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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE DIREITO PROCESSUAL DESPORTIVO Por: Scheyla Althoff Decat Orientador Prof. Dr. Jean Alves Pereira Almeida Rio de Janeiro 2006 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE DIREITO PROCESSUAL DESPORTIVO Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Processual Civil. Por: Scheyla Althoff Decat 3 AGRADECIMENTOS Ao professor Jean A. Almeida pelo incentivo e por ter acreditado neste trabalho A minha amiga Mônica que com seu carinho e dedicação deu forma e vida a este trabalho A minha amiga Carmen que de forma carinhosa contribuiu para a complementação deste trabalho Ao meu filho Rogério Henrique porque juntos iniciamos e aprimoramos o estudo do Direito Desportivo e por todo um apoio técnico Ao Marcos Firmino dos Santos Presidente da Federação Aquática do Estado do Rio de Janeiro pela confiança depositada no meu trabalho frente ao Tribunal de Justiça Desportiva da FARJ Agradecimento Especial ao meu irmão Alberto Henrique que mesmo longe se faz presente em todos momentos da minha vida 4 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a minha mãe, pois sem seu carinho, dedicação e ajuda eu não teria vencido esta etapa tão importante na minha vida In memorian ao meu pai que me incentivou a participar do mundo jurídico 5 RESUMO O presente trabalho tem por objetivo o estudo do direito processual desportivo em todas as suas nuances, abordando a sua conceituação e objetivo, as suas fontes englobando a lei processual desportiva, as formas de interpretação dos dispositivos da legislação desportiva, a sua eficácia no tempo e no espaço, a sua relação com o Direito Constitucional, discorrendo sobre os seus princípios básicos. Serão analisados os limites da jurisdição e competência na Justiça Desportiva, o conceito da Justiça Desportiva e sua instituição pela Constituição Federal de 1988, a sua natureza jurídica, a organização, estrutura e composição de seus órgãos regulados pela Lei Geral Sobre Desporto (Lei 9615/98), além de uma discriminação detalhada das atribuições de seus membros, da Procuradoria Desportiva e de suas Secretarias, descrevendo sobre a jurisdição e competência do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, do Tribunal de Justiça Desportivo e das Comissões Disciplinares, apresentando um quadro elucidativo no anexo 02. Será abordados, o conceito, a natureza jurídica, a finalidade, características, elementos identificadores e os pressupostos processuais no processo desportivo, as condições da ação, os atos processuais, sua forma, classificação, nulidade dos atos, os prazos, os meios de provas, o registro e distribuição dos feitos, a intervenção de terceiro. Serão ressaltados também no presente trabalho, os tipos de procedimentos adotados na Justiça Desportiva, como também elucidará a respeito da súmula e do relatório de uma competição (anexo 3), da queixa e da denúncia, analisará todos os casos pertinentes aos processos especiais, as fases de uma sessão de instrução e julgamento com apresentação de um organograma no anexo 4, as decisões na Justiça Desportiva, os tipos de recurso e finalizando com o julgamentos dos recursos perante as instâncias superiores. 6 METODOLOGIA Serão aplicados uma combinação dos métodos zetético e dialético para trazer para o presente estudo, os conceitos, princípios, normas e regras de procedimento estabelecido na legislação desportiva e na Constituição Federal de 1988, discorrendo sobre cada um e demonstrando a evolução para a solução de uma demanda desportiva. Em alguns pontos, através de uma lógica processual, será utilizado o método dedutivo pela experiência adquirida na área processual desportiva. Será aplicada, concomitantemente, a epistemologia sociologista, já que o estudo visa a atingir um grupo que está sob a égide de um regime jurídico desportivo. Para tanto, serão utilizados livros doutrinários referentes à área do Direito Processual e do Direito Desportivo, toda uma legislação comentada pertinente ao tema além de uma matéria disponibilizada na Internet com relação à Justiça Desportiva. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO I – Direito Processual Desportivo 11 CAPÍTULO II – Fontes do Direito Processual Desportivo 14 CAPÍTULO III - Princípios que regem o Direito Processual Desportivo 21 CAPÍTULO IV – Justiça Desportiva 31 CAPÍTULO V – Organização, Estrutura e Composição dos Órgãos da Justiça Desportiva 36 CAPÍTULO VI – Jurisdição e Competência das Instâncias Desportivas 39 CAPÍTULO VII – Atribuições dos Membros dos Tribunais Desportivos 41 CAPÍTULO VIII - Jurisdição, Ação e Processo 51 CAPÍTULO IX - Intervenção de Terceiro 63 CAPÍTULO X – Atos Processuais 64 CAPÍTULO XI – Prazos 73 CAPÍTULO XII – As Provas no Processo Desportivo 78 8 CAPÍTULO XIII – Registro e Distribuição 85 CAPÍTULO XIV– Procedimento Sumário 87 CAPÍTULO XV – Procedimento Especial 93 CAPÍTULO XVI – Sessão de Instrução e Julgamento 107 CAPÍTULO XVII - Decisões no Processo Desportivo 111 CAPÍTULO XVIII – Recursos 118 CAPÍTULO XIX – Sessão de Julgamento nos Tribunais Desportivo 128 CONCLUSÃO 130 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 133 BIBLIOGRAFIA CITADA 135 ANEXOS 140 ÍNDICE 145 FOLHA DE AVALIAÇÃO 151 9 INTRODUÇÃO A intenção do presente estudo é levar através de uma linguagem eminentemente didática, a todos aqueles que de alguma maneira estão ligados ao esporte e principalmente aos estudantes e aos profissionais do direito, toda uma matéria pertinente ao direito processual desportivo, dentro de um sistema harmônico, mas sem fugir a nomenclatura jurídica. Posso dizer, como estudiosa da matéria, que existe uma carência de informação e conhecimento, não só das pessoas física e jurídica ligadas ao desporto, mas, e principalmente por parte dos profissionais de direito que começam a militar nesta área, de todo um ordenamento jurídico-desportivo previsto no Código Brasileiro de Justiça Desportiva, que classifico como peculiar. Busca o presente trabalho, como o próprio tema sugere, demonstrar todos os aspectos processuais no Direito Desportivo, sempre ancorados no sistema jurídico e amparados nos preceitos constitucionais. Analisará no primeiro momento, o direito processual desportivo como o ramo da ciência jurídica que trata do complexo das normas reguladoras do exercício da jurisdição desportiva, que tem por objetivo a própria ordem jurídica, seguindo com a apresentação de suas fontes e dos princípios que o regem. Apontará o funcionamento da Justiça Desportiva, justiça esta instituída pela Constituição Federal de 1988, precisamente no seu artigo 217 parágrafos 1º e 2º, ocasionando um grande avanço para o desporto nacional, a organização, estrutura e composição de seus órgãos, com a apresentação de um organograma no anexo 1, a jurisdição e competência das instâncias desportivas minuciosamente descriminadas em um quadro constante do anexo 10 2, como também as atribuições de seus membros. Em seguida será analisada toda uma estrutura processual desportiva que repousa na trilogia, jurisdição, ação e processo, além de discorrer sobre os atos processuais em todos os seus momentos, indicará os prazos, as provas admitidas e o registro e distribuição dos feitos. Serão estudadas as duas formas de procedimento adotadas pelo ordenamento jurídico desportivo, com a inclusão de um modelo de relatório que se faz acompanhar da súmula no anexo 3, demonstrando também a celeridade e eficácia de suas decisões. Abordaráa cerca da sessão de instrução e julgamento como momento único, apresentando um organograma de seu desenvolvimento no anexo 4. Finalizará o presente estudo discorrendo sobre o os tipos de recurso, o procedimento recursal e a sessão de julgamento nos Tribunais Desportivos. Após a exposição sobre todos os pontos a cerca dos aspectos processuais do direito desportivo, lançando mão de entendimentos de grandes processualistas e esboçando outros, terá alcançado o objetivo do presente trabalho, esperando que seja um instrumento inovador e esclarecedor deste Direito magnífico que se chama Desportivo. 11 CAPÍTULO I DIREITO PROCESSUAL DESPORTIVO “As formas são necessárias, mas o formalismo é uma deformação.” Liebman 1.1- Conceito Toda atividade do ser humano sempre se exterioriza através de suas relações com seus semelhantes, ou através de suas ações, já que o Direito pressupõe, necessariamente, a existência daquele ser e daquela atividade. E no intuito de proteger a personalidade deste ser e disciplinar-lhe em sua atividade, dentro de um contexto social de que faz parte, é que o Direito procura estabelecer, entre os homens, uma relação mais harmoniosa dentro da sociedade. Porém, razão assiste ao ilustre processualista Humberto Theodoro Junior quando fala que: “Impossível à vida em sociedade sem uma normatização do comportamento humano. Daí surgir o Direito como conjunto das normas gerais e positivas, disciplinadoras da vida social. Mas não basta traçar a norma de conduta. O equilíbrio e o 12 desenvolvimento sociais só ocorrem se a observância das regras jurídicas fizer-se obrigatória.” 1 É justamente para manter a harmonia na sociedade desportiva, que se utiliza um método indispensável à função jurisdicional, chamado processo, podendo ser denominado processo desportivo, que é um instrumento a serviço do direito material. Vale lembrar que o Direito Processual é essencialmente uno, uma vez que os princípios da jurisdição e do processo é comum a todos os ramos do direito. Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrine Grinover e Cândido Rangel Dinamarco proclamam que: “chama-se direito processual o complexo de normas e princípios que regem tal método de trabalho (procedimento), ou seja, o exercício conjugado da jurisdição pelo Estado-juiz, da ação do demandante e da defesa do demandado”.2 Trazendo esta definição ao tema, objeto do presente estudo, tem-se por Direito Processual Desportivo o conjunto de princípios e normas reguladoras que disciplinam a composição das demandas desportivas. Em síntese, é o ramo da ciência jurídica que trata do complexo das normas reguladoras do exercício da jurisdição desportiva, podendo ser considerado uma das variações do direito processual. Nesse sentido, afirma Humberto Theodoro Junior que: “modernamente se registra uma tendência entre os doutrinadores em estudar a teoria geral do processo, nela englobando os princípios que são comuns a todos os seus diversos ramos”. 3 13 1.2- Objetivo O Direito Processual Desportivo tem por objetivo principal resguardar a própria ordem jurídica, pois ao solucionar as questões, a justiça desportiva cumpre uma função pública, assegurando o império da legislação brasileira do desporto nacional e da paz social. Ao aplicar as regras e normas do Direito Processual Desportivo define-se a vontade concreta da lei diante de uma infração disciplinar cometida. Assim, todos aqueles que no território nacional estiverem submetidos às entidades compreendidas pelo Sistema Nacional do Desporto e todas as pessoas física ou jurídica que lhes forem direta ou indiretamente filiadas ou vinculadas são passíveis de um procedimento desportivo. 14 CAPÍTULO II FONTES DO DIREITO PROCESSUAL DESPORTIVO 2.1- Noções Gerais Basicamente as fontes do direito processual desportivo são as mesmas do direito em geral, ou seja, a principal que é a lei, pelo fato de ser de caráter público, a Constituição, a doutrina e a jurisprudência. Em alguns casos, por falta de coerência do legislador, a obscuridade e a imprecisão dos textos legais são supridas pelo entendimento doutrinário e jurisprudencial, surgindo, assim, novas concepções sobre a matéria. 2.2- Lei Processual Desportiva É a lei processual desportiva que rege o processo desportivo e tem como objeto o conjunto de regras e normas pertinentes a sua jurisdição, quais sejam: a) as regras de organização da Justiça Desportiva, competência de seus órgãos, distribuição e atribuições de seus membros, procuradores e secretário; b) regras sobre os procedimentos adotados na Justiça Desportiva; 15 c) normas e princípios gerais e específicos de interpretação da sua função jurisdicional e do direito de ação, os pressupostos processuais, os meios de prova admitidos, os meios de solucionar os casos de omissão e lacunas na lei e os conflitos intertemporais de normas. A Lei Processual Desportiva foi compilada sob a forma de código, precisamente, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva, que além do Procedimento Desportivo dispõe sobre as Medidas Disciplinares cabíveis pela ocorrência de infração disciplinar. Trata-se do primeiro código de conduta, disciplina e justiça desportiva à altura das necessidades do desporto nacional, após a Justiça Desportiva ser alçada e reconhecida na Constituição Federal de 1988, e adequado a Lei Geral Sobre Desporto(Lei nº 9615/98 com alteração pelas Leis 9.981/2000, nº 10.672/2001 e a Lei nº 10.671/2003. Álvaro Melo Filho assevera que: “...o desporto é, sobretudo, é antes de tudo, uma criatura da lei, pois, sem o direito, o desporto carece de sentido, porquanto nenhuma atividade humana é mais regulamentada que o desporto. Com efeito “regras do jogo”, “Códigos de Justiça Desportivas”, “regulamentos técnicos de competições”, “leis de transferências de atletas”, “estatutos” “estatutos e regulamentos de entes desportivos”, “regulamentação de dopping”, atestam que, sem regras e normatização, o desporto torna-se caótico e desordenado, à falta de regras jurídicas para dizer quem ganha e quem perde”.4 16 2.3- Interpretação e Integração da Lei Processual Desportiva São aplicáveis a lei processual desportiva, as regras gerais de hermenêutica, ex vi, o art.283 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva “ A interpretação das normas deste Código far-se-á com observância das regras gerais de hermenêutica, visando à defesa da disciplina e da moralidade do desporto”. Tal atividade consiste em extrair da norma o seu correto significado, ou seja, à vontade da lei. O que significa, que o auditor julgador deverá dominar os conceitos de hermenêutica e as espécies de interpretação, sejam elas quanto à origem ou quanto aos efeitos. Quanto à origem: a) autêntica ou legal –efetuada pelo órgão encarregado da elaboração do texto que através de orientação jurisprudencial dos tribunais desportivos modifica a legislação para adequá-la ao novo entendimento. b) judicial – é a interpretação tida como definitiva nas decisões no âmbito da justiça desportiva. c) doutrinária –a interpretação é feita de acordo com o sistema em que está enquadrada a norma processual desportiva. Quanto aos efeitos: a) declarativa – é a interpretação do próprio texto da lei, melhor dizendo, as palavras expressam o espírito da lei na sua medida exata. b)extensiva – aplicação do texto a casos que, não estando incluídos no significado de suas palavras, estão incluídos em seu espírito. c) restritiva – o intérprete elimina a amplitude das palavras que constam no texto. 17 Carlos Maximiliano citando Max Gmür diz que: “O jurista,esclarecido pela Hermenêutica, descobre, em Código, ou, em um ato escrito, a frase implícita, mais diretamente aplicável a um fato do que o texto expresso. Multiplica as utilidades de uma obra; afirma o que o legislador decretaria, se previsse o incidente e o quisesse prevenir ou resolver; intervém como auxiliar prestimoso da realização do Direito. Granjeia especiais determinações, não por meio de novos dispositivos materializados, e, sim, pela concretização e desdobramento prático dos preceitos formais. Não perturba a harmonia do conjunto, nem altera as linhas arquitetônicas da obra; desce aos alicerces, e dali arranca tesouros de idéias, latentes até aquele dia, porém vivazes e lúcidos”. 5 No caso de omissão ou lacunas na lei processual desportiva, estas serão supridas pelos princípios gerais de direito e pelos princípios que regem o processo desportivo ou por analogia. A essa atividade se dá o nome de integração, o que significa que o julgador efetua a complementação da norma concreta, que não foi prevista pelo legislador. A lei processual desportiva, no entanto, veda as decisões por analogia no que se refere à definição e qualificação de infrações, constituindo, pois, uma exceção a sua aplicação. Podemos dizer que interpretação e a integração se comunicam e se completam na justa aplicação do direito, devendo o intérprete atentar para o fato de que na interpretação busca-se o sentido da norma e na integração a sua complementação. 18 2.4- Eficácia da Lei Processual Desportiva no Tempo e no Espaço O Direito Processual Desportivo não foge a regra de que toda a norma jurídica limita-se no tempo e no espaço, aplicando durante um lapso de tempo em um determinado território. 2.4.1- No Tempo A sua eficácia temporal esta sujeita as regras gerais de direito intertemporal previstas nos art. 1º, 2º e 3º da Lei de Introdução do Código Civil e terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito e a coisa julgada conforme preceitua o art. 6ª da LICC, direito este que a Constituição Federal assegura no seu art. 5º inciso XXXVI. Para tanto, os processos desportivos que iniciarem na vigência da lei nova por estas serão regulados, em contrapartida a lei nova não incidirá sobre os processos findos. Tratando-se de processos em curso, a lei processual desportiva determina que devem ser mantidas as regras da lei anterior, ex vi, o que dispõe o art. 286 do CBJD: “Este Código entrará em vigor na data de sua publicação, mantidas as regras anteriores aos processos em curso”. 19 2.4.2- No Espaço A lei processual desportiva tem aplicação em todo território nacional, impondo, portanto, o princípio da territorialidade, “lex fori”, da qual ficam submetidas às entidades compreendidas pelo Sistema Nacional do Desporto e todas as pessoas físicas e jurídicas que lhes forem direta ou indiretamente filiadas ou vinculadas. 2.5- Relação do Direito Processual Desportivo com o Direito Constitucional Não há como negar a relação do direito processual desportivo com o direito constitucional, estabelecendo o equilíbrio e o real conhecimento que deve ter o auditor julgador no que concerne ao processo e a seus princípios. Nos moldes da Constituição Federal o direito processual desportivo estabelece o equilíbrio e o real conhecimento de seus princípios, fixa a estrutura e a competência dos órgãos da Justiça Desportiva, o direito de ação, as formas de procedimentos e demais atos que falaremos mais adiante. Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Dinamarco afirmam que “Todo o direito processual, como ramo do direito público, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo direito constitucional, que fixa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, que garante a distribuição da justiça e a declaração do direito objetivo, que estabelece alguns princípios processuais. E seguem dizendo que “Alguns dos princípios gerais que informam são, ao menos inicialmente, princípios constitucionais ou 20 seus corolários: em virtude deles o processo apresenta certos aspectos, como o do juiz natural, o da publicidade das audiências, o da posição do juiz no processo, o da subordinação da jurisdição à lei, o da declaração e atuação do direito objetivo; e, ainda, os poderes do juiz no processo, o direito de ação e de defesa, a função do Ministério Público, assistência judiciária”. 6 Visando proteger o ordenamento jurídico, a Justiça Desportiva foi constitucionalizada e prevista nos parágrafos 1º e 2º do art. 217 da Lei Maior, com atribuições de dirimir conflitos de natureza desportiva e competência limitada ao processo e julgamento de infrações disciplinares definidas no código desportivo. 21 CAPÍTULO III PRINCÍPIOS QUE REGEM O DIREITO PROCESSUAL DESPORTIVO 3.1- Noções Gerais Cada sistema processual se alicerça em princípios gerais que se estendem a todos os ordenamentos, como também em outros que lhes são próprios e específicos. Como bem os define José Afonso da Silva “Os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas”. 7 Os princípios norteadores do regime jurídico desportivo e previstos no Código Brasileiro de Justiça Desportiva em seu art. 2º, têm como objetivo assegurar a proteção e a garantia do direito de todas as pessoas física e jurídica que direta ou indiretamente tenham relação com as atividades desportivas e a sua inobservância pode acarretar a nulidade do processo desportivo. Marcílio César Ramos Krieger em seu comentário coloca que: “os princípios fundamentais dão viabilidade prática tanto a garantia constitucional do desporto como direito fundamental, quanto ao da autonomia das entidades práticas e dirigentes – autonomia 22 pressupõe o respeito às normas constitucionais quanto às normas e regras internacionais das respectivas modalidades”. 8 Tem como função precípua, auxiliar no processo interpretativo das regras e normas, permitindo o preenchimento de suas lacunas e na solução dos casos omissos.(art.282 CBJD). Podemos afirmar que por um feito inédito, o novo Código Brasileiro de Justiça Desportiva em seu Livro I – Capítulo I - art. 2º traz o rol de princípios orientadores, fato este nunca adotado em códigos anteriores. Vejamos cada um separadamente. 3.2- Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório Princípios Constitucionais, que asseguram as partes (acusação e defesa) a produzir suas alegações, provas e fatos capazes de elucidar, desmentir as acusações que lhe forem feitas, como também proteger os seus direitos. E nesse sentido, respeitando o princípio da ampla defesa e do contraditório é que o art. 56 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva dispõe que “Todos os meios legais, bem assim os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos alegados no processo desportivo” Obrigado a proferir decisões rápidas e com celeridade processual inerente às competições desportivas, os auditores das instâncias desportivas devem permitir que o acusado tenha todas as condições de exercer a sua defesa. As decisões devem estar fundamentadas na certeza dos fatos, não podendo, entretanto, subsistir qualquer decisão condenatória fundamentada na dúvida. 23 Nesse diapasão, a lei processual desportiva inovou no que diz respeito à súmula e o relatório de árbitros, auxiliares e representantes da entidade promotora do evento desportivo, atribuindo presunção de veracidade a súmula, ou seja, ela servirá de base para a formulação da denúncia pela Procuradoria ou como meio de prova, no entanto, não constituindo verdade absoluta(art. 58 CBJD). Diante disso é possível contraditar a narrativa do árbitro constante da súmula do evento desportivo, ou até provar fatos antidesportivos não informados pela mesma, garantindo, assim, a ampla defesa e o contraditório. 3.3- Princípio da Celeridade Uma das peculiaridades do regime jurídico desportivo é o dinamismo com que são cumpridos os atos processuais, evitando com isso que decisões tardias ou infrações não apreciadas em tempo hábil acarretem prejuízos irreparáveis ao sistema desportivo, principalmente com relação aos atletas como também às competições, o que viria de encontro ao ordenamento jurídico. É de bom alvitre lembrar que a Constituição Federal determinou o prazo de 60(sessenta) dias para a solução definitiva do litígio desportivo. Inácio Nunes diz que “o principio da celeridade na prestação de Justiça é desejo agasalhado na alma de toda a sociedade e na mente de todos quantos têm por mister a aplicação da lei”. 9 No mesmo sentido já dizia Carnelutti que “justiça tardia, freqüentemente é uma justiça pela metade”. 24 3.4- Principio da Economia Processual Sua finalidade é evitar que atos desnecessários sejam praticados, comprometendo a agilidade no alcance da finalidade a que se propõe a Justiça Desportiva. Ela está estruturada e aparelhada para agir rápido e cumprir com suas obrigações sem morosidade. O rigor no formalismo não é aplicado ao processo desportivo. 3.5-Princípio da Impessoalidade A Justiça Desportiva dispensa um tratamento isonômico a todos os participantes dos eventos desportivos sobre sua jurisdição. Se houve a prática de uma infração disciplinar, para as instâncias desportivas não importa se o denunciado é o árbitro, atleta, técnicos, dirigente de entidade de prática desportiva, entidade administrativa do desporto e seus funcionários ou até membro do Tribunal de Justiça Desportiva, o caso dever ser processado e julgado sem distinção. Para tanto, exige-se que o auditor julgador disponha de conhecimentos técnico-jurídicos desportivos capazes de permitir-lhe uma avaliação correta da caracterização da infração. 3.6-Princípio de Independência A Justiça Desportiva deve atuar com autonomia e total independência das entidades administrativas do desporto, sendo vinculada apenas com relação à parte econômica, haja vista que a mantença da estrutura de suas instâncias é de competência das entidades. 25 3.7- Principio da Legalidade Tido como o mais importante dos princípios, assegura plenamente o cumprimento do disposto no art. 5º da Constituição Federal, precisamente nos incisos II, XXXVI, XXXIX, LV, LVI, LVII. LX e LXXVII pertinentes ao regime jurídico desportivo. Sob o aspecto formal, que também é chamada de princípio da reserva legal, esta estabelecido nos parágrafos 1º e 2º art. 217 da Lei Maior, que ao instituir a Justiça Desportiva remeteu a sua regulamentação à lei ordinária competente, que no caso é a Lei Geral Sobre Desportos(Lei 9615/98), onde no caput do art. 50 determina a competência do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, no que se refere a organização, funcionamento e atribuições da Justiça Desportiva, nos termos constitucionais, ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas. Por sua vez o Livro II do CBJD vêm enumerando as medidas disciplinares, especificando as disposições legais. Portanto constituem o princípio da reserva legal do Direito Desportivo Brasileiro, a Constituição Federal(art. II e art. 217 parágrafo 1º), a Lei Geral Sobre Desportos(art. 1º, parágrafo 1º e art. 50) e o Código Brasileiro de Justiça Brasileiro. No que tange ao seu aspecto material, ou princípio da tipicidade, está estabelecido nos moldes do que preceitua o art. 5º inciso XXXIX da CF, quando dispõe que “não há crime, sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”; no CBJD quando em seu art. 153 dispõe que “é punível toda infração disciplinar, tipificada no presente Código”, definindo ainda no art. 156 que “Infrações Disciplinares para os efeitos deste código é toda ação ou omissão antidesportiva, típica e culpável”. Nos dispositivos subseqüentes do CBJD estão explicitadas as condições em que tais ações ou omissões constituem violação a serem punidas pela Justiça Desportiva. 26 3.8-Princípio da Moralidade A moralidade desportiva é voltada para os valores basilares da prática desportiva, como o respeito aos atletas e entre os atletas, aos desportistas em geral e ao “fair play” como também ao próprio expectador. A prática da imoralidade gera a contaminação de todo um sistema desportivo, viciando qualquer ato, sujeitando o mesmo ao controle da Justiça Desportiva. 3.9- Princípio da Motivação Diz-se da exposição das razões de fato e de direito que servem de base para uma decisão. Os votos dos auditores devem ser fundamentados, pois o acusado necessita conhecer e compreender as razões da procedência ou não de uma denúncia contra si formulada, possibilitando ao mesmo o exercício do amplo direito de recurso. Compete ainda aos auditores a expedição de acórdãos na própria seção de julgamento, se requerido pela parte. Para tanto, a instrução processual e os fundamentos do colegiado “a quo”, que são as Comissões Disciplinares, devem ficar de alguma maneira consignados. 3.10-Princípio da Oficialidade Atualmente, não é uma prática comum nas instâncias desportivas, através de seus Presidentes, a atuação de ofício em casos isolados. Necessário se faz que a parte interessada formule queixa encaminhando ao Tribunal de Justiça Desportiva da modalidade, que o analisará. Sendo admissível o pedido, este será remetido à apreciação do Procurador. Somente 27 nos casos mais complexos, que coloquem em risco a paz, a moralidade e a disciplina desportiva, principalmente hoje com a evolução e profissionalização das competições e os interesse envolvidos, a atuação da Justiça Desportiva se faz obrigatória. 3.11- Princípio da Oralidade Como as decisões na Justiça Desportiva devem ser proferidas com rapidez, certos atos processuais são produzidos oralmente e está ligado diretamente com o princípio da celeridade, podendo os mesmos ser produzido por escrito. No entanto, alguns atos dependem de forma escrita como a denúncia, a citação e a intimação. 3.12- Princípio da Proporcionalidade O poder discricionário na apreciação das provas e no convencimento do auditor julgador não o autoriza a agir com excessos. Uma vez exercida tal postura, fica caracterizado o desvio de finalidade e abuso de poder. O poder de decisão requer do auditor julgador, que está investido na função jurídico- desportiva, a exteriorização de atos coerentes e sensatos. 3.13- Princípio da Publicidade É dever das instâncias desportivas divulgar os seus atos, a fim de que a sociedade desportiva, sujeita ao Código Brasileiro de Justiça Desportiva, tome conhecimento ou mesmo para esclarecimento de interesse individual. 28 Trata-se de um dos componentes de controle da legitimidade. Com exceção do sigilo e circunstâncias de ordem interna, as decisões e os procedimentos devem ser disponibilizados através de publicação por edital, boletim ou por meios eletrônicos, a fim de não obstacular os procedimentos e providências por parte do litigante interessado. Quando houver casos envolvendo atletas menores, devem ser observadas as exigências elencadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente(ECA), tanto no que se refere aos atos processuais de comunicação como também no que tange as sessões de julgamento. O sistema de publicidade dos atos processuais na Justiça Desportiva garante a independência, imparcialidade, autoridade eresponsabilidade dos auditores. 3.14- Princípio da Razoabilidade É um atributo exigível dos membros das instâncias desportivas. Os auditores julgadores devem atuar com bom senso, ponderação e prudência ante o infortúnio de situações deferidas a seu encargo, atendo-se a razoabilidade da sanção e ao objetivo maior que é o da moralização do desporto nacional. 3.15- Princípios Intrínsecos do Direito Processual Desportivo Além dos princípios geradores do Direito Processual Desportivo, existem princípios, que apesar de não constarem explicitados na legislação processual desportiva, foram prestigiados e que na prática a sua aplicação é ostensiva, constituindo verdadeiras normas jurídicas. 29 Paulo Marcos Schmitt discorrendo sobre os princípios que norteiam o direito processual desportivo coloca que “Entretanto, embora não expresso formalmente pelo notório conhecimento doutrinário e jurisprudencial que possui, o uso dos princípios precede qualquer omissão contida na lei. Vai além. Os princípios informam a correta interpretação de todo o aparelho legal. Não basta conhecer a codificação desportiva, faz-se necessário o seu estudo conceitual e principiológico. Uma codificação é editada com uma finalidade específica. Distanciar-se desse fim – o espírito da lei – significa incorrer em erro invencível de interpretação, qual seja, desprezar os seus princípios explícitos e implícitos”.10 3.15.1- Princípio da Verdade Real Os auditores têm o dever de investigar como os fatos se passaram na realidade. Na instrução ou até mesmo antes de proferir a decisão, os auditores, para exercerem o juízo de certeza dos fatos apresentados, podem propor ao órgão judicante que se faça uma diligência a fim de dirimir dúvida sobre algum ponto relevante, adiando, assim, o julgamento. 3.15.2- Princípio Devido Processo Legal Tem por objetivo assegurar aos desportistas em geral a garantia de um processo desenvolvido na forma que estabelece a lei, ou seja, o due process of law acolhido pelo art. 5º inciso LIV da Constituição Federal. Garante ao 30 acusado a plenitude de defesa, como o direito de ser ouvido, de ser informado pessoalmente de todos os atos processuais, de se manifestar após ter sido denunciado, à publicidade e motivação das decisões, ao duplo grau de jurisdição, a revisão da decisões e a imutabilidade das decisões favoráveis transitadas em julgado. 3.15.3- Princípio da Transparência Todos os atos decisórios na Justiça Desportiva são de natureza pública, não correndo em segredo, salvo exceções previstas por lei. 3.15.4- Princípio da Informalidade O processo desportivo dispensa o rigor das formas, pois seria incompatível e lesivo para com a sua própria finalidade. 3.15.5- Princípio do Impulso Oficial Consiste em atribuir ao órgão jurisdicional desportivo a incumbência de mover o processo de fase a fase até a decisão final, não dependendo do impulso das partes, haja vista a relevância do interesse da Justiça Desportiva na rápida e eficaz solução das demandas. 31 CAPÍTULO IV JUSTIÇA DESPORTIVA 4.1- Conceito Podemos conceituá-la como o conjunto de instâncias autônomas e independentes das entidades de administração do desporto, dotadas de personalidade de direito público ou privada, tendo como atribuição, dirimir as questões de natureza desportivas definidas no Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Sebastião José Roque define lides tipicamente desportivas como “controvérsias que, por sua natureza e pelas circunstâncias em que soem acontecer, não extrapolam os limites e o terreno da competição desportiva tout court, sendo, por isso, desejável que venham a ser dirimidas “interna corporis”, pelos próprios órgãos da Justiça Desportiva”. 11 A Justiça Desportiva Brasileira foi instituída pela Constituição Federal de 1988, com caráter administrativo, precisamente nos parágrafos 1º e 2º do art. 217, garantindo a sua primazia para o julgamento dos fatos relativos ao desporto e regulada pela Lei Geral Sobre Desportos (Lei 9615/98). Art. 217. É dever do estado fomentar práticas desportivas formais e não-informais, como direito de cada um, observados: 32 Parágrafo Primeiro: O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei. Parágrafo Segundo: A justiça desportiva terá o prazo máximo de 60(sessenta) dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final. No que diz respeito aos preceitos acima citados, a Constituição Federal vislumbrou toda uma problemática com relação ao congestionamento da Justiça Comum o que dificultaria a tramitação rápida e célere, já que na prática desportiva a demora no andamento das demandas desportivas prejudicaria sobremaneira os atletas como também o andamento das competições, partidas ou equivalentes, que possuem um calendário inadiável e que não poderiam ficar a mercê de sua morosidade, aliado ao fato do despreparo da Justiça Estatal no que diz respeito às questões jurídicas desportivas, uma vez que é exigido dos julgadores o conhecimento da técnica jurídica desportiva, sendo certo que há peculiaridades da legislação desportiva afeitas somente por quem milita nos desportos. Álvaro Melo Filho comenta que “os parágrafos 1º e 2º do art. 217, evidentemente, não acabam, mas limitam e restringe a interferência do Poder Judiciário nos desportos, sem aniquilar a garantia constitucional que assegura o acesso das pessoas físicas e jurídicas a Justiça Comum para defesa de seus direitos. A fórmula obriga, apenas, o exaurimento das instâncias da Justiça Desportiva, ou, se ela não proferir decisão final, no prazo de 60 (sessenta) dias, no máximo, contados da instauração do processo. Era essa, assim, a medida 33 necessária, profilática e inibidora de despachos e decisões da Justiça Estadual com efeitos irreversíveis e danosos às competições e à disciplina desportiva, muitas vezes gerando frustrações coletivas e desnaturando a função social e educativa do próprio desporto”. 12 Marcílio Cesar Ramos Krieger assinala que “Os bens jurídico-desportivos, como o “fair play”, o respeito aos atletas e aos desportistas em geral devem ser preservados. É para isto que existe a Justiça Desportiva, exercendo função delegada pela Constituição Federal para processar e julgar as infrações contra a disciplina e a organização desportivas”.13 Adquire, portanto, a Justiça Desportiva a condição de contencioso administrativo, constitucionalmente reconhecido para processar e julgar as ações relativas ao desporto, usando procedimentos próprios e aplicando às sanções previstas no Livro II do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Acentua Inácio Nunes que “Em boa hora e em face do preceito constitucional, o CBJD procura eliminar a possibilidade de que, por interposta pessoa (“laranja”), alguém ou alguma entidade possa beneficiar-se de ações judiciais perante a Justiça comum sem análise prévia da Justiça Desportiva.. e a entidade desportiva ou o atleta individualmente que se utilizar de tal subterfúgio será excluído do campeonato e ainda sofrerá a multa de valor entre R$ 50.000,00 34 (cinqüenta mil reais) e R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) (art. 231)”. 14 Há que se ressaltar, que ao institucionalizar a Justiça Desportiva, tirando-a dos textos das leis e dos regulamentos ordinários, a Constituição Federal de 1988 lhe outorgou um valor jamais concedido a qualquer outro órgão administrativo judicante. O regime jurídico desportivo e seus princípios guardam conceitos cujo únicoobjetivo está centralizado no alcance de uma finalidade, seja ela privada, calcada na autonomia constitucional conferidas aos órgãos judicantes, no que se refere a sua organização e funcionamento ou pública, haja vista que tanto a administração do desporto quanto os administrados possuem prerrogativas e direitos. 4.2- Natureza Jurídica Deve ser entendida como um sistema de justiça reguladora, fiscalizadora e disciplinadora de atos praticados pelos desportistas em geral, que vão de encontro a moral do desporto nacional. Para Sebastião José Roque “a Justiça Desportiva é um sistema de julgamento que caminha de forma paralela à jurisdição normal: objetiva dirimir as lides surgidas no campo desportivo. Mais precisamente, envolve pessoas físicas e jurídicas registradas nas federações esportivas e atos praticados nas competições esportivas promovidas pelas federações. Não atinge atos que não sejam praticados em decorrência de atividades desportivas promovidas pelas entidades reguladoras do esporte nacional, ou internacional, a 35 que estiver filiada a respectiva federação esportiva”.15 36 CAPÍTULO V ORGANIZAÇÃO, ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DOS ÓRGÃOS DA JUSTIÇA DESPORTIVA 5.1- Organização e Estrutura Aos órgãos da Justiça Desportiva a Lei Geral Sobre Desportos, Lei 9.615/98, em seu artigo 52, prevê uma estrutura orgânica e hierárquica, reconhecendo-os como entes autônomos e independentes das entidades de administração desportiva de cada modalidade, atuando com absoluta independência decisória, sendo vedadas quaisquer intervenções por parte das mencionadas entidades. “Art. 52. Os órgãos integrantes da Justiça desportiva são autônomos e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema, compondo-se do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, funcionando junto às entidades nacionais de administração do desporto; dos Tribunais de Justiça Desportiva, funcionando junto as entidade regionais da administração do desporto, e as Comissões Disciplinares, com competência para processar e julgar as questões previstas nos Códigos de Justiça Desportiva, sempre assegurados a ampla defesa e o contraditório”. Na Justiça Desportiva haverá tantos Superiores Tribunal de Justiça Desportiva quantas forem às entidades nacionais de administração do desporto e tantos Tribunais de Justiça Desportiva quantas forem às entidades estaduais de administração do desporto. 37 Exemplificando através de duas modalidades distintas: Junto a Confederação Brasileira do Futebol – CBF funciona um Superior Tribunal de Justiça Desportiva que julga a nível nacional somente as questões ligadas ao futebol. Junto a Federação Aquática do Estado do Rio de Janeiro – FARJ funciona um Tribunal de Justiça Desportiva que julga a nível estadual as questões que diz respeito aos esportes aquáticos(natação, pólo-aquático, nado sincronizado e saltos ornamentais). Para um melhor entendimento veja o organograma no Anexo 01. Inácio Nunes coloca que “Ao lado da Federação Estadual de cada modalidade desportiva, haverá um TJD para julgar os fatos do respectivo esporte (competência) exclusivamente dentro do território daquele estado (jurisdição), nas competições organizadas pela respectiva Federação”. 16 5.2- Composição A composição dos Tribunais Desportivos vem preceituada no artigo 55 da Lei Geral Sobre Desportos, Lei 9.615/98 e nos artigos 4º e 5º do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Os membros que compõem as três instâncias da Justiça Desportiva são chamados de auditores, os quais exerce função delegada pela Constituição Federal, aumentando, com isso, a responsabilidade judicanti desportiva. O Superior Tribunal de Justiça Desportiva e o Tribunal de Justiça Desportiva de cada modalidade é formado de nove membros, dos quais dois indicados pela entidade nacional de administração do desporto, dois indicados 38 pelas entidades de prática desportiva, dois indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, um indicado pelo órgão de classe representante dos árbitros e dois indicados pelo órgão de classe representante dos atletas. As Comissões Disciplinares órgãos que funcionam como primeira instância junto ao STJD e o TJD, devem ser compostas de 5(cinco) membros indicados pelos tribunais da respectiva modalidade, sendo certo que não podem ser componentes dos mencionados tribunais, conforme determina o artigo 6ª do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Cada Tribunal poderá criar tantas Comissões Disciplinares que julgar necessário para agilizar as demandas desportivas. Os três órgãos judicantes terão sempre um Presidente e um Vice- Presidente que cumulará a função de Corregedor, eleitos na forma da lei e de seu Regimento Interno. Todas as deliberações e julgamentos só se darão com a presença da maioria de seus auditores. O quorum mínimo para o julgamento tanto no STJD como no TJD é de cinco auditores e na Comissão Disciplinar o quorum mínimo é de três auditores. Assim, todos os órgãos da Justiça Desportiva são denominados colegiados. 39 CAPÍTULO VI JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA DAS INSTÂNCIAS DESPORTIVAS 6.1- Noções Gerais Em sede de Justiça Desportiva, a jurisdição pode ser definida como o poder conferido aos órgãos judicantes desportivos dentro do limite territorial de cada um, para o conhecimento e solução de determinadas demandas desportivas. Os órgãos judicantes estão diretamente relacionados com os limites de atuação das entidades da administração do desporto, seja ele nacional (confederações) ou regional ou estadual (federações) e por modalidade esportiva. O Superior Tribunal de Justiça Desportiva e o Tribunal de Justiça Desportiva além de terem a competência para julgar os processos especiais, são órgãos judicantes que atuam em grau de recurso em 2ª instância como também em 3ª instância no caso de haver o esgotamento da matéria no Tribunal de Justiça Desportiva. As Comissões Disciplinares, salvo as hipóteses de competência originária do STJD e do TJD, são órgãos de 1ª instância, cabendo aos mesmos processar e julgar as infrações disciplinares cometidas por pessoas física ou jurídica que estejam submetidas ao Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Para melhor entendimento a respeito da distribuição de competência, veja o quadro elucidativo referente à competência do Superior Tribunal de 40 Justiça Desportiva e sua Comissão Disciplinar e do Tribunal de Justiça Desportiva e sua Comissão Disciplinar no Anexo 3. 41 CAPÍTULO VII ATRIBUIÇÕES DOS MEMBROS DA JUSTIÇA DESPORTIVA 7.1- Do Presidente e Vice-Presidente Cabe ao Presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva e do Tribunal de Justiça Desportiva a responsabilidade pela boa atuação da Justiça Desportiva, além do bom desempenho dos processos disciplinares que são exercidos por profissionais capacitados para a função, além de notório saber jurídico. O Presidente do STJD e do TJD tem por dever orientar a preparação da pauta das sessões de julgamento, ter a capacidade de conduzir as atividades, a fim de apurar todos os fatos durante as sessões. Cabe a ele nomear o auditor relator de cada processo e a ele será atribuído o voto de qualidade em caso de empate. 7.1.1- Atribuições As atribuições dos Presidentes dos órgãos judicantes estão elencadas no art. 9º do CBJD, além das que lhes forem conferidas por lei e pelo Regimento Interno. Estão assim distribuídas: 42 � zelar pelo perfeito funcionamento da Justiça Desportiva e fazer cumprir suas decisões; � ordenar a restauração de autos; � dar imediata ciência, por escrito, das vagas verificadasno Tribunal ao presidente da entidade indicante; � determinar sindicâncias e aplicar a pena de advertência e suspensão aos seus funcionários; � sortear ou designar os relatores dos processos; � dar publicidade às decisões prolatadas; � representar o respectivo órgão judicante nas solenidades e atos oficiais, podendo delegar essa função a qualquer dos auditores; � designar dia e hora para as sessões ordinárias e extraordinárias e dirigir os trabalhos; � dar posse aos auditores do respectivo órgão judicante e de suas Comissões Disciplinares, aos Procuradores e aos Secretários; � exigir da entidade de administração o ressarcimento das despesas correntes e dos custos de funcionamento do tribunal e prestar-lhe contas; � acolher e processar os recursos voluntários e os necessários; � conceder efeito suspensivo a qualquer recurso, em decisão fundamentada, quando a simples devolução da matéria possa causar prejuízo irreparável ao recorrente; � conceder licença do exercício de suas funções aos auditores, inclusive aos das Comissões Disciplinares, procuradores, secretários e demais auxiliares; Em casos excepcionais e visando o interesse do desporto nacional, além das atribuições acima descriminadas, o Presidente do STJD e TJD poderá, através de ato fundamentado, permitir o ajuizamento de qualquer medida não prevista no Código Brasileiro de Justiça Desportiva, desde que requerida no prazo de 5 (cinco) contados da decisão do ato, do despacho ou da inequívoca ciência do fato, podendo conceder efeito suspensivo ou liminar quando houver fundado receio de dano irreparável. 43 Deve o Vice-Presidente dos órgãos judicantes conforme determina o art. 10 da CBJD, substituir o Presidente nos eventuais impedimentos e definitivamente quando da vacância; representar o órgão judicante nas solenidades e atos oficiais, quando essa função lhe for delegada e exercer as funções de Corregedor da Justiça Desportiva na forma que dispuser o regimento interno. 7.2- Do Presidente da Comissão Disciplinar As atribuições do Presidente da Comissão Disciplinar devem estar estabelecidas no regimento interno do respectivo Superior Tribunal de Justiça Desportiva e do Tribunal de Justiça Desportiva, estando, no entanto, previsto no parágrafo segundo do art. 9º do Código Brasileiro de Justiça Desportiva que examinará os requisitos de admissibilidade do recurso, encaminhando-o à instância superior. 7.3- Dos Auditores Os auditores são membros dos tribunais desportivos, responsáveis pelo julgamento das questões disciplinares, de notório saber jurídico e conduta ilibada além de serem profundos conhecedores das normas aplicadas no desenvolvimento de sua atuação junto as instâncias desportivas. Serão incompatíveis para exercer o cargo de Auditor todos aqueles que por ventura sejam membros do Conselho Nacional do Desporto, os dirigentes das entidades de prática desportiva e os dirigentes e funcionários das entidades de administração do desporto. 44 7.3.1- Posse e Mandato A posse dos auditores dos tribunais desportivos deve ocorrer de conformidade com o Regimento Interno de cada órgão, seja no STJD ou no TJD, conforme determina o art. 11 do CBJD. “Art. 11. Os membros dos órgãos judicantes serão empossados na conformidade do que dispuser o respectivo regimento interno de cada órgão”. O mandato atualmente é de 4 (quatro) anos permitida, no entanto, a recondução, de acordo com o parágrafo segundo do art. 55 da Lei Geral Sobre Desporto(Lei 9.615/98). Inácio Nunes comenta que “Os mandatos dos Auditores têm sua duração prevista em lei, que atualmente é de quatro anos, permitidas reconduções. Como o CBJD não limitou o número permitido, seus membros podem eternizar- se como Auditores dos tribunais, sem qualquer renovação de seus quadros”. 17 7.3.2- Requisitos de Atuação dos Auditores A função jurisdicional exercida pelos auditores, seja no STJD, no TJD ou nas Comissões Disciplinares, para ser válida e eficaz necessita de alguns requisitos: 1) Estar investido do poder de jurisdição; 2) Atuar dentro dos limites de atribuições asseguradas pela lei desportiva; 3) Atuar com imparcialidade, isento de qualquer influência das partes envolvidas e das pressões exercidas pelos interessados; 45 4) Não estar subordinado a nenhum outro tribunal, se colocando acima de qualquer poder político ou das massas que por ventura exerçam pressão sobre suas decisões; 5) Deve se ater somente à ordem processual desportiva; Neste sentido Álvaro Melo Filho faz a seguinte colocação: “Adite-se, por oportuno, que o desporto empolga e leva as massas a delírios, porém, o integrante da Justiça Desportiva, aquele que trata da disciplina e das infrações ocorridas nos certames, não pode envolver-se nas mesmas paixões dos torcedores comuns. E, como se trata de Justiça Desportiva, só em ter presente a expressão justiça, exige de seus membros, por ocasião do veredicto, despir-se de todas as impurezas de seu ego, tirando a camisa dos clubes que torcem e esquecendo de suas cores desportivas, devem prolatar uma decisão justa, humana e compatível com o fim do desporto. No momento da decisão, nada de represálias ou de vindictas, e devem sempre pensar em promover o desporto e não a si mesmos. Por isso, não há lugar na Justiça Desportiva para torcedores apaixonados, conquanto paixão e justiça nunca se misturam,e, quando isto ocorre, o resultado já é consabido: injustiça”. 18 7.3.3- Suspeição e Impedimentos Conforme acontece na Justiça Comum, o procedimento desportivo é pautado nos princípios gerais de direito e nas garantias constitucionais, que possibilitam a segurança das partes envolvidas de obter um resultado correto e justo. 46 Para tanto, os membros auditores dos tribunais desportivos devem apresentar um considerável conhecimento técnico-jurídico desportivo e principalmente, devem estar totalmente desvinculados do litígio que vão julgar. O próprio auditor, diante de um caso concreto deve declarar seu impedimento para atuar em um determinado processo, seja porque é parente (consangüinio ou afim), seja porque é sócio, fiador, patrão, avalista ou tenha alguma ligação mais íntima com qualquer das partes. Caso não declare o seu impedimento, qualquer das partes ou mesmo a Procuradoria Desportiva que atue perante o Tribunal ou Comissão Disciplinar poderá argüir, fato este que será julgado pelo Tribunal ou pela Comissão Disciplinar, não sendo admitido, entretanto, a interposição de recurso da decisão prolatada. 7.3.4- Vacância Ocorrendo a Vacância, por morte, renúncia, ou por motivo de condenação pela própria Justiça Desportiva ou pela Justiça Comum, o Presidente do órgão judicante comunicará imediatamente ao órgão indicante competente para preencher a vaga. Caso o órgão indicante não preencha a vaga em 30 (trinta) dias, o respectivo órgão judicante designará um substituto para ocupar interinamente o cargo, já que os trabalhos das instâncias desportivas não podem ser interrompidos. 7.3.5- Competência Além das atribuições definidas no regimento interno de cada órgão judicante, compete aos auditores: 47 � a obrigatoriedade de seu comparecimento nas sessões, quando for convocado, com antecedência mínima de 20 minutos; � empenhar-se para o cumprimento das leis, das normas contidas no CBJD, além de zelar pelo prestígio das instituições desportivas; � se manifestar rigorosamente dentro dos prazos processuais; � representar contra qualquer irregularidade, infrações disciplinares ou sobre fatos ocorridos nas competições dos quais tomou conhecimento; � apreciar livremente as provas apresentadas nos autos, visando sempre o interessedo desporto, proferindo decisão fundamentada; � deverá devolver à Secretaria do Tribunal, em até 48 horas, qualquer processo que tenha em seu poder e que esteja incluído em pauta; 7.3.6- Livre Acesso Para desempenhar plenamente as suas funções, os membros dos tribunais desportivos deverão ter livre acesso a locais públicos ou privados, destinados ao evento desportivo da modalidade de competência do órgão judicante, devendo ser reservados aos mesmos assentos em setor designado para as autoridades desportivas, como determinado no parágrafo único do art. 20 do CBJD. A atuação da Justiça Desportiva, nestes casos, é tida como preventiva. Como é o caso da presença da Comissão Disciplinar em um evento desportivo, que tem como função preventiva no caso de ocorrência de uma infração disciplinar durante a competição, partida ou similar. O direito ao livre acesso visa também o cumprimento de determinados atos processuais, em dado momento, necessitam de serem realizados durante uma competição, como no caso da citação e da intimação de determinada pessoa para o julgamento de um processo disciplinar. 48 Caso seja obstaculado ou dificultado o acesso de qualquer membro a praça desportiva e aí incluindo a pessoa do Secretário do órgão judicante que comparece no local para cumprir alguma diligência, deverá ser comunicado o fato ao Presidente do STJD ou TJD de sua jurisdição, que poderá interditar, liminarmente, o local para a prática de qualquer atividade relativa à respectiva modalidade, intimando a entidade da administração do desporto para que tomem as medidas cabíveis para o cumprimento da decisão sob pena de suspensão até que o faça. 7.4- Da Procuradoria Desportiva Junto a Justiça Desportiva atua a Procuradoria Desportiva, cuja competência e organização são regulamentadas pelo Código Brasileiro de Justiça Desportiva, pelo Regimento Interno de cada órgão judicante e no Estatuto da Entidade de Administração do Desporto de cada modalidade. Guardadas as devidas proporções, a Procuradoria Desportiva desempenha um papel semelhante ao do Ministério Público. Perante cada Tribunal funcionam sempre dois Procuradores, que são nomeados pelo respectivo órgão judicante. Cabe aos Procuradores oferecer denúncia nos processos distribuídos aos Tribunais e Comissões Disciplinares como também emitir pareceres e interpor recursos, de acordo com previsão legal, exercendo as atribuições determinadas pelo art. 21 incisos I e II do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Os Procuradores terão livre acesso às praças desportivas, onde estejam sendo realizadas competições, partida ou equivalentes da modalidade do órgão judicante e também estarão sujeitos a declaração de impedimento ou incompatibilidade imposta aos auditores. Determina o artigo 22 do Código 49 Brasileiro de Justiça Desportiva que: “Aplicam-se aos procuradores o disposto no art. 20, e no que couber, as incompatibilidades e impedimentos impostos aos auditores, assim declarados pelo respectivo órgão judicante, na forma do inciso IV do artigo 14”. 7.5- Da Secretaria Cada Tribunal Desportivo dispõe de uma Secretaria com as atribuições previstas no Código Brasileiro de Justiça Desportiva e no Regimento Interno de cada órgão judicante. Fazem parte de suas atribuições à execução cartorial dos atos e termos processuais; recebimento de documentos e diligenciar a distribuição de correspondências; classificar os processos e efetuar o competente registro; confeccionar as pautas das sessões de julgamento; redigir a ata das sessões; elaborar ofícios, intimações e citações e demais questões administrativas das instâncias desportivas. O Secretário tem a competência de secretariar as sessões dos órgãos judicantes. 7.6- Dos Defensores O art. 29 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva preceitua que “Qualquer pessoa maior e capaz poderá funcionar como defensor, observados os impedimentos legais”. Considero frágil o mencionado dispositivo, uma vez que o legislador não atentou para o fato de que o defensor, necessariamente, para atuar junto aos Tribunais Desportivos, deve possuir um considerável conhecimento 50 técnico-jurídico da matéria. Ter apenas o conhecimento jurídico não basta, se faz necessário conhecer das normas e regras da modalidade em que vai atuar. Que me desculpe o legislador, “qualquer pessoa maior e capaz não estará apta a funcionar como defensor”, haja vista que até para os operadores do direito que militam na área desportiva demanda um estudo aprofundado da matéria, a fim de suprir certas dificuldades. Pelo desconhecimento da matéria, um defensor muitas vezes poderá prejudicar irremediavelmente à parte. Apesar do código não exigir a presença de um advogado, esta praxe não constitui uma regra absoluta, já que nas sessões de julgamento os advogados se fazem presentes, atuando como defensores. A Habilitação de defensor para intervenção no processo depende de declaração formalizada pela parte, podendo, no entanto, as entidades de administração do desporto e da prática desportiva credenciar defensores para atuar em seu favor, de seus dirigentes, dos atletas e de outras pessoas que lhes forem subordinadas, salvo quando colidentes os interesses 51 CAPÍTULO VIII JURISDIÇÃO, AÇÃO E PROCESSO 8.1- Jurisdição Jurisdição é o poder de deliberação regularmente conferida aos órgãos judicantes desportivo através de seus auditores, para o conhecimento de questões que vão de encontro a disciplina desportiva, agindo em substituição às partes. Para Liebman “o órgão jurisdicional é, na verdade, convocado para remover a incerteza ou reparar a transgressão, mediante um juízo que preste a reafirmar e restabelecer o império do direito, quer declarando qual seja a regra do caso concreto, quer aplicando as ulteriores medidas de reparação ou sanção revistas pelo direito.” 19 É uma função reconhecida constitucionalmente, tanto que o parágrafo primeiro do art. 217 dispõe que “O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem as instâncias da Justiça Desportiva, regulada em lei”. 52 8.1.1- Princípios da Jurisdição A jurisdição desportiva é informada por princípios universalmente conhecidos, a saber: a) princípio da investidura – a jurisdição é exercida pelos auditores investidos na autoridade de julgador. b) princípio da aderência ao território – os órgãos judicantes têm o seu limite territorial de acordo com as entidades da administração do desporto de cada modalidade. c) princípio da indelegabilidade – o auditor deve exercer os poderes que lhe foram conferidos de uma forma exclusiva e indelegável. d) princípio da inevitabilidade – a autoridade dos órgãos judicantes impõe-se por si mesma, independente da vontade das partes. e) princípio da inafastabilidade ou do controle jurisdicional – a lei processual desportiva não pode excluir da apreciação pela Justiça Desportiva qualquer infração disciplinar ou ameaça a direito e nem o auditor a pretexto de omissão ou lacuna da lei, escusar de proferir decisão. f) princípio do juiz natural – nenhum desportista será privado de um julgamento por auditores independentes e imparciais, ou seja, é o que chamamos de garantia do juiz competente. g)princípio do duplo grau de jurisdição – é a possibilidade de revisão das decisões por via de recurso, de ações por infração disciplinares já julgadas pela Comissão Disciplinar, órgão da primeira instância do TJD e STJD. 53 8.1.2 – Poderes Inerentes a Jurisdição São os que por sua natureza se tornam inseparáveis quais sejam: 1- Poder Jurisdicional – é o poder concedido ao auditor para a aplicaçãodo caso concreto as regras legais e regulamentares previstas. 2- Poder de Polícia – O Auditor Presidente da Comissão Disciplinar (órgão de 1ª instância), o Auditor Presidente do Tribunal de Justiça Desportiva e do Superior Tribunal de Justiça Desportiva de cada modalidade exercem o poder de polícia, que os autorizam a manter a ordem nas seções de julgamento. 8.1.3– Competência Humberto Theodoro Junior comenta que “Houve época que se confundiam os conceitos de jurisdição e competência. Em nossos dias, porém, isto não mais ocorre entre processualistas, que ensinam de maneira muito clara que a competência é apenas a medida da jurisdição, isto é, a determinação da esfera de atribuições dos órgãos encarregados da função jurisdicional”. 20 A competência é a medida e o limite da jurisdição dentro da qual os auditores dos órgãos judicantes desportivos poderão dizer o direito e a extensão do seu poder de julgar. Para Hely Lopes Meirelles “Entende-se por competência administrativa o poder atribuído ao agente da Administração para o desempenho específico de suas funções. A 54 competência resulta da lei e por ela é limitada. Todo ato emanado de agente incompetente, ou realizado além do limite de que dispõe a autoridade incumbida de sua prática, é inválido, por lhe faltar um elemento básico de perfeição, qual seja, o poder jurídico para manifestar a vontade da Administração”. 21 No direito processual desportivo existe três espécies de competência: a) Competência em razão da matéria (ratione materiae) - Limita-se unicamente a processar e julgar as infrações disciplinares e às competições desportivas, competência essa delegada pela Constituição Federal. b) Competência em razão da pessoa (ratione persona) – Os órgãos judicantes desportivos tem competência para julgar todas as entidades compreendidas pelo Sistema Nacional do Desporto como também todas as pessoas físicas e jurídicas que lhes forem direta ou indiretamente filiadas ou vinculadas. c) Competência em razão do lugar (ratione loci) – é extensiva a todo território nacional, sendo necessário observar os limites territoriais de cada entidade de administração do desporto e respectiva modalidade. Para cada modalidade desportiva existe uma federação e uma confederação. As competições, campeonatos ou partidas organizadas pelas federações são de âmbito estadual e as organizadas pelas confederações de âmbito nacional ou interestadual, se foram por elas organizadas. 8.2- Ação É um direito, uma garantia constitucional que possui o atleta, a entidade da prática desportiva ou da administração do desporto que se sinta 55 lesado ou prejudicado de exercer o seu direito público subjetivo, de provocar o órgão de justiça desportiva e até mesmo para prevenir danos irreparáveis. Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrine Grinover e Cândido Rangel Dinamarco dizem que “..é o direito ao exercício da atividade de jurisdicional (ou o poder de exigir esse exercício). Mediante o exercício da ação provoca-se a jurisdição, que por sua vez se exerce através daquele complexo de atos que é o processo”. 22 Para que se possa exigir, no caso concreto, a prestação jurisdicional, faz-se necessário o preenchimento das condições da ação que são: possibilidade jurídica do pedido; interesse de agir e a legitimidade para a causa. 8.2.1- Possibilidade Jurídica do Pedido O seu conceito no processo desportivo é aferido positivamente, se o ordenamento jurídico desportivo, em abstrato, o admitir expressamente. A denúncia será rejeitada quando o fato narrado na queixa ou reclamação ou no protesto, evidentemente não constituir infração disciplinar. No âmbito do processo desportivo, a apreciação da possibilidade jurídica do pedido deve ser analisada sobre a causa de pedir (causa petendi), mas, ao mesmo tempo, desvinculada de qualquer prova que porventura possa existir. É feita uma análise do fato da maneira que foi narrado na queixa, reclamação ou protesto, sem, no entanto, perquirir se essa constitui ou não a verdade real, para que se possa concluir se o ordenamento jurídico desportivo, in casu, comina-lhe, em abstrato, uma pena. Se for verificado que realmente 56 houve a ocorrência de uma infração disciplinar, passa, então, a ser apreciada a causa petendi, após os fatos colhidos na instrução, ou seja, a aferição dos fatos em concreto, conforme ocorreram e não como foram narrados. Diante disso, o auditor relator do processo proferirá o seu voto seguido dos votos dos demais membros auditores, sendo a decisão final proferida pelo auditor Presidente da Comissão Disciplinar. A mesma análise será feita no procedimento especial, nos casos de Mandado de Segurança, Impugnação de Partida, Prova ou Equivalente em cada Modalidade ou de seu Resultado, Reabilitação, Dopagem, Infrações Punidas com Eliminação Inquérito, Suspensão, Desfiliação ou Desvinculação impostas pelas entidades de administração do desporto, na Revisão e nas demais medidas admitidas no parágrafo terceiro do art. 9º do CBJD, os quais serão apreciados e julgados pelos órgãos de segunda instância. 8.2.2- Interesse de Agir Devem ser verificadas a necessidade e utilidade do uso das vias jurisdicionais para a defesa do interesse material pretendido como também sua adequação ao procedimento que possibilite a atuação da vontade concreta da legislação processual desportiva, tudo de acordo como o devido processo legal. Diz-se da necessidade, já que é impossível se impor uma pena disciplinar ao desportista tido como infrator, sem o devido processo legal. Caso fique demonstrada a inutilidade do provimento jurisdicional, dar- se-á pela inexistência do interesse de agir. 57 8.2.3- Legitimação para a causa (Legitimatio ad causam) Diz-se da legitimação para ocupar tanto o pólo ativo da relação processual, o que é feito pelo Procurador da Comissão Disciplinar (no procedimento sumário), na denúncia do infrator ou do pólo passivo, que seria o próprio autor da infração disciplinar, o qual possui a capacidade para estar no pólo passivo, em nome próprio, e na defesa de seu próprio interesse. Em suma, determina que o Autor (Procurador no procedimento sumário) seja aquele a quem a lei desportiva assegura o direito de invocar a tutela jurisdicional e o Acusado aquele contra o qual o Autor pretenda uma punição por uma infração disciplinar cometida. 8.3- Processo Desportivo O processo desportivo é o instrumento de atuação da jurisdição, sem o qual não há como solucionar os litígios. É composto de um elemento objetivo, que seria a cadeia de atos e fatos coordenados, juridicamente perfeitos e com o objetivo de preparar o provimento final que é a decisão e de um elemento subjetivo que é a relação jurídica processual propriamente dita. Em suma, é o ordenamento sistemático de atos específicos e peculiares a cada caso, visando decisões que ponham termo a conflitos desportivos, aplicando o direito ao seu caso concreto. 58 8.3.1- Natureza Jurídica Sua natureza jurídica é de uma relação processual, caracterizado como um nexo que une e disciplina a conduta dos sujeitos processuais, no desenrolar do procedimento desportivo. 8.3.2- Finalidade do Processo Desportivo O processo desportivo tem por finalidade precípua, a proteção dos direitos dos atletas, das entidades de prática desportiva(os clubes) e das entidades da administração(federação e confederação), aí relacionados os seus funcionários, atender aos objetivos da prática desportiva e a observância das regras das competições, partidas ou equivalentes, reprimindo veementemente às atitudes antidesportivas. Para tanto se faz mister definirem cada caso submetido a julgamento, o tipo de infração disciplinar cometida, identificar os culpados, aplicar as sanções impostas pela legislação desportiva e exigir reparação com relação a eventuais efeitos danosos causados ao desporto. Pela sua finalidade, o processo desportivo adota um sistema concentrado de instrução e julgamento, que se desenvolve com brevidade, sem comprometer a segurança na apuração dos fatos e na correta aplicação da instrução procedimental, mediante a reunião de elementos probatórios, admitindo todas as provas legais (art. 56 do CBJD), para que no final seja proferida uma decisão fundamentada, clara e precisa. 59 8.3.3 Características Peculiares do Processo Desportivo A sua característica principal é a informalidade, respeitando, no entanto, os princípios que envolvem a proteção dos direitos fundamentais do contraditório, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição, assegurando a correta aplicação do direito desportivo. Diga-se, que o formalismo é incompatível e lesivo à própria finalidade do processo desportivo, além de ser desnecessário. O art. 36 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva dispõe que “Os atos do processo desportivo não dependem de forma determinada senão quando este código expressamente o exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial”. Outra característica peculiar do processo desportivo é o do impulso oficial, haja vista que uma vez instaurado o processo, seja qual for a forma de procedimento, o seu andamento não depende de iniciativa ou provocação de qualquer das partes, aplicando-se, portanto, o princípio da oficialidade previsto no art. 2º do CBJD. Em nenhum momento o processo poderá ficar paralisado, já que na maioria das vezes dependem de soluções rápidas, evitando-se, assim, gerar prejuízos tanto aos atletas bem como a todos os envolvidos nas competições, partidas ou equivalentes. 8.3.4 – Elementos Identificadores da Relação Processual Desportiva Na relação processual desportiva, são três os elementos que o identificam, diferenciando, no entanto, do direito material. 60 8.3.4.1- Sujeitos Processuais �No Procedimento Sumário: �Órgão Judicante � Procurador (autor) � Acusado �No Procedimento Especial: �Órgão Judicante � Autor � Procurador 8.3.4.2- Objeto da Relação Processual É a própria prestação jurisdicional requerida ao órgão judicante. No procedimento sumário é a apuração da ocorrência de uma infração disciplinar cometida e no procedimento especial são as medidas especiais requeridas aos órgãos judicantes, em caráter de urgência. Cito o Mandado de Garantia, a Impugnação da Partida ou o Resultado dentre outras. 8.3.5- Pressupostos Processuais São requisitos para a constituição de uma relação processual válida, que ao lado das condições da ação, formam os requisitos de admissibilidade do julgamento do mérito: 61 Subjetivos – relacionados aos principais sujeitos da relação processual desportiva. Quanto aos auditores: a) Investidura (art. 11/12 e 13 do CBJD e nos regimentos internos dos órgãos judicantes) b) Competência (art. 19 do CBJD e nos regimentos internos dos órgãos judicantes) c) Imparcialidade (art. 18 do CBJD e nos regimentos internos dos órgãos judicantes) Quanto às partes: a) capacidade de ser parte – é a capacidade de ser parte e de estar em juízo(art. 1ª do CC) b) capacidade processual – consiste na aptidão de participar da relação processual Objetivo - Será observado, intrinsecamente, a regularidade processual (regularidade na citação) e extrinsecamente a inexistência de ato impeditivo. 8.3.6-Procedimentos Podemos conceituá-lo como a forma pela qual o processo se realiza em cada caso concreto, ou seja, o rito processual. Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini e Cândido Dinamarco comentam que “A soma dos atos do próprio processo, visto pelo aspecto de sua interligação e de sua unidade teleológica, é o procedimento”. 23 62 Para Cândido Rangel Dinamarco “....o procedimento tem valor de penhor da legalidade. A lei traça o modelo dos atos do processo, sua seqüência, seu encadeamento, disciplinando com isso o exercício do poder e oferecendo a todos a garantia de que cada procedimento a ser realizado em concreto terá conformidade com o modelo preestabelecido: desvios ou omissões quanto a esse plano de trabalho e participação constituem violações à garantia constitucional do devido processo legal”. 24 O processo desportivo desenvolve-se por impulso oficial e obedece a dois procedimentos: sumário e especial. a) o procedimento sumário – adotado para o julgamento de processos que tratam das infrações disciplinares previstas no Código Brasileiro de Justiça Desportiva (artigos 185 a 280). b) o procedimento especial – visa o processamento e julgamento de casos mais complexos previstos nos artigos 80 e seguintes do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. 63 CAPÍTULO IX INTERVENÇÃO DE TERCEIRO Pode ocorrer no direito processual desportivo, no caso de haver legítimo interesse (art.55 do CBJD), a figura da intervenção de terceiro, em qualquer grau de jurisdição. Ocorre quando alguém como parte interessada ingressa em processo pendente entre outras partes, podendo ser requerida somente até a véspera da sessão de julgamento. É sempre voluntária e espontânea e ao mesmo tempo facultativa para o terceiro. Considera-se, também, como uma forma de intervenção do terceiro prejudicado. Não sendo admitido, entretanto, como assistente da Procuradoria. Coloca Inácio Nunes, que “Quando instaurado um processo desportivo, além das partes diretamente envolvidas, ocorrendo que uma terceira pessoa, física ou jurídica, tenha legítimo interesse no seu desenvolvimento e na decisão final, porque tal lhe aproveita ou a prejudica, poderá requerer, até a véspera da sessão de julgamento, seja-lhe admitido intervir no processo como terceiro interessado, mas nuca como assistente da Procuradoria”.25 64 CAPÍTULO X ATOS PROCESSUAIS DESPORTIVOS 10.1- Conceito Como ato processual temos a conduta dos sujeitos do processo que tenha por efeito a criação, modificação ou extinção de situações jurídicas processuais desportivas. Para Chiovenda são “atos jurídicos processuais os que têm importância jurídica em respeito à relação processual, isto é, os atos que têm por conseqüência imediata a constituição, conservação, o desenvolvimento, a modificação ou a definição de uma relação processual”.26 10.2- Formas dos Atos Processuais Inácio Nunes menciona que “Somente quando o CBJD exigir determinada forma para o desenvolvimento do processo terá ela que ser respeitada, sendo certo que, ainda que determinadas formalidades não sejam entendidas, 65 os atos praticados de outro modo serão considerados válidos desde que preencham a finalidade que desejem alcançar. É o princípio da informalidade, não contemplado pelo art. 2º”. 27 O Código Brasileiro de Justiça Desportiva preceitua que o processo desportivo não corre em segredo de justiça, já que é de caráter público, salvo as exceções previstas em lei; que todas as decisões proferidas deverão ser fundamentadas, mesmo que sucintamente; o acórdão só será redigido quando requerido pela parte e deverá conter, resumidamente, relatório, fundamentação, parte dispositiva e, quando houver, a divergência; as decisões proferidas pelos órgãos da Justiça desportiva devem ser publicadas na forma da lei, podendo, em face do princípio da celeridade, ser feita via edital ou Internet e a Secretaria numerará e rubricará todas as folhas dos
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