstrução das identidades das professoras da 
educação infantil, para tanto traremos ao texto alguns dos relatos obtidos. 
Utilizamos como metodologia do trabalho a pesquisa qualitativa, pois este 
tipo investigação possibilita a valorização de todos/as os/as envolvidos/as na 
investigação respeitando as peculiaridades dos sujeitos, bem como da pesquisadora e do 
pesquisador. 
Triviños (1987), Lüdke e André (1986), afirmam que a pesquisa qualitativa 
consiste, não apenas na quantificação de dados, mas, em uma análise de forma indutiva 
e dedutiva, buscando assim, averiguar e explicar a totalidade do fenômeno, desvelando 
 
1
 As docentes utilizam os termos sala de aula e escola, relacionando a educação infantil e o CEIM ao 
ensino de 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Na educação infantil são utilizados sala de atividades para 
designar o local em que desenvolvem os trabalhos com as crianças, e Centro Educacional local onde 
trabalham, sendo ainda responsável pelo atendimento de crianças de 0 a 4 anos de idade atualmente. 
3 
 
no caso, as práticas e ações desempenhadas pelas docentes em seu trabalho que não 
podem ser medidos ou quantificados. 
Na perspectiva da pesquisa qualitativa, utilizamos como instrumento de 
coleta de dados, entrevistas com duas profissionais que trabalham na Educação Infantil 
de um Centro de Educação Infantil no município de Dourados para estudo e análises, 
sendo ainda responsável pelas crianças menores no CEIM. 
As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas por meio da gravação, a 
partir de questões elaboradas de acordo com a proposta do trabalho. 
As participantes da pesquisa foram, uma professora regente da sala 
denominada de (R) na pesquisa e uma assistente nomeada de (A)
2
. Apesar destas 
profissionais, desenvolverem as mesmas tarefas cotidianamente no CEIM, existe a 
diferenciação de nomenclatura, e com elas papéis distintos entre assistente e regente, a 
partir dessas peculiaridades que permeiam a profissão e interferem diretamente na 
construção e reconstrução da identidade profissional destas docentes. 
Os estudos neste sentido estão pautados nos referencias relacionados as 
discussões sobre a identidade e identidade profissional docente, como será melhor 
explanado a seguir. 
 
1. A identidade profissional docente 
 
A identidade de uma pessoa não se restringe a um documento, no qual são 
colocadas informações que revelam onde e quando nascemos. Pensar em identidade vai 
além de meros dados registrados em um papel, segundo Ciampa (2004) quando somos 
indagadas/os sobre: “Quem eu sou?” e “Quem somos?”, pensamos imediatamente em 
respostas que nos descrevem de forma geral, de maneira que diríamos a qualquer pessoa 
quando questionadas, mas ao final da resposta não nos é possível realmente conhecer o 
indivíduo. 
Ciampa (2004) afirma assim, que essas indagações em um primeiro 
 
2
 A Lei complementar nº118, de 31 de dezembro de 2007 da cidade de Dourados/MS que regulamenta o 
plano de cargos, carreira e remuneração profissional (PCCR) do município atualmente. O documento 
discute as atribuições e plano de carreira das profissionais de educação da Educação Infantil e Educação 
Fundamental Básico de Dourados. De acordo com ele, a profissionais que atuam na educação infantil 
recebem a nomenclatura de Assistente Pedagógico da Educação Infantil, sendo as designadas como 
regentes, e a assistente conforme o documento é nomeado de Assistente de Apoio Educacional. 
4 
 
momento parecem simples, mas quando decorridos algum tempo, e pensamos sobre 
quem somos e quem sou, passamos arefletir não em respostas simples, fáceis e rápidas, 
mas em características que nos constituí não apenas externa, mas internamente, e por 
fatores diversos, pois “[...] a identidade do outro reflete na minha e a minha na dele [...]” 
(CIAMPA, 2004, p.59). A identidade segundo o autor assim, deixa de ser algo fácil, 
como aparentava em um primeiro momento. 
Passamos então, conforme Ciampa (2004) aponta, a uma segunda 
indagação: Como compreender a identidade se esta é algo tão complexo? O autor revela 
que devemos partir do pressuposto que a identidade tem como princípio a igualdade e a 
diferença. 
A medida que buscamos ser iguais: nos direitos de ser mulher, homem, 
criança, profissional, valorização enquanto sujeitos, entre outras características, 
buscamos sucessivamente a diferenciação para não nos igualarmos aos demais, 
procuramos afirmar diariamente também, um diferencial. Algo que nos distingue nas 
atitudes, imagem externa, trabalho, ações, pensamentos entre outros, algo que nos 
permita ser “notados”. 
Ciampa (2004, p. 67) afirma que: “Em cada momento de minha existência, 
embora eu seja uma totalidade, manifesta-se uma parte de mim como desdobramento 
das múltiplas determinações a que estou sujeito.” Assim a identidade deve ser 
compreendida como única do indivíduo, mas saber que pertencemos e compomos uma 
sociedade com histórias próprias, tradições, regras, cultura, entre outras configurações 
diferentes, que contribuem para a construção de quem eu sou, mas também do quem 
somos nós de forma contínua. 
Nesta perspectiva de constância, de transformação e de mutação, Ciampa 
(2004, p. 74) afirma que: “Identidade é movimento, é desenvolvimento do concreto. 
Identidade é metamorfose. É sermos o Um e um Outro, para que cheguemos a ser Um, 
numa infindável transformação”. Nossas identidades assim são criadas e recriadas 
constantemente. 
A identidade conforme Gatti (1996) deve ser vista como um fruto das 
interações sociais complexas nas sociedades contemporâneas e como expressão sócio-
psicológica que interagem nas aprendizagens, nas formas cognitivas, nas ações dos 
seres humanos. 
Mais especificamente sobre a identidade do professor Gatti (1996) afirma 
5 
 
que é a maneira única de ser e estar no mundo e no trabalho. Para a autora fatores como 
a motivação, os interesses, as expectativas e atitudes consistem em elementos 
multideterminantes para a construção da identidade, no caso a identidade profissional 
das profissionais de educação infantil. 
A questão da aquisição da identidade é amplamente discutida no domínio 
sociológico, psicológico, antropológico, dentre outros, sendo abordado por diferentes 
campos da ciência e podendo ter perspectivas diferentes, diferenciando-se em algumas 
questões, dependendo do referencial que se toma como referência, por isso pode ser 
encontrada relações tênues e conflitantes quanto à definição do conceito, isto porque se 
trata de um conceito polissêmico conforme Gatti (1996). 
Dubar (2005) afirma existir duas identidades, fazendo a distinção entre a 
identidade individual e a coletiva. Para ele, a identidade individual é uma construção 
interna, enquanto a identidade coletiva é desenvolvida por meio das relações externas 
entre o indivíduo constituindo a relação de sujeito/sociedade. O autor relata ainda, que a 
identidade não é algo dado, mas construído, reconstruído, mantido em relação dinâmica. 
Até mesmo em sua definição encontra diversas dificuldades em se estabelecer um termo 
único, pois se acredita que a identidade é criada com base na realidade, portanto de 
forma individual. 
São criadas categorias, no qual são criados sentimentos de pertença aos 
processos entre a identidade atribuída e a identidade aceita, construída por si e pelos 
outros. A identidade não pode ser forjada pelos demais, porém, não é construída sem a 
interferência destes conjuntos de elementos, pois estes são interligados. 
A identidade profissional é estabelecida com base nas atribuições das 
identidades adquiridas ao longo da vida de cada pessoa, desde a infância até mesmo na 
escolha da carreira profissional. A escola e instituições de educação infantil neste 
processo representará um dos principais meios para a construção e reconstrução da 
identidade. 
A identidade profissional será segundo Dubar (2005, p.150) uma: “[…] 
construção pessoal de uma estratégia identitária que mobilize a imagem de si, a 
avaliação de suas capacidades e a realização de seus desejos [...]”, sendo construídas 
assim, com base em suas identificações criadas na e pela profissão. 
Percebe-se que a formação da identidade não é algo pronto, acabado, mas 
que se modifica ao longo da vida constituindo o processo de socialização, de maneira 
6 
 
evolutiva e contínua, para Dubar (2005). Berger e Luckmann (1985), complementam 
que a identidade é construída de forma dialética, entre indivíduos, sendo influenciadas 
de acordo com as realidades vivenciadas por meio da estrutura social. 
Entendemos assim, a identidade como inseparável da relação entre 
indivíduos e a sociedade, pois, é por meio destas relações dialéticas que se constrói a 
identidade baseada na realidade social, estabelecendo-se como um fenômeno que é 
modificado ao longo da vida, mas que também transforma a realidade social. 
Neste sentido, as pessoas responsáveis pelo atendimento das crianças 
menores no decorrer da história desta modalidade de educação foram sendo 
modificadas, influenciando na construção e mesmo na desconstrução das identidades 
profissionais das professoras da educação infantil. 
 Conforme aponta Assis (2009) mudanças, em relação a maneira de se 
entender a criança, a educação, o atendimento e o papel das profissionais da educação 
infantil e mesmo, o papel da mulher no país, compondo assim, as representações do ser 
e do fazer das profissionais de educação infantil hoje. 
A profissionalização das docentes, foi sendo perpetuadas historicamente 
pelos enfoques assistencialista principalmente, e recentemente pelo tripé do cuidar, 
educar e brincar. Com base nas reflexões de Assis (2009) essas mulheres que se 
dedicavam ao atendimento das crianças pequenas receberam de acordo com os lugares, 
diferentes nomenclaturas, sendo (eram/são) mulheres sem formação, com salários 
baixos, contribuindo para a relação conflituosa entre o cuidar e o educar. 
A relação estabelecida entre quem cuida, e quem educar, passam a perpetuar 
as discussões desta categoria profissional, tornando-se uma das principais dicotomias da 
educação infantil, já que a partir desta lógica houve a separação das funções das 
profissionais. Conforme destaca Assis (2009, p. 46) cria-se com esta divisão de tarefas: 
“[...] o auxiliar que cuida e o professor que educa”. 
Estas características estão intrinsecamente no ideário das mulheres que 
trabalham com as crianças pequenas nas instituições de educação infantil no país. Assis 
(2009) relata ainda que a partir desta lógica, as pessoas que atuam nesta 
categoria/carreira, muitas vezes não se compreendem como tendo uma função 
profissional, já que o trabalho se assemelha ao espaço privado e a função materna. A 
profissionalização e mesmo identidade das professoras da educação infantil se 
constituiu, e está ainda, em processo de construção e desconstruções, sendo permeadas 
7 
 
por características e concepções da educação destinadas as crianças de zero a cinco anos 
atualmente. 
Conforme mencionado, este é um recorte do trabalho de conclusão de curso, 
apresentaremos algumas possibilidades da pesquisa referentes a realização docente, a 
definição profissional e as representações de “boas” professoras da educação, 
configurações essas que influenciam na construçãoe reconstrução das identidades das 
professoras da educação infantil, para tanto traremos ao texto alguns do relatos obtidos. 
 
2. Realização docente e definição profissional: reflexão-na-ação. 
 
A realização profissional e a definição de suas práticas são perguntas 
difíceis de serem respondidas de imediato. Refletir sobre as ações, posturas, visão da 
educação e das práticas desenvolvidas, a partir da maneira individual de se compreender 
enquanto profissional da educação, possibilitando assim, neste processo conflituoso de 
reflexão-na-ação a construção e reconstrução da identidade docente. 
Imbernón (2005) relata que não se aprende a ser professora e professor, mas 
é possível, apreender fundamentos para se criar uma base sólida que direcione as 
práticas e as ações a serem realizadas. As professoras em suas falas permitem 
compreender este processo de visão da educação infantil e a reflexão sobre suas 
próprias ações, quando apresentam a definição de si, enquanto relacionadas à profissão 
docente. 
 
Eu me defino uma educadora. Sempre procuro ficar a par de tudo. Até de 
como é a vida da família para entender a criança. Então acho que a gente se 
preocupa bastante. Até mais, muitas vezes, que os próprios pais. (A) 
 
Não sou nem metade do que desejaria ser, as vezes, me sinto impotente em 
determinadas situações, mas sempre que é preciso, brigo com coordenador, 
pai, em defesa do bem estar e desenvolvimento da criança e sinto que está é a 
coisa certa a ser feita. 
A minha responsabilidade com a criança termina quando começa a dos pais. 
Busco sempre o diálogo com a família. Já que nos vemos todos os dias. 
Apesar de não ser fácil este trabalho, no final tudo acaba bem e a criança 
vitoriosa. (R) 
 
As docentes falam ainda, sobre a realização profissional ao longo da 
carreira. No entanto estas realizações estão intimamente ligadas aos problemas que 
enfrentam, mas que permitem ter vitórias a partir da concepção de criança e infância 
que possuem. Conforme as docentes relatam, sobre suas realizações profissionais são: 
8 
 
 
Compreender que apesar de todas as dificuldades encontradas as crianças não 
desistem, elas evoluem dia a dia, isso nos orgulha. Ver seus primeiros passos, 
as primeiras palavras, os sorrisos, os choros, as quedas, o levantar. Essas 
coisas não têm preço. Temos oportunidade de ver dia a dia o que todos os 
pais perdem a evolução de seus filhos. (R) 
 
[...] É você vê, que no começo, pega os bebezinhos na faixa etária de dois 
meses e meio, três meses, quatro meses e no final do ano perceber, que 
haviam bebês que só choravam, ou que ficavam parados. Aqueles que você 
tinha que ficar mexendo com ele, de um lado para o outro. Que tinha que 
ficar motivando, você vê todo mundo andando. Ficar falando as primeiras 
frases. 
Eles cantando junto com a gente, bem assim... No ritmo. Mesmo que não 
saibam falar direito, eles vão fazendo o barulhinho igual. (A) 
 
As crianças são compreendidas por estas de forma muitas vezes 
romantizada, pelas características estarem diretamente relacionadas ao desenvolvimento 
das crianças. 
 
3. A “boa” professora de educação infantil: representações e auto-imagem. 
 
A reflexão sobre suas ações, a definição de suas práticas apontadas pelas 
docentes, à visão de educação, compõe a identidade de maneira indissociável, 
juntamente com as atribuições construídas pela sociedade para as mulheres e as 
professoras da educação infantil, que foram sendo conforme Louro (2008) aponta 
reconstruídas, transformadas, aceitas, adaptadas ou rejeitadas ao longo da história. 
As percepções que estas professoras têm sobre outras docentes, interferem 
diretamente em suas práticas desenvolvidas, permitindo assim a construção, adaptação 
ou mesmo modelos a serem refutados. A respeito de modelos de “boas professoras” 
afirmam que: 
 
Um exemplo para mim? Tem a professora Sandra [...]. Ela fazia e acontecia 
com as crianças. Desenvolvia projetos, brincadeiras. 
Tudo ela estava pronta, então como era no início que eu entrei lá (no CEIM) 
tentei me espelhar muito nela. (A) 
 
Olha exemplos que eu tive, foi de professores até dos meus filhos. Mas hoje 
estão todas doentes. Tem uma que esta até readaptada, por que ficou com 
problemas na cabeça. Por que todo professor que quer inovar, que quer fazer 
alguma coisa diferenciada, de novo, acaba ficando doente. Por que não tem 
apoio. É perseguido. [...] Acaba ficando doente. Mas tem vários exemplos, 
mas que infelizmente estão nessa situação. Mas a gente não pode desanimar 
isso tem que fazer parte da gente. Mas que é difícil é. (R) 
 
9 
 
 (R) releva que possui “boas” professoras como modelos, mas que muitas 
destas docentes, devido às inadimplências causadas pela falta de investimento na 
educação como um todo, em especial na educação infantil, a visão que as colegas de 
trabalho possuem sobre práticas diferentes acabam por desestimular, levando até mesmo 
a doenças e desistência da profissão docente. Paschoal e Machado (2009) neste sentido 
apontam, assim como (R), como sendo uma das dificuldades desta categoria 
profissional da educação infantil o esforço físico e psicológico, exigidos durantes as 
práticas pedagógicas desenvolvidas cotidianamente. 
Conforme as considerações de Nóvoa (1992b) que afirma, que é impossível 
estar separando o eu profissional do eu pessoal, a profissão docente é composta por 
todos esses elementos apresentados anteriormente, entre outras características que são 
constantemente criadas. A visão assim, de uma “boa” profissional de educação infantil, 
apontadas pelas professoras, são aquelas que o trabalho, não termina no fim do 
expediente no CEIM, tendo principalmente as crianças como centro das atividades, 
valorizando-as em todas as circunstâncias criadas diariamente. 
Segundo as docentes a boa professora de educação infantil tem que ser: 
 
[...] uma professora de atitude, que não abaixa a cabeça para seus patrões, 
nem para os pais que muitas vezes não tem responsabilidades com seus 
filhos. 
Seria uma professora que em defesa da criança enfrentasse todas as situações 
adversas para que os direitos dos pequenos sejam garantidos. Direitos esses, 
muitas vezes usurpados dos mesmos. Seria uma professora que não tratasse o 
aluno com indiferença, que vai além de sua função docente em defesa de uma 
formação integral, onde a afetividade esteja presente diariamente. (R) 
 
Eu acho que uma boa professora, tem que ser uma professora-educadora tem 
que estar preocupada com o desenvolvimento como um todo da criança. 
Não só como: eu vou ali só para ganhar meu dinheiro e pronto. Não. 
Tem que estar desenvolvendo com a criança dia a dia (atividades diferentes). 
Vendo as necessidades. Pegando no pé dos pais quando precisa. 
E não só assim: eu vou fazer a minha parte e pronto. Cada um, a parte da 
gente é bem ampla. 
Não é só chegar ali, brincar e pronto. (A) 
 
Desta forma a “boa” professora de educação infantil são aquelas que 
enfrentam e superam as dificuldades conforme vão surgindo, mas que apesar de todos 
os problemas existentes deve ter compromisso com a criança, independente dos 
conflitos que aparecem cotidianamente. 
O ser o e fazer das docentes são construídos e desconstruídos diariamente, 
sendo permeadas, por todas as características anteriores explicitadas, a identidade 
10 
 
profissional assim, pode ser apreendida tendo como base os relatos das professoras 
como algo complexo, mas que possibilita compreender um pouco sobre a implicações 
do fazer docente, e algumas características do ser das professoras. 
 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS: alguns apontamentos 
 
 Pensar em identidade profissionalde docentes da educação infantil é algo 
novo e necessário, conforme os apontamentos teóricos utilizados ao longo do trabalho e 
os depoimentos das professoras entrevistadas. Foi possível compreender que a 
identidade é processo, que ocorrem mudanças constantemente, rodeadas por 
configurações que compõe a sociedade, possibilitando a construção e reconstrução de 
maneira dinâmica. 
Os estudos sobre a identidade profissional docente na educação infantil é 
recente, pois historicamente essa profissão foi pensada para mulheres, com funções e 
características relacionadas ao ser e ao fazer feminino. Assim foram sendo criados 
estereótipos do magistério principalmente as responsáveis pelas crianças menores, 
desvalorizando desta forma, as práticas desenvolvidas por estas docentes. 
Passou a relacionar a identidade ao ser e ao fazer da mulher, da mãe, da 
esposa, das “donas de casa”, papéis construídos histórico e socialmente ao longo da 
história, regidos pela lógica estereotipada da profissão docente como sendo algo 
feminino, e juntamente com estes atributos designadas as docentes, o ser foram sendo 
mudados. 
A forma de se pensar e compreender a criança, o ensino, a infância, as 
práticas, as significações atribuídas a educação infantil, passou a ter uma nova 
configuração para estas docentes desta etapa da educação, assim como o fazer, suas 
ações, concepções, e o ser, visão de educação, reflexão sobre suas práticas, definição, 
entre outras características que compõe a identidade profissional de forma indissociável 
foram e estão sendo mudadas. 
A identidade de uma pessoa, assim não se restringe apenas a um documento, 
no qual são colocadas informações que revelam onde e quando nascemos, mas é criada 
e recriada de forma dinâmica e constante, composta ainda por elementos que permitem 
a resignificações, muitas vezes de forma conflituosa, compondo deste modo o processo 
11 
 
de construção e reconstrução da identidade profissional, a partir da visão de si e as 
atribuições designadas pelos outros. 
Em virtude dos fatos abordados ao longo do trabalho foi possível 
compreendermos que a identidade profissional docente a partir das práticas 
pedagógicas, e das atribuições inerentes à profissão das duas profissionais de educação 
infantil de um Centro de Educação Infantil Municipal da cidade de Dourados/MS, são 
permeadas pelos ideais criados e cobrados pela sociedade, compondo suas ações 
diariamente de maneira imperceptível. 
As concepções de educação das profissionais de educação infantil, seus 
interesses e motivações, são algumas das características que compõe a construção da 
identidade profissional e contribui ainda para a construção da identidade pessoal. 
O trabalho docente é uma profissão dinâmica e permeada de dificuldades, 
no qual o processo de reflexão e criticidade muitas vezes são comprometidos a 
consciência do papel pedagógico desenvolvido e as contribuições no trabalho docente 
acontecem de maneira indissociável, assim como as funções desempenhadas não são 
fixas e rígidas, sendo flexíveis conforme as necessidades do processo educacional da 
educação infantil. 
A realização docente e a definição enquanto professoras, são baseadas em 
suas práticas e a reflexão de suas próprias ações, as características e significados para 
ser uma “boa” professora de educação infantil e as representações e auto-imagem 
criadas, aceitas ou mesmo rejeitadas, constitui em alguns dos elementos da identidade 
profissional, e que nos permitiu compreender que estas características mudam e são 
resignificadas constantemente. 
 
REFERÊNCIAS 
 
ASSIS, Muriane Sirlene Silva de. Ama, guardiã, crecheira, pajem, auxiliar... em busca 
da profissionalização do educador da educação infantil. In: ANGOTTI, Maristela 
(Org.). Educação Infantil: da condição de direito a condição de qualidade no 
atendimento. Campinas, São Paulo: Editora Alínea, 2009. 
 
BERGER, Peter L. e LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade: 
Tratado de sociologia do conhecimento. Petrópolis: Editora Vozes, 1985. 
 
CIAMPA, Antonio da Costa. Identidade. In: SILVA, T.M Lane e CODO Wanderley 
(Orgs.) Psicologia Social: o homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 2004. 
12 
 
 
DUBAR, Claude. A socialização: Construção das identidades sociais e profissionais. 
São Paulo: Editora Martins Fontes, 2005. 
 
GATTI, Bernardete A. Os professores e suas identidades: o desvelamento da 
heterogeneidade. Cadernos de Pesquisa. N. 98, 1996. 
 
IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional: formar-se para a 
mudança e a incerteza. São Paulo: SP, Editora Cortez, 2005. 
 
LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: PRIORE, Mary Del (Org.). 
História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008. 
 
LÜDKE, Menga e ANDRÉ, Marli E. D. Pesquisa em Educação: abordagens 
qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. 
 
NÓVOA, Antônio. Formação de professores e profissão docente. In: NÓVOA, Antônio 
(Org.). Os professores e sua formação. Lisboa, Portugal: Dom Quixote, 1992 a. 
 
______, Antônio. Os professores e as histórias da sua vida. In: NÓVOA, Antônio (Org.) 
Vida de professores. Portugal: Editora Porto, 1992b. 
 
PASCHOAL. Jaqueline Delgado e MACHADO. Maria Cristina Gomes. A história da 
educação infantil no Brasil: avanços, retrocessos e desafios dessa modalidade 
educacional. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.33, p.78-95, mar. 2009 - ISSN: 
1676-2584. Disponível em: 
<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/33/art05_33.pdf>. Acesso em: 31 
ago.2011. 
 
TRIVIÑOS, Augusto. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa 
qualitativa em educação. São Paulo: Editora Atlas, 1987.

Outros materiais

Materiais relacionados

Perguntas relacionadas

Perguntas Recentes