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Sepse e Choque Séptico: Definições e Tratamentos

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Sepse e Choque Séptico
Luciano César Pontes de Azevedo
Vladimir Ribeiro Pinto Pizzo
Rogério Zigaib
CAPÍTULO
29
INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
Em 1991, uma conferência de consenso envolvendo es-
pecialistas de diversas áreas que atuam no tratamento do pa-
ciente séptico realizou uma tentativa de padronizar as
definições destas doenças (Tabela 29.I). A partir de então, os
termos SRIS (síndrome da resposta inflamatória sistêmica) e
sepse passaram a ser incorporados definitivamente no jargão
médico e os termos prévios vagos septicemia e síndrome
séptica foram abandonados. De acordo com os critérios ado-
tados nessa conferência, sepse é a síndrome da resposta in-
flamatória sistêmica associada a infecção fortemente suspei-
ta ou documentada, ou seja, não há necessidade de culturas
positivas para o diagnóstico. Do mesmo modo, choque sép-
tico é a sepse na qual há necessidade de uso de vasopressores
após uma reposição volêmica adequada (Tabela 29.I).
A despeito de considerável debate acerca da inespecifici-
dade das definições de SRIS e sepse, esta terminologia persiste
atual e adequada. Uma nova conferência de consenso realiza-
A evolução dos pacientes com sepse/choque séptico depende
fundamentalmente da identificação precoce do quadro, bem
como da precocidade e da eficácia do tratamento adotado na sala
de emergência. O tratamento geral da sepse inclui ressuscitação
volêmica precoce guiada por metas, antibioticoterapia imediata e
remoção de focos infecciosos. Quando necessário, o suporte com
drogas vasoativas e inotrópicos deve ser instituído.
Sepse é uma das condições associadas a maior morbimortalidade
em UTIs, bem como a custos elevados de tratamento.
A despeito de sua considerável inespecificidade para diagnóstico
de sepse, os termos SRIS, sepse, sepse grave e choque séptico
permanecem atuais e úteis na classificação das diversas etapas da
doença.
A fisiopatologia do episódio séptico depende da interação entre
células inflamatórias do hospedeiro com produtos bacterianos,
com produção de diversos mediadores responsáveis pelo
surgimento de disfunção orgânica.
Os critérios diagnósticos para sepse incluem os achados clínicos e
laboratoriais habituais, bem como sinais de disfunção orgânica.
A ausência de uma característica clínica, bem como de exames
laboratoriais específicos para sepse, tornam mais importante a
suspeita clínica precoce com o objetivo de evitar a progressão da
doença para disfunção de múltiplos órgãos.
Estratégias específicas para sepse grave/choque séptico incluem
ressuscitação volêmica guiada por PVC e saturação venosa central
(SvcO2) nas seis primeiras horas no pronto-socorro. Outras
medidas, como controle glicêmico, corticoterapia (em baixas
doses) e uso de proteína C ativada, podem ser úteis e melhoram o
prognóstico desses pacientes em determinadas situações.
O prognóstico da sepse depende fundamentalmente do número
de órgãos envolvidos, contudo, mesmo pacientes com
recuperação completa das disfunções orgânicas podem
permanecer limitados em suas atividades diárias.
A mortalidade em pacientes com choque séptico e mais de três
órgãos disfuncionais é em torno de 80%.
Pacientes que desenvolvem SARA/LPA devem receber ventilação
mecânica com estratégia protetora: volume corrente baixo (4 a 6
mL/kg) e limitando pressões de vias aéreas (Pplatô < 30 cmH2O).
TÓPICOS IMPORTANTES
Infecção: Fenômeno microbiano caracterizado por resposta inflamatória
reacional à presença de microrganismos ou à invasão de tecidos
normalmente estéreis àqueles microrganismos.
SRIS (síndrome da resposta inflamatória sistêmica): Resposta
inflamatória generalizada do organismo a diversos agressores, como:
trauma, queimaduras, pancreatite, sepse etc. Dois ou mais dos critérios
abaixo são necessários para estabelecer o diagnóstico:
• Temperatura maior que 38,3ºC ou central menor que 36ºC.
• Frequência cardíaca acima de 90 bpm.
• Frequência respiratória maior que 20 ipm, ou PaCO2 menor que 32
mmHg ou ainda necessidade de ventilação mecânica por um
processo agudo.
• Leucocitose maior que 12.000/mm3 ou leucopenia menor que
4.000/mm3 ou ainda presença de mais de 10% de formas imaturas
(bastonetes).
Sepse: Síndrome da resposta inflamatória sistêmica relacionada à
infecção documentada ou presumida.
Sepse grave: Sepse associada à hipoperfusão tecidual, hipotensão ou
disfunção orgânica (cardiovascular, neurológica, renal, respiratória,
hepática, hematológica, metabólica).
Choque séptico: Sepse com hipotensão e hipoperfusão não responsiva a
volume com necessidade de uso de agentes vasopressores.
Síndrome da disfunção de múltiplos órgãos: Presença de função
orgânica alterada em pacientes gravemente enfermos, nos quais a
homeostase do organismo não pode ser mantida sem intervenção.
Tabela 29.I – Definições de infecção, SRIS, sepse, sepse grave e
choque séptico
CAPÍTULO 29 – SEPSE E CHOQUE SÉPTICO 259
da dez anos após a conferência de 1991 reafirmou o uso dess-
es termos, apesar de reconhecer suas diversas limitações.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Apesar dos recentes avanços no entendimento de sua fi-
siopatologia e na terapêutica, a sepse é ainda frequente-
mente letal, com taxas de mortalidade variando em torno
de 20 a 50%, dependendo da série examinada. Além da
grande mortalidade associada a essa condição, a morbidade
e consequentemente os custos do tratamento também são
bastante elevados. A tendência é que o número de casos de
sepse venha a aumentar nos próximos anos pelo progressi-
vo envelhecimento da população e melhora na sobrevida de
pacientes imunossuprimidos (como os portadores de SIDA
e neoplasias), o que torna estes indivíduos mais sujeitos a
infecções. O uso indiscriminado de antimicrobianos e o
consequente surgimento de resistência bacteriana a essas
drogas podem também contribuir para o aumento.
Os dados epidemiológicos nacionais confirmam a mor-
bimortalidade elevada da sepse. O estudo BASES (Brasilian
Sepsis Epidemiological Study) identificou entre pacientes
internados em diversas UTIs nacionais taxas de mortali-
dade de 24,2%, 33,9%, 46,9% e 52,2% para pacientes com
SRIS, sepse, sepse grave e choque séptico, respectivamente.
Fisiopatologia
Embora nos últimos anos tenham ocorrido avanços
consideráveis no conhecimento da fisiopatologia da sepse,
muito ainda permanece por ser esclarecido, na medida em
que a interação microrganismo-hospedeiro é extremamente
complexa e o mecanismo fisiopatológico depende, entre ou-
tras coisas, do agente causador e do local da infecção. Em
termos gerais, após o estímulo infeccioso inicial, a resposta
do organismo se compõe da liberação de inúmeros media-
dores inflamatórios responsáveis por muitas das caracterís-
ticas clínicas que observamos no indivíduo com sepse. As-
sim sendo, a liberação de citocinas, como IL-1 β, IL-6 e
TNF-α, é associada ao aumento na produção de espécies
reativas de oxigênio e óxido nítrico (NO), sendo este último
o principal responsável pela vasoplegia que esses pacientes
apresentam. Por sua vez, a liberação de citocinas é responsá-
vel por ativar leucócitos, com seu recrutamento ao local de
infecção, sua adesão ao endotélio, diapedese e liberação nos
tecidos de espécies reativas de oxigênio e enzimas como a
elastase neutrofílica, que por sua vez causarão lesão tecidual,
contribuindo assim para a disfunção de múltiplos órgãos. A
ativação de células do sistema imune é também capaz de in-
duzir a ativação da cascata de coagulação com expressão de
fator tecidual e inibição da fibrinólise, com formação de mi-
crotrombos em arteríolas e capilares, os quais, por obstruí-
rem o fluxo sanguíneo, geram hipoxia tecidual e agravam a
disfunção orgânica. Por outro lado, muitos investigadores
acreditam que a sepse, após ou mesmo durante esse estado
de imunoestimulação, associa-se a um quadro de imunode-
pressão por liberação conjunta de citocinas anti-inflamató-
rias,o qual pode ser responsável pela incidência aumentada
de novas infecções durante a internação na UTI.
Em termos de microbiologia, qualquer microrganismo
pode provocar sepse ou choque séptico, incluindo bactérias,
vírus, protozoários, fungos e espiroquetas. Atualmente, vem
aumentando a incidência de sepse fúngica e por Gram-posi-
tivos. Frequentemente a sepse por Gram-negativo é indistin-
guível daquela por Gram-positivo, quando avaliada apenas
sob características clínicas. Contudo, alguns fatores epidemio-
lógicos, do hospedeiro e clínicos podem aumentar a probabi-
lidade de infecção por um determinado microrganismo.
ACHADOS CLÍNICOS
Além dos critérios descritos na definição de sepse, di-
versos outros achados clínicos podem ser encontrados nos
indivíduos sépticos. Estes achados, reunidos abaixo e des-
critos pelos especialistas após a conferência de definições de
sepse de 2001, frequentemente são correlacionados com
sinais de disfunção orgânica (Tabela 29.II).
Em termos hemodinâmicos, a sepse caracteriza-se inicial-
mente por uma fase hipodinâmica às custas de redução do
volume intravascular e eventualmente depressão miocárdica.
Após ressuscitação, tipicamente ocorre evolução para um
padrão hemodinâmico de débito cardíaco elevado, redução
da resistência vascular sistêmica por vasoplegia, bem como
elevação do lactato arterial e redução da perfusão tecidual,
com alteração do enchimento capilar. A saturação venosa
tipicamente é alta e a presença de ânions não mensuráveis al-
tera o déficit de base na gasometria arterial. É importante
salientar que o diagnóstico precoce de sepse, principalmente
nas suas formas mais graves, reveste-se de importância
prognóstica, na medida em que, uma vez sendo adiados o
diagnóstico e o tratamento, a chance de que haja evolução
para insuficiência de múltiplos órgãos aumenta, o que, em úl-
tima análise, é a grande causadora de óbito nesses indivíduos.
EXAMES COMPLEMENTARES
Infelizmente, não existe um exame laboratorial especí-
fico para o diagnóstico de sepse. Em termos laboratoriais, a
presença de leucopenia, a despeito de ser previamente con-
siderada como indício de infecção por Gram-negativo,
atualmente é mais correlacionada com infecção grave e
imunossupressão, o que confere a esses pacientes um pior
prognóstico. Estes indivíduos têm ainda frequentemente re-
dução das contagens plaquetárias, bem como alteração dos
tempos de coagulação, com aumento dos produtos de de-
gradação da fibrina, dímero-D e redução do fibrinogênio, o
que indica a presença de coagulopatia de consumo.
A hiperglicemia é achado comum nesses pacientes e
usualmente reflete a ação de hormônios contrarreguladores,
como epinefrina, cortisol e glucagon. Outros achados labo-
ratoriais se correlacionam com as disfunções orgânicas e in-
cluem elevação de enzimas hepáticas e bilirrubinas, elevação
das escórias nitrogenadas, hipoxemia e hipocapnia na gasome-
tria, bem como presença de acidose metabólica.
A incidência de culturas positivas em pacientes sépticos
é de cerca de 45% das amostras. Apesar disso, todos os pa-
cientes sépticos devem ter culturas colhidas imediatamente
após o diagnóstico, pois diversos estudos demonstram que
PRONTO-SOCORRO SEÇÃO II – ABORDAGEM INICIAL DO PACIENTE GRAVE260
a antibioticoterapia precoce e empírica inicialmente segui-
da por ajuste após resultado de culturas associa-se a re-
dução da mortalidade nestes indivíduos.
Os exames de imagem são úteis no choque séptico para
identificar o local de infecção. Assim, a radiografia de tórax
pode demonstrar presença de pneumonia ou síndrome do
desconforto respiratório agudo. A ultrassonografia e a to-
mografia computadorizada podem ser úteis para identificar
o local da infecção e na identificação de novas coleções em
pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos prévios e
que estejam evoluindo com novos episódios de sepse.
TRATAMENTO
Princípios gerais
Indivíduos em sepse grave e choque séptico devem ser
conduzidos em UTI, ou, numa fase inicial, em unidades de
emergência adequadas para o seu cuidado, com monitori-
zação eletrocardiográfica e de oximetria de pulso contínuas.
Seu manejo clínico deve, de modo geral, ser norteado pelos
princípios descritos na Tabela 29.III.
Aqueles indivíduos em que as metas não são atingidas
com a simples infusão volêmica são bons candidatos à
monitorização hemodinâmica invasiva.
Volemia
Em linhas gerais a medida inicial sempre é a restauração
da volemia conseguida por expansão do intravascular, feita
através de provas de volume, ou seja, infusão rápida de uma
solução de expansão, que pode ser cristaloide ou coloide.
As “provas de volume” devem ser pautadas pelos
seguintes princípios (capítulo sobre Hipotensão e choque):
1. Escolha da solução: basicamente se será utilizado um
cristaloide (soro fisiológico).
2. Objetivos: o que se espera alcançar para avaliar a efetivi-
dade do processo, assim como decidir se a prova volêmi-
ca deve ser continuada ou interrompida (por exemplo:
queda da frequência cardíaca, elevação da pressão arteri-
al ou da saturação venosa).
3. Limites: até quando levar a prova sem gerar prejuízos ao
paciente (congestão pulmonar, elevação das pressões de
enchimento além de valores predeterminados).
Vasopressores
Dopamina e noradrenalina são eficientes na elevação da
pressão arterial, em especial se o indivíduo está adequada-
mente ressuscitado do ponto de vista volêmico. A dopamina
eleva o débito cardíaco, porém é potencialmente mais arrit-
mogênica que a noradrenalina. A noradrenalina pode ter
atividade vasopressora mais pronunciada em determinados
indivíduos e parece associar-se a um efeito benéfico mais
Infecção documentada ou suspeita e alguns dos seguintes critérios 
(1, 2, 3, 4, 5):
1 – Variáveis gerais
• Febre (temperatura central > 38,3ºC)
• Hipotermia (temperatura central < 36ºC)
• Frequência cardíaca > 90 bpm
• Taquipneia (frequência respiratória > 20 ipm)
• Alteração neurológica
• Edema significativo ou balanço hídrico positivo (> 20 mL/kg em 24
horas)
• Hiperglicemia (glicemia maior que 120 mg/dL) na ausência de diabetes
2 – Variáveis inflamatórias
• Leucocitose (> 12.000/mm3)
• Leucopenia (< 4.000/mm3)
• Contagem leucocitária normal com mais de 10% de formas imaturas
• Níveis plasmáticos de proteína C-reativa aumentados 2 vezes do normal
• Níveis plasmáticos de procalcitonina aumentados 2 vezes do normal
3 – Variáveis hemodinâmicas
• Hipotensão arterial (PAS < 90 mmHg, PAM < 70 mmHg ou
decréscimo maior que 40 mmHg em adultos)
• SvO2 > 70%
• Índice cardíaco acima de 3,5 L/min/m2
4 – Variáveis de disfunção orgânica
• Hipoxemia (PaO2/FiO2 < 300)
• Oligúria aguda (débito urinário < 0,5 mL/kg/h por pelo menos 2 horas)
• Aumento na creatinina maior que 0,5 mg/dL
• Íleo (ruídos hidroaéreos ausentes)
• Trombocitopenia (contagens plaquetárias < 100.000/mm3)
• Hiperbilirrubinemia (> 4 mg/dL)
• Alterações de coagulação (INR > 1,5 ou TTPa > 60 s)
5 – Variáveis de perfusão tecidual
• Hiperlactatemia
• Redução do enchimento capilar
Tabela 29.II – Critérios diagnósticos para sepse
• Instituição de antibioticoterapia precoce e adequada (idealmente orien-
tada por pesquisas microbiológicas como culturas e bacterioscopias).
• Resolução de processos instalados, localizados e tratáveis por intervenções
médicas (drenagens de coleções, exérese das lesões responsáveis etc.).
• Ressuscitação hemodinâmica iniciada prontamente e perseguida
vigorosamente. Medidas de otimização da perfusão tissular são mais
efetivas se atingidas precocemente.
• Monitorização invasiva de pressão arterial é preferida, pois permite
medidas mais acuradas e entendimento batimento a batimento dos
processos envolvidos na instabilidade.
• As metas de ressuscitação devem ser definidas do ponto de vista
clínico (frequência cardíaca, pressão arterial,débito urinário, nível de
consciência) e laboratorial (níveis de lactato, excesso de base e
saturação venosa de oxigênio).
• Acesso às pressões de enchimento das câmaras cardíacas pode ser
obtido através da cateterização venosa central ou utilização de cateter
de artéria pulmonar que pode, ainda, fornecer dados como débito
cardíaco e saturação venosa central mista.
• Ressuscitação volêmica: deve ser o passo inicial do processo e
orientada por metas.
Tabela 29.III – Princípios do manejo do choque séptico
CAPÍTULO 29 – SEPSE E CHOQUE SÉPTICO 261
importante que a dopamina nos indivíduos sépticos (capí-
tulo sobre Hipotensão e choque). Um estudo recente de
grande porte em pacientes com choque de qualquer etiolo-
gia demonstrou que, a despeito de não haver diferença em
termos de mortalidade, a utilização de dopamina para su-
porte vasopressor nesses pacientes associou-se a uma maior
incidência de arritmias cardíacas, sugerindo assim que a no-
radrenalina é a melhor droga para suporte hemodinâmico
de pacientes com choque. Na Tabela 29.IV estão relaciona-
dos os medicamentos mais usados no choque séptico, com
os princípios para o uso de cada um deles.
Ressuscitação volêmica precoce guiada por metas
Esta estratégia baseia-se num protocolo de condução
inicial de doentes com sepse grave e choque séptico ressus-
citados nas primeiras 6 horas (golden hours), ainda na sala de
emergência. Neste estudo, o tratamento era guiado pela
pressão venosa central (PVC), pressão arterial média (PAM),
débito urinário nos dois grupos com a adição da saturação
venosa central (SvcO2) no grupo-intervenção. A variável-
objetivo do grupo-intervenção era uma SvcO2 acima de
70%. Esta monitorização só é possível com a obtenção de
um acesso venoso profundo (no caso um cateter venoso
central com um sensor que monitorizava, em tempo real, a
porcentagem de hemoglobina saturada por oxigênio naque-
la posição). Com base nas variáveis hemodinâmicas acima
eram tomadas medidas terapêuticas com o intuito de “otimi-
zar” a oferta de oxigênio aos tecidos baseado no conceito de
adequação oferta/consumo de oxigênio estimando uma taxa
de extração de oxigênio (SaO2-SvcO2/SaO2) em torno de 25 a
30%. Estas estratégias eram perseguidas através de adequa-
ção volêmica (estimada pela PVC – pressão de enchimento
do átrio direito), pressão arterial média (estimativa de pres-
são de perfusão orgânica) e hematócrito, lançando-se mão,
portanto, de medidas como expansão volêmica, indução de
vasoconstrição ou vasodilatação, transfusões sanguíneas ou
uso de inotrópicos (dobutamina) para atingir cada um des-
tes objetivos, norteados por um objetivo final comum, qual
seja, o de obter SvcO2 acima de 70%.
A primeira estratégia terapêutica do estudo em questão
era a ressuscitação volêmica com soluções cristaloides com
estimativa de 30 mL/kg de peso e limitadas a valores de PVC
entre 8 e 12 cmH2O ou sinais de sobrecarga volêmica. Uma
vez atingidos tais valores, a próxima etapa era a
manutenção de uma PAM adequada, a qual seria estabiliza-
da com drogas vasopressoras (dopamina ou norepinefrina
em doses crescentes) se abaixo de 65 mmHg ou reduzida ar-
tificialmente com vasodilatadores (nitroglicerina ou nitro-
prussiato) se acima de 90 mmHg.
A etapa seguinte de ajuste da oferta/consumo de oxigê-
nio do estudo era a obtenção ou manutenção de um hema-
tócrito acima de 30% através da oferta de concentrados de
hemácias aos pacientes até que fossem atingidos estes valo-
res. Uma vez que não houvesse indicação de transfusão ou
o valor de SvcO2 ainda não tivesse sido alcançado utilizava-
se dobutamina em infusão contínua em doses crescentes
com incrementos de 2,5 µg/kg/min a cada 30 minutos até a
obtenção da estratégia-alvo. A oferta abundante de oxigê-
nio, bem como eventual intubação orotraqueal e paralisa-
ção com o intuito de diminuir a demanda de oxigênio, tam-
bém faziam parte do protocolo.
Um dos dados mais interessantes deste estudo é a ausên-
cia de necessidade de determinação do valor número do
débito cardíaco (dado extrapolado do conceito de extração,
que avalia a adequação DO2 e VO2) para adequação da
reposição volêmica. Em relação à análise dos resultados, ob-
servou-se que o grupo intervenção recebeu uma quantidade
Tabela 29.IV – Medicamentos mais utilizados no choque séptico e princípios para uso
Ação
Atua em receptores adrenérgicos (principalmente α1 e β1). Aumenta
consistentemente a pressão arterial, parece promover melhora sobre a
perfusão esplâncnica. Quando comparada à dopamina, causa menos
taquicardia e menos alterações endócrinas.
Atua em receptores adrenérgicos e dopaminérgicos (daí seus efeitos
neuroendócrinos). Quando comparada à noradrenalina aumenta menos
consistentemente a pressão arterial, causa taquicardia e taquiarritmias e o
uso deve ser limitado em pacientes taquicárdicos.
Atua em receptores adrenérgicos. Está indicada em estados de choque
refratário. O uso de adrenalina pode estar associado ao aparecimento de
febre, diminuição de fluxo esplâncnico e hiperlactatemia.
Atua predominantemente em receptores adrenérgicos β1 e β2, atua em
diversas condições clínicas, funciona como inotrópico, aumenta a perfusão
periférica. Aumenta a frequência cardíaca e o consumo miocárdico de
oxigênio, o que limita o uso em pacientes com insuficiência coronariana.
Os vasodilatadores estão indicados para pacientes com PAM > 90 mmHg
em vigência de quadro séptico, têm a vantagem de início de ação rápida e
meia-vida curta quando suspensos. O nitroprussiato é um vasodilatador
balanceado arterial e venoso, enquanto a nitroglicerina é
predominantemente venosa.
Medicamentos
Noradrenalina
Dopamina
Adrenalina
Dobutamina
Nitroglicerina
Nitroprussiato
Dose
0,05-2,0 µg/kg/min
5-20 µg/kg/min
0,005-0,1 µg/kg/min
2-30 µg/kg/min
0,05-5 µg/kg/min
0,25-10 µg/kg/min
Diluição
1 amp = 4 mg/4 mL
4 amp + 250 mL (SG 5%)
conc. 60 µg/mL
1 amp = 50 mg/mL
5 amp + 200 mL (SG 5%) 
conc. 1.000 µg/mL
1 amp = 1 mg/1 mL
2 amp + 250 mL
conc. 8 µg/mL
1 amp = 250 mg/20 mL
4 amp + 170 mL (SG 5%)
conc. 4.000 µg/mL
1 amp = 50 mg/10 mL
1 amp + 240 mL (SG 5%)
conc. 200 µg/mL
1 amp + 50 mg/2 mL
1 amp + 248 mL (SG 5%)
conc. 200 µg/mL
PRONTO-SOCORRO SEÇÃO II – ABORDAGEM INICIAL DO PACIENTE GRAVE262
de volume muito semelhante à do grupo controle no total
das primeiras 72 horas de tratamento, com a diferença que o
volume nas primeiras 6 horas foi muito maior no grupo in-
tervenção, ressaltando assim a importância da precocidade
da reposição volêmica. Outro dado interessante é a porcenta-
gem de uso de dobutamina ainda na sala de emergências do
grupo intervenção, 13,7% contra 0,8% no grupo controle.
Quanto aos resultados, os indivíduos ressuscitados pre-
cocemente com reposição volêmica guiada pela saturação
venosa obtiveram uma correção mais rápida dos parâmetros
de perfusão tecidual (lactato e excesso de base), redução dos
escores de disfunção orgânica e, mais importante, redução
de mortalidade aos 28 dias e hospitalar quando comparados
aos pacientes do grupo controle, provavelmente às custas de
diminuição da incidência de disfunções orgânicas.
Mais recentemente, outros estudos ofereceram alterna-
tivas à ressuscitação volêmica guiada por saturação venosa
de oxigênio. Um estudo em pacientes sépticos realizado em
2010 demonstrou que a ressuscitação hemodinâmica basea-
da no clareamento do lactato em 10% nas primeiras 6 horas
era equivalente à reanimação utilizando a SvcO2 como refe-
rência. Em outro estudo em pacientes hiperlactatêmicos na
UTI (não somente sépticos), o clareamento de lactato em
20% reduziu a incidência de disfunções orgânicas. Assim, o
lactato também pode ser usado como objetivo da ressuscita-
ção volêmica em pacientes sépticos com hiperperfusão.
Controle de glicemia
Embora seja conhecida há algum tempo a relação entre
taxas elevadasde glicemia e mortalidade em UTI, os últi-
mos trabalhos com pacientes com complicações predomi-
nantemente clínicas não demonstraram redução de mortali-
dade quando comparados com pacientes com controle
estrito (80-110 mg/dL). Parece haver menor tempo de in-
ternação em pacientes com controle estrito que necessitam
de internação prolongada.
Do ponto de vista prático o protocolo de insulina regu-
lar humana diluído em soro fisiológico em infusão con-
tínua deve ser ajustado de acordo com a glicemia capilar
visando manter os níveis entre 80 e 150 mg/dL. Esses níveis
também parecem ser eficientes em diminuir a ocorrência de
hipoglicemias associadas ao controle glicêmico.
Uso de corticosteroides em baixas doses
Foi realizado um estudo multicêntrico, prospectivo,
aleatorizado, duplo-cego, placebo-controlado no qual foi
administrada dose de 50 mg de hidrocortisona endovenosa
a cada 6 horas em associação com 50 µg/dia de fludrocorti-
sona ou placebo por 7 dias aos pacientes com critérios de
choque séptico em 19 centros franceses após coleta de cor-
tisol basal e teste de estimulação com ACTH.
Da análise dos dados observou-se que 77% dos pa-
cientes apresentavam insuficiência adrenal relativa, ou seja,
não apresentavam elevação dos valores do cortisol em
níveis adequados após administração do ACTH. Em espe-
cial neste grupo, foi observada diminuição do número de
dias de uso de drogas vasoativas, assim como de mortali-
dade, em comparação com os pacientes que não receberam
corticosteroides exógenos. É importante salientar que nesse
estudo o uso de corticosteroides não foi associado a efeitos
colaterais graves como aparecimento de novas infecções ou
sangramento gastrintestinal.
Estudos recentes não conseguiram reproduzir trabalhos
prévios com administração de corticosteroides em baixas
doses em pacientes com choque séptico.
A recomendação atual é a administração de corticos-
teroides (hidrocortisona 50 mg 6/6h) para pacientes com
choque séptico, com necessidade crescente de doses de va-
sopressores.
Proteína C ativada humana recombinante
(drotrecogina α)
Dados de estudos experimentais constataram que a ad-
ministração de proteína C ativada previne o surgimento de
síndromes sépticas e dados em humanos demonstraram a
diminuição do nível sérico dos produtos de degradação da
fibrina e aparente controle dos processos inflamatórios as-
sociados aos quadros sépticos com o seu uso. Essa substân-
cia apresenta atividade anti-inflamatória – bloqueando a
adesão de leucócitos ao endotélio e sua posterior passagem
para os tecidos – antitrombótica – inibindo a cascata da co-
agulação ao nível dos fatores Va e VIIIa – , e ainda efeito
pró-fibrinolítico – bloqueando a ativação dos inibidores da
fibrinólise: ativador do plasminogênio tipo I e inibidor da
fibrinólise ativado por trombina. Neste contexto foi con-
duzido um estudo aleatorizado, prospectivo, multicêntrico,
duplo-cego, placebo-controlado com a administração da
proteína C humana ativada recombinante em pacientes
com sepse grave de início recente (dentro das primeiras 24
horas da definição da disfunção orgânica) contra placebo
por 96 horas. A droga do estudo foi administrada em bom-
ba de infusão contínua numa velocidade de 24 µg/kg/hora
e interrompida por uma hora antes de procedimentos per-
cutâneos, sendo reiniciada uma hora após nestes casos ou a
partir de 12 horas após procedimentos cirúrgicos.
Estudou-se mortalidade nos 28 primeiros dias, assim
como o perfil de segurança da droga, sendo observada me-
lhora da mortalidade no grupo tratado, em especial naque-
les indivíduos mais graves – APACHE II acima de 24 – in-
dependentemente dos níveis séricos de proteína C e uma
incidência de sangramentos graves – que trariam risco de
morte – relativamente baixa. Do ponto de vista prático, as
grandes limitações ao uso desta medicação são seus poten-
ciais efeitos adversos, em especial os sangramentos, assim
como a relativa baixa disponibilidade em nosso meio, bem
como seu elevado custo.
Outras estratégias possivelmente úteis
Neste tópico vale a pena comentar o uso de métodos de
substituição renal – em especial a hemofiltração com altos
fluxos –, cujo papel na remoção de determinadas citocinas
potencialmente deletérias parece ser favorável em determi-
nados casos, em especial se iniciada precocemente. No en-
CAPÍTULO 29 – SEPSE E CHOQUE SÉPTICO 263
tanto, pelas dificuldades e questões específicas inerentes aos
métodos – preço, necessidade de acesso venoso específico,
entre outros – dificilmente haverá estudo bem controlado
que teste a hipótese de benefício desta, motivo pelo qual, até
o momento, é estratégia considerada de resgate em casos
mais graves.
O uso de substâncias que interfiram com o metabolis-
mo do óxido nítrico não tem trazido resultados alenta-
dores, contudo, dados experimentais e monitorização de
biomicroscopia in vivo chamam a atenção para o uso de ni-
troglicerina, por exemplo, como doador de NO para “re-
crutamento” capilar no nível da microcirculação com a
abertura de um novo paradigma para o entendimento e a
monitorização da adequação oferta/demanda de oxigênio
nos estados de choque circulatório.
LEITURA ADICIONAL
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nous oxygen saturation as goals of early sepsis therapy: a randomized
clinical trial. JAMA 2010; 303: 739-46.
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for management of severe sepsis and septic shock: 2008. Intensive Care
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10. Silva E, Pedro MA, Sogayar ACM, et al. Brazilian Sepsis Epidemiological
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8-12 mmHg
Inotrópicos
Admissão hospitalar
O2 suplementar 
± IOT e ventilação mecânica
CVC e cateter arterial
Algoritmo 29.1 – Terapia precoce guiada por objetivos
Bolus 500 mL
cristaloide em 30 min
Drogas vasoativas
Não Sim
PVC
PAM
SvcO2
Sedação, paralisia 
(se IOT) ou ambos
Objetivos
atingidos?
≥ 65 e ≤ 90
≥ 70%
< 8 mmHg
< 65 mmHg
ou > 90 mmHg
< 70%
≥ 70%
PVC = pressão venosa central; PAM = pressão arterial média; SvO2 = saturação venosa de
oxigênio, Ht = hematócrito. (Modificado de Rivers et al. N Engl J Med 2001; 345(19): 1368-77.)

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