Buscar

4 - O papel da sociedade civil no acolhimento e integração dos solicitantes de refúgio

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 3, do total de 15 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 6, do total de 15 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 9, do total de 15 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Prévia do material em texto

1 1 
DIREITO
INTERNACIONAL
DOS
REFUGIADOS
E O BRASIL
DANIELLE ANNONI (Coord.) 
CRÉDITOS 
Capa: Bernadette Saori Borges 
Fotos: Isabella Patrizzi Merolli 
Revisora e diagramadora da obra: Bernadette Saori Borges 
Tradutora e pesquisadora do Projeto: Elisa Moretti Pavanello 
Fontes históricas: Ana Carolina Contin Kosiak 
D598 DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL 
/ Coordenação Danielle Annoni – Curitiba: Gedai/UFPR, 2018. 
759p. 
1. Refugiados. 2. Direito Trabalhista. 3. Direito Previdenciário. 3. Acesso à
Justiça. I. Annoni, Danielle (coord.). II. Título.
ISBN – 978-85-67141-24-4 [bruchura] 
ISBN – 978-85-67141-23-7 [recurso eletrônico] 
CDD 325.21 
CDU 3442.7 
417 
O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NO ACOLHIMENTO E 
INTEGRAÇÃO DOS SOLICITANTES DE REFÚGIO267 
Larissa Moura Getirana268 
Fernanda da Silva Lima269 
1 INTRODUÇÃO 
 deslocamento forçado não se configura como um fenômeno 
novo na história da humanidade. O início da proteção aos que, em 
virtude de perseguição humana ou desastres ecológicos, deixam 
seu local de origem pode ser traçado até a Grécia Antiga, período em que o 
asilo revestia-se de caráter religioso. Em seguida, no Império Romano, além da 
base religiosa, o asilo assumiu qualidade jurídica. Seguem-se, então, séculos de 
perseguições a parcelas específicas da população. 
No entanto, o Direito Internacional dos Refugiados só surgiu no século XX, 
sob a égide da Liga das Nações. Apenas a partir do início deste século, os 
267 Artigo produzido no âmbito do projeto de pesquisa “Direito Internacional dos Refugiados 
e o Brasil: Um Estudo dos Direitos Reconhecidos pelo Brasil aos Refugiados e como se dá 
o Acesso à Justiça em caso de Violação” aprovado pelo CNPq - MCTI/CNPq/Universal
14/2014.
268 Mestranda em Direito Internacional na Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
voluntária no Programa de Atendimento a Refugiados e Solicitantes de Refúgio da
Cáritas/RJ e membro do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Direito Internacional -
NEPEDI/UERJ.
269 Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Bacharel em
direito pela Universidade do Extremo Sul Catarinense. Professora no Programa de Pós-
Graduação em Direito da Unesc (Mestrado em Direito). Professora titular da disciplina de
Direitos Humanos na UNESC. Integrante do Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais da
Criança e do Adolescente (NEJUSCA/UFSC). Integrante do Núcleo de Estudos em Direitos
Humanos e Cidadania (NUPEC/UNESC). Líder do Grupo de Pesquisa em Direitos
Humanos, Relações Raciais e Feminismos. Pesquisadora na área de Direito Público com
linha de pesquisa em Relações étnico-raciais, feminismo negro e políticas públicas de
promoção da igualdade racial; Direito da Criança e do Adolescente e políticas públicas.
Pesquisador no Projeto de Pesquisa Direito Internacional dos Refugiados e o Brasil: Um
Estudo dos Direitos Reconhecidos pelo Brasil aos Refugiados e como se dá o Acesso à
Justiça em caso de Violação, financiado pelo CNPQ - MCTI/CNPQ/Universal 14/2014.
O 
418 
refugiados passaram a ser percebidos como um problema mundial e que, 
portanto, deveria ser enfrentado em nível internacional. 
Contrariando expectativas e previsões, a questão dos refugiados revelou-
se de cunho permanente. Em face dessa conjuntura, evidenciou-se a 
necessidade de uma definição geral que abarcasse todos os refugiados e 
soluções de caráter não temporário para esta problemática. 
Nesse contexto, foi elaborada, sob a égide da ONU, uma Convenção 
com o escopo de estabelecer uniformidade ao tratamento dispensado aos 
refugiados em todo o mundo: a Convenção sobre o Estatuto de Refugiados, 
conhecida como Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967. 
A despeito da rede internacional de proteção aos refugiados, verifica-se 
que a proteção efetiva ocorre no âmbito dos Estados. O Brasil possui uma lei 
específica sobre a temática dos refugiados. A legislação brasileira é considerada 
a mais avançada da América do Sul e uma das mais modernas e generosas do 
mundo, servindo de modelo pra os países vizinhos da América Latina. 
Quanto ao procedimento brasileiro de concessão de refúgio, este 
apresenta caráter tríplice, com a participação do Alto Comissariado das Nações 
Unidas para os Refugiados (ACNUR), da sociedade civil e do governo 
brasileiro. 
O presente artigo aborda o segundo elo dessa cadeia – a sociedade civil 
e a sua fundamental relevância no acolhimento e integração de solicitantes de 
refúgio e refugiados que chegam ao Brasil, com destaque para a Cáritas, 
instituição que trabalha desde os anos 1970 com atendimento a refugiados. 
Em termos metodológicos o artigo deve ser classificado como qualitativo 
e descritivo, com a utilização do método indutivo. Como método de coleta de 
dados, foi utilizada a pesquisa bibliográfica e documental. 
2 A SOCIEDADE CIVIL E OS DIREITOS HUMANOS 
A sociedade civil concebida como uma esfera de geração de respostas 
inovadoras para as necessidades emergentes da comunidade ao redor encontra 
lastro ainda na Antiguidade. No entanto, parcela significativa da doutrina 
aponta o fim da Guerra Fria e seu marco, a queda do Muro de Berlim, como 
ponto de virada no estudo sistemático da sociedade civil. No contexto histórico 
de redemocratização de inúmeros Estados, a sociedade civil assumiu posição de 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
419 
destaque nas discussões acadêmicas e políticas. No tocante à América Latina, a 
partir dos anos 1970, a sociedade civil representou um pilar de resistência contra 
ditaduras militares e regimes autoritários em países como Brasil, Argentina, 
Chile e Peru. 
Estudiosos do tema debatem quanto à definição da sociedade civil, no 
entanto, cabe aqui menção à definição de Walzer (1998), segundo o qual a 
sociedade civil é a esfera da associação humana não coercitiva entre o indivíduo 
e o Estado, na qual as pessoas realizam ações coletivas com fins normativos e 
substantivos, relativamente independentes do governo e do mercado. 
A atuação da sociedade civil ao longo do tempo, em diferentes cenários 
de organização política e em regiões distintas do mundo demonstra que as 
constantes tranformações das relações humanas formam seu substrato. A 
capacidade de fornecer, por meio do esforço coletivo, soluções criativas e 
inovadoras para além das fórmulas reiteradamente exploradas, torna o núcleo 
da sociedade civil uma alternativa importante às respostas produzidas pelo 
Estado para solução de conflitos sociais. 
Nas palavras de Edwards (2011), a sociedade civil tornou-se o “elo 
perdido” ou o “ingrediente mágico” que corrigiria as distorções causadas pelo 
mercado e pelo Estado e resolveria as tensões entre a coesão social e o 
capitalismo. Sob um olhar crítico, o autor afirma que o que começou como uma 
categoria adicional ao Estado e ao mercado - uma fonte distinta de valor e 
valores - foi relegado ao status de um residual - algo que existe apenas porque 
essas outras instituições têm pontos cegos e fraquezas, reduzindo muito o seu 
potencial de atuação como uma força para mudanças estruturais ou sistêmicas. 
Nas lacunas não preenchidas pelo Estado, a sociedade civil apresenta-se 
como condição fundamental para o desenvolvimento e aprofundamento da 
democracia, do pluralismo, da conquista de importantes objetivos sociais e 
econômicos e da governança global. 
Diante das muitas esferas de atuação da sociedade civil, merece destaque 
sua influência na temática dos direitos humanos. Organizações não 
governamentais de direitos humanos são consideradas por certos autores como 
“a consciência do mundo”. (WILLETTS, 1996). É possível atribuir ao papel 
desempenhado pelas ONGs parte da explicação sobre a formulação de normas 
de direitos humanos e seu cumprimento pelos Estados. 
As contribuições de organizações não governamentais para o 
desenvolvimento do direito internacionaldos direitos humanos é inegável e 
suas atividades abrangem quase todos os aspectos da prática de direitos 
humanos, desde o aporte na elaboração de tratados multilaterais de direitos 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL
420 
humanos até a assistência a Organizações Internacionais e Estados na 
implementação das normas. Um exemplo emblemático é a Anti-Slavery 
International, uma das ONGs mais antigas do mundo, fundada no Reino Unido 
em 1839. A organização chamava-se, originalmente, Anti-Savery Society, um 
grupo abolicionista que ainda hoje atua na área de tráfico humano, escravidão 
e temas análogos.
Atualmente, atesta-se a importância dos movimentos transfronteiriços 
realizados por ONGs ao impulsionar uma agenda de direitos humanos. Essa 
dinâmica, salvo as devidas proporções, encontra paralelo no movimento 
histórico pela abolição da escravidão e do tráfico de escravos que envolveu o 
ativismo transfronteiriço de indivíduos organizados de forma privada e incluiu 
o fortalecimento de regimes de tratados internacionais sobre o tráfico de
escravos como um dos seus objetivos. Uma semelhança chave entre esses
antecedentes históricos e o ativismo moderno dos direitos humanos é a
importância dos laços transnacionais como forma bem-sucedida de
mobilização. (MARTINEZ, 2013).
O uso do termo “organização não governamental” adquiriu maior 
projeção com a fundação das Nações Unidas em 1945. O artigo 71 da Carta das 
Nações Unidas estabelece que “O Conselho Econômico e Social poderá entrar 
nos entendimentos convenientes para a consulta com organizações não 
governamentais, encarregadas de questões que estiverem dentro da sua própria 
competência.” (BRASIL, 1945). 
Na convenção fundadora das Nações Unidas em São Francisco, os 
representantes das ONGs foram fundamentais para promover a inclusão de 
referências aos direitos humanos na Carta das Nações Unidas. As grandes 
potências envolvidas na elaboração da carta não incluíram qualquer menção aos 
direitos humanos no projeto original. A Grã-Bretanha percebia isso como 
possível alavanca para os movimentos de independência em suas colônias, e, 
por sua vez, a União Soviética não queria interferência em sua crescente esfera 
de influência. Devido à pressão da sociedade civil e de países menores, as 
referências aos direitos humanos foram incluídas na versão final da Carta. 
Em 1974, aproximadamente 600 ONGs detinham status consultivo 
junto às Nações Unidas. No ano de 2012, esse número chegou a mais de 3.500 
ONGs, além de inúmeras outras organizações que trabalham a nível local. Não 
só o número dessas organizações cresceu exponencialmente nas últimas 
décadas, mas o alcance dessas organizações também cresceu, influenciando a 
elaboração de diversos tratados de direitos humanos. 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
421 
Atualmente, um dos maiores desafios globais no campo dos direitos 
humanos encontra-se nos fluxos migratórios e na crise de refugiados e é neste 
cenário que a sociedade civil desponta como notável ferramenta no 
acolhimento desses indivíduos. 
3 A CRISE MIGRATÓRIA E O REFÚGIO 
Embora a migração faça parte da história da humanidade, atualmente, 
somos testemunhas oculares de uma das maiores crises migratórias já 
experimentadas nos tempos modernos. Diariamente, imagens de milhares de 
pessoas tentando atravessar o Mar Mediterrâneo em pequenas embarcações 
inundam as primeiras páginas de noticiários ao redor do mundo. Fotografias de 
uma criança morta em uma praia na Turquia ou vítimas de ataques biológicos 
causam grande comoção na comunidade internacional. A crueldade da crise 
migratória é latente, é pungente, é, sobretudo, urgente. 
Ao final de 2016, atingiu-se um recorde de 65,6 milhões de indivíduos 
deslocados em razão de conflitos e perseguições. Este dado inclui 22,5 milhões 
de refugiados ao redor do mundo, 2,8 milhões de solicitantes de refúgio e 40,3 
milhões deslocados internos270. O número de novos deslocados equivale a 20 
pessoas forçadas a deixar seus lares a cada minuto em 2016. (ACNUR, 2016). 
Os países em desenvolvimento receberam 84% de todos os refugiados 
sob o mandato do ACNUR. Entre os países receptores, a Turquia é o Estado 
que mais abriga refugiados, um total de 2,9 milhões. O Líbano, mais do que 
qualquer outro país, tem a maior proporção refugiado/habitantes nacionais: são 
169 para cada mil habitantes. Nos países desenvolvidos, 3,2 milhões 
aguardavam no final de 2015 a resposta a suas solicitações de refúgio – o maior 
número já registrado pelo ACNUR. (ACNUR, 2016). 
No Brasil, de acordo com o relatório de 2016 do Comitê Nacional para 
os Refugiados (CONARE), órgão ligado ao Ministério da Justiça, as solicitações 
de refúgio cresceram 2.868% nos últimos cinco anos. Passaram de 966, em 
2010, para 28.670, em 2015. Até 2010, haviam sido reconhecidos 3.904 
refugiados. Os sírios formam a maior comunidade de refugiados reconhecidos 
no Brasil. Eles somam 2.298, e são seguidos pelos angolanos (1.420), 
270Os deslocados internos, pessoas deslocadas dentro de seu próprio país, muitas vezes são 
erroneamente chamadas de refugiados. Ao contrário dos refugiados, os deslocados internos 
(IPDs em seu acrônimo inglês) não atravessaram uma fronteira internacional para encontrar 
segurança mas permaneceram em seu país de origem. 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL
422 
colombianos (1.100), congoleses (968) e palestinos (376). Ao todo são 79 
nacionalidades presentes no Brasil. (ACNUR, 2016). 
A guerra na Síria já provocou quase 5 milhões de refugiados e a pior crise 
humanitária em 70 anos. Com o aumento do fluxo no Brasil, o governo adotou 
medidas de facilitação da entrada desses imigrantes no território e sua inserção 
na sociedade brasileira. Em setembro de 2013, o CONARE publicou a 
Resolução n.º 17 que autorizou as missões diplomáticas brasileiras a 
emitirem visto especial a pessoas afetadas pelo conflito na Síria, diante do 
quadro de graves violações de direitos humanos. Em 21 de setembro de 2015, 
a Resolução teve sua duração prorrogada por mais dois anos. Os critérios de 
concessão do visto humanitário atendem à lógica de proteção por razões 
humanitárias, ao levar em consideração as dificuldades específicas vividas em 
zonas de conflito, mantendo-se os procedimentos de análise de situações 
vedadas para concessão de refúgio. 
Neste quadro de aumento exponencial de demanda do governo 
brasileiro, a sociedade civil destaca-se como ponto de resposta efetiva às 
necessidades dos recém-chegados. 
4 A SOCIEDADE CIVIL BRASILEIRA E O ACOLHIMENTO DE 
SOLICITANTES DE REFÚGIO E REFUGIADOS 
Como apresentado, o número de refugiados e solicitantes de refúgio no 
Brasil cresceu sobremaneira nos últimos anos. Neste tópico, será analisada a 
adaptação dos refugiados ao Brasil e os mecanismos de integração estabelecidos 
pela sociedade civil. 
A integração efetiva do refugiado passa pela necessidade de emprego, 
aprendizado da língua portuguesa, acesso aos serviços públicos, bem como o 
exercício de direitos de cidadão, participação política e o estreitamento de laços 
com a comunidade que o cerca.271 
A sociedade civil liderou por muitos anos o apoio à integração dos
refugiados no Brasil. Este fato pode ser constatado, na medida em que, nos 
271Em 2007, uma pesquisa foi feita com famílias de refugiados residentes no Rio de Janeiro e 
em São Paulo. Constatou-se que 56.4% trabalhavam, embora mais da metade deles 
encontrava-se em ocupações informais. Apenas 2.8% foram incluídos em programas de 
assistência do governo como o Bolsa família e 11% recebiam suporte financeiro da Cáritas. 
(MOREIRA; BAENINGER, 2010). 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
423 
primeiros 10 anos da vigência da Lei n.o 9.474/97, o governo concentrou seus 
esforços no processo de elegibilidade, em oposição à integração. 
Uma das principais instituições de acolhidade solicitantes de refúgio e 
refugiados é a Cáritas, com destaque para a Cáritas das cidades do Rio de Janeiro 
e São Paulo. A instituição atua desde os anos 1970 amparando pessoas que 
fugiam das ditaduras latino-americanas. O estudo e análise do trabalho realizado 
por essa instituição pode servir de referência para outras organizações da 
sociedade civil. 
Com uma média diária de atendimento de 70 a 100 pessoas, a Cáritas/SP 
conta com uma equipe de 46 pessoas entre funcionários e voluntários. No Rio 
de Janeiro, aproximadamente 40 pessoas trabalham todos os dias para atender 
as demandas dos solicitantes de refúgio e refugiados. 
Essas organizações não recebem subsídios do governo para sua 
manutenção e contam com inúmeras parcerias para o desenvolvimento de seu 
trabalho. De acordo com a fala de um dos entrevistados: “Nada do que é feito 
é feito sozinho.”. As atividades são realizadas em três frontes principais: 
Acolhimento ou Assistência, Proteção Legal/Jurídica e Integração Local.
O acolhimento ou assistência atua diretamente nos suprimentos das 
primeiras necessidades básicas dos solicitantes de refúgio e refugiados, como 
alimentação, vestimentas, moradia e saúde. A entrega de doações e 
encaminhamento para atendimentos de saúde ocorre em parceria com setores 
público e privado. Na Cáritas/RJ, as assistentes sociais elencaram critérios de 
vulnerabilidade para a distribuição de recursos. O financiamento para o 
atendimento de necessidades básicas vem do ACNUR, ONG’s estrangeiras e 
doações privadas. Quanto ao último, o trabalho de conscientização da 
comunidade em escolas, empresas, e o uso de mídias sociais acaba gerando esse 
retorno em doações. 
O setor de integração desempenha papel fundamental na garantia do 
exercício de direitos dos solicitantes de refúgio e refugiados no Brasil. Neste 
sentido, um passo primordial na alocação dos recém-chegados ao mercado de 
trabalho, bem como na outorga de autonomia aos imigrantes é o 
encaminhamento para cursos de português. Os cursos de português são 
realizados em parceria com coletivos de bairro, universidades e com o sistema 
S.272
272 Termo que define o conjunto de organizações das entidades corporativas voltadas para o 
treinamento profissional, assistência social, consultoria, pesquisa e assistência técnica, que 
além de terem seu nome iniciado com a letra S, têm raízes comuns e características 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL
424 
No mais, os programas de integração auxiliam na elaboração de 
currículos e oferecem orientação relacionada ao comportamento no mercado 
de trabalho. Há também encaminhamento para cursos profissionalizantes, 
especialmente em parceria com o Sistema S. Além disso, as organizações da 
sociedade civil citadas mantêm parceiras com órgãos públicos que trabalham 
com cadastro e encaminhamento para vagas de emprego. Os vínculos com a 
Secretaria Municipal de Trabalho funcionam como um meio para a 
empregabilidade dos refugiados e solicitantes de refúgio.
Observa-se na Cáritas/RJ um movimento forte voltado para o 
empreendedorismo desenvolvido por meio do Projeto CORES. Em São Paulo,
o programa social PARR da empresa EMDOC disponibiliza duas funcionárias
que, três vezes por semana, cadastram currículos dos solicitantes e refugiados
em um software e disponibilizam para empresas. Este é o maior banco de
currículos de refugiados do Brasil. A atividade abrange a função de
conscientização nas empresas ao elucidar sobre as vantagens de contratar os
migrantes em situação de vulnerabilidade.
No Brasil, o direito ao trabalho é assegurado à população refugiada e aos 
solicitantes de refúgio, bem como os direitos resultantes da relação de emprego 
da seguridade social. A solicitação de refúgio perante à Polícia Federal permite 
a emissão de carteira de trabalho. Contudo, na prática, a população refugiada 
encontra obstáculos no exercício desses direitos. 
A revalidação de diplomas apresenta-se como um fator importante na 
integração dos refugiados ao mercado de trabalho brasileiro. É fato que em uma 
situação de fuga, levar o diploma consigo não está lista de prioridades dos
solicitantes de refúgio. Não obstante o artigo 44 da Lei n.o 9.474/97273 (BRASIL, 
1997), o processo de revalidação de diplomas é burocrático, caro e demorado 
e, por essas razões, as parcerias são fundamentais para esse processo. A 
Cáritas/SP274 realiza parceira com a ONG Compassiva e a Cáritas/RJ tem 
parceira com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). 
organizacionais similares. Fazem parte do sistema S: Serviço Nacional de Aprendizagem 
Industrial (Senai); Serviço Social do Comércio (Sesc); Serviço Social da Indústria (Sesi); e 
Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (Senac). Existem ainda os seguintes: 
Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar); Serviço Nacional de Aprendizagem do 
Cooperativismo (Sescoop); e Serviço Social de Transporte (Sest). (BRASIL, s/d). 
273 Art. 44. O reconhecimento de certificados e diplomas, os requisitos para a obtenção da 
condição de residente e o ingresso em instituições acadêmicas de todos os níveis deverão ser 
facilitados, levando-se em consideração a situação desfavorável vivenciada pelos refugiados. 
274 As atividades desenvolvidas pela Cáritas no Brasil podem ser acompanhadas neste link: 
http://caritas.org.br/ 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
425 
De acordo com os funcionários das ONGs entrevistadas, os principais 
obstáculos na integração do refugiado ao mercado de trabalho são a falta de 
informação quanto à condição de refugiado, e o desconhecimento das 
potencialidades ao contratar essas pessoas como riqueza cultural, novas formas 
de visão empreendedora e diversidade de línguas. Outro fator agravante é o 
protocolo de solicitação de refúgio, que é, basicamente, um pedaço de papel e, 
por essa razão, é considerado como uma documentação frágil por muitos 
empregadores. A validade de apenas 1 ano do protocolo e da carteira de 
trabalho (renováveis por igual período) também podem resultar em um regime 
de trabalho precário. Os relatos dos estrangeiros revelam diferenças de 
tratamento em virtude de sua condição migratória. 
As organizações contribuem para a difusão de conhecimento da
legislação trabalhista e previdenciária brasileira pelos solicitantes de refúgio e 
refugiados através de canais digitais de informação, produção de cartilhas sobre 
direitos trabalhistas e, no caso da Cáritas/RJ, uma vez por mês acontece uma 
oficina sobre direitos do trabalho. 
Os principais direitos trabalhistas e previdenciários violados são 
decorrentes da formalização do contrato e do desvio de função intensificado 
por problemas relativos à validação do diploma. Neste contexto, o refugiado é 
contratado para exercer uma função de menor hierarquia com um salário mais 
baixo, mas, de fato, exerce função de maior hierarquia compatível com sua 
qualificação. Ademias, assédio e discriminação em virtude da condição de 
estrangeiro é um problema recorrente no ambiente de trabalho dos refugiados. 
Em caso de violação de direitos trabalhistas e previdenciários, as ONGs 
contribuem para a efetivação do acesso à justiça dos refugiados por meio de 
intermediação com os empregadores e encaminhamento para Defensoria 
Pública e MPT. Além disso, a Cáritas/RJ tem uma parceria com um escritório 
de advocacia que presta consultoria e ajuíza ações de forma gratuita. 
Para além do trabalho direto com solicitantes de refúgio e refugiados, as 
organizações da sociedade civil trabalham em parceria com órgãos do governo 
na articulação de políticas públicas para essa parcela da população. 
Na esfera internacional, as ONGs impulsionam a linguagem dos direitos 
humanos, interferindo na elaboração de hard law. Historicamente, elas foram 
participantes centrais na estruturação dos tratados anti-escravidão no início do 
século XIX, da Declaração Universal dos DireitosHumanos, do Pacto 
Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e de outras normas 
fundamentais de direitos humanos. Mais recentemente, as ONGs 
desempenharam um papel crítico na conclusão do Tratado de Minas Terrestres 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL
426 
e do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Alguns dos 
instrumentos jurídicos internacionais mais importantes dos últimos anos 
receberam a contribuição ativa da sociedade civil. 
Essa representação também pode ser constatada em âmbito nacional e 
local. A título exemplificativo, a lei municipal de imigração aprovada na gestão 
do prefeito de São Paulo Fernando Haddad teve participação ativa da 
Cáritas/SP nas discussões. Uma importante conquista dessa legislação foi a 
proteção legal do CRAI (Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes). 
No Rio de Janeiro, a Cáritas/RJ trabalha próxima do Comitê Estadual 
Intersetorial de Políticas de Atenção aos Refugiados e, em âmbito municipal, 
ajudou na elaboração do texto para criação de um comitê sobre o tema. 
Importante é o trabalho articulado entre as entidades da sociedade civil 
para melhor atender os solicitantes de refúgio e refugiados em toda a extensão 
do território nacional. O Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH) 
coordena uma rede que integra cerca de 60 entidades da sociedade civil 
envolvidas com a temática do refúgio no Brasil, a RedeMir. O IMDH275 
promove um encontro anual em que as ONG's se reúnem em um espaço de 
intercâmbio de práticas e experiências, fortalecimento e apoio mútuo e 
cooperação da academia e dos órgãos governamentais da área de migrações e 
refúgio ou serviços correlatos. No ano de 2016, o encontro ocorreu com o 
apoio do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), do Ministério da 
Justiça, do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), da Organização 
Internacional para o Trabalho (OIT) e da Organização Internacional para as 
Migrações (OIM). 
Uma das pautas há anos discutida por essa rede foi a imprescindibilidade 
de uma nova lei de imigração que se conformasse com a atual Constituição 
Cidadã de 1988 e deixasse para trás os resquícios da ditadura militar e sua visão 
do estrangeiro como inimigo. Após anos de militância, a nova lei de imigração, 
Lei n.o 13.445/2017, foi sancionada. Este é um exemplo notável da interferência 
das ONGs na elaboração de leis e políticas públicas que concretizem o princípio 
da dignidade humana. 
275 Informações disponíveis em: <http://www.migrante.org.br/>. 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
427 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 
O Direito Internacional dos Refugiados a nível internacional é regido 
pela Convenção de 1951 e pelo Protocolo de 1967. Em sua dimensão 
institucional, a proteção aos refugiados cabe ao Alto Comissariado das Nações 
Unidas para os Refugiados (ACNUR). No Brasil, há uma lei específica sobre a 
temática dos refugiados que amplia a proteção às vítimas de grave e generalizada 
violação de direitos humanos, contemplando a Declaração de Cartagena. 
O Brasil experimentou nos últimos aos um crescimento significativo no 
fluxo migratório. A mudança nos números foi acompanhada por uma mudança 
na distribuição geográfica dos solicitantes de refúgio e refugiados. Em certo 
momento da história do refúgio no Brasil, as instituições de acolhida dos 
estados do Rio de Janeiro e São Paulo chegaram a, combinadas, assistirem mais 
de 90% dos refugiados no Brasil.276 Em 2013, as regiões Sul e Sudeste 
concentravam a maior parte das solicitações de refúgio apresentadas no Brasil. 
Esse cenário gerou uma reação adequada das ONGs localizadas nessas regiões. 
Recentemente, verifica-se uma mudança no perfil de distribuição 
regional de solicitantes de refúgio e refugiados no Brasil com um grande fluxo 
de migrantes atravessando as fronteiras no norte do país, de haitianos e 
colombianos até, recentemente, os venezuelanos. Como visto anteriormente, a 
sociedade civil tem como combustível as transformações da comunidade ao 
redor e é neste novo cenário que as ONGs devem instalar-se nessas localidades 
e trabalhar para suprir as novas demandas. Essas novas entidades da sociedade 
civil devem participar da rede já articulada e buscar inspiração nos projetos bem 
sucedidos das ONGs que há muitos anos trabalham com os refugiados. 
Neste contexto de incertezas, fechamento de fronteiras, aumento do 
número de conflitos e, consequentemente, aumento do fluxo de deslocamento 
no mundo e no Brasil, cumpre ressaltar o longo caminho traçado para a 
consolidação dos direitos humanos a nível internacional e a importância de não 
retroceder. 
276 JUBILUT, Liliana Lyra. Enhancing refugee's integration: new initiatives in Brazil. Forced 
Migration Review, n.° 35, p.47. 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL
428 
REFERÊNCIAS 
ACNUR, Manual de Procedimentos e Critérios para Determinar a Condição de Refugiado 
– de acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 relativos ao
Estatuto dos Refugiados. Brasil. 2004.
ANDRADE, José H. Fishel de. Direito Internacional dos Refugiados: Evolução 
Histórica (1921-1952). Rio de Janeiro: Renovar, 1996. 
BARRETO, Luiz Paulo Teles Ferreira, A Lei Brasileira de Refúgio – Sua 
História, In: Refúgio no Brasil: A Proteção Brasileira e seu impacto nas Américas, 
BARRETO, Luiz Paulo Teles Ferreira (Org.), Brasília: ACNUR, Ministério da 
Justiça, 2010, 1ª edição. 
BRASIL. Decreto n.o 19.841, de 22 de outubro de 1945. Promulga a Carta das 
Nações Unidas, da qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de 
Justiça, assinada em São Francisco, a 26 de junho de 1945, por ocasião da Conferência de 
Organização Internacional das Nações Unidas. 1945. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d19841.htm>. 
Acesso em: 10 maio 2017. 
______. Senado Notícias. Sistema S. s/d. Disponível em: 
<http://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/sistema-s>. 
Acesso em: 18 set. 2017. 
______. Lei n.º 9.474, de 33 de julho de 1997. Define mecanismos para a implantação 
do Estatuto dos Refugiados, de 1951, e determina outras providências. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9474.htm>. Acesso em: 18 
set.2017. 
EDWARDS, Michael (Editor). The Oxford Handbook of Civil Society. Editora: 
Oxford University Press, 2011. 
HATHAWAY, James C. The Rights of refugees under International law. Cambridge: 
Cambridge University Press, 2005. 
JOSEPH, Sarah; MCBETH, Adam. Research Handbook on International Guman 
Rights Law. Edward Elgar Publishing: 2010. 
JUBILUT, Liliana Lyra; APOLINÁRIO, Silvia Menicucci de Oliveira Selmi. A 
população refugiada no Brasil: em busca da proteção integral. Disponível em: 
<http://www.defensoria.sp.gov.br>. Acesso em: 20 maio 2017. 
DANIELLE ANNONI ( COORD).
429 
JUBILUT, Liliana Lyra; O Direito Internacional dos Refugiados e sua Aplicação no 
Ordenamento Jurídico Brasileiro; São Paulo: Método, 2007. 
LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. A temática do refúgio no Brasil após a criação 
do CONARE In: MILESI, Rosita (Org.), Refugiados: Realidades e Perspectivas. 
Brasília: CSEM/IDMH; Edições Loyola, 2003. 
MARTINEZ, Jenny S. The Anti-Slavery Movement and the Rise of 
International Non-Governamental Organizations. In: SHELTON, Diana (Ed). 
The Oxford Handbook of International Human Rights Law. Oxford University Press: 
2013. 
MOREIRA, Julia Bertino e BAENINGER, Rosana. Local integration of 
Refugees in Brazil. Forced Migration Review, n 35, 2010. Disponível em: 
<http://www.fmreview.org/disability-and-displacement/julia-bertino-
moreira-and-rosana-baeninger.html>. Acesso em: 15 maio 2017. 
PIOVESAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional dos 
refugiados. In: ARAÚJO, Nadia de; ALMEIDA, Guilherme Assis de. (Coord.) 
O Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira. 2ª.ed. Rio de 
Janeiro: Renovar, 2001. 
SHELTON, Diana (Ed). The Oxford Handbook of International Human Rights Law. 
Oxford University Press: 2013. 
WALZER, M. The Idea of Civil Society: A Path to Social Reconstruction. In: 
E. J. Dionne (ed.) Community Works: The Revival of Civil Society in America. 
Washington, D.C.: Brookings Institution Press, 1998.
WILLETTS, Peter. ‘The Conscience of the World’: The Influence of Non-Governmental 
Organizations on the UN System. Washington, D.C.: Brookings Institution Press, 
1996. 
DIREITO INTERNACIONAL DOS REFUGIADOS E O BRASIL

Outros materiais