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GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL um estudo axiomático 2a. edição Conselho Editorial Presidente: Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado. Editor Associado: Prof. Dr. Ulysses Cecato. Vice-Editor Associado: Prof. Dr. Luiz Antonio de Souza. Editores Científicos: Prof. Adson C. Bozzi Ramatis Lima, Profa. Dra. Ana Lúcia Rodrigues, Profa. Dra. Analete Regina Schelbauer, Prof. Dr. Antonio Ozai da Silva, Prof. Dr. Clóves Cabreira Jobim, Profa. Dra. Eliane Aparecida Sanches Tonolli, Prof. Dr. Eduardo Augusto Tomanik, Prof. Dr. Eliezer Rodrigues de Souto, Profa. Dra. Ismara Eliane Vidal de Souza Tasso, Prof. Dr. Evaristo Atêncio Paredes, Prof. Dr. João Fábio Bertonha, Profa. Dra. Larissa Michelle Lara, Profa. Dra. Luzia Marta Bellini, Prof. Dr. Manoel Messias Alves da Silva, Profa. Dra. Maria Suely Pagliarini, Profa. Dra. Maria Cristina Gomes Machado, Prof. Dr. Oswaldo Curty da Motta Lima, Prof. Dr. Raymundo de Lima, Prof. Dr. Reginaldo Benedito Dias, Prof. Dr. Ronald José Barth Pinto, Profa. Dra. Rosilda das Neves Alves, Profa. Dra. Terezinha Oliveira, Prof. Dr. Valdeni Soliani Franco, Profa. Dra. Valéria Soares de Assis. Equipe Técnica Fluxo Editorial: Edilson Damasio, Edneire Franciscon Jacob, Mônica Tanamati Hundzinski, Vania Cristina Scomparin. Projeto Gráfico e Design: Marcos Kazuyoshi Sassaka. Artes Gráficas: Luciano Wilian da Silva, Marcos Roberto Andreussi. Marketing: Marcos Cipriano da Silva. Comercialização: Norberto Pereira da Silva, Paulo Bento da Silva, Solange Marly Oshima. Editora da Universidade Estadual de Maringá Reitor: Prof. Dr. Décio Sperandio. Vice-Reitor: Prof. Dr. Mário Luiz Neves de Azevedo. Diretor da Eduem: Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado. Editor-Chefe da Eduem: Prof. Dr. Alessandro de Lucca e Braccini. João Roberto Gerônimo Valdeni Soliani Franco GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL um estudo axiomático 2a. edição Maringá 2010 Copyright © 2010 para os autores Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo mecânico, eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, dos autores. Todos os direitos reservados desta edição 2010 para Eduem. Revisão textual e gramatical: Annie Rose dos Santos Normalização textual e de referências: Adriana Curti Cantadori de Camargo Projeto gráfico/diagramação: Marcos Kazuyoshi Sassaka Capa: Jaime Luis L. Pereira Imagens: Fornecidas pelos autores Ficha catalográfica: Edilson Damasio (CRB 9-1123) Fonte: Times New Roman Tiragem - versão impressa: 500 exemplares Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) (Eduem - UEM, Maringá – PR., Brasil) G377g Gerônimo, João Roberto Geometria plana e espacial : um estudo axiomático / João Roberto Gerônimo, Valdeni Soliani Franco. 2. ed. -- Maringá : Eduem, 2010. 320 p. : il. Inclui índice. ISBN 978-85-7628-254-9 1. Geometria plana. 2. Geometria espacial. 3. Geometria - Matemática. I. Franco, Valdeni Soliani. II. Título. CDD 21. ed. 516.22 Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá Av. Colombo, 5790 - Bloco 40 - Campus Universitário 87020-900 - Maringá-Paraná Fone: (0xx44) 3011-4103 - Fax: (0xx44) 3011-1392 www.eduem.uem.br - eduem@uem.br SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ...................................................................................... 9 CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO .................................................................. 11 CAPÍTULO 2: INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO .............................. 17 2.1. Axiomas de Incidência .................................................................. 17 2.2. Axiomas de Ordem ........................................................................ 20 2.3. Ordenando uma Reta ..................................................................... 27 2.4. Polígonos ....................................................................................... 30 2.5. Exercícios ...................................................................................... 32 CAPÍTULO 3: SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS ......................... 37 3.1. Medidas de Segmentos .................................................................. 37 3.2. Medidas de Ângulos ...................................................................... 45 3.3. Congruência de Segmentos e Ângulos .......................................... 50 3.4. Exercícios ...................................................................................... 54 CAPÍTULO 4: CONGRUÊNCIA DE TRIÂNGULOS ............................... 57 4.1. O Caso LAL................................................................................... 59 4.2. O Caso ALA .................................................................................. 64 4.3. O Caso LLL ................................................................................... 66 4.4. O Caso LAAo ................................................................................. 68 4.5. O Caso LLA ................................................................................. 70 GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 6. 4.6. Existência de Perpendiculares e Paralelas ..................................... 72 4.7. Distância de Ponto a Reta e Desigualdade Triangular................... 74 4.8. Exercícios ...................................................................................... 78 CAPÍTULO 5: AXIOMA DAS PARALELAS ............................................ 83 5.1. O Axioma das Paralelas ................................................................. 83 5.2. Triângulos e Quadriláteros ............................................................ 88 5.3. Teorema das Paralelas ................................................................... 97 5.4. Exercícios ...................................................................................... 100 CAPÍTULO 6: REGIÕES POLIGONAIS E ÁREAS ................................. 103 6.1. Regiões Poligonais ........................................................................ 104 6.2. Áreas .............................................................................................. 108 6.3. Teorema de Pitágoras..................................................................... 112 6.4. Exercícios ...................................................................................... 116 CAPÍTULO 7: SEMELHANÇA DE TRIÂNGULOS E O TEOREMA DE TALES ......................................................................................................... 119 7.1. Sequências Proporcionais .............................................................. 119 7.2. Teorema de Tales ........................................................................... 122 7.3. Semelhança .................................................................................... 123 7.4. Exercícios ...................................................................................... 127 CAPÍTULO 8: CIRCUNFERÊNCIA E CÍRCULO .................................... 131 8.1. Tangentes ....................................................................................... 133 8.2. Ângulo Inscrito .............................................................................. 135 8.3. Perímetro de uma Circunferência .................................................. 144 8.4. Área de um Círculo ....................................................................... 153 8.5. Exercícios ...................................................................................... 157 CAPÍTULO 9: TRIGONOMETRIA ............................................................ 161 9.1. Funções Trigonométricas .............................................................. 161 9.2. Relação Fundamental .................................................................... 163 9.3. Ampliando o Domínio ................................................................... 169 9.4. Lei dos Cossenos ...........................................................................171 9.5. Lei dos Senos ................................................................................. 174 9.6. Exercícios ...................................................................................... 175 CAPÍTULO 10: INCIDÊNCIA E ORDEM NO ESPAÇO .......................... 179 10.1. Axiomas de Incidência ................................................................ 180 SUMÁRIO 7. 10.2. Determinação de Planos .............................................................. 184 10.3. Axioma de Ordem ....................................................................... 186 10.4. Ângulos entre Retas ..................................................................... 190 10.5. Exercícios .................................................................................... 192 CAPÍTULO 11: PARALELISMO NO ESPAÇO E SUAS CONSEQUÊNCIAS .................................................................................... 195 11.1. Paralelismo entre Retas e Planos ................................................. 195 11.2. Paralelismo entre Planos .............................................................. 197 11.3. Teorema de Tales ......................................................................... 203 11.4. Exercícios .................................................................................... 206 CAPÍTULO 12: PERPENDICULARISMO NO ESPAÇO E SUAS CONSEQUÊNCIAS ..................................................................................... 211 12.1. Perpendicularismo entre Retas e Planos ...................................... 211 12.2. Perpendicularismo entre Planos .................................................. 218 12.3. Exercícios .................................................................................... 221 CAPÍTULO 13: PROJEÇÕES, DISTÂNCIAS, ÂNGULOS, DIEDROS E TRIEDROS .................................................................................................. 225 13.1. Distância de Ponto a Plano .......................................................... 225 13.2. Distância entre Retas Reversas .................................................... 231 13.3. Ângulo entre Planos e entre Reta e Plano ................................... 233 13.4. Diedros ........................................................................................ 236 13.5. Triedros ........................................................................................ 239 13.6. Exercícios .................................................................................... 249 CAPÍTULO 14: POLIEDROS ..................................................................... 253 14.1. Figuras Poliédricas ...................................................................... 254 14.2. Superfícies Poliédricas ................................................................ 255 14.3. Poliedros ...................................................................................... 256 14.4. Fórmula de Euler ......................................................................... 258 14.5. Poliedros de Platão ...................................................................... 262 14.6. Poliedros Regulares ..................................................................... 266 14.7. Exercícios .................................................................................... 268 CAPÍTULO 15: SUPERFÍCIE ESFÉRICA E ESFERA ............................. 271 15.1. Conceito e Propriedades .............................................................. 271 15.2. Determinação de uma Superfície Esférica .................................. 273 15.3. Posições Relativas ....................................................................... 274 15.4. Superfície Esférica e suas Partes ................................................. 278 GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 8. 15.5. Exercícios .................................................................................... 280 CAPÍTULO 16: ÁREAS E VOLUMES ...................................................... 283 16.1. Axiomas ....................................................................................... 283 16.2. Prisma .......................................................................................... 285 16.3. Pirâmide ....................................................................................... 287 16.4. Cilindro ........................................................................................ 291 16.5. Cone ............................................................................................. 293 16.6. Esfera ........................................................................................... 296 16.7. Exercícios .................................................................................... 302 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 307 APÊNDICE A: O LIVRO “OS ELEMENTOS” DE EUCLIDES ............... 309 APÊNDICE B: RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS .................................. 313 ÍNDICE REMISSIVO ................................................................................. 315 APRESENTAÇÃO Este é um texto que vem sendo desenvolvido pelos autores há nove anos no Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Maringá (DMA/UEM), e seu conteúdo faz parte de uma disciplina que é oferecida atualmente para alunos do segundo ano do curso de Licenciatura e Bacharelado em Matemática do DMA/UEM. Neste trabalho, temos como objetivo apresentar a Geometria Euclidiana clássica, mas utilizando uma linguagem moderna e com certo rigor nas demonstrações; salientamos que na Geometria Espacial admitiremos todos os resultados obtidos na Geometria Plana. O texto está dividido em 16 capítulos, sendo que o primeiro é introdutório, os capítulos 2 a 9 tratam da geometria plana e os capítulos 10 a 16 tratam da geometria espacial. Mais especificamente no capítulo 1, elaboramos uma introdução histórica, na qual justificamos a abordagem escolhida. No capítulo 2, estudamos os primeiros axiomas e seus principais resultados na geometria plana. No capítulo 3, apresentamos os axiomas sobre medidas de segmentos e ângulos. No capítulo 4, estudamos a congruência entre triângulos. No Capítulo 5, tratamos do principal axioma da Geometria Euclidiana, que por mais de dois mil anos acreditaram ser consequência dos outros axiomas. No capítulo 6, contemplamos áreas de regiões poligonais. No capítulo 7, estudamos os casos de semelhança em triângulos e, consequentemente, o Teorema de Tales. No capítulo 8, estudamos as propriedades da circunferência e do círculo. No capítulo 9, abordamos as relações métricas existentes nos triângulos. No capítulo 10, discorremos sobre os primeiros axiomas e seus principais resultados relativos ao espaço euclidiano. No capítulo 11, estudamos as relações de paralelismo entre retas e planos e entre planos e planos. No capítulo 12, abordamos as relações de perpendicularismo entre retas e planos GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 10. e entre planos e planos. No capítulo 13, utilizamos as relações de perpendicularismo e paralelismo para definir distâncias, ângulos, diedros e triedros. No capítulo 14, definimos poliedros e classificamos os poliedros regulares e os de Platão. No capítulo 15, estudamos a esfera e suas propriedades. Para finalizar, no capítulo 16 estudamos áreas e volumes de figuras geométricas espaciais. No Apêndice A apresentamos um pequeno relato sobre a obra “Elementos” de Euclides. No Apêndice B indicamos uma página na Internet com a resolução dos exercícios propostos no livro em formato PDF. Deixamos também disponibilizados, as figuras encontradas no texto. Para resolver esses exercícios, contamos com a colaboração inicial dos ex-acadêmicos Ademir Pastor Ferreira, Vânia Batista Marinho e Waldir Soares Júnior.Neste texto, empregamos uma linguagem contemporânea, em que falamos de conjuntos, relações e funções, conceitos que, a priori, não precisam ser compreendidos de forma mais aprofundada, porém utilizando apenas o conhecimento do Ensino Médio. Gostaríamos de registrar nossos agradecimentos aos alunos das turmas de 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 e 2005 do Curso de Matemática da UEM, e aos docente Marcelo Escudeiro Hernandes e Jorge Ferreira Lacerda pelas sugestões apresentadas. Autores CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO A geometria1 surgiu há aproximadamente 4.000 anos no Egito e na Babilônia, sem dúvida de uma maneira intuitiva, e portanto, não sistemática, com uma série de regras práticas sugeridas pela experiência, cujo objetivo principal era aplicações às medições. De fato, as relações dessa sociedade, baseadas na propriedade, impuseram a necessidade de medir. Já a geometria com um caráter dedutivo, apoiado em proposições gerais, podemos afirmar que teve seu início na antiga Grécia, com Tales de Mileto2 e Pitágoras3. Mas foi Euclides4, na sua famosa obra Elementos (ser Apêndice A), o primeiro a apresentar um sistema axiomático para a geometria, ou seja, um sistema formado por noções primitivas, definições, axiomas e teoremas evidentemente aproveitando o conhecimento que já havia na época. Os axiomas são o começo dessa cadeia dedutiva e são as afirmações não demonstradas que podiam ser aplicadas a várias áreas de conhecimento. Ainda nessa obra, Euclides chamou de postulado (aquilo que não se pode) outras afirmações não demonstráveis, porém agora vinculadas à teoria que queria 1 Palavra de origem grega: “geo” significa “terra” e “metria” significa “medida”. 2 Tales de Mileto nasceu por volta de 624 a.C. em Mileto, Ásia Menor (atualmente Turquia) e morreu por volta de 547 a.C. em Mileto. Tales de Mileto foi o primeiro filósofo grego, cientista e matemático conhecido. A ele são creditados cinco teoremas da geometria elementar (O’Connor; Robertson, 2008). 3 Pitágoras de Samos nasceu por volta de 569 a.C. em Samos, Ionia, e morreu por volta de 475 a.C., Pitágoras foi um filósofo grego que fez importantes descobertas na matemática, astronomia e na teoria musical. O teorema, hoje conhe- cido como Teorema de Pitágoras era conhecido pelos Babilônios 1000 anos atrás mas ele foi o primeiro a demonstrá-lo (O’Connor; Robertson, 2008). 4 Euclides de Alexandria nasceu por volta de 325 a.C. e morreu por volta de 265 a.C. em Alexandria, Egito. Euclides é o mais notável matemático da Antiguidade. Foi mais conhecido pelo tratado sobre geometria denominado Os Elementos (O’Connor; Robertson, 2008). GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 12. construir, no caso a geometria. Euclides procurou escolher como postulados afirmações que, por sua simplicidade, seriam aceitas por qualquer pessoa de bom senso e que eram, em certo sentido, evidentes por si mesmas. Acontece que os quatro primeiros postulados de Euclides, enunciados a seguir, satisfazem essas condições de simplicidade e evidência, mas o quinto nem tanto, como podemos perceber: 1. Dois pontos determinam uma reta; 2. A partir de qualquer ponto de uma reta dada é possível marcar um segmento de comprimento arbitrário; 3. É possível obter uma circunferência com qualquer centro e qualquer raio; 4. Todos os ângulos retos são iguais. 5. Se uma reta r corta duas outras retas5 s e t (no mesmo plano) de modo que a soma dos ângulos interiores (α e β) de um mesmo lado de r é menor que dois retos, então s e t, quando prolongadas suficientemente, se cortam daquele lado de r. 5 s t r α β Já na Antiguidade, Proclus6 não aceitava o quinto postulado, pois achava que este poderia ser demonstrado a partir dos conceitos básicos da obra euclidiana, sendo, portanto, na realidade um teorema. Todavia a maior parte das tentativas de demonstração do quinto postulado admitiam fatos que, ou eram equivalentes a ele, ou não podiam ser demonstrados usando unicamente os outros quatro postulados. Grandes nomes da matemática tentaram sem sucesso a demonstração do quinto postulado. A negação do quinto postulado, e assim sua independência em relação aos outros quatro, levaram à criação de outras geometrias. A primeira geometria não-euclidiana foi publicada de maneira independente e quase simultânea pelo matemático russo N. 5 No início do capítulo 2, apresentaremos as notações para pontos, retas, ángulos, etc. Os desenhos também farão parte do texto como forma de fixar melhor as ideias e resultados apresentados . 6 Proclus Diadochus nasceu em 8 de fevereiro de 411 em Constantinopla (atualmente Istambul), Byzantium (atualmente Turquia), e morreu em 17 de abril de 485 em Atenas, Grécia. Proclus não foi um matemático criativo – ; mas foi um expositor crítico e detalhista, com um bom conhecimento dos métodos matemáticos e um conhecimento detalhado de milhares de anos da Matemática Grega de Tales até os seus dias (O’Connor; Robertson, 2008). 1 INTRODUÇÃO 13. I. Lobachewsky7 em 1829 e pelo matemático J. Bolyai8 em 1832. Tal geometria é hoje chamada geometria hiperbólica. Durante muito tempo, distinguiu-se axioma de postulado; hoje, axiomas e postulados são designações das proposições admitidas sem demonstração. Na verdade, atualmente emprega-se sempre a palavra axioma em lugar de postulado. Existem outras versões para os postulados da geometria plana que são encontradas na obra Os Elementos de Euclides. David Hilbert9 construiu um sistema de axiomas para a geometria euclidiana (Pogorelov, 1984) consistindo de cinco grupos, a saber: I - Axiomas de incidência: nesse grupo, são apresentados oito axiomas, dos quais três são relacionados ao plano e cinco são relacionados ao espaço. Esses axiomas estabelecem as relações mútuas entre ponto e reta. II - Axiomas de ordem: neste grupo são apresentados quatro axiomas e com eles é possível fazer a ordenação dos pontos sobre uma reta, um plano e no espaço. III-Axiomas de congruência: neste grupo são apresentados cinco axiomas, dos quais três são relacionados à congruência de segmentos, um relacionado à congruência de ângulos e um relacionado à congruência de triângulos. IV- Axioma das paralelas: esse axioma estabele a unicidade de uma reta paralela a uma reta dada passando por um ponto. Nesse grupo temos apenas um, mas é o mais importante, pois é ele que caracteriza a geometria euclidiana. V - Axiomas de continuidade: esse grupo é constituído de dois axiomas, a saber: axioma de Arquimedes10 e axioma de Dedekind11. 7 Nikolai Ivanovich Lobachewsky nasceu em 1 de dezembro de 1792 em Nizhny Novgorod, Rússia, e morreu em 24 de fevereiro de 1856 em Kazan, Rússia. Em 1829, Lobachevsky publicou sua geometria não-euclidiana, o primeiro tratado desse tema a ser impresso (O’Connor; Robertson, 2008)). 8 Jãnos Bolyai nasceu em 15 de dezembro de 1802 em Kolozsvár, Império Austríaco (atualmente, Cluj, Romênia), e mo- rreu em 27 de Janeiro de 1860 em Marosvásárhely, Império Austríaco (atualmente Tirgu-Mures, Romênia). Entre 1820 e 1823, Bolyai preparou um tratado sobre um sistema completo de geometria não-euclidiana (O’Connor; Robertson, 2008)]. 9 David Hilbert nasceu em 23 de janeiro de 1862 em Königsberg, Prussia (atualmente Kaliningrad, Rússia) e morreu em 14 de fevereiro de 1943 em Göttingen, Alemanha. A publicação de Hilbert em geometria foi um dos trabalhos com mais influência nessa área depois de Euclides. Um estudo sistemático dos axiomas da geometria euclidiana levou Hilbert a propor 21 axiomas e suas consequências. Ele fez contribuições em muitas áreas da matemática e física (O’Connor; Robertson, 2008). 10 Arquimedes de Siracusa nasceu em 287 a.C. e morreu em 212 a. C. em Siracusa, Sicília. A maior contribuição de Arquimedes foi em Geometira. Seu método antecipou o cálculo integral 2.000 antes de Newtone Leibniz (O’Connor; Robertson, 2008). 11 Julius Wihelm Richard Dedekind nasceu em 06/10/1831 e morreu em 12/02/1916 em Braunschweig, atual Alemanha. A maior contribuição de Dedekind foi a definição de números irracionais em termos de cortes. Ele introduziu a noção de ideal que é fundamental para a teoria de anéis (O’Connor; Robertson, 2008). GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 14. Apresentar a Geometria Euclidiana de forma dedutiva utilizando o sistema apresentado por Euclides ou Hilbert é mais complicado. Aleksei Vasil’evich Pogorelov12, com o objetivo de tornar o texto (Pogorelov, 1984) mais simples, dividiu os axiomas em seis grupos13: I. Axiomas de incidência: esse grupo é constituído de quatro axiomas, sendo dois relacionados ao plano e dois relacionados ao espaço. II. Axiomas de ordem: esse grupo é constituído de dois axiomas. III. Axiomas de medidas: esse grupo é constituído de doze axiomas, sendo dois relacionados a segmentos, dois relacionados a ângulos, quatro relacionados a áreas e quatro relacionados a volumes. IV. Axioma de existência de um segmento de comprimento dado: esse axioma e garante a construção de segmentos a partir de um número real dado. V. Axioma de Congruência: esse axioma garante a congruência de triângulos e permite obter áreas e volumes de figuras congruentes. VI. Axioma das paralelas: por último, temos o axioma que caracteriza a geometria euclidiana. Se, por um lado, Pogorelov não apresenta o grupo “axiomas de continuidade”, ele acrescenta mais dois grupos relacionados a medidas que de certa forma garantem a validade desse grupo. Neste texto, utilizaremos uma versão simplificada de Pogorelov, que possui a vantagem adicional de poder ser utilizada na Educação Básica para o ensino da Geometria Euclidiana. Faremos algumas adaptações: • Para o estudo de áreas e volumes, acrescentamos o axioma do completamento. • Acrescentamos ao grupo de medidas axiomas relacionados à área e aos volumes. No decorrer do livro faremos a construção das principais figuras geométricas planas e espaciais sem, no entanto, fazer o estudo da construção com régua e compasso. Apesar de empreendermos este estudo através da apresentação axiomática, não nos preocuparemos com as questões relacionadas à consistência, independência e completude dos axiomas apresentados. Esta análise está fora do escopo deste livro e pode ser vista nos livros de Hilbert (1957) e Pogorelov (1984). 12 Aleksei Vasil’evich Pogorelov nasceu em 3 de março de 1919 na Rússia e morreu em 2002. Sua área de pesquisa é ca- racterizada por uma rara combinação de talento para a a matemática e engenharia. É autor de mais de 200 publicações, incluindo 40 monografias e livro-textos. 13 Esses grupos foram apresentados separadamente para o plano (estudo que chamou de planimetria) e o espaço (estudo que chamou de estereometria). 1 INTRODUÇÃO 15. Nosso estudo será formado por • Noções primitivas: são os conceitos aceitos sem definição. • Axiomas: são os resultados aceitos sem demonstração. • Definições: são os conceitos apresentados para simplificar a linguagem matemática ou para identificar um novo objeto matemático. • Teoremas: são os resultados que são demonstrados a partir de uma cadeia dedutiva de afirmações. • Proposições: são o mesmo que os teoremas, mas que no sistema como um todo não apresentam tanta importância quanto os teoremas. • Lemas: são pequenos resultados que também devem ser demonstrados e que simplificam a demonstração de um teorema. • Corolários: são consequências imediatas de um teorema e que merecem ser evidenciados. Cada uma dessas noções ficará clara no decorrer deste estudo. As primeiras noções primitivas que adotaremos são as seguintes: Noção Primitiva 1: Ponto. Noção Primitiva 2: Reta. Noção Primitiva 3: Plano14. Essas noções primitivas demonstram quem serão os objetos básicos da geometria euclidiana. Desta forma, a geometria euclidiana estudará as relações entre esses três objetos. As notações que utilizaremos para pontos, retas e planos serão as seguintes: Pontos: Letras latinas maiúsculas: A, B, C, X, Y,... Retas: Letras latinas minúsculas: a, b, c, x, y,... Planos: As seguintes letras gregas maiúsculas15: Π, Θ, Ω, Ψ, Λ, ∆, Γ, Σ. 14 Das noções primitivas temos um conhecimento intuitivo pela experiência, sensibilidade e observação. Por exemplo, a marca de um toque de grafite num papel dá a ideia da noção não definida de ponto, a pesar de que isso é uma repre- sentação de ponto, pois ponto não tem dimensão, e a marca no papel tem. É interessante observarmos que Euclides, no Livro I de “Elementos”, definiu de maneira equivocada essas três noções; por exemplo, ele escreve que “ponto é aquilo que não tem partes” e deixa sem significado o termo “ter partes”. 15 O alfabeto grego maiúsculo é dado por: Α (alfa), Β (beta), Γ (gama), ∆ (delta), Ε (epsílon ou epsilo), Ζ (zeta ou dzeta), Η (eta), Θ (teta), Ι (iota), Κ (capa), Λ (lambda), Μ (mi ou mu), Ν (ni), Ξ(xi), Ο(ômicron), Π (pi), Ρ (rô), Σ (sigma), Τ(tau), Υ(upsilon), Φ (fi), Χ (chi), Ψ(psi) e. Ω(ômega). GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 16. Nos capítulos 2 a 9 trabalharemos somente em um plano fixado e, portanto, não haverá necessidade da notação de plano. Essa necessidade somente ocorrerá a partir do capítulo 10. As representações gráficas que utilizaremos para pontos, retas e planos serão as seguintes: Ponto: • Reta: Plano: É importante observarmos que essas notações gráficas são apenas uma maneira de fixar as ideias com relação a cada um dos objetos trabalhados e que isto, de forma alguma, representa os objetos da teoria apresentada. Em todo o livro serão apresentados desenhos que servirão para fixar as ideias no desenvolvimento de determinado conceito ou resultado. Por outro lado, devemos esclarecer que são apenas ilustrativos e não podem servir para justificar qualquer uma das propriedades geométricas. No texto trataremos de figuras geométricas (planas ou espaciais), ou simplesmente, figuras planas ou figuras espaciais, que são subconjuntos do plano ou do espaço e estaremos apresentando uma classificação das principais figuras. CAPÍTULO 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO Neste capítulo, apresentaremos os axiomas de incidência e ordem no plano. Os axiomas de incidência estabelecem as relações mútuas entre ponto e reta, e os axiomas de ordem estabelecem uma ordenação dos pontos na reta e no plano. 2.1. AXIOMAS DE INCIDÊNCIA Neste primeiro grupo, estudaremos a incidência entre pontos e retas, que terá o mesmo significado de interceptar, passar por, estar sobre. Começaremos pelo axioma de existência. Axioma I.1: (de existência) a) Existe ponto. b) Existe reta e qualquer que seja a reta existem pontos que pertencem à reta e pontos que não pertencem à reta. O mais interessante desse axioma é que ele nos garante a existência dos objetos básicos, ou seja, que a geometria não constitui-se de um conjunto vazio, e logo, fará sentido o estudo da relação entre esses objetos. Axioma I.2: (de determinação): dados dois pontos distintos, existe uma única reta que contém esses pontos. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 18. Observações: 1. Como dois pontos determinam uma reta, quando falarmos de uma reta que passa por dois pontos distintos A e B, a denotaremos por rAB. 2. Esse axioma constitui um bom teste de qualidade das réguas que utilizamos, ou seja, se conseguirmos desenhar duas retas distintas passando por dois pontos distintos, significa que esssa régua não é adequada para essa geometria. 3. Dada uma reta r, que existe pelo Axioma I.1.b, tomamos um ponto P qualquer fora de r e um ponto Q em r, que existe pelo mesmo axioma; unindo P com Q, teremos uma nova retas, que é univocamente determinada pelos pontos P e Q de acordo com oAxioma I.2a. O ponto Q na reta r é o que chamaremos de interseção de r e s, cuja notação será r ∩ s. Fazendo um abuso de notação, escreveremos r ∩ s = Q ao invés de r ∩ s = {Q}. Isto será feito com o objetivo de simplificá-la. 4. Quando duas retas possuírem um ponto de interseção, diremos que as duas retas se interceptam. Como estamos estudando geometria, vamos visualizar geometricamente o conteúdo das observações 3 e 4. No desenho ao lado, temos as retas r e s se interceptando no ponto Q e o ponto P não pertencente à reta r. r s P Q Notemos que o Axioma I.1 garante que existe pelo menos fora da reta e isto é suficiente para apresentar a seguinte definição. Definição 2.1: se três (ou mais) pontos estão sobre uma mesma reta, diremos que eles são colineares. Exemplo 2.1. No desenho ao lado, os pontos A, B e C são colineares pertencendo à reta r; os pontos D, E e F são não colineares, sendo que D e E pertencem à reta s, D e F pertencem à reta t, e E e F pertencem a reta q. A B C F E D r s t q 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 19. Proposição 2.2: dadas duas retas distintas, elas possuem no máximo um ponto de intersecção. Demonstração: se a interseção de duas retas contiver pelo menos dois pontos distintos, então pelo Axioma I.2 as retas não podem ser distintas, o que é uma contradição. Logo, as duas retas se interceptam no máximo em um ponto. Vejamos agora a quarta noção primitiva da geometria euclidiana que permitirá apresentar a noção de segmento de reta. Noção Primitiva 4: um ponto C estar entre dois pontos A e B de uma reta r, na qual A, B e C são distintos. Observemos que dizer “C está entre A e B” é o mesmo que dizer “C está entre B e A”. No desenho ao lado, os pontos A, B e C pertencem à reta r e o ponto C está entre A e B. A C B r Definição 2.3: sejam A e B dois pontos de uma reta r. O conjunto constituído pelos dois pontos A e B e pelos pontos que estão entre A e B é chamado de segmento de reta, cuja notação será AB. Os pontos que estão entre A e B são chamados pontos interiores, ou simplesmente pontos do segmento AB; os pontos A e B, são denominados extremos do segmento AB. A reta r é denominada reta suporte do segmento AB e será denotada por rAB. 16 Exemplos 2.2. No desenho ao lado, indicamos o segmento AB, o interior do segmento AB e os extremos A e B na reta suporte r. Observemos que o segmento AB é formado pela união dos pontos extremos com os pontos interiores. A B r Segmento AB Interiores Extremos 16 Não há diferença entre o segmento AB e o segmento BA. Existirá a diferença quando temos um segmento orientado. A notação é a mesma da reta que passa por dois pontos e é razoável que seja assim, pois existe uma única reta suporte do segmento e que contém os extremos do segmento. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 20. 2.3. A noção de segmento permitirá a construção de várias figuras planas conhecidas. Com os conceitos e resultados que temos já podemos construir os triângulos, que são figuras formadas por três pontos não colineares A, B e C e pelos segmentos de reta determinados por esses três pontos. No desenho ao lado, temos um triângulo construído sobre as retas r, s e t que, duas a duas, se interceptam nos r s B C A t pontos A, B e C, formando os segmentos AB, AC e BC. Os pontos A, B e C são chamados vértices do triângulo e os três segmentos de lados do triângulo. Denotaremos esse triângulo por ABC. Um triângulo é bem determinado pelos seus três pontos, pois os segmentos são bem determinados por dois pontos. Até o momento, apresentamos quatro classes17 de figuras geométricas planas: pontos, retas, segmentos e triângulos. No diagrama ao lado, visualizamos essas classes que, conforme observamos, são disjuntas, ou seja, um ponto não pertence à classe dos segmentos, um segmento não pertence à classe dos triângulos, etc. 17 Figuras pontos retas segmentos triângulos O diagrama apresentado não se preocupa com questões relativas à cardinalidade de cada classe e nem com a relação entre os elementos de cada classe, mas sim com a questão de conjunto propriamente dita, ou seja, consideramos o conjunto de todas as figuras planas e vamos visualizar esse conjunto que está particionado em classes que poderão ser disjuntas ou não. 2.2. AXIOMAS DE ORDEM O próximo grupo estabelecerá as relações mútuas entre os pontos em uma reta e no plano e pertencem ao segundo grupo de axiomas denominado axiomas de ordem. Axioma II.1: Dados três pontos colineares, um e apenas um deles localiza-se entre os outros dois. 17 O sentido que estamos dando para a classe é o usual, ou seja, um conjunto de objetos que possuem uma propriedade em comum. 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 21. Axioma II.2: Dados dois pontos A e B em uma reta, sempre existe um ponto C entre A e B e um ponto D, tal que A está entre D e B. A B C D Definição 2.4: Seja r uma reta e fixemos um ponto O em r. Consideremos os pontos A e B em r, distintos de O. Se A = B, diremos que A e B estão do mesmo lado em relação ao ponto O. Caso contrário, pelo Axioma II.1, O está entre A e B, ou não. Se O não está entre A e B, diremos que A e B estão no mesmo lado em relação ao ponto O. Se O está entre A e B, diremos que A e B estão em lados diferentes em relação ao ponto O. Exemplos 2.4. No desenho ao lado, temos as seis possibilidades que podem ocorrer com três pontos sobre uma reta dada. Deixamos subentendida uma ordem que será vista na próxima seção. De fato, até o momento não há diferença entre o primeiro e o sexto caso, segundo e quarto caso, terceiro e quinto caso. A B C A C B B A C B C A C A B C B A A relação entre os pontos, dada pelo ponto O, nos permite particionar a reta: Teorema 2.5: Um ponto em uma reta fornece uma partição18 da mesma. O A r S’ S Demonstração: Dada uma reta r e um ponto O pertencente a r, escolhamos um ponto arbitrário A em r distinto de O, que existe pelo item b) do Axioma I.1. Vamos denotar por S o conjunto de todos os pontos que se encontram do mesmo lado que A em relação a O, e por S’ o conjunto de todos os pontos que se encontram em lados diferentes de A em relação a O. Considere a família de conjuntos ℑ ={S, S’,{O}}. Vamos mostrar que ℑ é uma partição de r, ou seja: 18 Dado um conjunto A, dizemos que uma família ℑ de conjuntos é uma partição do conjunto A se todos os elementos de ℑ são subconjuntos não vazios de A, quaisquer dois elementos de ℑ são disjuntos e a união de todos os elementos de ℑ fornece o conjunto A. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 22. 1. S ≠ ∅ e S’ ≠ ∅; 2. S ∩ {O} = ∅, S’ ∩ {O} = ∅ e S ∩ S’ = ∅; 3. S ∪ S’ ∪ {O} = r. De fato, vamos demonstrar cada um dos itens de 1 a 3: 1. Pela Definição 2.4, temos que o ponto A está do mesmo lado que A em relação ao ponto O. Logo, A ∈ S e, então, S ≠ ∅. Para demonstrar a segunda parte, temos, pelo Axioma II.2, que existe um ponto D tal que O está entre A e D. Logo, pela Definição 2.4, D ∈ S’ e, então, S’ ≠ ∅. 2. Pela Definição 2.4, temos que qualquer ponto de S ou S’ é diferente do ponto O. Logo, S ∩ {O} = ∅ e S’ ∩ {O} = ∅. Para demonstrar a terceira parte, seja B ∈ S ∩ S’, ou seja, B está do mesmo lado que A em relação a O e B está em lado diferente de A em relação a O, o que pela Definição 2.4 contradiz o Axioma II.1. 3. É claro que S ∪ S’ ∪ {O} ⊆ r. Para mostrar que r ⊆ S ∪ S’ ∪ {O}, consideremos um ponto B ∈ r diferente do ponto O. Se B = A então B ∈ S, pela Definição 2.4. Se B ≠ A, pelo Axioma II.1 temos B entre O e A, ou A entre O e B, ou O entre A e B. Nos primeiro e segundo casos temos, pela Definição 2.4, temos B ∈ S. No terceiro caso, também pela Definição 2.4 temos B ∈ S’. Logo, r ⊆ S ∪S’ ∪ {O} e, portanto r = S ∪ S’ ∪ {O}. Esse teorema garante a existência de uma relação de equivalência em r. Deixamos como exercício a demonstração dessa afirmação (Exercício 2.6). Definição 2.6: o conjunto S da demonstração do Teorema 2.5, juntamente com o ponto O, é chamado semirreta. Analogamente, o conjunto S’ unido com {O} também é chamado semirreta. O ponto O é chamado origem da semirreta. Se um ponto A ∈ S, vamos denotar a semirreta que contém A por SOA. Analogamente, se um ponto A’ ∈ S’, a notação da semirreta que contém A’ será SOA’. Geometricamente, a semirreta SOA será representada como no desenho ao lado. Dizemos que SOA’ é a semirreta oposta a SOA e vice-versa. O A 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 23. Proposição 2.7: se B está entre A e C, e C está entre B e D, então B e C estão entre A e D. Demonstração: consideremos as semirretas SBA e SBC. Como B está entre A e C, temos SBA ∪ SBC = r e SBA ∩ SBC = B. É claro que A ∈ SBA e C ∈ SBC. Se D ∈ SBA então, pela Definição 2.4 e Definição 2.6, temos que B está entre C e D, o que é uma contradição. Logo, D ∈ SBC e, portanto, B está entre A e D. Consideremos, agora as semirretas SCD e SCB. Como C está entre B e D, temos SCD ∪ SCB = r e SCD ∩ SCB = C. B D C A B A C D É claro que D ∈ SCD e B ∈ SCB. Se A ∈ SCD então, pela Definição 2.6 e Definição 2.4, temos que C está entre A e B, o que é uma contradição. Logo, A ∈ SCB e, portanto, C está entre A e D. Concluímos até agora que o ponto O determina exatamente duas semirretas distintas, cuja interseção é o ponto O. A seguir, vamos dividir os pontos de um plano também em duas classes. Para isso, necessitamos da seguinte definição: Definição 2.8: consideremos uma reta r e dois pontos A e B que não pertencem a essa reta. Se A = B, diremos que A e B estão em um mesmo lado em relação a reta r. Se A ≠ B, temos duas possibilidades, o segmento AB intercepta ou não a reta r. Se intercepta, diremos que A e B estão em lados contrários em relação à reta r, se não intercepta, A e B estão em um mesmo lado em relação à reta r. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 24. Exemplos 2.6. No desenho ao lado, temos que os pontos C e D estão em lados contrários em relação à reta r e os pontos A e B estão do mesmo lado em relação à reta r. Por outro lado, C e D estão do mesmo lado em relação à reta s e os pontos A e B estão em lados contrários em relação à reta s. BA C D r s Teorema 2.9: uma reta fornece uma partição do plano. Demonstração: seja r uma reta do plano, a demonstração desse teorema é análoga à do Teorema 2.5. Nesse caso, tomamos um ponto A não pertencente a r, que existe pelo Axioma I.1.b. Denotamos por Π o conjunto de todos os pontos que se encontram do mesmo lado que A em relação à r, e por Π’ o conjunto de todos os pontos que se encontram em lados diferentes de A em relação à reta r. Considere a família ℑ = {Π , Π’ ,r}. Devemos mostrar que 1. Π ≠ ∅ e Π’ ≠ ∅; 2. Π ∩ r = ∅, Π’ ∩ r = ∅ e Π ∩ Π’ = ∅; 3. Π ∪ Π’ ∪ r é igual ao plano. De fato, vamos demonstrar cada um dos itens de 1 a 3. 1. Pela Definição 2.8, temos que o ponto A está do mesmo lado que A em relação à reta r, e assim, A ∈ Π, donde Π ≠ ∅. Para a segunda parte, tomamos um ponto O qualquer em r (que existe pelo do Axioma I.2.b); os pontos O e A fornecem uma reta s pelo Axioma I.2.a, cuja interseção com r é o ponto O. Pelo Axioma II.2, existe um ponto B em s, tal que O está entre A e B. Assim, O pertence ao segmento AB e pela Definição 2.8 A e B estão em lados diferentes em relação à reta r. Logo, B ∈ Π’, donde Π’ ≠ ∅; 2. Pela Definição 2.8, temos que qualquer ponto de Π ou de Π’ não está em r. Assim, Π ∩ r = ∅ e Π’ ∩ r = ∅. Para mostrar que a terceira interseção é vazia, observamos que se B ∈ Π ∩ Π’, então B está do mesmo lado que A em relação à r e B está em lado diferente em relação à r, assim, pela Definição 2.8, temos uma contradição; 3. É claro que Π ∪ Π’ ∪ r está contido no plano. Vamos mostrar que todos os pontos do plano estão contidos em Π ∪ Π’ ∪ r. Seja B um ponto qualquer do plano, se B ∈ r, temos o desejado. Se B ∉ r, podemos ter B = A, nesse caso pela Definição 2.8, B ∈ Π, e 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 25. novamente teremos o resultado. Se B ≠ A, consideremos a reta s = rAB. Pela Proposição 2.2, r e s tem no máximo um ponto de interseção. Se r ∩ s é o conjunto vazio, então o segmento AB não intercepta r e assim, pela Defi nição 2.8, B está do mesmo lado que A em relação a r, ou seja, B ∈ Π. Se r ∩ s = {O}, então pelo Axioma II.1, ou O está entre A e B, ou não. No primeiro caso, B ∈ Π’ e no segundo caso, B ∈ Π. Assim, esgotamos todas as possibilidades, e em todas elas temos B ∈ r, ou B ∈ Π ou B ∈ Π’, donde segue o resultado. Esse teorema garante a existência de uma relação de equivalência no plano. Deixamos como exercício a demonstração dessa afi rmação (Exercício 2.7). r A Defi nição 2.10: sejam r uma reta e A um ponto que não pertence à r. O conjunto Π da demonstração do Teorema 2.9, juntamente com r, é chamado de semiplano determinado por r contendo A, e será representado por Πr,A. Exemplos r A B Πr,A Πr,B 2.7. Uma reta r divide o plano em dois semiplanos distintos, a saber: os semiplanos Πr,A e Πr,B, cuja interseção é a reta r. Aqui, o ponto B está do lado contrário de A em relação à reta r. No desenho ao lado, visualizamos esses dois semiplanos. 2.8. Com esses resultados, podemos construir os quadriláteros, que são fi guras formadas por quatro pontos A, B, C e D (três a três não colineares) e pelos segmentos de reta AB, BC, CD e DA tais que os segmentos podem se interceptar somente em seus extremos. Os pontos A, B, C e D são chamados vértices do quadrilátero e os quatro segmentos são B C A D GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 26. chamados de lados do quadrilátero. Denotaremos o quadrilátero por ABCD. Para construir um quadrilátero, considerem uma reta r e pontos A, B e C tais que A, C ∈ r e B ∉ r. A existência desses pontos está garantida pelo Axioma I.1.b. r B C A rBE D E Consideremos um ponto E ∈ r, que podemos supor entre A e C. Na reta rBE consideremos a semirreta oposta a SEB e um ponto D pertencente a ela. Afirmamos que os pontos A, B, C e D junto com os segmentos AB, BC, CD e DA, formam um quadrilátero. De fato, temos que os pares de segmentos AB e BC, BC e CD, CD e DA, DA e AB se interceptam somente em um dos extremos, pois caso contrário eles seriam iguais pela Proposição 2.2. Resta mostrar que os pares de segmentos AB e CD, AD e BC não se interceptam. Temos que os segmentos AB e BC estão no semiplano Πr,B, CD e AD estão no semiplano Πr,D. Logo, AB e CD estão em semiplanos opostos determinados por r. Como A, C ∈ r e são distintos, temos que AB e CD não se interceptam. Deixamos como exercício a verificação de que AD e BC não se interceptam (Exercício 2.10). 2.9. Dados quatro pontos três a três não colineares, sempre é possível construir um quadrilátero. De fato, sejam A, B, C e D esses pontos, escolhamos dois pontos quaisquer, digamos A e B. Temos, então, duas opções: 1. C e D estão em semiplanos opostos determinados por rAB: Nesse caso, basta considerar os segmentos AC, CB, BD e DA. rABD A B C 2. C e D estão no mesmo semiplano determinado por rAB: Nesse caso, escolhamos um dos pontos A ou B e um dos pontos C e D, digamos A e C. Temos duas opções: rABC B D A 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 27. a) B e D estão no mesmo semiplano determinado por AC: Neste caso, basta considerarmos os segmentos AC, CD, DB e BA. rAB C D A B rAC b) B e D estão em semiplanos opostos determinados por rAC: Nesse caso, basta considerar os segmentos AB, BC, CD e DA. rAB C D B A rACCom esses resultados, o diagrama apresentado anteriormente passa a ter a visualização no diagrama abaixo. Observamos que agora temos sete classes distintas de figuras planas, todas disjuntas: pontos, retas, segmentos, semirretas, triângulos, semiplanos e quadriláteros. Figuras pontos retas segmentos triângulos semi-retas semiplanos quadriláteros 2.3. ORDENANDO UMA RETA Nosso objetivo agora será utilizar os axiomas anteriores para construir uma relação de ordem sobre uma reta. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 28. Definição 2.11: seja r uma reta arbitrária e O um ponto sobre r. Consideremos uma das duas semirretas que têm origem comum em O. Diremos que um ponto A dessa semirreta precede um ponto B, se A está entre O e B. B r O A Chamando uma das duas semirretas com origem O de primeira semirreta ou semirreta negativa, e a outra de segunda semirreta ou semirreta positiva, podemos definir uma relação na reta r toda, estabelecendo as seguintes condições: C r A B D O Sem i-re ta pos itiv a Sem i-re ta neg ativ a Sejam A e B dois pontos da semirreta negativa. Então, na reta r, A é menor do que B se B precede A. 1. Todos os pontos da semirreta negativa são, na reta r, menores do que o ponto O. 2. Todos os pontos da semirreta negativa são, na reta r, menores do que todos os pontos da semirreta positiva. 3. O ponto O, na reta r, é menor do que todos os pontos da semirreta positiva. 4. Sejam C e D dois pontos da semirreta positiva. Então, na reta r, C é menor do que D se C precede D. Notação: se A é menor do que B, escreveremos “A < B”, e se A é menor do que ou igual a B, escreveremos “A ≤ B”. Proposição 2.12: a relação “menor do que ou igual a” (≤) é uma relação de ordem total na reta. A relação “menor do que” (<) é uma relação de ordem estrita na reta19. Demonstração: demonstraremos a primeira parte e deixaremos como exercício a demons-tração da segunda parte (Exercício 2.11). Devemos mostrar que essa relação é 19 Uma relação R em um conjunto A é denominada relação de ordem se satisfizer as propriedades reflexiva (P(x): (∀x ∈ A)(x R x), anti-simétrica (P(x,y): (∀x,∀y ∈ A)(x R y e y R x ⇒ x = y) e transitiva (P(x,y,z): (∀x,∀y,∀z ∈ A)(x R y e y R z ⇒ x R z). Se além disto tivermos (x,y) ∈ R ou (y,x) ∈ R para quaisquer x, y ∈ A, a ordem será total. Para ser uma ordem estrita, a relação deverá satisfazer a propriedade transitiva e a propriedade P(x): (∀x ∈ A)(x R/ x), denominada irreflexiva. 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 29. reflexiva, anti-simétrica, transitiva, e que dados quaisquer dois pontos A e B em r, ou A ≤ B, ou B ≤ A. i) Reflexiva: A ≤ A, pois A = A. ii) Anti-simétrica: sejam A e B pontos da reta tais que A ≤ B e B ≤ A. Suponhamos que A e B estejam na semirreta negativa e que sejam distintos. Temos A < B e, por (1), B precede A na semirreta negativa, ou seja, B está entre O e A. Mas também temos que B < A e, por (1), A precede B na semirreta negativa, ou seja, A está entre O e B, o que é uma contradição pelo Axioma II.1. Analogamente, obtemos os outros casos. iii) Transitiva: sejam A, B e C pontos de uma reta tais que A ≤ B e B ≤ C. Podemos supor que os pontos sejam dois a dois distintos, pois caso contrário, o resultado é imediato. Suponhamos que A, B e C estejam na semirreta positiva. Existem seis possibilidades para A, B e C na semirreta positiva, como mostra o desenho ao lado. Como A < B e B < C, por hipótese, só nos resta a primeira possibilidade, que nos fornece B entre A e C. Além disso, temos A entre O e B. Logo, pela Proposição 2.7 temos A entre O e C. Portanto, A ≤ C. O caso em que A, B e C estão na semirreta negativa é análogo. Suponhamos agora que o ponto A esteja na semirreta negativa e o ponto C esteja na B CO A C BO A A CO B C AO B A BO C B AO C semirreta positiva. Nesse caso, o resultado é imediato pela Definição 2.11. Se o ponto A está na semirreta positiva e o ponto C está na semirreta negativa, temos que o ponto B está na semirreta positiva, porque A < B. Logo, C < B, o que contradiz a hipótese. Em todos os casos, concluímos que A < C e, portanto, A ≤ C. iv) Dados dois pontos A e B quaisquer em r, é imediato das cinco condições que A é menor do que ou igual a B ou B é menor do que ou igual a A. Diante do exposto acima, vemos o porquê dos Axiomas II.1 e II.2 serem classificados nos grupos dos axiomas de ordem, porque por meio deles ordenamos todos os pontos de uma reta. Teorema 2.13: entre dois pontos quaisquer de uma reta, existem infinitos pontos desta. Demonstração: suponhamos que entre dois pontos A e B de uma reta existam n pontos distintos, digamos { P1, P2, …,Pn }. Com a relação de ordem “≤”, podemos considerar P1 GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 30. < P2 < …< Pn, a menos de uma reordenação de índices. Como P1 ≠ P2, pelo Axioma II.2, existe um ponto P tal que P1 < P < P2. Assim, P é distinto P3, …,Pn, o que é absurdo, pois entre os dois pontos supusemos existir exatamente n pontos. Por conseguinte,, existem infinitos pontos entre dois pontos quaisquer de uma reta. Corolário 2.14: existem infinitos pontos em uma reta. Demonstração: imediata, visto que todo conjunto que contém um conjunto infinito é infinito. 2.4. POLÍGONOS Estudamos nas seções anteriores as definições e construções de triângulos e quadriláteros. Nesta seção, vamos definir uma classe de figuras denominada polígonos, que inclui os triângulos e quadriláteros. Definição 2.15: dois segmentos são ditos consecutivos se possuirem exatamente um extremo em comum. Dado n ∈ IN, n ≥ 3, uma n-poligonal é uma figura formada por uma sequência de n pontos A1, A2, ..., An e pelos segmentos consecutivos A1A2, A2A3, A3A4, A4A5,...,An-1An. Os pontos são chamados vértices da poligonal e os segmentos são chamados lados da poligonal. A1 A2 A3 A4 A5 A6An-1 An Denotaremos a n-poligonal por A1A2...An. Estamos interessados em poligonais com certas propriedades: Definição 2.16: uma n-poligonal A1A2...An é denominada polígono de n lados ou n-ágono, se as seguintes condições são satisfeitas: a) A1 = An; b) Os pontos A1, A2, ..., An-1 são dois a dois distintos; 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 31. c) Os lados não consecutivos não se interceptam; d) Dois lados consecutivos não são colineares. Os segmentos AiAi+1 (i=1,…,n–2) e An-1A1 são denominados lados e, os pontos A1, A2, ...An-1 são denominados vértices. Os segmentos determinados pelos vértices que não são lados do polígono são chamados diagonais do polígono. Observemos que todo polígono é uma poligonal, porém nem toda poligonal é um polígono. Exemplos 2.10. Os desenhos a seguir ilustram alguns polígonos. O polígono (1) é um quadrilátero, o polígono (2) é um 5-ágono, os polígonos (3) e (5) são 8-ágonos, o polígono (4) é um triângulo, o polígono (6) é um 6-ágono. (1) (2) (3) (4) (5) (6) 2.11. Os desenhos a seguir não representam polígonos. O desenho (1), apesar de satisfazer os itens b), c) e d), não satisfaz o item a). O desenho (2) não satisfaz o item c). O desenho (3) não satisfaz os itens a) e b). O desenho (4) não satisfaz os itens b), c) e d). O desenho (5) não satisfaz os iten b), c) e d).20 (1) (2) (3) (4) (5) 2.12. O desenho ao lado ilustra um polígono, apesar de termos dois lados contidos em uma mesma reta. O que ocorre é que esses lados não possuem extremos em comum. 20 Observamos a diferença entre os desenhos (2) e (4): enquanto em (2) ocorre a interseção de dois segmentos, em (4) temos quatro segmentos com um vértice em comum. Os desenhos que serão feitos a partir de agora não apresentarão mais os pontos de forma explícita e ficarão subentendidos os vértices. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 32. 2.13.Os polígonos recebem nomes especiais para alguns valores de n. Vejamos na tabela a seguir alguns deles: Número de lados Nome do polígono 3 triângulo 4 quadrilátero 5 pentágono 6 hexágono 7 heptágono 8 octógono 9 nonágono 10 decágono 12 dodecágono 15 pentadecágono Para encerrar este capítulo, apresentamos um diagrama das principais figuras geométricas obtidas até o momento. Dentro da classe dos polígonos estão aqueles mencionados no exemplo anterior, e as poligonais constituem uma classe não apresentada no desenho, mas que contém a classe dos polígonos. 2.5 EXERCÍCIOS 2.1. Pela Proposição 2.2, duas retas distintas possuem no máximo um ponto em comum, o que podemos dizer de um conjunto de três retas distintas do plano? E um conjunto de quatro retas distintas do plano? E um conjunto de 5 retas distintas do plano? Obtenha um resultado para o caso de n retas distintas, justificando sua resposta. 2.2. Mostre que três pontos não colineares determinam três retas. Quantas retas são determinadas por quatro pontos, sendo que quaisquer três deles são não colineares? E para o caso de 6 pontos? Generalize para o caso de n pontos. 2.3. Sejam P = {a,b,c}, r1 = {a,b}, r2 = {a,c} e r3 = {b,c}. Chame P de plano e, r1 , r2 e r3 de retas. Mostre que nessa “geometria” vale o Axioma I.2. Idem para o plano P = {1,2,3,4,5,6,7,8,9} e as retas como r1 ={1,2,3}, r2 = {4,5,6}, r3 = {7,8,9}, r4 = {1,4,7}, 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 33. r5 = {2,5,8}, r6 = {3,6,9}, r7 = {1,5,9}, r8 = {2,6,7}, r9 = {3,4,8}, r10 = {3,5,7}, r11 = {2,4,9} e r12 = {1,6,8}. 1 2 3 4 5 6 7 2.4. O desenho ao lado representa um “plano”, o símbolo • representa um “ponto” e as linhas unindo os pontos 1, 2 e 3; 1, 7 e 4; 1, 6 e 5; 2, 7 e 5; 2, 4 e 6; 3, 4 e 5; 3, 7 e 6; cada umarepresenta uma “reta”. Observe que há 7 “retas” e 7 “pontos” no desenho. Verifique se nesse modelo de geometria valem os axiomas de existência e de determinação. 2.5. Com base nos exercícios anteriores, mostre que não existe exemplo de uma geometria com exatamente seis pontos, em que sejam válidos o Axioma I.1 e o Axioma I.2 e no qual todas as retas tenham exatamente 3 pontos. 2.6. Seja r uma reta qualquer e O um ponto de r. Mostre que a relação “estar do mesmo lado em relação ao ponto O” é uma relação de equivalência em r. 2.7. Seja r uma reta qualquer. Mostre que a relação “estar do mesmo lado em relação à reta r” é uma relação de equivalência no plano. 2.8. Mostre que, se uma reta intercepta um lado de um triângulo e não passa por nenhum de seus vértices, então ela intercepta também um dos outros dois lados.21 2.9. Mostre que se C está entre A e D e B está entre A e C, então B se encontra entre A e D, e C se encontra entre B e D. 2.10. No Exemplo 2.8 (construção do quadrilátero), verifique que AD e BC não se interceptam. 2.11. Complete a demonstração da Proposição 2.12. 2.12. Considere a seguinte construção de quadrilátero: Para construir o quadrilátero, considere uma reta r e os pontos A, D e E tais que A, D ∈ r e E ∉ r. A existência está garantida pelo Axioma I.1.b. Construa o triângulo ADE. 21 Esse resultado é também conhecido como Axioma de Pasch devido ao matemático Moritz Pasch, que nasceu 8/11/1843 em Breslau, na Alemanha (atualmente, Wroclaw na Polônia) e morreu em 20/09/1930 em Bad Homburg, Alemanha. Pasch trabalhou nos fundamentos da geometria e encontrou algumas hipóteses nos Elementos que ninguém havia no- tado antes. D. Hilbert, no livro (Hilbert, 1957), admite esse resultado como axioma e demonstra o Axioma II.2. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 34. Utilizando o Axioma II.2, considere um ponto B entre A e E e um ponto C entre D e E. O quadrilátero é dado pelos pontos A, B, C, D e pelos segmentos AB, BC, CD e DA. a) Mostre que essa construção nos fornece um quadrilátero. b) Qualquer quadrilátero pode ser construído dessa forma? Justifique sua resposta. 2.13. Podem existir dois segmentos distintos que têm exatamente dois pontos em comum? 2.14. Utilizando semiplanos, defina interior de um triângulo. 2.15. Demonstre que existem infinitas retas no plano. 2.16. Demonstre que por um ponto P passam infinitas retas. 2.17. Desenhe as diagonais de um quadrilátero, de um pentágono e de um hexágono. Conte quantas diagonais têm cada um deles. Quantas diagonais têm um polígono de n lados? 2.18. Um subconjunto do plano é dito convexo se o segmento ligando quaisquer dois de seus pontos está totalmente contido nele. a) Mostre que o próprio plano e qualquer semiplano são convexos. b) Nos desenhos abaixo, quais representam conjuntos convexos? c) Mostre que a interseção de n conjuntos convexos é um conjunto convexo. d) Mostre que a interseção de n semiplanos é um conjunto convexo. e) A união de dois conjuntos convexos é um conjunto convexo? Mostre ou dê um contraexemplo. 2.19. Mostre que um triângulo separa o plano em duas regiões, uma convexa e a outra não. 2 INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO 35. 2.20. Classifique como verdadeiro (V) ou falso (F), justificando sua resposta. a) Ponto é o que não tem dimensão. b) Reta é o que tem uma única dimensão. c) Dois pontos determinam uma reta. d) Três pontos não colineares são distintos. e) Duas retas que têm um ponto em comum são concorrentes. CAPÍTULO 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS Medir um ente geométrico é, antes de qualquer coisa, compará-lo com outro, e foi através da comparação de áreas de terras que a geometria se iniciou. Neste capítulo, trabalharemos com o terceiro e quarto grupos de axiomas. Intercalaremos os dois grupos por serem recíprocos um do outro. Esses grupos fazem a conexão da geometria com os números reais. 3.1. MEDIDAS DE SEGMENTOS O primeiro passo para esbelecer medidas de segmentos é garantir que podemos associar um número a um segmento. Isto é dado pelo próximo axioma: Axioma III.1: a todo segmento de reta corresponde um número real maior ou igual a zero. Esse número é zero se, e somente se, os extremos do segmento são coincidentes. Ao introduzir esse axioma, estamos supondo que podemos fazer essa medida através de algum instrumento conhecido, como, por exemplo, por meio de uma régua com escala, e ao fazermos isto, estamos definindo uma unidade de medida. Definição 3.1: o número a que se refere esse axioma é chamado comprimento do segmento, ou distância entre os pontos A e B, extremos do segmento. Denotaremos o comprimento de um segmento AB, por AB . GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 38. Axioma III.2: se um ponto C está entre dois pontos A e B, então o comprimento do segmento AB é igual à soma do comprimento do segmento AC com o comprimento do segmento CB, ou seja, AB AC CB= + . Esses dois axiomas fazem parte do grupo III dos axiomas de medidas (estes são de medida de segmentos). Após definirmos ângulos, daremos mais dois axiomas de medidas (de ângulos). Nos capítulos 6 e 16, necessitaremos dos axiomas de medidas de áreas e volumes, respectivamente. Uma das consequências do Axioma III.2 é saber a posição de dois pontos através da medida dos segmentos formados com o ponto O. Proposição 3.2: em uma semirreta SOA, se considerarmos o ponto B ≠ O tal que OB OA< , então o ponto B estará entre O e A. Demonstração: a origem O certamente não está entre A e B, pela própria definição de semirreta. Se o ponto A O B A estivesse entre O e B, pelo Axioma III.2, teríamos que OB OA AB= + e como AB tem comprimento maior ou igual a zero, teríamos OB OA≥ , o que é um absurdo. Só resta a alternativa que B está entre O e A. O axioma seguinte pode ser visto como o “recíproco” do Axioma III.1. Entretanto ele é colocado em um quarto grupo, que é constituído pelos axiomas de existência de um segmento de um dado comprimento e ângulosde uma dada medida. Na verdade, esse grupo de axiomas introduz a noção de continuidade na geometria. Axioma IV.1: para qualquer número real d > 0, existe um segmento de reta de comprimento d, que pode ser construído a partir da origem de qualquer semirreta dada. Agora podemos estabelecer uma unidade de medida de segmentos e construir um instrumento que servirá para comparar comprimentos. Essa unidade é denominada metro internacional e é a distância entre dois traços em uma certa barra de metal conservada no 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS 39. Bureau Internacional de Pesos e Medidas perto de Paris (a barra deve estar à temperatura do gelo fundente: 0ºC). Esse é o segmento cuja medida vale 1 metro.22 Para construir uma régua graduada, subdividimos o metro em 1000 partes iguais, fornecendo, assim o milímetro. Cada 10 milímetros nos dá 1 centímetro. A foto a seguir ilustra em tamanho natural parte de uma régua graduada de 20 centímetros que corresponde a 200 milímetros. O conceito de distância permite definir ainda o perímetro de um polígono. Definição 3.3: a soma das medidas dos lados de um polígono qualquer é chamada perímetro do polígono. Exemplos 3.1. Consideremos três pontos A, B e C tais que B esteja entre A e C e AB = 2. Não importa qual seja o valor de BC , o valor de AC é 2 + BC , pelo Axioma III.2. Por exemplo, se BC = 5, teremos AC = 7. 3.2. Se considerarmos os números reais 4 e 6 pelo Axioma IV.1, existem segmentos de reta de comprimento 4 e 6 que podem ser construídos a partir de qualquer ponto da reta. No desenho ao lado, vemos que o segmento AB possui comprimento de 1 cm, o segmento CD possui comprimento de 0,9 cm e o segmento BC possui 22 Historicamente, em 1790 a Assembléia Constituinte da França criou uma comissão de cientistas, integrada por Lagran- ge, Laplace e Monge, entre outros, com o objetivo de analisar e propor soluções para o problema de criar uma unidade de medida de comprimento. Como consequência dos trabalhos dessa comissão, em 1795 criou-se uma lei que estabe- lecia o metro como unidade padrão de comprimento e era definido como: “a décima milionésima parte do quadrante de um meridiano terrestre”. Para chegarem a essa relação, dois astrônomos franceses, Méchain e Delambre, mediram o arco de meridiano entre as cidades de Dunquerque, na França, e Barcelona, na Espanha, passando por Paris, sendo então construído um metro de platina para ser utilizado como padrão. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 40. comprimento de 1,5. Observamos que o segmento AD possui comprimento de 3,4. O próximo teorema, que utiliza esses axiomas, permitirá introduzir a noção de coordenada. Teorema 3.4: sejam r uma reta e IR o conjunto dos números reais. Existe uma função x: r → IR bijetora tal que, se x(A) e x(B) são as imagens de dois pontos A e B, o comprimento do segmento AB será igual a x(B) – x(A). Demonstração: seja O ∈ r um ponto qualquer, pelo Teorema 2.5 e Definição 2.6, O divide r em duas semirretas. Escolhamos uma para ser a semirreta negativa, denotando-a por SO–, e a outra para ser a semirreta positiva, denotando-a por SO+. Definamos a relação x = {(A,x(A))|A∈r}, em que O O 0 se A O x(A) OA se A S OA se A S . + − = = ∈ − ∈ Temos que x é uma função, pois Dom x = r, pelo Axioma III.1. Além disso, se A = B, temos x(A) = x(B), porque OA = OB, e então OA OB= . Temos também que x é bijetora. De fato, x é injetora, pois considerando A e B distintos, temos os seguintes casos: 1. A e B em SO–: OA ≠ OB ⇒ – x(A) ≠ – x(B) ⇒ x(A) ≠ x(B). 2. A e B em SO+: OA ≠ OB ⇒ x(A) ≠ x(B). 3. A e B em semirretas distintas: teremos x(A) e x(B) com sinais distintos e portanto x(A) ≠ x(B). Quanto à sobrejetividade, seja d ∈ IR, pelo Axioma IV.1, existe um segmento de reta de comprimento |d| construído a partir do ponto O. Se d> 0, contruímos o segmento OD na semirreta positiva SO+, se d<0, construímos o segmento OD’ na semirreta negativa SO– e se d = 0, temos que x(O) = 0. Assim, x(D) = d se d > 0 e x(D’) = d se d < 0. Logo, para qualquer d ∈ IR, sempre obtemos um ponto P em r tal que x(P) = d, em que 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS 41. D se d 0 P O se d 0 D ' se d 0. > = = < Para demonstrar a segunda parte, sejam A, B em r. Se A = B, então x(A) = x(B) e, assim, AB = 0 = |x(B) – x(A)|. Se A ≠ B temos os seguintes casos: 1. A entre O e B na semirreta positiva: OB OA AB AB OB OA= + ⇒ = − = x(B) – x(A). 2. B entre O e A na semirreta positiva: OA OB BA AB BA OA OB= + ⇒ = = − = x(A)–x(B). 3. A entre O e B na semirreta negativa: BO BA AO AB BA BO AO= + ⇒ = = − = –x(B) – (–x(A)) = = x(A) – x(B). BO A AO B OB A 1 2 3 4. B entre O e A na semirreta negativa: AO AB BO AB AO BO= + ⇒ = − = – x(A) – (–x(B)) = x(B) – x(A) 5. A na semirreta positiva e B na negativa: BA BO OA= + = –x(B) + x(A) = x(A) – x(B). 6. B na semirreta positiva e A na negativa: AB AO OB= + = –x(A)+x(B)= x(B)–x(A). OA B AB O BA O 4 5 6 Assim, em qualquer caso, obtemos AB = x(B) – x(A). GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 42. Definição 3.5: sejam r uma reta, O ∈ r e a função x: r → IR, dada pelo Teorema 3.4. Dado A ∈ r, o número x(A) é chamado de coordenada do ponto A em relação a O e a função x é denominada um sistema de coordenadas em relação a O para a reta r. Com a relação de ordem entre os pontos de uma reta r, estabelecida no capítulo 2, os Axiomas III.1, III.2, IV.1, e o Teorema 3.4, podemos garantir o seguinte resultado: Corolário 3.6: Dado um número real d e fixado um ponto O de uma reta r, existe um único ponto de r tal que sua coordenada com relação a O é d. Demonstração: segue diretamente do fato da função x, dada pelo Teorema 3.4, ser bijetora. A existência segue da sobrejetividade e a unicidade segue da injetividade da função x construída no Teorema 3.4. As coordenadas dos pontos caracterizam sua posição na reta. Esse é o resultado apresentado na proposição a seguir: Proposição 3.7: sejam A, B e C pontos de uma mesma reta, cujas coordenadas são, respectivamente, a, b e c. O ponto C está entre A e B se, e somente se, o número c está entre os números a e b. Demonstração: primeiramente, suponhamos que o ponto C esteja entre A e B, então, pelo Axioma III.2, temos AB AC CB= + . Pelo Teorema 3.4, temos AB = |b – a|, AC = |c – a| e CB = |b– c|. Assim, |b – a| = |c – a| + |b – c|. Suponhamos que b>a, então |c – a| < b – a e |b – c| < b – a. Logo, c – a < b – a e b – c < b – a. Portanto, c < b e a < c, ou seja, a < c < b. No caso em que a>b, temos |c – a| < –(b – a) e |b – c| < –(b – a). Logo, c – a > b – a e b – c > b – a. Portanto, c > b e a > c, ou seja, b < c < a. Assim, em ambos os casos o número c está entre os números a e b. Reciprocamente, se a < c < b ou b < c < a, temos |c – a| + |b – c| = |b – a|. Assim, pelo Teorema 3.4, segue que AC CB AB+ = . Em particular, AC AB< . Consideremos as semirretas determinadas pelo ponto A. Se B e C estão em semirretas opostas, pela definição de coordenadas de pontos, as coordenadas a, b e c não poderiam satisfazer a < c 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS 43. < b ou b < c < a, assim, B e C estão na mesma semirreta em relação a A e pela Proposição 3.2, temos que C está entre A e B, como queríamos demonstrar. Definição 3.8: dado um segmento AB, dizemos que um ponto C ∈ AB é o ponto médio de AB, se AC CB= .23 23 A C B A existência e unicidade do ponto médio são garantidas pela proposição a seguir. Proposição 3.9: qualquer segmento tem um único ponto médio. 1Demonstração: (Existência) sejam a e b as coordenadas das extremidades desse segmento. Considere o número (a b)c 2 + = . Afirmamos que o segmento de coordenada c (queexiste pelo Axioma IV.1) é o ponto médio desejado. De fato: a b a bAC a c a 2 2 2 + = − = − = − a b a bCB c b b 2 2 2 + = − = − = − do que segue que AC CB= , e como o número (a b) 2 + está entre a e b, segue da Proposição 3.7 que C está entre A e B. (Unicidade) Suponhamos que C e D sejam pontos médios do segmento AB, então: a b (a x(D)) (x(D) b) AD BDCD x(C) x(D) x(D) 0 2 2 2 + − − − − = − = − = = = . Portanto, x(C) = x(D), pela injetividade da função x dada pelo Teorema 3.4, temos que C = D. 23 Utilizaremos os símbolos /, //, ///, ////, ... sobre os segmentos para representar que estes possuem o mesmo comprimento. aquí, estamos utilizando no desenho o símbolo “//”. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 44. É importante observar que apenas a condição C ∈ AB não é suficiente para que C seja ponto médio. Se impormos apenas a condição AC CB= , verificamos que também não é suficiente, haja vista que podemos ter algo, como mostra o desenho ao lado, no qual AC CB= e C ∉ AB. Por outro lado, podemos supor somente que C está na A C B reta rAB e teremos como consequência da condição AC CB= que C está entre A e B. De fato, se C ∉ AB, então temos B entre A e C, ou A entre B e C. No primeiro caso, AC AB BC CB= + > , e no segundo caso, temos CB AC AB AC= + > , o que torna impossível C satisfazer a condição AC CB= e, portanto, C está entre A e B. O r A O conceito de distância permite definir circunferência e círculo. Seja O um ponto do plano e r um número real positivo, a circunferência de centro O e raio r é o conjunto constituído por todos os pontos C do plano tais que OC r= . O conjunto dos pontos C que satisfazem a desigualdade OC r≤ é dito ser o círculo de centro O e raio r (ou disco de centro O e raio r). Se um ponto A é tal que OA < r, dizemos que A está no interior do círculo. Se um ponto B é tal que OB > r, dizemos que B está no exterior do círculo. As propriedades das circunferências e dos círculos O r serão estudadas no capítulo 8.24 A circunferência de centro O e raio r é uma figura plana na qual todos os pontos pertencentes a ela distam r de O e qualquer ponto que dista r de O pertence à circunferência. Essas duas propriedades nos levam ao conceito de lugar geométrico segundo uma propriedade ℘, que é uma figura plana ℑ tal que: a) Todos os pontos pertencentes a ℑ satisfazem a propriedade ℘; b) Os únicos pontos do plano que satisfazem a propriedade ℘ pertencem a ℑ. O círculo é também um lugar geométrico. No decorrer do texto, apresentaremos outros exemplos de lugares geométricos. 24 Em peral, os termos circunferência e disco, em qualquer texto matemático, têm sentido bastante claro, ou seja, circun- ferência é a linha e disco é a região determinada pela circunferência. Já para o termo círculo existe uma ambiguidade em vários textos, significando ora circunferência ou ora disco. Neste texto, seremos rigorosos no uso desses termos, seguindo rigorosamente a definição dada. 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS 45. 3.2. MEDIDAS DE ÂNGULOS Da mesma maneira que trabalhamos com segmentos, apresentaremos os principais conceitos e resultados relacionados aos ângulos. O O Definição 3.10: Em um semiplano, chamamos de ângulo a figura formada por duas semirretas com a mesma origem, tal que uma das semirretas está sobre a reta que determina o semiplano. As semirretas são chamadas de lados do ângulo e a origem comum, de vértice do ângulo. Um ângulo formado por duas semirretas distintas de uma mesma reta é chamado de ângulo raso.25 A B O Existem várias maneiras de denotar um ângulo. É muito usual denotar o ângulo da Definição 3.10 por AÔB ou por BÔA. Ao utilizarmos essa notação, a letra indicativa do vértice deve sempre aparecer com acento circunflexo entre as outras duas letras que representam os pontos das semirretas que formam o ângulo. Quando nenhum outro ângulo exibido tem o mesmo vértice, podemos denotar por Ô, utilizando apenas a letra do vértice com acento circunflexo para designar o ângulo.26 Voltaremos agora para o grupo III de axiomas para estabelecer medida de ângulos. Axioma III.3: a todo ângulo corresponde um número maior ou igual a zero e menor ou igual a 180. Esse número é zero se, e somente se, ele é constituído por duas semirretas coincidentes. Ao ângulo raso corresponderá o número 180. Definição 3.11: dado um ângulo Â, número θ a que se refere esse axioma é chamado medida em graus do ângulo  e será denotado por m(Â) = θo (leia-se: “a medida do ângulo  é igual a θ graus”). 25 Alguns livros definem ângulo como a “região” determinada pelas semirretas. Não existe diferença entre essas escolhas, mas devemos lembrar que a cada ângulo determinado por uma definição está associado um ângulo determinado pela outra definição. 26 Note que não estamos diferenciando o ângulo AÔB do ângulo BÔA, isto somente é feito quando se deseja trabalhar com ângulos orientados. GEOMETRIA PLANA E ESPACIAL 46. Aqui também, ao introduzirmos esse axioma, estamos admitindo que podemos fazer essa medida em graus através de algum instrumento conhecido, que definirá uma unidade de medida. Mais adiante, veremos como construir e utilizar esse instrumento. Quando não há a necessidade de explicitar os elementos de um ângulo, é bem usual a utilização de letras gregas minúsculas27 para denotar a medida do ângulo. Nesse caso, é conveniente escrever a letra grega em questão próxima do seu vértice, conforme desenho ao lado. Quando a medida é um número conhecido, escreve- se o próprio número no lugar da letra. 27 α Não se sabe exatamente quando o homem começou a medir ângulos, mas certamente eles já eram medidos por volta de 2.800 a.C. na antiga Mesopotâmia. Conjectura-se que a necessidade de medir ângulos surgiu na Astronomia, sendo talvez o primeiro estudo a incorporar a aplicação da matemática. Por exemplo, se se quisesse saber a que distância a Lua estava acima do horizonte utilizavam-se os seguintes métodos: • Esticava-se o braço e se calculava quantos dedos comportava o espaço entre a Lua e o horizonte ou • Segurava-se um fio entre as mãos afastadas do corpo e se media a distância. A medida era diferente de um comprimento comum, sendo considerado o primeiro passo para medir ângulo. O análogo ao Axioma III.2 para ângulos é dado pelo próximo axioma. Para isto, apresentamos a seguinte definição: Definição 3.12: sejam SOA, SOB e SOC semirretas com origem O. Se o segmento AB interceptar SOC, diremos que SOC divide o ângulo AÔB. Podemos mostrar que se o segmento AB interceptar SOC, então SOC intercepta qualquer segmento com extremos nos lados do ângulo. Deixamos como exercício a demonstração dessa afirmação (Exercício 3.12). O A B C 27 O alfabeto grego minúsculo é dado por: α (alfa), β (beta), γ (gama), δ (delta), ε (epsílon ou epsilo), ζ (zeta ou dzeta), η (eta), θ (teta), ι (iota), κ (capa), λ (lambda), µ (mi ou mu), ν (ni), ξ (xi), ο(omicron), π (pi), ρ (rô), σ (sigma), τ(tau), υ(upsilon), ϕ (fi), χ (qui), ψ(psi) e ω(omega). 3 SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS 47. Axioma III.4: se uma semirreta SOC divide um ângulo AÔB, então a medida do ângulo AÔB é igual à soma das medidas dos ângulos AÔC e CÔB, ou seja, m(AÔB) = m(AÔC) + m(CÔB). O A B C Teorema 3.13: consideremos um ângulo AÔB e SOC uma semirreta por O onde C está no mesmo semiplano de B com relação à reta rOA. Nessas condições, temos que ou SOB divide AÔC, ou SOC divide AÔB, e em ambos os casos m(BÔC) = m(AÔC) – m(AÔB). Demonstração: seja A1 um ponto na semi- reta oposta a SOA. O B A C O B A C Consideremos o triângulo AA1C. Então, pelo Exercício 2.8, como a reta OB corta o lado A1A do triângulo e não passa por nenhum dos seus vértices, (as
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