Buscar

Bem me quer, mal me quer

Prévia do material em texto

"Bem me quer, mal me quer"
a) Trata-se de uma hipótese diagnóstica de neurose ou de psicose?
Transtorno psiquiátrico da linha das psicoses, chamada de erotomania ou Síndrome de Clérambault. A erotomania é convicção delirante que, por parte do paciente, sente ser amado por alguém com uma condição social mais elevada que a sua e esse amor ocorre de forma que eles se comunicam através de olhares, bilhetes, disposições de objetos e coisas ditas em público. Esse transtorno ocorre tanto em culturas orientais como em ocidentais, não fazendo distinção de idade nem tampouco de gênero, afetando tanto homens como mulheres.
Tal transtorno pode, por vezes, resultar em situações constrangedoras para ambos os envolvidos, porém para o erotomaniaco, tal situação é apenas mais um desencontro do casal, mesmo que o outro diga claramente que não o ama. Na erotomania a existência de três fases clássicas: esperança, despeito e rancor.
b) Em quais momentos (são 3) percebe-se a presença de sua hipótese diagnóstica?
1° - Em seu delírio, Angélique fantasia uma história de amor à primeira vista Loic. Num gesto simples de gentileza em que ele lhe oferece uma flor (por estar feliz com a gravidez da esposa) leva-a imaginar que ele estaria apaixonado por ela. Ao interpretar o gesto do médico como uma demonstração de amor, a jovem fantasia um relacionamento amoroso com o médico seu vizinho. Porém em seu relacionamento perfeito há apenas um obstáculo: o fato de seu amado, Loïc, ser casado. Obstáculo, no entanto, superável em breve, pois, segundo Angélique, seu amado está decidido a separar-se. 
2º - O delírio passou a ter um papel preponderante na vida de Angélique. Atravessando seus laços sociais, fazendo com que seu mundo todo girasse em torno de seu amor e fazendo com que suas outras amizades perdessem o sentido. Em sua arte, tudo que retrata era ele, perdendo o foco no que era visto. A cena em que ela tinha que retratar um modelo exposto, ela só via Loic. Desde que ela armou seu mundo, e de onde sua vida e seu próprio ser adquirem sentido. Todo o real é tratado pelo imaginário, conferindo sentido amoroso a tudo.
A cena em que envia um coração de presente ao cardiologista evidencia sua particular forma de tratar o simbólico: sem metáforas. No limite vemos o que prenunciava a romântica frase que a jovem escrevera: “meu coração é para sempre seu”. O coração, órgão que encarna a metáfora do amor, fora tratado no real do órgão.
3° - No ápice de seu delírio, após o fracasso de retomar o amor de Loic, tirando o obstáculo de sua relação, (a esposa gravida), promovendo o acidente na qual culminou no aborto. Suas expectativas imaginarias de retomada são frustradas levando-a a depressão e isolamento. Ao ver o objeto de seu amor sendo preso, ela vai ao encontro dele e presenciando a cena em que ele declara o amor que deveria sentir por ela a outra mulher, sua vida perde o sentido e a loucura chega ao seu ápice. Levando-a tentar suicídio. Fazendo valer a frase que dissera ao amigo: “se eu não acreditar nisso [no amor de Loïc], o que me resta?”. 
c) Justifique sua hipótese diagnóstica utilizando os pontos de vista da Psiquiatria e da Psicanálise freudiana estudados em sala de aula.
No primeiro momento a personagem estava se relacionando bem com seu trabalho e amigos, tendo uma vida produtiva e socialmente normal. 
1° fase - Ao se deparar com seu objeto de desejo há um desencadeamento de emoções. Toda a energia que antes era voltada para ela agora vai para o objeto de desejo (o médico). Isso faz que a personagem se afaste da realidade construindo em seu mundo interno e externo a fantasia de que o amor que sente pelo outro é correspondido e que a esposa é o obstáculo desse amor. Sendo assim, violentando a realidade, num quadro de mecanismo de recusa. 
Segundo Freud, nos casos de psicoses o mundo interno e externo vai perdendo a linha divisória que os separa. Não fazendo mais distinção entre eles, a personagem não aceita os acontecimentos em sua volta (a demonstração de afeto do amigo que é apaixonado por ela, a perda da amizade por conta da verdade) levando-a ao empobrecimento do pensar. Perdendo as significações de afetos, levando a desagregação das funções mentais. As funções mentais superiores são afetadas: pensamento, vontade e afetividade.
Neste momento o poder do ID e o fracasso do EGO (realidade, proibição moral), em sua confusão alucinatória faz com que o mundo exterior não seja percebido ou a percepção dele não tenha nenhum efeito. Fazendo assim ela sem nenhum limite moral cometer vários crimes.
2° fase – Após um período de depressão e estagnação por conta de seus planos frustrados, há um retorno do conteúdo anteriormente recusado (realidade) mas sob forma de uma nova construção realidade. Quando a personagem resgata e usa sua amizade com o médico que tem sentimentos por ela, para conseguir um coração(órgão), enviando para seu objeto de desejo com a seguinte frase: “meu coração é para sempre seu” numa tentativa desesperada de se reconectar a ele. 
Segundo Freud, nesta segunda fase há uma tentativa de se conectar com a realidade, tentativa de reconstrução das relações objetais anteriormente perdida. No delírio, o psicótico, tenta se resgatar a realidade sendo essa a única maneira que tem para sobreviver.

Outros materiais