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Epidemiologia das Doenças Ocupacionais 2/127 Epidemiologia das Doenças Ocupacionais Autor: Alessandro Formenton Como citar este documento: FORMENTON, Alessandro. Epidemiologia das Doenças Ocupacionais. Valinhos: 2014. Sumário Apresentação da Disciplina 03 Unidade 1: Epidemiologia das Doenças Ocupacionais Assista a suas aulas 04 29 Unidade 2: Epidemiologia das Doenças e Agravos Não Transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho Assista a suas aulas 38 Unidade 3: Estudos Epidemiológicos Assista a suas aulas 64 85 Unidade 4: Monitoramento Clínico-Epidemiológico das Populações Humanas Expostas a Situações de Risco Assista a suas aulas 94 2/123 118 55 3/127 Apresentação da Disciplina Nesta disciplina, você será apresentado aos principais conceitos da epidemiologia. Esses conceitos servirão de base para você, durante sua atividade profissional como enfermeiro do trabalho. Dentro desse escopo, na primeira aula da disciplina você será apresentado à epidemiologia, seus conceitos básicos e a história natural das doenças. Em seguida, você terá acesso à epidemiologia e agravos de doenças não transmissíveis relacionadas ao trabalho e vigilância epidemiológica. Na terceira aula serão discutidos os estudos epidemiológicos. Na quarta aula você terá acesso ao monitoramento das situações de risco. Bons estudos! 4/127 Unidade 1 Epidemiologia das Doenças Ocupacionais Objetivos Nesta primeira aula nós vamos entrar em contato com uma visão geral e com aspectos históricos da ciência chamada Epidemiologia. Para melhor entender como o processo saúde-doença se dá e quais são seus determinantes, estaremos discutindo também a história natural das doenças. Por fim, vamos conhecer os conceitos básicos e usos da epidemiologia descritiva. Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais5/127 Introdução Etimologicamente, epidemiologia (epi= sobre; demo= população e logos= tratado) significa “ciência do que se abate sobre o povo” ou “o estudo que afeta a população”. Com o avanço e ampliação do campo de aplicação da epidemiologia, muitas definições surgiram na tentativa de expressar com maior precisão a evolução da disciplina, visto que sua temática é dinâmica e seu objeto, complexo. As definições mais antigas estão limitadas à preocupação com as doenças transmissíveis, já as mais recentes incluem as doenças não infecciosas e outros problemas e agravos à saúde. Tradicionalmente, a Epidemiologia tem sido definida como a ciência que estuda a distribuição das doenças e suas causas em populações humanas e pode ser considerada a ciência básica da saúde coletiva. Atualmente, pode-se dizer que a Epidemiologia se constitui a principal ciência da informação em saúde. A International Epidemiological Association (IEA, 1973, p. 25) define epidemiologia como: o estudo dos fatores que determinam a frequência e a distribuição das doenças nas coletividades humanas. Enquanto a clínica dedica-se ao estudo da doença no indivíduo, analisando caso a caso, a Epidemiologia debruça-se sobre os problemas de saúde em grupo de pessoas [...] na maioria das vezes envolvendo populações numerosas. Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais6/127 Para Rouquayrol (1993), epidemiologia é a ciência que estuda o processo saúde- enfermidade na sociedade, analisando a distribuição populacional e fatores determinantes do risco de doenças, agravos e eventos associados à saúde, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de enfermidades, danos ou problemas de saúde e de proteção, promoção ou recuperação da saúde individual e coletiva, produzindo informação e conhecimento para apoiar a tomada de decisão no planejamento, administração e avaliação de sistemas, programas, serviços e ações de saúde. Autores norte-americanos, europeus e latino-americanos definem epidemiologia de modo bastante semelhante, tendo como ponto comum o estudo da distribuição das doenças nas coletividades humanas e dos fatores causais responsáveis por essa distribuição. Esse conceito toma por base relações existentes entre os fatores do ambiente, do agente e do hospedeiro. Outros autores, especialmente latino- americanos, avançam em direção a uma nova epidemiologia, que dá ênfase ao estudo da estrutura socioeconômica a fim de explicar o processo saúde- doença de maneira histórica, tornando a epidemiologia um dos instrumentos de transformação social. Entre os principais objetivos da epidemiologia estão o de identificar fatores etiológicos na gênese das enfermidades e Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais7/127 o de fornecer subsídios para a redução dos problemas de saúde na população, e sua aplicação pode ser colocada em três grupos: • Análise das situações de saúde – desenvolve e aplica metodologias para a descrição e análise das situações de saúde, fornecendo subsídios para o planejamento e organização das ações de saúde. • Estudo dos determinantes de saúde-enfermidades – possibilita o avanço do conhecimento sobre os determinantes do processo saúde-doença, contribuindo para o avanço no conhecimento etiológico-clínico. • Avaliação de tecnologias e processo no campo da saúde – pode ser empregada na avaliação de programas, atividades e procedimentos terapêuticos no que se refere tanto a sistemas de prestação de serviços quanto ao impacto das medidas de saúde na população. Essas formas de aplicações podem auxiliar decisões em nível coletivo e individual. Em nível coletivo, as decisões em saúde são tomadas a partir das evidências epidemiológicas, no sentido de implementar novas intervenções, reorientar ou manter as existentes. Em nível individual, o uso da epidemiologia pode orientar os profissionais de saúde no sentido de fundamentar decisões e condutas como diagnósticos clínicos, solicitação de exames e prescrição de vacinas, Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais8/127 drogas e regimes alimentares. 1. Evolução Histórica da Epidemiologia A história da epidemiologia pode ser traçada desde a Antiguidade Clássica, tendo Hipócrates, médico grego que viveu há cerca de 2500 anos, como seu precursor. Esse sábio dominou o pensamento médico de sua época e dos séculos seguintes. Para ele, as doenças eram produto da relação entre o indivíduo e o ambiente que o cerca, analisando a doença em bases racionais, distanciando-se das explicações sobrenaturais até então aceitas. Além disso, estudou as doenças epidêmicas e as variações geográficas das condições endêmicas e é considerado por alguns o primeiro epidemiologista (FILHO, ROUQUAYROL, 2006). A tradição de Hipócrates foi mantida na Roma Antiga, preservada por árabes na Idade Média e retomada, primeiramente por clínicos na Europa Ocidental, a partir da Renascença, e depois, por toda a parte. Porém, durante séculos, até a metade do século XIX, a teoria que dominou os pensamentos médicos em relação às doenças foi a teoria dos miasmas. No início da Idade Média, o domínio do catolicismo romano e as invasões bárbaras determinaram o predomínio de práticas de saúde de caráter mágico religioso. Amuletos, orações e cultos a santos protetores da saúde materializavam a ideologia religiosa da salvação Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais9/127 da alma, ficando as ações coletivas em saúde em segundo plano, restritas a momentos de pragas e epidemias. Somente no século XIX uma massa crítica de investigações e pensamento epidemiológico surge na ciência. Uma sucessão de acontecimentos, na Europa, influenciava profundamente as pessoas e as ideias. A Revolução Industrial, que produziu um intenso deslocamento da população do campo para as cidades, atraída pelos empregos nas fábricas recém-criadas, a RevoluçãoFrancesa e movimentos políticos sociais da metade do século XIX transformam o contexto de vida político e social europeu. Epidemias de cólera, febre tifoide e febre amarela constituíam graves problemas nas cidades, levantando preocupações com a higiene, aprimoramento da legislação sanitária e criação de estrutura administrativa para aplicação das medidas preconizadas. Franceses e ingleses ocuparam posição de destaque na história da medicina e da epidemiologia daquela época. Entre eles, podemos destacar: • Pierre Louis, francês que viveu de 1787 a 1872. Entre suas principais obras destacam-se estudos clínico-patológicos sobre a tuberculose e a febre tifoide e análises de internações hospitalares em Paris, mais especificamente, a letalidade da pneumonia em relação à sangria. Sua maior contribuição foi ter introduzido e divulgado o método estatístico, Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais10/127 utilizando-o na investigação clínica das doenças. • Louis Villermé (1782-1863), um dos pioneiros dos estudos sobre a etiologia social das doenças, investigou a pobreza, as condições de trabalho e suas repercussões sobre a saúde, realçando as relações entre situação socioeconômica e mortalidade. • William Farr (1807-1883). Entre as suas contribuições podem- se destacar uma classificação das doenças, uma descrição das leis das epidemias e produção de informações epidemiológicas sistemáticas que compunham os relatórios do Registro Geral da Inglaterra. Essas informações subsidiaram diversas ações de planejamento, prevenção e controle das doenças, além de ter servido de fonte de dados para os trabalhos sobre saúde de outras importantes figuras, como Freidrich Engels e Edwin Chadwich. • John Snow (1813-1858) é considerado um clássico da epidemiologia de campo e recebeu esse reconhecimento por seu trabalho de investigação no intuito de esclarecer a origem das epidemias de cólera ocorridas em Londres de 1849 a 1854. Como resultado de uma cuidadosa e planejada coleta de dados na comunidade, Snow Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais11/127 conseguiu relacionar o consumo de água poluída com os episódios de cólera e traçar os princípios da prevenção e controle de novos surtos, válidos até hoje. • Louis Pasteur (1822-1895), considerado o pai da bacteriologia, foi figura central da microbiologia, identificou e isolou inúmeras bactérias, além de fazer trabalhos pioneiros na imunologia. A partir das descobertas de Pasteur, as bases biológicas para o estudo das doenças infecciosas foram solidificadas dando a impressão de que as doenças poderiam ser explicadas por uma única causa, o agente etiológico, e as pesquisas em epidemiologia passaram a ter forte componente ambulatorial. O desenvolvimento da bacteriologia na segunda metade do século XIX influenciou profundamente as primeiras décadas do século XX, levando a uma reorientação do pensamento médico e ao fortalecimento da medicina organicista e científica; o individual suplanta o coletivo na abordagem da doença e seus determinantes. O conhecimento básico sobre as doenças transmissíveis cresce rapidamente, dirigindo o conhecimento epidemiológico para os processos de transmissão ou controle de epidemias. Nesse contexto, no Brasil, podemos destacar os trabalhos de Oswaldo Cruz, que além de fundar o Instituto Oswaldo Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais12/127 Cruz de pesquisa, empreendeu vitoriosa campanha contra a febre amarela no Rio de Janeiro e o combate à peste e à varíola. Além dele, podemos destacar também Carlos Chagas, Adolfo Lutz e Emílio Ribas, que contribuíram em muitas obras Link Atualmente, os rumos da epidemiologia no Brasil são discutidos pela ABRASCO (Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva). Para saber mais, acesse: http://www.epi2011. com.br/ e http://www.abrasco.org.br/ grupos/g3.php públicas com a indicação de medidas de saneamento preventivas que deviam ser tomadas no controle das doenças. Na década de 1930, a medicina científica entra em crise. O avanço tecnológico leva a uma fragmentação do cuidado médico que conduz à especialização, à ênfase no procedimento, a uma elevação dos custos e à capitalização da saúde, o que revela uma incapacidade desse modelo de prover condições mínimas de vida e saúde para a totalidade da população. Assim, renasce nesse contexto o caráter social e cultural da enfermidade e da medicina. A partir da Segunda Guerra Mundial há o aperfeiçoamento dos grandes inquéritos epidemiológicos, principalmente a respeito das doenças não infecciosas que se haviam Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais13/127 revelado como problemas de saúde durante o processo de seleção de recrutas para o exército. Nos Estados Unidos, a medicina preventiva se consolida como movimento ideológico, o que leva à instalação de departamentos específicos nas escolas médicas. Na Europa Ocidental, onde o pós-guerra foi marcado pelo welfare state, a assistência à saúde se integra mais claramente às políticas sociais. O século XX é marcado pela mudança das doenças prevalentes, com a crescente importância das doenças crônico- degenerativas como causas de morbidade e mortalidade e a epidemiologia progride através da pesquisa sobre temas como: a determinação das condições de saúde da população; a busca sistemática de fatores antecedentes ao aparecimento das doenças; e a avaliação das intervenções propostas para alterar a incidência ou a evolução da doença, através de estudos controlados. O desenvolvimento da epidemiologia fez com que a disciplina, antes restrita à saúde pública e aos aspectos físicos e biológicos, se expandisse para a área clínica e social. Assim, podemos dizer que a epidemiologia moderna se vale dos conhecimentos de três áreas básicas: ciências sociais, ciências biológicas e estatística. Das ciências biológicas, a epidemiologia apoia-se em conhecimentos da clínica, patologia, microbiologia, parasitologia e imunologia. Estas áreas do conhecimento Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais14/127 contribuem para melhor descrever as doenças e classificá-las. As ciências sociais conferem à epidemiologia uma visão mais ampla. A sociedade como está organizada oferece aos indivíduos tanto proteção como também determina muitos riscos de adoecer, com maior ou menor acesso das pessoas às técnicas de prevenção de doenças e de promoção e recuperação da saúde. Os fatores que produzem as doenças são biológicos e ambientais, com significados sociais complexos. A estatística tem papel fundamental na epidemiologia. Em diversas fases da pesquisa epidemiológica, assume papel de realce, como, por exemplo, nas fases de planejamento, execução, análise e interpretação dos resultados de estudos sobre a saúde de grupos de pessoas. Após o advento da computação, na década de 1960, a estatística traz para a epidemiologia um grande avanço e transformação. À ampliação dos bancos de dados é somada a criação de técnicas analíticas com múltiplas especificações, se comparadas à analise mecânica dos dados, além disso, a computação torna possível a realização de pareamentos múltiplos, estratificação de variáveis, entre outros procedimentos mais complexos e cada vez mais precisos. 2. História Natural da Doença História natural da doença é o nome dado Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais15/127 ao conjunto de processos interativos compreendendo as inter-relações do agente, do suscetível e do meio ambiente que afetam o processo global e seu desenvolvimento, desde as primeiras forças que criam o estímulopatológico no meio ambiente, ou em qualquer outro lugar, passando pela resposta do homem ao estímulo, até as alterações que levam a um defeito, invalidez, recuperação ou morte (LEAVELL; CLARK, 1976, p. 50). O curso da doença no organismo não é uniforme, podendo apresentar grandes variações, porém é possível delinear alguns padrões de progressão da doença que podem ser colocados em cinco categorias principais (PEREIRA, 2006): 1. Evolução aguda, rapidamente fatal. 2. Evolução aguda, clinicamente evidente e com rápida recuperação na maioria dos casos. 3. Evolução sem alcançar o limiar clínico, de modo que o indivíduo não saberá do ocorrido, salvo se for submetido a exames laboratoriais. 4. Evolução crônica, que se exterioriza e progride para o êxito letal após longo período. Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais16/127 5. Evolução crônica, com períodos assintomáticos entremeados de exacerbações clínicas. Embora conceitualmente o processo saúde-doença seja contínuo, para melhor entendimento, usualmente a história natural da doença pode ser dividida em período pré-patológico e período patológico, em quatro fases a seguir: • Fase Inicial (ou de suscetibilidade): ocorre no período pré-patológico e nesta fase ainda não há doença propriamente dita, embora existam condições que favoreçam o seu aparecimento. Vale ressaltar que as pessoas não possuem o mesmo risco de adoecer e a ocorrência da doença vai depender da interação do indivíduo com o meio. • Fase Patológica Pré-Clínica: é a primeira fase do período patológico e nela a doença ainda está no estágio de ausência de sintomatologia, embora o organismo já apresente alterações patológicas. O seu curso pode ser subclínico e evoluir para a cura, ou progredir para a fase seguinte. Hoje já é possível fazer a detecção de diversas doenças ainda nesta fase, como, por exemplo, a hipertensão arterial assintomática. Essa detecção precoce pode resultar, muitas vezes, em maior êxito no tratamento e prevenção de complicações. • Fase Clínica: é a fase de Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais17/127 manifestação da doença. Há diferentes graus de acometimento do organismo, podendo ser leve, mediana ou de grave intensidade, e de evolução aguda ou crônica. Essa classificação vai depender da natureza da própria doença e das características e suscetibilidade do indivíduo e do meio em que vive. • Fase de Incapacidade Residual: esta fase caracteriza-se quando a doença não progride até a morte ou não há cura completa e as alterações anatômicas e fisiológicas se estabilizam. Nesta fase há um grande predomínio das medidas de reabilitação que visam o desenvolvimento da pessoa afetada, que, por vezes, apresenta sequelas. Quadro 1.1. Período pré-patológico e patológico da história natural da doença (extraído e adaptado de PEREIRA, 2006). PERÍODO PRÉ-PATOLÓGICO PERÍODO PATOLÓGICO Antes de o indivíduo adoecer Curso da doença no organismo humano Interação de agentes mórbidos, o hospedeiro humano e os fatores ambientais Doença precoce discernível Doença avançada Convalescença Alterações Precoces Fase de suscetibilidade Fase patológica pré-clínica Fase clínica Fase residual Morte Invalidez Cronicidade LIMIAR CLÍNICO Recuperação Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais18/127 A divisão da história natural das doenças em fases é útil para a compreensão do processo saúde-doença e para colocar os indivíduos em diferentes categorias de acordo com o risco e danos à saúde que apresentam, além de facilitar o planejamento das ações preventivas e curativas. São consideradas medidas preventivas todas aquelas utilizadas para evitar a progressão das doenças ou suas consequências. Essas medidas podem ser classificadas em medidas inespecíficas e específicas; prevenção primária, secundária e terciária; cinco níveis de prevenção; e medidas universais, seletivas e individualizadas (PEREIRA, 2005). Cada um desses níveis pode ser aplicado em fases específicas da história natural da doença. • As medidas inespecíficas ou gerais têm o objetivo de promover o bem- estar das pessoas e as medidas específicas ou restritas incluem as técnicas para lidar com dada doença ou agravo à saúde em particular. Elas podem ser aplicadas em todas as fases do processo saúde-doença. • A prevenção primária é dirigida para a manutenção da saúde, ou seja, para evitar novos casos de doença ou agravo à saúde. As medidas são empregadas no período pré-patológico da doença e podem ser subdivididas em Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais19/127 dois níveis: promoção da saúde (destinadas a manter o bem-estar, sem focar nenhuma doença em particular, ex.: educação sanitária, habitação adequada, emprego e salários adequados) e proteção específica (inclui medidas para impedir o aparecimento de uma determinada doença, ex.: vacinação, quimioprofilaxia, fluoretação da água). • A prevenção secundária visa à prevenção da evolução do processo patológico na tentativa de fazê-lo regredir. As medidas são utilizadas no período patológico, nas fases pré-clínica e clínica da doença, e podem ser subdivididas em dois níveis: diagnóstico e tratamento precoce (trata-se de identificar a doença em seu início, antes do aparecimento dos sintomas, para tentar evitar sua progressão, ex.: rastreamento, exames periódicos de saúde, autoexame) e limitação do dano (consiste em identificar a doença, limitar a extensão das lesões e retardar o aparecimento das complicações, se não for possível evitá-las, ex.: acesso ao serviço de saúde, tratamento adequado). • A prevenção terciária visa desenvolver a capacidade funcional do indivíduo cujo potencial foi reduzido pela doença, ou seja, promover o ajustamento do paciente Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais20/127 a condições irreversíveis. As medidas são aplicadas na fase residual da doença e coincidem com o nível de reabilitação (ex.: terapia ocupacional, próteses e órteses, adequação das ações a uma determinada deficiência). • As medidas universais são aquelas que podem ser aplicadas a todas as pessoas já que os benefícios ultrapassam os riscos (ex.: higiene oral, dieta balanceada). As medidas seletivas são aquelas aconselhadas apenas a um subgrupo da população identificado por alguma característica marcante, como sexo, idade, ocupação (ex.: uso de proteção no trabalho). As medidas individualizadas são aquelas aplicadas unicamente na presença de uma condição que coloca o indivíduo em alto risco para o desenvolvimento da doença (ex.: quimioprofilaxia da tuberculose). Essas medidas são mais restritas e individualizadas e são utilizadas no período pré-patológico da doença. 3. Epidemiologia Descritiva A epidemiologia descritiva tem como objetivo principal o conhecimento da distribuição de um evento na população e esse conhecimento pode ser utilizado para o direcionamento de ações norteadoras e para a elaboração de explicações e relações, para mostrar as razões das Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais21/127 variações de frequências na população. O processo descritivo consiste da organização de dados de maneira a evidenciar as frequências do evento em diversos subgrupos da população, de modo a compará-los, por exemplo, entre faixas etárias, sexo e tipo de ocupação. Para o conhecimento da distribuição de um evento podemos lançar mão de informações sobre a saúde que podem referir-se globalmente ou parcialmente a uma população. Quando as informações são globais, ou seja, referem-se a toda a população, dizemos que há um coeficiente geral.Exemplo: coeficiente geral de natalidade (todos os nascimentos de uma dada população em um dado período divididos pela população geral). Quando as informações são específicas, ou seja, referem-se a um subgrupo populacional, dizemos que há um coeficiente específico. Exemplo: mortalidade por sarampo, na faixa etária de 1 a 5 anos, no ano de 2011. Um estudo epidemiológico descritivo é composto por alguns elementos essenciais que podem ser resumidos pelos verbetes: “que”, “quem”, “onde”, “quando”, “como” e “por quê”. O “que” representa o tipo de evento que está sendo estudado. É preciso definir muito bem o evento e especificar as suas frequências em relação às seguintes características, que também podemos chamar de variáveis: Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais22/127 • “Quem”, as pessoas que foram atingidas pelo evento. • “Onde”, os lugares em que se deu o evento. • “Quando”, o tempo em que ocorreu o evento. Além disso, é preciso que as informações sejam organizadas de forma a mostrar “como” os eventos acontecem e variam na população, no caminho de esclarecer “por quê” o evento ocorre com aquelas características, naquela população, naquele local e naquele tempo. A partir dessa detalhada descrição é possível traçar um diagnóstico da situação que se pretende estudar e levantar hipóteses para explicar a distribuição encontrada, acompanhar a evolução do problema na coletividade e atuar em função desse conhecimento, priorizando algumas intervenções e avaliando seus efeitos (PEREIRA, 2005). O estudo descritivo segue as mesmas linhas gerais de qualquer estudo científico partindo da definição do problema, identificação e exame das fontes de dados, seleção das variáveis que serão utilizadas, discussão dos principais achados apontando hipóteses para explicar o evento, análise crítica desses achados e conclusão. Um ponto importante a ser destacado para o entendimento dos estudos descritivos são as fontes de dados. As estatísticas que expressam a frequência e distribuição de Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais23/127 um evento podem ser preparadas a partir de três tipos de fontes ou bases de dados: 1) rotineira, contínua ou permanente (prontuários médicos, notificações de doenças, atestados de óbitos); 2) periódica (pesquisas realizadas anualmente) e 3) ocasional (investigações de morbidade). Para quem investiga um tema, a busca de informações se dá primeiramente a partir de estatísticas que tratem do assunto, que geralmente provêm dos sistemas de informação. As estatísticas têm a vantagem de permitir o uso imediato da informação sem precisar coletar os dados de outra forma. Na falta de estatísticas são feitos levantamentos dos dados em registros já existentes, como fichas e prontuários, e se ainda forem necessários dados adicionais que esses últimos registros não fornecem, são realizados inquéritos para obtenção dos dados junto às pessoas. Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais24/127 Glossário Determinantes: fatores contribuintes ou determinantes parciais, que em sua articulação e provável sinergia propiciam a atuação do estímulo patológico. Epidemia: é a ocorrência em uma comunidade ou região de casos de natureza semelhante, claramente excessiva em relação ao esperado. Teoria miasmática: teoria que defende que a origem das doenças situava-se na má qualidade do ar, proveniente das emanações da decomposição de animais e plantas. Os miasmas, ou as emanações, passariam do ambiente para os indivíduos suscetíveis, o que explicaria a origem das epidemias das doenças contagiosas. Questão reflexão ? para 25/127 Procure em bases de dados científicos um trabalho que utilize a epidemiologia descritiva e, de acordo com o texto, identifique suas principais características. 26/127 Considerações Finais » Epidemiologia tem sido definida como a ciência que estuda a distribuição das doenças e suas causas em populações humanas e pode ser considerada a ciência básica da saúde coletiva. » Os principais objetivos da epidemiologia são identificar os fatores etiológicos na gênese das enfermidades e fornecer subsídios para a redução dos problemas de saúde na população. » As principais aplicações da epidemiologia são: análise das situações de saúde, estudo dos determinantes de saúde-enfermidade e avaliação de tecnologias e processos no campo da saúde. » A história da epidemiologia pode ser traçada desde a Antiguidade Clássica, passando por importantes expoentes no século XIX, que levaram ao advento da bacteriologia, importante marco no desenvolvimento dessa ciência. O século XX é marcado pela crescente importância das doenças crônico-degenerativas. 27/127 » A epidemiologia moderna se vale dos conhecimentos de três áreas básicas: ciências sociais, ciências biológicas e estatística. » A história natural da doença pode ser dividida em período pré- patológico e período patológico, e em quatro fases: inicial, patológica pré-clínica, clínica e incapacidade residual. » São consideradas medidas preventivas todas aquelas utilizadas para evitar a progressão das doenças ou suas consequências. Essas medidas podem ser classificadas em medidas inespecíficas e específicas; prevenção primária, secundária e terciária; cinco níveis de prevenção; e medidas universais, seletivas e individualizadas. » A epidemiologia descritiva tem como objetivo principal o conhecimento da distribuição de um evento na população. » Um estudo epidemiológico descritivo é composto por alguns elementos essenciais que podem ser resumidos pelos verbetes: “que”, “quem”, “onde”, “quando”, “como” e “por quê”. Considerações Finais Unidade 1 • Epidemiologia das Doenças Ocupacionais28/127 Referências AIE. Associação Internacional de Epidemiologia. Guia de métodos de Enseñanza. IEA/OPAS/OMS, Publ. Cient. 266, 1973, 246p. FILHO, A. N.; ROUQUAYROL, M. Z. Introdução à Epidemiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 281p. LEAVEL, H.; CLARK, E. G. Medicina Preventiva. São Paulo: Megraw-Hill, 1976, 744p. PEREIRA, M. G. Epidemiologia teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. ROUQUAYROL, M. Z. Epidemiologia e Saúde. Rio de Janeiro: MEDSI, 1993. 29/127 Aula 1 - Tema: Introdução à Epidemiologia – Parte I Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f- 1d/75e4fa0c12655b6111225b0bfafd510a>. Aula 1 - Tema: Conceitos de Epidemiologia – Parte II. Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f1d/ ddf5f5912ef2ea23c2c1da4fcb58174e>. Assista a suas aulas 30/127 Aula 1 - Tema: Vigilância em Saúde – Parte III Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f1d/ be0c89af861ec25b4a739c0b5a315f7c>. Aula 1 - Epidemiologia e as Doenças – Parte IV Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f- 1d/76a37683d904983379e55c20cebbed19>. Assista a suas aulas 31/127 1. Assinale a alternativa que apresenta o objetivo da epidemiologia: a) Identificar fatores etiológicos na gênese das enfermidades. b) Fornecer subsídios para o aumento dos problemas de saúde na população. c) Compreender o processo saúde-doença. d) Planejar ações preventivas e curativas à saúde. e) Promover o bem-estar das pessoas. Questão 1 32/127 2. O desenvolvimento da bacteriologia na segunda metade do século XIX influenciou profundamente as primeiras décadas do século XX, levando a uma reorientação do pensamento médico e ao fortalecimento da medi- cina organicista e científica. Assinale a alternativa queindica uma conse- quência do desenvolvimento da bacteriologia: a) Cresce a importância das doenças crônico-degenerativas como causas de morbidade e mortalidade. b) A medicina preventiva se consolida como movimento ideológico, o que leva à instalação de departamentos específicos nas escolas médicas. c) O estudo das doenças infecciosas foi solidificado, dando a impressão de que as doenças poderiam ser explicadas por uma única causa, o agente etiológico. d) Há o aperfeiçoamento dos grandes inquéritos epidemiológicos, principalmente a respeito das doenças não infecciosas. e) Renasce o caráter social e cultural da enfermidade e da medicina. Questão 2 33/127 3. Assinale a alternativa que contenha fases da história natural das doen- ças. a) Fase pré-patológica e fase pré-clínica. b) Fase inicial ou de suscetibilidade e fase clínica. c) Fase pré-patológica e fase clínica. d) Fase capacidade residual e fase clínica. e) Fase residual e fase pré-patológica. Questão 3 34/127 4. Ações de prevenção primária são: a) Aquelas que visam à prevenção da evolução do processo patológico na tentativa de fazê- lo regredir. b) Aquelas que visam desenvolver a capacidade funcional do indivíduo cujo potencial foi reduzido pela doença. c) Aquelas que podem ser aplicadas a todas as pessoas, já que os benefícios ultrapassam os riscos. d) Aquelas dirigidas para a manutenção da saúde, ou seja, para evitar novos casos de doença ou agravo à saúde. e) Aquelas aconselhadas apenas a um subgrupo da população identificado por alguma característica marcante. Questão 4 35/127 5. O principal objetivo da epidemiologia descritiva é: a) Compreender o processo saúde-doença e colocar os indivíduos em diferentes categorias de acordo com o risco e danos à saúde que apresentam. b) Tornar possível a realização de pareamentos múltiplos, estratificação de variáveis, entre outros procedimentos mais complexos e cada vez mais precisos. c) Facilitar o planejamento das ações preventivas e curativas. d) Permitir o uso imediato da informação sem precisar coletar os dados de outra forma. e) Conhecer a distribuição de um evento na população. Questão 5 36/127 Gabarito 1. Resposta: A. Entre os principais objetivos da epidemiologia estão identificar fatores etiológicos na gênese das enfermidades e fornecer subsídios para a redução dos problemas de saúde na população. 2. Resposta: C. O desenvolvimento da bacteriologia na segunda metade do século XIX influenciou profundamente as primeiras décadas do século XX, levando a uma reorientação do pensamento médico e ao fortalecimento da medicina organicista e científica, e o individual suplanta o coletivo na abordagem da doença e seus determinantes. As bases biológicas para o estudo das doenças infecciosas foram solidificadas, dando a impressão de que as doenças poderiam ser explicadas por uma única causa, o agente etiológico, e as pesquisas em epidemiologia passaram a ter forte componente ambulatorial. O conhecimento básico sobre as doenças transmissíveis cresce rapidamente, dirigindo o conhecimento epidemiológico para os processos de transmissão ou controle de epidemias. 3. Resposta: B. A história natural da doença pode ser dividida em período pré-patológico e período patológico, e em quatro fases: inicial ou de suscetibilidade, patológica pré-clínica, clínica e incapacidade residual. 37/127 4. Resposta: D. A prevenção primária são ações dirigidas para a manutenção da saúde, ou seja, para evitar novos casos de doença ou agravo à saúde. As medidas são empregadas no período pré-patológico da doença e podem ser subdivididas em dois níveis: promoção da saúde (destinadas a manter o bem-estar, sem focar nenhuma doença em particular, ex.: educação sanitária, habitação adequada, emprego e salários adequados) e proteção específica (inclui medidas para impedir o aparecimento de uma determinada doença, ex: vacinação, quimioprofilaxia, fluoretação da água). Gabarito 5. Resposta: E. A epidemiologia descritiva tem como objetivo principal o conhecimento da distribuição de um evento na população, e esse conhecimento pode ser utilizado para o direcionamento de ações norteadoras e para a elaboração de explicações e relações, para mostrar as razões das variações de frequências na população.. 38/127 Unidade 2 Epidemiologia das Doenças e Agravos Não Transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho Objetivos Nesta aula, você irá conhecer a epidemiologia das principais doenças e agravos relacionados ao trabalho. Você será apresentado aos riscos ocupacionais: químico, físico, biológico e ergonômico. Por fim, discutiremos as relações entre o adoecimento e os riscos do trabalho. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho39/127 Introdução Observa-se um aumento significativo na incidência de doenças crônicas degenerativas relacionadas ao aumento da exposição a agentes tóxicos de origem ambiental ou ocupacional. Tal fenômeno é resultado das mudanças do processo produtivo e do uso de novas tecnologias. Nesta aula, será discutida a epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: suas condições geradoras e possíveis agravos à saúde do trabalhador. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho40/127 1. Epidemiologia das Doenças e Agravos Não Transmissíveis: princi- pais doenças relacionadas ao trabalho 1.1. Risco Químico É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos químicos como solventes, agrotóxicos, metais pesados, entre outros. 1.2. Mercúrio. A exposição ocupacional ao mercúrio é conhecida desde a antiguidade, quando era usado na decoração e pintura de castelos. A industrialização diversificou sua aplicação, além de ser utilizado como cosmético em ambiente médico hospitalar e em restaurações de amálgama na odontologia (FARIA, 2003). O Hidrargirismo é a denominação da doença ocupacional decorrente da intoxicação por mercúrio. Atualmente, a exposição ao mercúrio ocorre em atividades como garimpo, manipulação de amálgamas, indústria elétrica, na produção de cloro e soda. Inúmeros acidentes ambientais têm levado à contaminação das águas, de peixes e crustáceos que são consumidos pela Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho41/127 população. Em seres humanos, a mortalidade devido à contaminação por mercúrio varia de 7% a 11%, sendo que muitos sobreviventes apresentam sequelas neurológicas. Em intoxicações agudas, são observados efeitos como depressão do sistema respiratório, alterações cardiovasculares (edema pulmonar) e gastrointestinais (diarreia, vômito, corrosão da mucosa gástrica). Já em intoxicações crônicas, observa-se alteração do sistema nervoso central, levando a danos cerebrais irreversíveis. 1.3. Chumbo A intoxicação ocupacional por chumbo é denominada Saturnismo e o aumento da sua incidência é uma consequência do processo de industrialização. Ela ocorre em atividades como mineração, fundição, manipulação de baterias elétricas, soldas, manipulação de sucatas, indústria de plástico e tinturas. A absorção do chumbo ocorre por contato com a pele, ingestão de alimentos ou água contaminada e, na maioria dos casos, por inalação. Ele tem ação tóxica sobre o sistema nervoso, promovendo a desmielinização e degeneração dos axônios, o que pode provocar um dano ao nervo periférico conhecido como “queda do punho” devido à paresia do nervo radial. Observam-se ainda como sintomas gerais: cólicas abdominais,anemia e neuropatia. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho42/127 1.4. Agrotóxicos Os agrotóxicos são utilizados para o controle de pragas na agricultura, combate a vetores, tratamento de madeiras, produção de flores e na pecuária. Quanto à classificação, temos: inseticidas (organofosforados, carbamatos e organoclorados), fungicidas, herbicidas, paraquat e agente laranja (utilizado como arma de guerra no Vietnã). A intoxicação por agrotóxicos atinge principalmente os trabalhadores rurais, porém, pode atingir outros profissionais que atuam na produção, transporte, manipulação e armazenamento. Nos casos de intoxicação crônica, os sintomas aparecem de forma tardia e são indefinidos, já nos casos de intoxicação aguda, os sintomas são severos. Os sintomas são variáveis, podendo ser classificados como leves (fadiga, cefaleia e distúrbios gastrointestinais), moderados (fraqueza, dificuldade de fala, mialgia) e intensos (dificuldade respiratória, sudorese intensa, náuseas e vômitos). 1.5. Solventes A manipulação de solventes ocorre principalmente em indústrias petroquímicas, na produção e manipulação de vernizes, tintas, colas e plásticos. Muito frequentemente, a absorção ocorre por inalação, uma vez que existe uma alta solubilidade desses elementos na corrente Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho43/127 sanguínea. Entre os sintomas temos: irritabilidade, depressão respiratória, agitação psíquica, cefaleia severa, fadiga, perda de memória. 2. Risco Biológico É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos contendo micro-organismos, como bactérias, vírus, fungos, parasitas, ou secreções, como sangue. O risco biológico é frequentemente observado em atividades de profissionais de saúde, como enfermeiros, fisioterapeutas, médicos e dentistas, mas outros profissionais também estão expostos ao manipular alimentos, lixo, restos de animais e meios de cultura. Os acidentes com material biológico são classificados em: leves (contato com secreções, urina ou sangue em pele íntegra), moderados (contato com secreções ou urina em mucosas; sem sangue visível) e graves (contato de líquido orgânico contendo sangue visível com mucosas ou exposição percutânea com materiais perfurocortantes). Estima-se que após a exposição percutânea com agulha contaminada o risco de contaminação com o vírus da hepatite B (HBV) é de 6 a 30%, com o vírus da hepatite C (HCV) é de 0,5 a 2% e com o vírus da AIDS (HIV), de 0,3 a 0,4% (BRASIL, 2005). Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho44/127 Profissionais que atuam diretamente em contato com o público (recepcionistas, enfermeiros, professores) estão sujeitos a contato com pessoas portadoras de enfermidades e podem ser acometidos por virose, escabiose e infecções das vias aéreas. As atividades laborais desenvolvidas por trabalhadores braçais, pedreiros, marceneiros, lixeiros, trabalhadores rurais, jardineiros, expõem esses profissionais ao risco de adquirir tétano, doença grave causada pela toxina do Clostridium tetani – bactéria que penetra no organismo via lesões da pele. 3. Risco Ergonômico É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao desenvolver a tarefa, considerando a biomecânica do trabalhador relacionada à carga de trabalho, ritmo e movimentos desenvolvidos. A sobrecarga estática ocorre quando o trabalhador desenvolve a atividade por longos períodos com limitação de movimentos corporais, levando à sobrecarga do sistema osteomuscular; da mesma forma, trabalhos de ritmo intenso também podem provocar lesões musculoesqueléticas e alterações psíquicas. Observa-se, frequentemente, o Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho45/127 desrespeito da biomecânica do trabalhador na realização de tarefas que impõem movimentos de torção, flexão de tronco, braços suspensos, cadeiras sem apoios, exigência de força muscular intensa, jornadas prolongadas, controle excessivo de produtividade, repetitividade de tarefas, ritmos excessivos ou monotonia. 4. Risco Físico São considerados riscos físicos as diversas formas de energia, tais como: ruído, temperaturas extremas, vibração, pressões anormais, radiação e umidade. 4.1. Ruído A exposição ao ruído, a curto, médio e longo prazo, pode provocar sérios prejuízos à saúde. As alterações podem ser imediatas ou graduais dependendo da exposição, nível sonoro e da sensibilidade individual. O limite para exposição ao ruído segue a lógica de quanto maior o ruído, menor deve ser a exposição. Níveis elevados de ruído podem ocasionar fadiga, perda de memória, irritabilidade, dificuldade de concentração, hipertensão, alterações cardíacas, gastrointestinais e perda temporária ou definitiva da audição. A exposição máxima ao ruído não pode ultrapassar o limite de tolerância para ruído, de acordo com o Quadro 2.1: Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho46/127 Quadro 2.1: Limites de tolerância para exposição ao ruído. Nível de ruído dB Máxima exposição diária permissível 85 8 horas 86 7 horas 87 6 horas 88 5 horas 89 4 horas e 30 minutos 90 4 horas 91 3 horas e 30 minutos 92 3 horas 93 2 horas e 40 minutos 94 2 horas e 40 minutos 95 2 horas 96 1 hora e 45 minutos 98 1 hora e 15 minutos 100 1 hora 102 45 minutos 104 35 minutos 105 30 minutos 106 25 minutos Nível de ruído dB Máxima exposição diária permissível 108 20 minutos 110 15 minutos 112 10 minutos 114 8 minutos 115 7 minutos Fonte: BRASIL, 2011, p. 2. 4.2. Vibração Ao operar máquinas ou manipular equipamentos o trabalhador pode ser exposto a vibrações que podem ser localizadas (uso de ferramentas manuais) ou generalizadas (operação de tratores). Essa exposição pode levar a alterações neurovasculares em membros superiores e inferiores, assim como a lesões na coluna. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho47/127 4.3. Radiação É uma forma de energia que é transmitida por ondas eletromagnéticas. Pode ser classificada em dois grupos: radiações ionizantes (que podem afetar o organismo em nível celular), como aparelhos de raios X, e radiações não ionizantes (provenientes de operação em fornos, radiação ultravioleta), que geram efeitos como perturbações visuais (conjuntivites, cataratas), queimaduras, lesões na pele etc. 4.4. Temperaturas Extremas A exposição ao calor excessivo em trabalho a céu aberto, em fornos ou próximo de outras fontes de calor intenso pode levar o trabalhador a desenvolver desidratação, insolação, fadiga e alterações neurológicas. Já o trabalho em condições de frio intenso pode acarretar no desenvolvimento de congelamento, doenças respiratórias, hipotermia fadiga física. 4.5. Pressões Anormais O trabalho em altas pressões é aquele que é desenvolvido com níveis de pressão acima da pressão atmosférica normal. Pode ocorrer em atividades realizadas em tubulações de ar comprimido, máquinas de perfuração, caixões pneumáticos e trabalhos executados por mergulhadores. Geralmente são usados na construção de pontes e barragens. A variação brusca Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho48/127 dos níveis de pressão pode causar mal- estar, cefaleia e embolias, podendo levar o trabalhar a óbito. 4.6.Umidade As atividades ou operações executadas em locais alagados ou encharcadas, com umidade excessiva, são capazes de produzir danos à saúde dos trabalhadores. A exposição do trabalhador à umidade pode acarretar doenças do aparelho respiratório, quedas, doenças de pele, doenças circulatórias, entre outras. 5. Doenças Osteomuscula- res Relacionadas ao Trabalho (DORT) As DORT também são conhecidas como doenças dos tecidos moles causadas por esforços repetitivos. São caracterizadas por acometer tendões, nervos e músculos de membros superiores, estão presentes em diferentes ocupações e ocorrem devido à associação de movimentos repetitivos e sobrecarga muscular. A fisiopatologia inclui processo inflamatório, fadiga neuromuscular e isquemia de tecidos. O diagnóstico é definido pela história ocupacional e exame físico, observa-se: dor, paresia, edema, rigidez matinal, alterações de temperatura Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho49/127 e formigamento. O tratamento inclui a avaliação do trabalho buscando eliminar os possíveis estressores que estão fadigando o sistema osteomuscular do trabalhador. Além de eliminar a fonte, dependendo do grau de lesão o tratamento pode envolver fisioterapia, medicamentos (anti- inflamatórios) ou ato cirúrgico. 5.1 Lesões de Coluna A atividade laboral gera frequentemente lesões de coluna. Os sintomas evoluem de forma gradativa e não necessariamente o trabalhador apresenta histórico de acidente ou trauma direto sobre a coluna, sendo observada relação direta entre insatisfação profissional e desconforto motor. Além dos fatores de risco individuais (idade, sexo, anormalidades musculoesqueléticas, força e resistência muscular e condicionamento físico), a coluna sofre durante a ocupação profissional com atividades de levantamento, torção e encurvamento, com posturas inadequadas e tarefas repetitivas. Dependendo do grau da lesão, além de dor local e limitação de movimento, pode ocorrer lesão do disco intervertebral. O grau de lesão, a limitação e a dor são parâmetros que devem ser avaliados para indicação de afastamento do trabalhador. Orienta-se tratamento conservador, Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho50/127 sintomatológico, fisioterapia e avaliação do ambiente de trabalho. 5.2. Cardiorrespiratório O trabalho pode levar tanto ao agravamento de doenças preexistentes quanto à ocorrência de muitas patologias. O estresse influencia diretamente a ocorrência de patologias do miocárdio, a organização do trabalho tem relação direta sobre a saúde do trabalhador. Fatores como: carga de trabalho, insegurança, insatisfação, monotonia, grau de responsabilidade e trabalho em turnos são fatores ambientais geradores de estresse. Os nitratos orgânicos têm ação vasodilatadora, influenciando o controle da pressão arterial; os solventes são cardiotóxicos e levam à diminuição da contractilidade do miocárdio e, dependendo da exposição, podem levar à parada cardiorrespiratória. Gases, partículas suspensas, fumos e aerossóis são absorvidos pelos pulmões. As partículas maiores atingem nasofaringe e traqueia, já as partículas menores chegam aos brônquios e alvéolos. A gravidade das lesões é determinada pela natureza do agente, tempo de exposição, concentração do agente e suscetibilidade do indivíduo. Os principais agentes causadores de lesões pulmonares são: arsênico, sílica, poeiras de algodão, asbesto, gás cloro, flúor e poeiras de resíduos biológicos. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho51/127 5.3. Rins e Fígado Tanto os rins quanto o fígado são órgãos filtradores que desempenham função de desintoxicação do organismo. Quando o trabalhador é exposto a uma substância química tóxica, observam-se reflexos na atividade devido a lesões agudas ou crônicas que interferem na eficiência desses órgãos. A hepatite aguda pode ocorrer devido à exposição a solventes alifáticos, aromáticos e metais, como arsênico, chumbo e fósforo. Já a manifestação crônica ocorre de forma tardia e pode ser associada a medicamentos, álcool e infecções virais. O diagnóstico diferencial buscando identificar possível relação com o trabalho é feito com base na história clínica-ocupacional e análise dos riscos a que o trabalhador está exposto. Glossário Aerossóis: uma suspensão de matérias sólidas ou líquidas sob a forma de partículas muito finas em um gás. DATASUS: Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde. Paresia: perda parcial da função muscular. Pode atingir membros superiores e inferiores. Questão reflexão ? para 52/127 O portal DATASUS (disponível em: http://www2. datasus.gov.br) disponibiliza informações que podem servir para subsidiar análises objetivas da situação sanitária, tomadas de decisão baseadas em evidências e elaboração de programas de ações de saúde. Visite o site, conheça as estatísticas de sua região e compare o local onde vive com outras regiões do Brasil. Estão disponíveis dados de morbidade, incapacidade, acesso a serviços, qualidade da atenção, condições de vida e fatores ambientais. 53/127 Considerações Finais » Risco químico: é o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos químicos como solventes, agrotóxicos, metais pesados, entre outros. » Risco biológico: é o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos contendo micro-organismos, como bactérias, vírus, fungos, parasitas, ou secreções, como sangue. » Risco ergonômico: é o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao desenvolver a tarefa, considerando a biomecânica do trabalhador relacionada à carga de trabalho, ritmo e movimentos desenvolvidos. » Lesões de coluna: a coluna sofre durante a ocupação profissional, com atividades de levantamento, torção e encurvamento, com posturas inadequadas e tarefas repetitivas. Unidade 2 • Epidemiologia das doenças e agravos não transmissíveis: principais doenças relacionadas ao trabalho54/127 Referências BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. BRASIL, Ministério do Trabalho. NR32. Segurança e segurança no trabalho em serviços de saúde. Brasília: Ministério do Trabalho em Emprego, 2005. BRASIL, Ministério do Trabalho. NR15. Atividades e operações insalubres. Brasília: Ministério do Trabalho em Emprego, 2011. FARIA, M. A. M. (2003) Mercuralismo metálico crônico ocupacional. Revista de Saúde Pública. São Paulo, v.37, n.1. MEDRONHO, A. R. Epidemiologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2009. MORAES, Giovanni; BENIT, Juarez (orgs.). Normas Regulamentadoras Comentadas. Legislação de segurança e saúde no trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: GVC, 2000. ROUQUAYROL, M. Z. Epidemiologia e Saúde. Rio de Janeiro: MEDSI, 1993. 55/127 Aula 2 - Tema: Doenças Relacionadas ao Trabalho - Bloco I. Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f1d/ eef11229d49e90c90f33a5051201469a>. Aula 2 - Tema: Gerenciamento dos Fatores de Risco - Bloco II. Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f1d/ cc740cfb3c5cddb777885fcfda2f316d>. Assista a suas aulas 56/127 Aula 2 - Tema: Riscos Ocupacionais - Físicos - Bloco III Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f1d/ b036fbbdaea8f81aedf57af665d15f6e>.Aula 2 - Tema: Classificação dos Riscosocupacionais - Bloco IV Disponível em: <http://fast.player.liquidplatform.com/ pApiv2/embed/dbd3957c747affd3be431606233e0f- 1d/8a2fde4dbb8d3525ec8c964ea2e18f66>. Assista a suas aulas 57/127 1. O levantamento de situações de risco é uma estratégia que tem como objetivo: a) Avaliar o indivíduo. b) Controle estatístico de doenças. c) Informação em saúde. d) Avaliar situações e acontecimentos que podem levar a agravos de saúde. e) Implantar serviços de saúde. Questão 1 58/127 2. Dentre as alternativas, que lesão o trabalhador que sofre intoxicação crônica por mercúrio pode apresentar? a) Varizes. b) Osteopenia. c) Lesões no Sistema Nervoso Central. d) Hipotireoidismo. e) Hipotensão. Questão 2 59/127 3. Risco ergonômico pode ser definido como: a) Risco de acidentes ou situações que podem levar à ocorrência de acidentes, tais como máquinas e equipamentos sem manutenção adequada ou com defeito. b) É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos contendo micro-organismos, como bactérias, vírus, fungos, parasitas, ou secreções, como sangue. c) É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao manipular produtos químicos, como solventes, agrotóxicos, metais pesados, entre outros. d) É o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao desenvolver a tarefa considerando a biomecânica do trabalhador relacionada à carga de trabalho, ao ritmo e aos movimentos desenvolvidos. e) Intoxicação por agrotóxico, que atinge principalmente os trabalhadores rurais, porém, pode atingir outros profissionais que atuam na produção, transporte, manipulação e armazenamento. Questão 3 60/127 4. O trabalhador portador de DORT apresenta o seguinte quadro: a) Dor, paresia, edema, rigidez matinal, alterações de temperatura e formigamento. b) Anestesia, edema, flacidez e coceira. c) Sintomas gastrointestinais, como azia e sangramentos. d) Tontura. e) Infertilidade. Questão 4 61/127 5. Assinale a alternativa que apresenta uma situação de exposição a risco biológico. a) Trabalhadores expostos a ruído de um trator. b) Utilização de máquinas de solda. c) Realização de pulverização com agrotóxicos. d) Realização de um curativo. e) Vibração e calor durante a operação de um equipamento. Questão 5 62/127 Gabarito 1. Resposta: D. Áreas e situações de risco: o levantamento desses dados tem como objetivo avaliar situações e acontecimentos que podem levar a agravos de saúde. Exemplos: condições de saneamento, abastecimento, qualidade de água, exposição a agentes tóxicos. 2. Resposta: C. Em seres humanos, a mortalidade devido à contaminação por mercúrio varia de 7% a 11%, sendo que muitos sobreviventes apresentam sequelas neurológicas. Em intoxicações agudas são observados efeitos como depressão do sistema respiratório, alterações cardiovasculares (edema pulmonar) e gastrointestinais (diarreia, vômito, corrosão da mucosa gástrica). Já em intoxicações crônicas, observa-se alteração do sistema nervoso central, levando a danos cerebrais irreversíveis. 3. Resposta: D. Risco ergonômico é o perigo a que determinado indivíduo está exposto ao desenvolver a tarefa, considerando a biomecânica do trabalhador relacionada à carga de trabalho, ao ritmo e aos movimentos desenvolvidos. 4. Resposta: A. As DORT são também conhecidas como 63/127 doenças dos tecidos moles causadas por esforços repetitivos. São caracterizadas por acometer tendões, nervos e músculos de membros superiores, estão presentes em diferentes ocupações e ocorrem devido à associação de movimentos repetitivos e sobrecarga muscular. A fisiopatologia inclui processo inflamatório, fadiga neuromuscular e isquemia de tecidos. O diagnóstico é definido pela história ocupacional e exame físico, observa-se: dor, paresia, edema, rigidez matinal, alterações de temperatura e formigamento. Gabarito 5. Resposta: D. É considerado risco biológico qualquer exposição a micro-organismos, como vírus e bactérias, assim como a manipulação de tecidos ou peças anatômicas. Os curativos têm grande potencial de contaminação do trabalhador. 64/127 Unidade 3 Estudos Epidemiológicos Objetivos Nesta aula você irá aprender sobre as principais características e classificações dos estudos epidemiológicos, utilizados para melhor conhecer a saúde da população. De forma mais detalhada, serão apresentados os cinco principais estudos empregados em epidemiologia: o ensaio clínico randomizado, o estudo de coorte, o estudo de caso controle, o estudo transversal e o estudo ecológico. Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos65/127 Introdução Com o objetivo de melhor conhecer a saúde da população, os fatores que a determinam, a evolução do processo saúde-doença e o impacto das ações de saúde, a ciência desenvolveu métodos de investigação que se adéquam a diversas situações, tendo, cada um, suas vantagens e suas limitações. Na investigação de um tema, três estratégias têm sido utilizadas: o estudo de caso, a investigação experimental em laboratório e a pesquisa ao nível de população. Os estudos de casos são utilizados para uma avaliação inicial de problemas ainda pouco conhecidos. Trata-se de observar um ou mais indivíduos com a mesma doença ou evento e, a partir da descrição detalhada, traçar um perfil das suas principais características. Na investigação experimental de laboratório é possível imprimir maior precisão às etapas da investigação. O grau de subjetividade é reduzido pela adoção de rigorosos controles, que servem também de parâmetro para a comparação dos resultados. A pesquisa populacional é a abordagem central dos estudos epidemiológicos e, a partir desse momento, será estudada mais profundamente. Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos66/127 1. Classificação dos Métodos Utilizados em Epidemiologia Muitos são os critérios para classificar os métodos utilizados na epidemiologia, de- pendendo do ângulo a partir do qual os métodos são enfocados. A seguir, conheça alguns desses critérios e classificações. 1.1 Experimentação x Observação As informações científicas podem ser geradas por experimentação ou por observação. Os estudos experimentais destinam-se a testar uma associação entre eventos, buscando verificar se há relação causal entre eles, e as condições de estudo estão sob controle direto do pesquisador. Já nos estudos observacionais não há intervenção e a investigação acontece a partir da observação de situações que ocorrem naturalmente. Os objetivos deste tipo de estudo são descrever a distribuição de um parâmetro na população ou testar uma hipótese sobre associação entre dois eventos, sem usar experimentação. 1.2 Estudo Descritivo x Analítico Esta é uma das classificações mais utilizadas na epidemiologia. Os estudos descritivos têm o objetivo de informar sobre a distribuição de um evento na população em termos quantitativos e Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos67/127 podem ser de incidência ou prevalência. Não há formação de grupo controle e por isso são considerados estudos não controlados. Exemplo: a prevalência de hepatite B entre voluntários à doação de sangue; as principais causas de óbitos da população de um dado município. Os estudos analíticos estão subordinados a uma questão científica – a hipótese, que relaciona eventos: uma suposta causa e um dado efeito. O intuito deste tipo de estudo é explorar em profundidade essa relação causa-efeito. Há presença de um grupo de controle formado simultaneamente com o grupo de estudo que serve para a comparação dos resultados. Exemplo: a exposição de umindivíduo a um fator de risco e a ocorrência da diabetes. O modo como os grupos de estudo e controle são formados gera os diferentes tipos de estudos analíticos (estudo experimental randomizado, estudo de coorte, estudo de caso controle e estudo transversal). As principais características desses estudos serão apresentadas mais a frente, nesta aula. 1.3 Estudo de caso x Série de casos O que diferencia um tipo de estudo do outro é a quantidade de indivíduos investigados. A inclusão de um ou poucos indivíduos caracteriza o estudo de caso. Um número maior de pessoas incluídas na investigação constitui a série de casos. Nesses estudos, não há grupo de controle e Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos68/127 por isso também são considerados estudos não controlados. 1.4 Estudo controlado x Estudo não controlado O termo “estudo controlado” está relacionado a dois aspectos dos estudos – neutralização de fatores que confundem a interpretação dos resultados e existência de grupo de controle – embora o segundo critério tenha sido o mais utilizado para diferenciar esses tipos de estudo. Em epidemiologia, existe um consenso entre os especialistas de que para melhor testar as hipóteses é conveniente dispor de grupo de controle, de modo a possibilitar um referencial adequado de comparação (PEREIRA, 2005). 1.5 Estudo Transversal x Longitu- dinal Transversal, seccional e prevalência são termos utilizados como sinônimo e quando os dados relativos aos indivíduos que compõem a amostra do estudo referem- se a um determinado momento na vida das pessoas. Exemplo: renda familiar, estado imunitário das crianças naquele dia. Em investigações desse tipo, não há seguimento das pessoas para saber efeitos decorridos depois de passado certo tempo. Longitudinal refere-se à pesquisa em que cada indivíduo é observado em mais de uma ocasião. Este tipo de investigação Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos69/127 tem o sentido de detectar mudanças no indivíduo com o passar do tempo. Exemplo: investigação do crescimento e desenvolvimento de crianças. 1.6 Estudo Prospectivo x Retros- pectivo O termo prospectivo tem a conotação de “seguimento” do presente ao futuro, ou seja, de ligação de um evento atual com um evento futuro. A condição para que uma pesquisa seja considerada prospectiva é a circunstância de o efeito ainda não ter ocorrido quando os participantes iniciarem o estudo. Exemplo: em pesquisa sobre o hábito de fumar, os fumantes são acompanhados para verificar os resultados clínicos que possam estar relacionados ao hábito de fumar. O termo retrospectivo tem a conotação de utilização de dados do passado sobre a exposição ou doença. Exemplo: manutenção de um arquivo sobre a evolução de uma doença. 1.7 Estudo Paralelo x Cruzado Em investigações comparativas, quando os indivíduos participantes do estudo são mantidos no mesmo grupo em que foram colocados desde o início até o final da pesquisa, caracteriza-se um estudo paralelo. Em contrapartida, quando há mudança de um grupo para outro após um certo tempo Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos70/127 de observação, temos um estudo cruzado. 1.8 Estudo Experimental x Quase experimental A palavra experimental caracteriza qualquer investigação na qual o pesquisador decide quais pessoas ou grupos serão expostas ou não ao fator cujo efeito está sob pesquisa, ou seja, há o controle do pesquisador sobre as variáveis pesquisadas. As investigações quase experimentais são definidas como experimentos em que o investigador não tem completo controle sobre a alocação ou o momento da intervenção (LAST, 1988). Além disso, esses estudos implicam uma intervenção e não há emprego da alocação aleatória na formação dos grupos de comparação. 1.9 Estudo Randomizado x Não randomizado Estes termos são utilizados em relação ao controle da composição dos grupos pertencentes ao estudo. Diz-se que um estudo é randomizado quando os grupos são alocados a partir de processos aleatórios de seleção de casos, buscando uma distribuição equilibrada de variáveis de confundimento. Já nos estudos não randomizados, os grupos experimental e de controle são escolhidos a partir de critérios de Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos71/127 disponibilidade ou conveniência (FILHO; ROUQUAYROL, 2006). 2. Principais Tipos de Estudos Epidemiológicos Nesta seção serão apresentadas as principais características, vantagens e limitações dos principais estudos epidemiológicos. 2.1 Estudo Experimental: o ensaio clínico randomizado O ensaio clínico randomizado é um tipo de experimento no qual os indivíduos são alocados aleatoriamente nos grupos de estudo (ou experimental) e controle (ou testemunha) de modo a serem submetidos a uma intervenção e terem seus efeitos avaliados. Através desse tipo de pesquisa, visa-se responder uma questão central: quais são os efeitos da intervenção? O ensaio clínico randomizado é considerado o padrão de excelência de todos os métodos de investigação em epidemiologia, pois é o que produz evidências mais diretas para esclarecer uma relação de causa e efeito entre dois eventos. O delineamento desse tipo de estudo pode ser esquematizado em etapas. Primeiramente, escolhe-se a população para a realização da pesquisa em função Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos72/127 de ser portadora de características específicas, que interessam para a hipótese em estudo. Cada indivíduo que aceita participar do estudo é colocado aleatoriamente em um dos grupos. O intuito é formar dois grupos semelhantes a fim de diminuir os efeitos dos fatores que poderiam causar confusão na interpretação dos resultados. O grupo experimental recebe o tratamento que está sendo testado e o grupo de controle recebe o alternativo. Os grupos são acompanhados, observados ou examinados de maneira semelhante. O objetivo desse tipo de estudo consiste em introduzir um fator de diferença entre os grupos e verificar o impacto do tratamento diferencial, através da comparação dos resultados. Entre as principais vantagens desse método podemos citar: • Alta credibilidade como produtor de evidências científicas. • A qualidade dos dados sobre a intervenção e os efeitos pode ser de excelente nível, já que é possível proceder à sua coleta no momento em que os fatos ocorrem. • A interpretação dos resultados é simples, pois estão relativamente livres de fatores de confundimento. Entre as limitações, podemos apontar: • Por questões éticas, muitas situações não podem ser experimentalmente Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos73/127 investigadas, como os efeitos de virose na gravidez sobre o recém- nascido. • Requer estrutura administrativa e técnica de porte razoável, estável e bem preparada. • Exigência de população estável e cooperativa. 2.2 Estudo de Coorte Trata-se de uma pesquisa em que um grupo de pessoas é identificado, a informação sobre a exposição de interesse é coletada e o grupo é seguido no tempo com o objetivo de determinar quais de seus membros desenvolveram a doença e se essa exposição prévia está relacionada à doença. Formam-se dois grupos, os “expostos” e os “não expostos”, de modo que os resultados sejam comparados. Vale ressaltar que a exposição neste caso não é aleatória. A questão a ser esclarecida por um estudo de coorte é: quais os efeitos da exposição? Em relação ao delineamento do estudo, uma população ou amostra é selecionada em função de apresentar características que possibilitem a investigação. Por observação determina-se o nível de exposição a que a população está ou esteve submetida, então, a incidência dos desfechos clínicos nos doisgrupos é determinada por acompanhamento. Entre as vantagens desse tipo de estudo, Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos74/127 podemos destacar: • Não há problemas éticos quanto às decisões de expor as pessoas a fatores de risco ou tratamentos. • A qualidade dos dados sobre a exposição pode ser de excelente nível, já que é possível coletar os dados no momento em que os fatos ocorrem. • Os dados referentes à exposição são conhecidos antes da ocorrência da doença. • Quanto às limitações, pode-se destacar: • O número de pessoas a ser acompanhado costuma ser grande. • Mudança de categoria de exposição pode levar a erros de classificação de indivíduos quanto à exposição. • Em muitas situações os resultados somente são obtidos após longo prazo de seguimento. Os estudos de coorte podem ser classificados em prospectivo e histórico, e o critério para diferenciá-los é a exposição do investigador frente aos acontecimentos. No estudo de coorte prospectivo, o investigador acompanha de corpo presente o desenrolar da investigação e é em direção ao futuro. O pesquisador toma conhecimento da exposição nas pessoas antes de ocorridos os desfechos clínicos. No estudo de coorte histórico ou retrospectivo, o investigador tem a Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos75/127 consciência de que tanto a exposição quanto a doença já ocorreram e que os dados de interesse podem ser recolhidos por pesquisas em arquivos ou por anamnese. 2.3 Estudo de Caso Controle Esse tipo de estudo parte do efeito de elucidar a causa. As pessoas são escolhidas porque têm a doença (os casos) e pessoas comparáveis que não possuem a doença (os controles) são investigadas para saber se foram expostas a fatores de risco, de modo a determinar se esses fatores de risco são causas da doença. É uma pesquisa retrospectiva – parte do doente. A questão de pesquisa a ser respondida é: quais as causas da doença? Em linhas gerais, o delineamento da pesquisa se inicia com a escolha de uma população para o estudo, em função de apresentar características de interesse. Especificam-se com objetividade os critérios de inclusão e exclusão para definir o que seja um caso da doença. A cada caso são escolhidos controles adequados que devem ter tido a mesma probabilidade de serem expostos ao fator de risco em investigação, mas que não devem ter a doença. Em seguida, verifica-se o nível de exposição ao fator de risco dos grupos de caso e controle. A coleta de dados, nesse tipo de estudo, pode ser feita através de Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos76/127 entrevista ou pesquisa em prontuários, atestados e resultados de exames laboratoriais. O importante é a coleta ser feita com o mesmo rigor para os dois grupos a fim de evitar um viés de aferição. Quanto às vantagens desse tipo de estudo, cita-se: • Os resultados são obtidos rapidamente. • Baixo custo. • Muitos fatores de risco podem ser investigados simultaneamente. • Não há necessidade de acompanhamento dos participantes. Entre as limitações temos: • A seleção do grupo de controle é uma grande dificuldade. • Os dados de exposição no passado podem ser inadequados, incompletos nos prontuários ou falhos quando baseados na memória das pessoas. • Se a exposição é rara, pode ser difícil realizar o estudo ou interpretar os resultados. 2.4 Estudo Transversal Este tipo de investigação, também chamado de seccional, corte ou corte transversal, representa a forma mais simples de pesquisa populacional. É uma pesquisa em que a relação exposição- doença é examinada em uma dada população, em um dado momento. Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos77/127 A população em um estudo transversal é reunida em momento definido pelo investigador que, em geral, refere-se à coleta de dados. Uma população é selecionada para o estudo em função de apresentar características que possibilitem a investigação, são coletados os dados de cada indivíduo e somente na análise é que os grupos de expostos e não expostos são formados, pois é apenas nessa fase que essas informações são conhecidas. As questões científicas que um estudo transversal visa responder são: quais as frequências do fator de risco e da doença? A exposição ao fator de risco e a doença estão associadas? Os resultados informam sobre a situação existente em um momento particular, característica muito útil para o planejamento em saúde. Entre as principais vantagens desse tipo de estudo, destacam-se: • Simplicidade e baixo custo. • Rapidez – os dados referem-se a um único momento e podem ser coletados em um curto período de tempo. • Objetividade na coleta de dados. • Não há necessidade de seguimento das pessoas. • Boa opção para descrever as características dos eventos na Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos78/127 população. Quanto às limitações, pode-se citar: • Dados da exposição atual não podem representar a exposição passada. • A relação cronológica entre os eventos pode não ser facilmente detectada. • Não determina risco absoluto, é possível uma estimativa direta. • Possibilidade de erros de classificação, os casos podem não ser mais casos no memento da coleta. 2.5 Estudos Ecológicos Também conhecidos como estudos de grupos, de agregados, de conglomerados, estatísticos ou comunitários, trata-se de uma pesquisa realizada com estatísticas e a unidade de análise é constituída de grupos de indivíduos, não se sabe se um particular indivíduo da população investigada é exposto ou doente, apenas as informações globais estão disponíveis, por exemplo, a proporção de expostos e doentes naquela população. Entre as vantagens dos estudos ecológicos estão: • Simplicidade e baixo custo, não há fase de coleta de dados caso a caso. • Rapidez. • As conclusões são generalizáveis com mais facilidade do que em estudos Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos79/127 em base individual. Entre as limitações estão: • Não há acesso a dados individuais, só a informações estatísticas. • Nem sempre o que se aplica ao todo é aplicável a cada parte desse todo. • Possibilidade de efetuar muitas comparações, o que facilita encontrar correlações apenas ao acaso. • Dados de fontes diferentes podem significar qualidade variável da informação. Os estudos ecológicos são muito utilizados para levantar as possíveis relações causais, para testar hipóteses etiológicas e avaliar o efeito das intervenções. É possível também planejar um estudo desse tipo, incluindo no planejamento a randomização de áreas e outros agregados. Depois da alocação aleatória, faz-se a intervenção de modo que certas áreas ou grupos sejam expostos a uma forma de tratamento, caracterizando o grupo experimental, enquanto as demais sirvam de controle, visto que não recebem o tratamento em foco. Unidade 3 • Estudos Epidemiológicos80/127 Glossário Delineamento: modelo de organização do estudo que deve ser definido de acordo com os objetivos da pesquisa e do objeto de estudo. Nível de exposição: observação da exposição intencional ou ao acaso de um fator ou mais fatores de risco em um indivíduo ou população. Variáveis de confundimento: quando parte do efeito observado de um fator de exposição resulta da presença de uma ou mais variáveis, que estão relacionadas tanto com a doença sob estudo quanto com a exposição de interesse na base populacional. Questão reflexão ? para 81/127 Acesse os acervos de revistas científicas, selecione um artigo e identifique qual tipo de estudo foi utilizado, destacando suas características, vantagens e limitações. 82/127 Considerações Finais » O ensaio clínico randomizado é um tipo de experimento
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