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Historiografia brasileira O projeto historiográfico do IHGB (I) - A fundação do instituto e a proposta de uma historiografia da nação O princípio fundamental da aula O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado em 1838, se empenhou em delinear uma historiografia nacional baseada no princípio da Retórica da nacionalidade, ou seja, um conjunto de estratégias discursivas cuja característica é a dispersão de seus elementos constituintes, utilizadas para persuadir os brasileiros de que, a despeito da natureza heterogênea e compósita de sua formação social, compartilhavam um passado comum e, consequentemente, a mesma origem e identidade. Conteúdos trabalhados - A fundação do IHGB. - As primeiras escolhas do IHGB. A bibliografia da aula - GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Livro de Fontes da historiografia brasileira. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2010. (Documentos 01, 03 e 04) - _______. Historiografia e Nação no Brasil (1838-1857). Rio de Janeiro: ED. UERJ, 2011. (Caps. 01, 02, 03 e 04) A fundação do IHGB O caso brasileiro não escapará, nesse sentido, ao modelo europeu – e isto certamente trará consequências cruciais para o trabalho do historiador em nosso país – ainda que deste lado do atlântico outro será o espaço de produção historiográfica. Não o espaço sujeito à competição acadêmica própria das universidades europeias, mas o espaço da academia de escolhidos e eleitos a partir de relações sociais, nos moldes das academias ilustradas que conheceram seu auge na Europa nos fins do século XVII e no século XVIII. O lugar privilegiado da produção historiográfica no Brasil permanecerá até um período bastante avançado do século XIX vincado por uma profunda marca elitista, herdeira muito próxima de uma tradição iluminista. E este lugar, de onde o discurso historiográfico é produzido, para seguirmos as colocações de Michel de Certeau, desempenhará um papel decisivo na construção de uma certa historiografia e das visões e interpretações que ela proporá na discussão da questão nacional. (SALGADO; 1988, p. 01) É, portanto, à tarefa de pensar o Brasil segundo os postulados próprios de uma história comprometida com o desvendamento do processo de gênese da nação que se entregam os letrados reunidos em torno do IHGB. A fisionomia esboçada para a Nação Brasileira e que a historiografia do IHGB cuidará de reforçar visando produzir uma homogeneização da visão de Brasil no interior das elites brasileiras(...) No movimento de definir-se o Brasil, define-se também o “outro” em relação a esse Brasil. Num processo muito próprio ao caso brasileiro, a construção da ideia de Nação não se assenta sobre uma oposição à antiga metrópole portuguesa; muito ao contrário, a nova Nação brasileira se reconhece enquanto continuadora de uma certa tarefa civilizadora iniciada pela colonização portuguesa. (SALGADO; 1988, p. 02) O recrutamento segundo as normas estabelecidas pelos primeiros estatutos dava-se fundamentalmente pela via das relações sociais, sem que o candidato tivesse que provar como os estatutos de 1851 definiram – uma produção intelectual na área de atuação do instituto. Desse modo, um outro elemento importante se agrega à fisionomia do IHGB, conformando o tipo de produção historiográfica e – mais do que isso – o próprio retrato da nação em esboço. Marcada pelos critérios que presidem e organizam um tipo de sociabilização própria de uma sociedade de corte, esta produção historiográfica escapa, assim, às regras e injunções específicas do mundo acadêmico, cujo critério de recrutamento básico apoia-se no domínio de um certo saber específico. Enquanto na Europa o processo de escrita e disciplinarização da história estava-se efetuando fundamentalmente no espaço universitário, entre nós esta tarefa ficará ainda zelosamente preservada dentro dos muros da academia de tipo ilustrado, de acesso restrito, regulamentado por critérios que passam necessariamente pela teia de relações sociais e pessoais. Como traços marcantes desta história nacional em construção, teremos o papel do estado nacional como o eixo central a partir do qual se lê na História do Brasil, produzida nos círculos restritos da elite letrada imperial. (SALGADO; 1988, p. 06) O projeto de uma história geral brasileira Karl Friedrich Philipp von Martius (1794-1868), autor do texto Como se deve escrever a história do Brasil“, vencedor do concurso de monografias aberto pelo IHGB em 1838. O projeto de uma história geral brasileira Qualquer que se encarregar de escrever a história do Brasil, pais que tanto promete, jamais deverá perder de vista quais os elementos que aí concorrerão para o desenvolvimento do homem. São porém estes elementos de natureza muito diversa, tendo para a formação do homem convergido de um modo particular três raças, a saber: a de cor de cobre ou americana, a branca ou caucasiana, e enfim a preta ou ethiopica. Do encontro, da mescla, das relações mútuas e mudanças dessas três raças, formou-se a atual população, cuja história por isso mesmo tem um cunho muito particular. (VON MARTIUS, 2010 p. 64). Jamais nos será permitido duvidar que a vontade da providência predestinou ao Brasil esta mescla. O sangue português, em um poderoso rio deverá absorver os pequenos confluentes das rações India e Ethiopica. Em a classe baixa tem lugar esta mescla, e como em todos os países se formam as classes superiores dos elementos das inferiores, e por meio delas se vivificam e fortalecem, assim se prepara atualmente na última classe da população brasileira essa mescla de raças, que daí a séculos influirá poderosamente sobre as classes elevadas, e lhes comunicará aquela atividade história para a qual o Império do Brasil é .” (VON MARTIUS, 2010 p. 65). Portanto devia ser um ponto capital para o historiador reflexivo mostrar como no desenvolvimento sucessivo do Brasil se acham estabelecidas as condições para o aperfeiçoamento de três raças humanas, que nesse país são colocadas uma ao lado da outra, de uma maneira desconhecida na história antiga, e que devem servir-se mutuamente de meio e de fim. (VON MARTIUS, 2010 p. 65).