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Rafael Dias Toitio
O mito de que vivemos em uma democracia plena se desfaz sempre que é realizada uma pesquisa a respeito da situação de algum grupo social subalterno. O caso do grupo formado por travestis, lésbicas, gays, transexuais, transgêneros e bissexuais (LGBTs) não é diferente. Pelo contrário. A concepção dominante de que a heterossexualidade é uma característica natural – e não socialmente construída – sustenta a desigualdade político-cultural existente entre os heterossexuais e os não-conformados sexualmente.
Isso se reflete, concretamente, nas diversas formas de discriminação e preconceito às LGBTs nas diferentes esferas de convívio social (família, trabalho, escola etc.). As formas mais truculentas de opressão resultam, muitas vezes, em morte e assassinatos, num quesito em que o Brasil é um recordista. Pesquisa feita pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) revelou que, em 2011, um homossexual foi brutalmente assassinado a cada 33 horas no país, resultando ao todo em 266 homicídios. Já no primeiro semestre de 2012, foram 165 assassinatos, uma morte a cada 26 horas.
Tais dados atribuíram ao Brasil o título de país mais homofóbico do mundo. Aqui cabem duas considerações. Primeiro, o título se sustenta apenas quando comparamos as nossas estatísticas com as de outros países que também fazem esse levantamento, uma vez que muitos países sequer reconhecem formalmente a homossexualidade e a travestilidade. Em segundo lugar, os dados levantados pelo GGB são retirados sobretudo de notícias de jornais e dados policiais, o que não abrange os assassinatos que não são divulgados pela mídia nem denunciados aos órgãos policiais e jurídicos. Os números, nesse sentido, podem ser muito maiores.
De todo modo, é importante apontar que, durante os últimos anos, se multiplicou o número de pesquisas sobre as LGBTs e a homofobia no Brasil. Importantes iniciativas promovidas por fundações e centros de pesquisa, programas de pós-graduação, governo e ONGs. Contudo, falta ainda uma pesquisa mais ampla e representativa de cada estado que nos ofereça o perfil socioeconômico das LGBTs brasileiras. Uma investigação veiculada pelo Relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Igualdade no trabalho: um desafio contínuo, de 2011, mostrou, por exemplo, que os trabalhadores e trabalhadoras homossexuais ganham um salário de 3% a 30% menor do que os trabalhadores e trabalhadoras heterossexuais, além de enfrentarem barreiras no acesso ao emprego na maioria dos países.
Isso aponta que a desigualdade não é apenas política e cultural, mas pode ser também econômica. Além disso, cabe olhar para as LGBTs das classes populares, que são as mais vulneráveis às formas de preconceito e opressão. Uma pessoa LGBT das classes ricas tem, em geral, maior possibilidade de encontrar espaços de sociabilidade onde possa exercer sua sexualidade sem grande repressão, já que o dinheiro lhe dá acesso à segurança e ao silêncio de pessoas preconceituosas. Na outra ponta, as LGBTs das camadas populares estão mais propensas às práticas de violência, preconceito e discriminação, inclusive por policiais. Um levantamento feito, em 2009, pela ONG Conexão G, que tem sede no Complexo da Maré na cidade do Rio de Janeiro, revelou que todos os dias pelo menos um homossexual é agredido nas comunidades carentes cariocas. E, como se isso não bastasse, tais práticas de violência homofóbica, cujo “tom” é dado pelas desigualdades sociais de classe, permanecem em geral no anonimato.
É evidente que as LGBTs de todas as classes estão vulneráveis a constrangimentos morais e físicos e a assassinatos. Contudo, em um país onde a desigualdade social e econômica fundamenta sua estrutura política e social, avançar nas investigações sobre a violência homofóbica significa, entre outros elementos, aprofundar a forma como a opressão se dá nas diferentes classes. O que nos levaria necessariamente a considerar também a questão racial e as especificidades da população negra, haja vista que as relações de classe e de “raça” no Brasil encontram-se imbricadas. Isso ajudaria na fundamentação de políticas de combate à homofobia, seja na formulação de políticas públicas, seja na elaboração das estratégias traçadas pelos grupos e militantes do movimento LGBT.
É importante apontar que a ideia de homofobia está muito relacionada à homossexualidade masculina e que, por isso, o movimento tem utilizado também as expressões transfobia, lesbofobia e bifobia.
No último dia 15/9, o juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, concedeu uma liminar que afronta o debate sobre direitos LGBT: determinou ao Conselho Federal de Psicologia que não interprete a Resolução CFP nº 01/1999 de modo a impedir que psicólogos e psicólogas promovam estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re)orientação sexual.
Em outras palavras, a decisão do magistrado permite que profissionais da psicologia façam estudos e ofereçam terapias com a temática de (re)orientação sexual, abrindo brecha para o entendimento que a homossexualidade pode ser curada.
A Organização Mundial da Saúde, desde 1990, defende que a homossexualidade não é doença e sim uma variação natural da sexualidade humana. A posição foi tomada a partir de estudos científicos no campo da psicologia.
A Resolução do CFP, alvo da decisão, é fundamentada em importantes argumentos: aponta que homossexualidade não é doença, distúrbio ou perversão; que na sociedade há “inquietação” em torno de práticas sexuais desviantes; e que a psicologia deve contribuir para explicitar questões na área, permitindo a superação de preconceitos. Além disso, determina que psicólogos e psicólogas não exerçam qualquer atividade que transforme a homossexualidade em doença e veta que a categoria se pronuncie sobre o assunto de modo a reforçar preconceitos presentes na sociedade.
O CFESS divulgou nesta semana um vídeo criticando a decisão judicial e manifestando apoio ao CFP, argumentando que o Código de Ética do/a Assistente Social defende que o exercício do Serviço Social deve ocorrer sem qualquer tipo de discriminação em razão da orientação sexual e identidade de gênero, e que a categoria deve se empenhar na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade.
Entretanto, alguns comentários na publicação do vídeo mostram que uma parte da categoria de assistentes sociais ainda apresenta resistências a este debate, seja por uma interpretação equivocada do Código de Ética, seja porque se fundamenta em argumentos de cunho religioso, ou ainda porque se apoia na concepção de uma pretensa liberdade de psicólogos/as que, ao oferecerem cura para algo que não é doença, reforçam o preconceito que está na sociedade.
“Isto sim é o que adoece e mata a população LGBT: o preconceito e a discriminação da sociedade. Portanto, o/a assistente social que defende a posição do magistrado, e que acha que a homossexualidade é uma doença que pode ser curada, está desconsiderando todo o debate que o Serviço Social brasileiro faz há mais de uma década sobre a defesa dos direitos LGBT. Pode, inclusive, estar cometendo uma infração ética se, em um atendimento a uma usuária LGBT, dizer que a pessoa pode ser ‘curada’, como se sua orientação sexual fosse o problema”, afirma a vice-presidente do CFESS, Daniela Neves.
A decisão judicial também abre temerosos precedentes para interferência nas atividades precípuas dos Conselhos de Profissões Regulamentadas. “São órgãos como CFP e CFESS que regulam, orientam e fiscalizam questões referentes às suas respectivas áreas de saber, e se embasam em conhecimento teórico-metodológico específico e nos valores éticos universais de respeito à diversidade humana”, completa Daniela.
O vídeo também reafirma a campanha do Conjunto CFESS-CRESS pela livre orientação e expressão sexual, de 2006, chamada: O Amor Fala todas as Línguas - Assistente Social na luta contra o preconceito.
“É tarefa nossa contribuir para eliminar, nos nossos espaços de trabalho, práticas discriminatóriase preconceituosas quanto à orientação sexual e identidade de gênero. Atendemos pessoas que vivenciam cotidianamente a discriminação e a violência que atingem a população LGBT. Buscar intervir nessa realidade, em articulação com movimentos sociais, órgãos de defesa dos direitos humanos, entidades da própria categoria profissional, entre outros, construindo uma prática de combate ao preconceito e buscando viabilizar o acesso a direitos e serviços, é uma contribuição imprescindível que temos que prestar", finaliza a vice-presidente do CFESS.
erviço Social e direitos da população LGBT
Não faltam instrumentos teórico-político-normativos do Conjunto CFESS-CRESS em relação à defesa dos direitos da população LGBT. A começar pelo Código de Ética do/a Assistente Social, que traz princípios em defesa da liberdade, autonomia, diversidade da pessoa humana, e de luta contra a discriminação por orientação sexual, gênero, identidade de gênero e etnia etc. 
Em 2006, o Conjunto CFESS-CRESS lançou a campanha nacional pela liberdade de orientação e expressão sexual "O amor fala todas as línguas: assistente social na luta contra o preconceito", em parceria com o Instituto em Defesa da Diversidade Afetivo-Sexual (DIVAS), a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), a Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) e a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), e publicou a Resolução 489/2006, que estabelece normas vedando condutas discriminatórias ou preconceituosas, por orientação e expressão sexual por pessoas do mesmo sexo, no exercício profissional do/a assistente social.
Em 2010, o CFESS adotou o "Manual de Comunicação LGBT", que serve de orientação para imprensa e sociedade trazendo termos, leis, datas e outras informações que ajudam, sobretudo, os meios de comunicação a compreenderem a realidade e as necessidades do público LGBT. 
E mais recentemente, publicou a Resolução CFESS nº 615/2011, de 8 de setembro de 2011, que permite à assistente social travesti e ao/à transexual a utilização do nome social na carteira e na cédula de identidade profissional. A normativa possibilita a utilização do nome social nas assinaturas decorrentes do trabalho desenvolvido pelo/a assistente social, juntamente com o número do registro profissional.
"Entretanto, ainda tem assistente social que não apreendeu esse conteúdo e sentimos isso na pele, ao sermos atendidas em Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS)", reclama a travesti e militante LGBT paraense Symmy Larrat. Segundo ela, é preciso aprofundar o debate com a categoria sobre a diversidade e o atendimento ao/à usuário/a LGBT. "Às vezes, vemos o despreparo de alguns/as profissionais assistentes sociais, a começar pela forma de se referir ao público LGBT", afirmou. 
Mas para o assistente social e professor da UERJ, Guilherme Silva de Almeida, o Serviço Social, nos últimos anos, vem aprofundando a temática LGBT, pincipalmente no que diz respeito à produção acadêmica, o que contribui muito para o exercício profissional do/a assistente social. "A inserção da nossa profissão na questão dos direitos humanos LGBT precisa estar cada vez mais qualificada", apontou. 
Guilherme falou também da importância da participação dos/as assistentes sociais na Conferência que, segundo ele, aumentou em relação à primeira edição, mostrando que o Serviço Social está se apropriando sim do debate sobre a diversidade humana. "Lembro-me que na 1ª Conferência, em uma discussão que participei em um grupo de trabalho, militantes do movimento LGBT mostravam pouco entendimento sobre o Serviço Social, mais especificamente sobre a Política de Assistência Social. Alguns/as até achavam que era 'corporativismo' nosso. Aí eu questionei que se elas/as achavam que não existia pessoa LGBT em situação de rua, pessoa LGBT em situação de extrema pobreza, adolescente LGBT, idoso/a LGBT, pessoa LGBT com deficiência, o Serviço Social não seria necessário. Hoje, o cenário é outro: um maior número de assistentes sociais na Conferência e uma demanda maior de usuários/as LGBT de Serviço Social", relatou.
CFESS se reúne com assistentes sociais 
Nem a falta de espaço, nem o horário desfavorável foram capazes de desmobilizar a reunião organizada pelo CFESS com os/as assistentes sociais presentes na 2ª Conferência Nacional de Direitos Humanos de LGBT. Mais de vinte profissionais e estudantes marcaram presença no encontro, que aconteceu no horário de almoço do dia 16/12.
Os/as conselheiros/as Maurílio Matos e Marylucia Mesquita, da Comissão de Ética e Direitos Humanos do CFESS (CEDH), conversaram por mais de uma hora sobre as ações do Conjunto CFESS-CRESS em defesa dos direitos da população LGBT. Foram apresentados os posicionamentos do CFESS na defesa intransigente dos direitos humanos, da liberdade como valor ético central e do combate a todas as formas de preconceito e discriminação que se afirmam por meio da reprodução do machismo, sexismo, racismo, homofobia/lesbofobia/transfobia – ao não respeito à diversidade humana.
Segundo a coordenadora da CEDH, Marylucia Mesquita, a reunião "foi fundamental para dar visibilidade a uma área de atuação que ainda se afirma como 'marginal' no âmbito profissional, uma vez que tanto a população LGBT, bem como os/as assistentes sociais que afirmam suas identidades políticas como lésbicas, travestis, gays e transexuais, enfrentam, cotidianamente, a homofobia/lesbofobia/transfobia institucional, fruto do sistema de dominação heterosexista".  Ela fez questão de ressaltar as duas Resoluções do CFESS como subsídios importantes para a categoria e para a população LGBT no reconhecimento de seus direitos e a importância de os/as assistentes sociais divulgarem mais instrumentos e iniciativas.
Também na reunião foi discutida a questão da alteração do Cadastro Único no âmbito da Política de Assistência Social. "É um dos maiores desafios, uma vez que se trata de um instrumento que identifica e caracteriza as famílias, possibilitando conhecer sua realidade socioeconômica, trazendo informações do núcleo familiar e de cada um/a dos/as componentes da família. No entanto, a família LGBT não está visibilizada. Ora, se é com uma referência familiar heteronormativa que se trabalha, como estes/as usuários/as LGBT vão ter acesso aos seus direitos?", questionou Marylucia, afirmando que a população LGBT precisa ser reconhecida como usuária no Cadastro Único para, efetivamente, ter acesso aos programas e políticas sociais. "Por isso, é necessário que os/as assistentes sociais que atuam com esta população sistematizem suas experiências e invistam em pesquisas que permitam conhecer o perfil sócio econômico e cultural, para podermos identificar as reais necessidades e demandas desta população em quaisquer políticas, como Assistência Social, Saúde, Educação, Segurança, Habitação, dentre outras", completou. 
Para Maurílio Matos, "a reunião mostrou que já há, nos diferentes cantos do Brasil, assistentes sociais que, no seu dia-a-dia, constroem uma prática profissional de combate às diferentes expressões de homofobia, lesbofobia e transfobia. Também percebemos que a reunião foi um espaço importante de articulação entre os/as profissionais, na defesa de propostas importantes nas suas áreas de ação profissional, especialmente nos campos da Previdência, da Assistência Social". 
CFESS Manifesta, adesivo e cartaz 
Também durante a reunião, o CFESS lançou, oficialmente, o manifesto "Assistentes sociais em defesa da Diversidade Humana", produzido especialmente para a 2ª Conferência. "O Conselho Federal representa, aproximadamente 110 mil assistentes sociais em todo o Brasil e atua em conjunto com 25 Conselhos Regionais na fiscalização e orientação do exercício profissional, na defesa de um projeto profissional vinculado a um projeto societário anticapitalista, não patriarcal, antirracista e não heterosexista. É com base nesse entendimento que, no âmbito de sua atuação na defesa de uma ética libertária e emancipatória e na defesa intransigente dos direitos humanos, nos empenhamos na eliminaçãode todas as formas de preconceito, recusa toda forma de arbítrio e autoritarismo. E dessa forma incentivamos o respeito à diversidade e à participação de grupos socialmente discriminados", afirma trecho do documento.
Um adesivo com os dizeres "Homofobia é crime. Aprovação do PLC 122 já" também foi distribuído.  
E em resposta uma demanda dos CRESS e do próprio movimento LGBT, e cumprindo uma das deliberações do eixo Ética e Direitos Humanos do 40º Encontro Nacional CFESS-CRESS, o CFESS reimprimiu também cartazes da campanha "O amor fala todas as línguas: assistente social na luta contra o preconceito", que foi distribuído para os/as participantes. O material será enviado aos CRESS e Seccionais de Base para distribuição.
O Serviço Social, como profissão inserida na divisão sócia técnica do trabalho, tem se empenhado na garantia de direitos humanos, justiça social e cidadania5 . Ao estudar a reprodução das relações sociais embasada em um projeto societário, os profissionais passam a refletir sobre questões referentes não só à economia, mas também sobre a esfera política, social, ideológica e cultural, ou seja, sobre as varias determinações da questão social6 . Desta forma, reflexões relacionadas à compreensão da realidade nos trouxeram demandas ainda pouco estudadas, pois ficou notável a necessidade de apreender as varias expressões das desigualdades para construir formas de resistência e de defesa dos sujeitos, apreensão esta que é norteada por uma perspectiva de totalidade histórico-social, pois só assim apreendem-se as particularidades. O marco desta transformação é a década de 90, quando a Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS), baseada nos movimentos sociais de diferentes segmentos sociais e no amplo debate acadêmico em nível nacional, propõem as novas Diretrizes Curriculares, sobrepondo-se a de 1880. Portanto, os Assistentes Sociais nos vários espaços sócio-ocupacionais, a partir das transformações societárias que engrenaram e materializaram novas formas de ser e se mostrar da profissão, precisam desde então construir coletivamente reflexões analíticas, assim como propostas interventivas que pudessem responder as novas expressões da questão social na contemporaneidade. A partir desta formulação, entendemos o Serviço Social como uma profissão inserida na divisão sócio técnica do trabalho que ao longo do tempo construiu um projeto profissional crítico, com fundamentos históricos e teórico-metodológicos extraídos do materialismo histórico dialético, além de princípios éticos reiterando o compromisso com a classe trabalhadora. Este projeto profissional tem o profissional como ser prático-social dotado de liberdade, capaz de projetar coletivamente seu trabalho, buscando sua implementação por meio de sua atividade (IAMAMOTO, 2014). O Código de Ética do/a Assistente Social, traz como Princípio Fundamental, no inciso VI, o “empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças”. (CFESS, 2012) Ele representa e regula a atuação da Assistente Social, denunciando condutas discriminatórias e enaltecendo as diferenças e diversidades. Sendo assim, ressalta-se a importância deste profissional no ambiente escolar como um agente que pode elaborar estratégias na eliminação de preconceitos, pois o projeto ético-político é emancipador. No âmbito da produção científica na área de gênero no Serviço Social, as reflexões a respeito da diversidade sexual e dos direitos LGBT é ainda recente. Só nos últimos dez anos é que este cenário tem se modificado devido às manifestações públicas do movimento LGBT, que trouxeram ao debate denuncias de violência e a necessidade de leis de proteção. Desta forma, o mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva7 iniciado em 2002, é reconhecido como um marco de diálogo maior com os grupos LGBTS, no entanto, reconhecemos as limitações de tal governo, sobretudo por compreendermos todas as contradições8 colocadas em cena nos últimos anos.
A presença do neotomismo no Serviço Social marca profundamente a profissão desde a fundação da primeira escola de Serviço Social no Brasil. O Serviço Social, ao surgir atrelado ao projeto da reforma social da Igreja, a serviço de sua ideologia, carrega, além de sua prática, o seu ponto de vista teórico. Toda a visão de homem e de sociedade adotada na profissão se dará a partir da visão católica, tendo como sustentação filosófica o neotomismo.
Toda a visão de homem e de sociedade adotada na profissão se dará a partir da visão católica, tendo como sustentação filosófica o neotomismo.
A formação cristã do profissional em Serviço Social foi objeto de estudo de alguns encontros de Assistentes Sociais. Segundo Aguiar (1982), até 1967, quando é realizado o Seminário de Araxá, houve 14 convenções da Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social (ABESS), atual Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), onde o pano de fundo era a doutrina católica. Os encontros da ABESS comumente iniciavam-se com a celebração de uma missa e, por vezes, eram precedidos de um dia de recolhimento, aos moldes dos retiros espirituais promovidos pela Igreja a seus fiéis, tal era estreita a relação da profissão com a prática cristã católica. Na IV Convenção da ABESS, que ocorreu em São Paulo em 1954, o tema foi A formação cristã para o Serviço Social e a Metodologia de Ensino de Serviço Social de Grupo e Organização de Comunidade. Em 1959, em convenção realizada em Porto Alegre para discussão do currículo dos cursos de Serviço Social, foram reafirmadas como importantes para a formação integral do Assistente Social as disciplinas de Religião e Doutrina Social da Igreja. No discurso de encerramento deste evento foi salientada a missão dos Assistentes Sociais do seguinte modo: o cristianismo humanizante para a conquista da paz. E a exemplo de Maria, os assistentes sociais têm a tarefa de Anunciar a Redenção. (AGUIAR, 1982, p. 38). Em 1960, um novo encontro realizado em Fortaleza teve como tema Formação da Personalidade do Assistente Social em todos os Aspectos e os aspectos analisados foram: a formação psicológica, moral e espiritual.  No que se refere ao aspecto espiritual, enfatizou-se que o Assistente Social deve buscar a perfeição e que esta busca da perfeição seja iluminada pelo espírito comunitário e pela doutrina do Corpo Místico de Cristo.
Fica evidente, portanto, a importância dos ideais cristãos na formação dos primeiros Assistentes Sociais e a forte presença da postura humanista com base na doutrina social da Igreja e no neotomismo.
Os princípios de dignidade da pessoa humana, do bem comum, explicitados por Santo Tomás de Aquino, predominaram no Serviço Social brasileiro até a década de 1960, e podemos afirmar que ela continua presente ainda hoje, através da ação de vários profissionais.
O QUE É O NEOTOMISMO?
O neotomismo é uma corrente filosófica surgida no século XIX com o objetivo de reviver a filosofia de Santo Tomás de Aquino, do século XIII, o tomismo, a fim de atender aos problemas contemporâneos. A condição de exploração e miséria em que vivem os operários na Europa do final do século XIX, decorrentes da industrialização e do desenvolvimento do capitalismo, leva a Igreja a se posicionar, pois este momento era visto por esta como de crise e decadência da moral e dos costumes cristãos. A Igreja vê, então, no ressurgimento das ideias de Tomás de Aquino o caminho para o enfrentamento desta realidade.
O QUE É O TOMISMO?
Se o neotomismo, que é a corrente que influencia o Serviço Social, é uma retomada do tomismo, então é preciso entender o que é o tomismo.
O Tomismo é a doutrina filosófica cristã elaborada pelo dominicano Tomás de Aquino, estudioso do filósofo grego Aristóteles. Tomás de Aquino dedicou-se ao esclarecimento das relações entre a verdade revelada e a filosofia, isto é, entre a fé e a razão. Segundo sua interpretação, tais conceitos não se chocam nem se confundem, mas sãodistintos e harmônicos.
Segundo Aguiar (1982), Santo Tomás parte da reflexão feita por Aristóteles e a reinterpreta à Tomás de Aquino dedicou-se ao esclarecimento das relações entre a verdade revelada e a filosofia, isto é, entre a fé e a razão, luz do cenário filosófico de sua época, marcado por questões como: as relações entre Deus e o mundo, fé e ciência, teologia e filosofia, conhecimento e realidade.
Para Santo Tomás, a primeira realidade a ser explicada deve ser Deus, que é a fonte de todos os seres. Após analisar a existência de Deus, analisa o homem, a pessoa humana, entendendo que a pessoa humana é composta de duas substâncias incompletas: alma e corpo. É da transformação destas duas substâncias em uma substância única que resulta o ser humano, distinto de qualquer outro ser. Este ser dotado de razão é capaz de escolha, de saber, de vontade.
Por ser inteligente, afirma Santo Tomás, a pessoa significa o que há de mais perfeito em todo o universo. (AGUIAR, 1982, p. 42). Esta perfeição se apresenta no aspecto físico e espiritual. Para Santo Tomás, o corpo humano é o mais perfeito, o mais funcional e o mais complexo e a pessoa humana tem também uma perfeição espiritual que se manifesta através da racionalidade. Esta racionalidade produz o princípio da consciência em si e da liberdade, que o distingue dos outros seres.
Portanto, a liberdade e a capacidade de escolha é também manifestação da inteligência do homem. Mas o homem é também dotado de vontade, o que lhe permite a escolha dos caminhos a percorrer na busca da virtude, do bem e no alcance do fim último, que é Deus.
O homem é, também, um ser social em decorrência da própria natureza humana. Como Aristóteles, Santo Tomás afirma que o homem é naturalmente um animal social e para desenvolver-se necessita viver em sociedade.
Para Santo Tomás a sociedade é a união dos homens com o propósito de efetuar algo comum (COOK apud AGUIAR, 1982, p. 43). toda forma de governo, desde que garanta os direitos da pessoa e o bem-estar da comunidade é boa e o Estado deve respeitar a Igreja, assim não existe conflito entre fé e razão. Toda forma de autoridade deriva de Deus, respeitá-la é respeitar a Deus. (SCIACCA apud AGUIAR, 1982, p. 43). Esta visão com relação à autoridade e ao Estado, reafirmada posteriormente no neotomismo, explica a posição inicial do Serviço Social brasileiro de não questionamento da ordem vigente, buscando sempre reformar a sociedade.
O Neotomismo e o Serviço Social
A repercussão do neotomismo na teoria e na prática profissional dos Assistentes Sociais pode ser percebida até hoje. A idealização de um projeto societário que contemple as duas dimensões do homem: o corpo e a alma, e a visão da sociedade como a instância na qual o homem pode completar-se e realizar-se como pessoa humana leva os Assistentes Socais a recusa, como sugeria a Igreja Católica, do comunismo e do liberalismo.
O comunismo é interpretado, pelos primeiros Assistentes Sociais como uma teoria social refutável porque postula um projeto societário erigido por uma compreensão materialista do homem e era tido como uma doutrina totalitária com princípios dissonantes com o conceito de pessoa humana.
O liberalismo, por sua vez, também era incompatibilidade com a natureza humana, pois era tido como uma doutrina individualista.
Nesse contexto, o trabalho dos primeiros assistentes sociais dirigia-se, sobretudo, à classe trabalhadora, porém na perspectiva da conciliação das classes sociais. A visão de homem do Serviço Social era a pessoa humana, portadora de valor soberano, criado por Deus, único ser no universo capaz de se aproximar da perfeição.
O objetivo do Serviço Social era moldar este homem, integrá-lo à sociedade, aos valores, a moral e aos costumes de uma sociedade cristã, a fim de que ele alcançasse a perfectibilidade. Somente na década de 1960 estas ideias vêm a ser questionadas, porém ainda hoje pode ser observada a presença de princípios cristãos no discurso de profissionais e alunos de Serviço Social.
Tomás de Aquino viveu de 1225 a 1274 e teve uma vida dedicada aos estudos, inicialmente sob a orientação de monges beneditinos e, posteriormente, em Paris sob a orientação de Alberto Magno. Era um estudioso metódico, que se empenhou em ordenar o saber teológico e moral acumulado na Idade Média, produzindo uma extensa obra com mais de sessenta títulos. Nasceu em 1225, no castelo de Roccasecca, na Campânia, da família feudal dos condes de Aquino. Era unido pelos laços de sangue à família imperial e às famílias reais da França, da Sicília e de Aragão. Recebeu a primeira educação no grande mosteiro de Montecassino, passando a mocidade em Nápoles. Depois de ter estudado artes liberais, entrou na ordem dominicana, renunciando a tudo, menos à ciência. Dedicou-se ao estudo da teologia, tendo como mestre Alberto Magno, primeiro na universidade de Paris (1245-1248) e depois em Colônia. Em 1252, voltou à Universidade de Paris, onde ensinou até 1269. Em 1272, voltou a Nápoles, onde lecionou teologia. Dois anos depois, em 1274, viajando para tomar parte no Concílio de Lião 2, por ordem de Gregório X, faleceu no mosteiro de Fossanova, entre Nápoles e Roma, com apenas 49 anos de idade.
Papel de Gênero - É o comportamento social, culturalmente determinado e historicamente circunscrito, esperado para homens e mulheres. “comportamento masculino” X “comportamento feminino” Espera-se que meninos gostem de azul, brinquem com carrinhos, e que meninas gostem de rosa e brinquem com bonecas. Espera-se que mulheres sejam sensíveis e usem cabelos compridos, e que homens sejam fortes e não chorem. Estes comportamentos são construídos culturalmente, variam de acordo com a sociedade e não são “naturais”, ou seja, não nascem com a pessoa. O fato de uma pessoa nascer com um pênis não signifi ca que ela irá automaticamente gostar de futebol e “falar grosso”. Da mesma forma, nascer com uma vagina não faz com que a pessoa seja emotiva e vaidosa. Assim, o que é ser homem e o que é ser mulher são construções sociais e não comportamentos “naturais” decorrentes das diferenças entre sexos biológicos. Todos nós, independente do sexo biológico, combinamos características e comportamentos considerados masculinos e femininos, cada um/a de uma maneira diferente!
1. NEOTOMISMO Universidade Católica de Brasília Pró- Reitoria de Graduação Disciplina: Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos do Serviço Social I Professora: Késia Miriam Santos de Araújo Alun@s: Cleber Eduardo de Andrade – UC13101706 Joelia Nogueira de Lima - UC Tânia Rodrigues - UC
2. Tomás de Aquino (em italiano: Tommaso d’Aquino), foi um frade dominicano e sacerdote italiano cujas obras tiveram enorme influência na teologia e na filosofia, principalmente na tradição conhecida como escolasticismo, e que, por isso, é conhecido como "Doctor Angelicus", "Doctor Communis" e "Doctor Universalis" "Aquino" é uma referência ao condado de Aquino, uma região que foi propriedade de sua família até 1137. Ele foi o mais importante proponente clássico da teologia natural e o pai do tomismo. Sua influência no pensamento ocidental é considerável e muito da filosofia moderna foi concebida como desenvolvimento ou oposição de suas ideias, particularmente na ética, lei natural, metafísica e teoria política. Ao contrário de muitas correntes da Igreja na época, Tomás abraçou diversas ideias de Aristóteles - a quem ele se referia como "o Filósofo" - e tentou sintetizar a filosofia aristotélica com os princípios do cristianismo. As obras mais conhecidas de Tomás são a "Suma Teológica" (em latim: Summa Theologiae) e a "Suma contra os Gentios" (Summa contra Gentiles). Seus comentários sobre as Escrituras e sobre Aristóteles também são parte importante de seu corpus literário. Vimos que o serviço social nasce no seio do trabalho social da Igreja católica, que, na virada do século XIX para o XX, busca enfrentar a questão social, agravada pelo desenvolvimento do capital.
3. Introdução Vimos também que esse enfrentamento tem como princípio e objetivofinal o trabalho apostólico dos leigos fiéis. Toda a prática assistencial foi, portanto, no período que vai de fins do século XIX até 1960 (no Brasil), um trabalho religioso.
4. Introdução Sendo assim, é evidente que a noção de caridade deveria estar no centro dessa prática. E nós vimos que a noção paulina de caridade teve importância crucial na teologia de Tomás de Aquino.
5. Introdução Não por acaso, assim, será o pensamento de Tomás que estará na base do trabalho social da Igreja. Contudo, a maneira como Tomás de Aquino influencia esse trabalho e, no bojo deste, o serviço social, é indireta: ela se faz pelo neotomismo.
6. Duas noções, duas ideias, são destacadas, no neoteomismo. São dois princípios: o da dignidade da pessoa humana; o do bem comum. É esse neotomismo, calcado nesses dois princípios, que será ensinado nas escolas de serviço social a partir de 1936.
7. Renascimento do Tomismo Nos séculos XVII e XVIII, o ensino do tomismo está em baixa. No XIX começa a ser retomado nas universidades. Mas quem dá o impulso maior – se seguirmos as palavras de Aguiar – será de novo Leão XIII, em sua encíclica Æterni Patris.
8. Renascimento do Tomismo (Cont.) Nesta encíclica aparece claramente a noção de “ordem e progresso”, transcrita na expressão “tradição e progresso”. Fica claro, também, segundo um historiador citado por Aguiar, que o pano de fundo desse restabelecimento do tomismo era uma luta entre formas de pensar diante da modernidade [p. 57] (ou p. 40).
9. Renascimento do Tomismo (Cont.) A Université Catholique de Louvain será o epicentro intelectual da restauração do tomismo, chefiada pelo Cardeal Mercier. A intenção era formar sob o novo tomismo não só padres mas também pessoas influentes ocupando postos de comando.
10.  Aguiar destaca alguns aspectos do pensamento tomista: 1) a “visão de pessoa humana”; 2) alguns “conceitos de sociedade e bem comum”; 3) “questão ética”. Destas três noções, a primeira é a mais importante.
11.  A união entre o corpo e a alma distingue o humano tanto das “inteligências separadas” – os anjos – quanto dos seres naturais orgânicos e inorgânicos. Tomás, ademais, fará uma distinção entre intelligentia (anjos) e intellectus (humanos).
12.  A união da alma com o corpo torna o corpo humano o mais perfeito entre todos os corpos do universo (que é o conjunto das coisas criadas). Isso porque, na ordem da criação, a alma vem logo após os anjos; em seguida, os corpos; logo...
13.  No homem, a perfeição da “inteligência” se manifesta na racionalidade. O homem é um corpo racional, e é isso o que distingue a pessoa humana. Pela razão, o homem é consciência de si, vontade, e liberdade.
14.  Liberdade implica moralidade, pois a liberdade para escolher isto ou aquilo implica responsabilidade pela escolha efetuada. E isso significa que a pessoa humana pode não cumprir o seu fim último, que é conhecer e unir-se a Deus.
15.  Desse desvio de percurso nascerão todos os problemas de ordem moral (pecado, mal etc.). Mas, realizando-o completamente, a pessoa cumpre o seu fim último e por isso realiza o progresso social, já que o homem é um “animal social”.
16.  Quer dizer, o homem só vive entre outros, na multitudo, em coletividade. A pessoa do homem é um “ser social”, que como tal deve buscar antes de tudo a perfeição do coletivo. O coletivo, aqui, está (e deve estar) acima do indivíduo.
17.  Isso significa que o bem comum está acima do bem individual – para realizar este, é preciso realizar aquele primeiro. Sociedade, para Tomás, não é outra coisa senão a união de homem com vistas a realização de alguma coisa que é comum a todos.
18.  Essa coisa comum é o “bem-estar da sociedade”, desde que esse possa ser partilhado por todos. (Compreendemos, então, a oposição da Igreja ao liberalismo). Só há comunidade se há partilha do bem comum.
19.  Mas o que é que garante e preserva essa comunidade? Lex aeterna, lex divina, lex humana, lex naturalis. A lei eterna é o plano racional de Deus ao criar o universo e todas as criaturas. Não podemos conhecê-la completamente, mas dela participamos.
20.  A lei divina é a lei revelada aos homens, na Bíblia. A lei natural é aquela presente no corpo humano e em outros; e como ela é necessariamente racional (já que feita pelo Criador inteligente), dela deriva a lei humana – o “direito positivo” do Estado.
21.  O Estado, portanto, sendo fruto da lei natural também presente no homem, é algo natural (e não histórico), como afirmava Aristóteles. E em todo Estado há autoridade – do contrário a lei humana não é respeitada e a desordem se instala.
22.  Ocorre, porém, que lex naturalis e lex humana se subordinam à sua fonte primeira, Deus; portanto, subordinam-se tanto à lex divina como à lex aeterna (a esta sobretudo).
23.  Logo, a autoridade que há em todo Estado deriva de Deus. E quem é o representante direto de Deus na Terra? A Santa Madre Igreja. Portanto, o Estado deve subordinar-se à autoridade da Igreja.
24.  Ora, a Igreja é uma instância que representa uma “ordem divina” e, portanto, “eterna”. Assim, não são os homens que devem decidir mudar ou transformar a sociedade, e sim os mandatários de Deus.
25.  Nessa perspectiva, toda aspiração à transformação (por exemplo, na forma da revolução) fica bloqueada. Eis por que o serviço social, em seus inícios, foi antes de tudo reformista, negando-se a si qualquer aspiração à transformação social (p. 43).
26.  A partir de 1920, haverá uma instituição católica que buscará fazer uma espécie de “ciência social” da Igreja: a “União Internacional de Estudos Sociais”. Na verdade, essa instituição foi criada especificamente para oferecer as bases teóricas da prática assistencial católica.
27.  A União foi fundada em Malinas, na Bélgica, e será inicialmente presidida pelo Cardeal Mercier. Este elaborará um documento, contendo o “catecismo” da intervenção social e política da Igreja. Trata-se do ´”Código de Malinas”.
28.  O principal neste código, além das afirmações baseadas em Tomás, é a afirmação de que economia e moral não se separam. Logo, a Igreja deve ser “fiscalizadora” da economia, já que é ela a guardiã da moral.
29.  Segundo o autor, o neotomismo irá exercer sua influência sobre a assistência social católica também através desse código. Em seguida, o autor trata do neotomismo especificamente no Brasil. Claro que quando falamos da transmissão do neotomismo estamos falando dos espaços onde isso era possível: nos centros e núcleo de estudos, mas sobretudo nas faculdades.
30.  As escolas de serviço social no Rio e em São Paulo, tendo recebido influências da mesma fonte – o catolicismo – seguiram caminhos muito parecidos. A diferença é que, em São Paulo, houve a Faculdade Livre de Filosofia e Letras do Largo de São Bento.
31.  Dela sairão professores e alunos que irão para as escolas de Serviço Social. Outra diferença é que São Paulo receberá o neotomismo quase que de sua fonte “original”: a Bélgica.
32.  No Rio, o neotomismo entra no serviço social mais ligado a instituições católicas locais, e o autor fala da presença dos jesuítas nesta história. E o importante é que lá o movimento da AC estará ligado diretamente ao nascimento da PUC-RJ. Na seqüência o autor trata especificamente de alguns neotomistas no Brasil. É interessante a trajetória e o papel de Van Acker, que se define como um restaurador da filosofia aristotélico-tomista.
33.  Ele virá inicialmente para a Faculdade de Filosofia do Largo de São Bento e posteriormente irá para a Escola de Serviço Social. Vocês podem imaginar a influência de suas palestras, à época (p. ex., a de 1941, intitulada “As bases do serviço social”). Outro nome importante, em São Paulo, será o de Alexandre Correia, primeiro tradutor da Suma Teológica no Brasil. Formado em São Paulo e na Bélgica. Note-se que ambos pretendem pôr o tomismo em diálogo com a contemporaneidade...
34.  Entre Rio e São Paulo, destaca-se o nome do padre Roberto Sabóia de Medeiros. Era conhecido como o “Apóstolo da Ação Social” católica. Aguiar destacaa presença de Sabóia tanto no universo acadêmico quanto no campo prático. Aliás, o depoimento dele é ilustrativo: nele aparece a proposta de Sabóia para acabar com a “briga de classe” (p. 48). Especificamente no Rio, há o Pe. Leonel Franca. Segundo o autor e os autores que ele cita, teria sido Franca o grande divulgador do tomismo no Brasil. Era considerado uma grande figura intelectual nos meios universitários católicos.
35.  Há outros dois padres citados entre os neotomistas brasileiros. O importante é que em todos eles a recuperação do tomismo se faz sob a sombra daquele que talvez seja o maior dos neotomistas no século XX: o cristão francês Jacques Maritain (1882-1973). A maior importância de Maritain foi a de ter influenciado uma parte da intelectualidade a voltar-se para o campo religioso. Uma parte da intelectualidade, inspirado nele, tentará conciliar universo intelectual e universo religioso.
36.  Claro que sempre se pode supor que essa parte dos intelectuais era a que já estava predisposta à “conversão” religiosa. É essa predisposição que explica que suas obras, até meados da década de 30, tenham sido aceitas passivamente, sem discussões. A principal obra de Maritain, no que concerne à Ação Católica e seus atos políticos e sociais, é o Humanismo integral, de 1936. Aí se oferecem certas fundamentações filosóficas para o trabalho social e defende-se uma nova relação entre a Igreja e o povo, no lugar das tentativas de relação entre Igreja e Estado.
37.  Maritain será o grande inspirador dos partidos democratas-cristãos (“Ê, Ê, Eimael, o democrata...”) em toda a América Latina. O humanismo de Maritain, claro, opõe-se ao humanismo burguês dos liberais da época. Lembremos que o Humanismo integral é uma obra cristã dirigida aos cristãos. Basicamente, o cerne da obra está em defender um novo papel histórico e político dos cristãos (p. 53-54).
38.  Uma das ideias de o Humanismo integral que irá influenciar os católicos, sobretudo aqueles desejosos de um conceito ou teoria que inspirasse sua ação social, será a noção de Ideal histórico. Para Maritain, toda época histórica tende a um ideal realizável, embora não necessariamente realizado na prática. Ideal, aqui, não seria simplesmente um modelo ideal fictício de sociedade que os homens anseiam ou tendem a desejar.
39.  O Ideal de Maritain se opõe, portanto, às utopias. Tratar-se-ia de um ideal histórico completo que seria, não um “ser de razão”, mas uma essência que, embora sendo ideal, seria contudo realizável aliás, Maritain, aqui, identifica uma noção utópica com um “ser de razão”; p. 54).
40.  O Ideal histórico é uma tendência a um certo grau de perfeição social, inscrito na ordem social vigente como uma de suas possibilidades. Maritain não é tão utópico: ele sabe que o ideal de cristandade é apenas uma das possibilidades de perfeição social.
41.  Para ele, porém, era a principal, a que deveria se concretizar; a melhor, a mais perfeita. Pois o clima histórico que ele identificava, em sua época, era o clima cristão. Portanto, o ideal de uma nova cristandade seria justamente aquele que se deveria buscar e concretizar.
42.  O objetivo é claro: no lugar de uma “civilização ocidental” ou “moderna”, Maritain propõe uma “nova civilização cristã”. Essa nova cristandade, é preciso notar, seria eminentemente leiga: a conversão pregada por Maritain é cristã, mas não necessariamente confessional.
43.  É interessante a visão religiosa de Maritain sobre a relação homem-sociedade. É uma visão em que transparece a presença de Agostinho e de Tomás de Aquino. Isso fica claro na ideia de que a existência – individual e social – comporta três dimensões: a comunitária, a personalista e a peregrinal.
44.  A dimensão comunitária enfatiza que o bem comum – seja ele de ordem material, espiritual ou moral - está acima do bem do indivíduo. Mas há algo próprio do indivíduo que está acima até mesmo do bem comum, do bem coletivo, social...
45.  Trata-se daquilo que é próprio da pessoa. Lembremos que a pessoa é um ente metafísico. Portanto, o fim último da pessoa não se confunde com bens e valores temporais. Sabemos qual é esse fim último: a união com Deus etc.
46.  Mas por isso mesmo, a vida na terra e em sociedade não é mais do que uma peregrinação. Uma passagem, uma caminhada rumo a algo superior. No entanto, Maritain afirma que isso não deve impedir os homens de fazer da terra um lugar viável de se viver.
47.  Pelo contrário: o lócus da via deve ser o melhor possível, justamente para facilitar a peregrinação. O que Maritain propõe, portanto, é uma espécie de “ascetismo intramundano” weberiano, mas de caráter mais social e coletivo.
48.  O Ideal histórico de uma nova cristandade, em Maritain, é certamente inspirado no ideal de cristandade da Idade Média. Ele sabe e admite isso. Mas como a época é outra, ele recupera a noção de analogia de Tomás de Aquino, fazendo um outro uso dela.
49.  Tomás, por sua vez, havia tirado a ideia de analogia de Aristóteles. Nos gregos antigos, a analogia tem um sentido matemático de proporção: a analogia exprime uma relação proporcional pela qual se pode igualar desiguais.
50.  Em Tomás, a analogia perde o sentido de proporção em favor da ideia de semelhança. E é por isso que Maritain falará de analogia como “similitude [Tomás] de proporções [Aristóteles e os gregos].
INTRODUÇÃO
Pesquisando as publicações dos primeiros assistentes sociais1 nos periódicos “Serviço Social – Órgão Doutrinário, Técnico e Informativo” (período de l939 a 1940) 2, observamos uma constante preocupação com um projeto societário que viesse a amenizar os efeitos nefastos do capitalismo, com a formação profissional, com a definição do objetivo e da prática do Serviço Social. Estas preocupações centralizavam-se no necessário respeito à pessoa humana e referiam-se à concepção de homem postulada pela perspectiva da filosofia neotomista preconizada pela Igreja Católica, naquele momento histórico. Nossa proposta, neste estudo, é analisar estas preocupações, sinalizando as concepções de homem a que se referem. Entendemos que é um estudo necessário à compreensão dos fundamentos filosóficos que subsidiaram a compreensão teórica dos primeiros assistentes sociais brasileiros acerca das premissas que deveriam subsidiar a prática do Serviço Social.
A concepção de homem e o projeto societário idealizado pelos primeiros assistentes sociais A concepção de homem dos primeiros assistentes sociais situava-se no horizonte metafísico. Eles entendiam que o homem, como pessoa humana, era portador de “valor soberano a qualquer outro valor temporal” (FERREIRA, T.P, 1939, p. 28) e tinha sua existência regulada por duas instâncias, uma temporal e outra determinante sobre a primeira, atemporal, entendida como parâmetro último para a sua realização enquanto pessoa que caminha para a vida eterna. A partir dessa concepção, estes assistentes sociais vinculavam o exercício profissional a princípios não submetidos ao movimento histórico. Sugeriam que a formação profissional do assistente social fosse orientada pela doutrina católica que era, segundo Telles (1940a, p.14), constituída por princípios verdadeiros, porque imutáveis. Doutrinas católicas, sobretudo a explicitada nas encíclicas Rerum Novarum (1881) e Quadragésimo Ano (1921), propunham o necessário envolvimento dos católicos com os problemas sociais advindos da questão social 3. Nessas propostas, ao referir-se, sobretudo, à exploração dos operários, as doutrinas explicitavam uma concepção de homem de inspiração neotomista. A partir dessa compreensão da Igreja e, também, da sugestão doutrinária com relação ao necessário retorno à filosofia de S.Tomás de Aquino (Encíclica Aerteni Patris, 1879), os primeiros assistentes sociais explicitavam uma filiação neotomista. Entendiam que o homem apresentava-se à nossa razão como composto de “corpo e alma [...] Ser social incompleto, utilizando-se da sociedade para o cumprimento de seu fim último” (TELLES, 1940a, p.4) . Jacques Maritain, uma das maioresexpressões inspiradoras da filosofia neotomista no Brasil, considera o homem como pessoa humana, dotado de corpo e alma e entende que a sociedade é uma instância da qual este homem não pode prescindir em sua existência corpórea. A sociedade, além de garantir a sobrevivência física do homem, permite-lhe atender à solicitude da alma (o fim atemporal). A partir desse pressuposto neotomista, os assistentes sociais idealizavam um projeto societário que contemplasse as duas dimensões do homem: o corpo e a alma. Neste sentido, a sociedade era entendida como “meio posto ao homem para colimar livre e plenamente sua destinação” (MANCINI, 1940a, p. 4). A sociedade é instância na qual o homem pode completar-se e realizar-se como pessoa humana. A partir dessa idealização de projeto societário, os primeiros assistentes sociais recusavam, como sugeria a Igreja Católica, o comunismo e o liberalismo. Interpretavam o comunismo como uma teoria social refutável porque postula um projeto societário erigido por uma compreensão materialista do homem. Refutavam-no, ainda, porque o entendiam como uma “doutrina totalitária”, com princípios incongruentes com o conceito de pessoa humana. E é por esta mesma via, pela sua incompatibilidade com a natureza humana, que estes assistentes sociais interpretavam os princípios do liberalismo como uma “doutrina individualista”. Segundo Mancini, seria necessário descartar a perspectiva do totalitarismo porque esta coloca a sociedade acima do indivíduo (“como alfa e ômega do ser”), simula uma “metamorfose da natureza humana[...] se assenta na ilusão de ter transformado a própria vida e criado o homem novo, o seu homem”. Essa perspectiva, ainda segundo Mancini, caracteriza o ideal do socialismo e preconiza o caráter social, em detrimento ao individual, levando à diluição de traços essenciais da pessoa humana, os quais, por princípio, seriam indestrutíveis, porque eternos 4. Por outro lado, continua Mancini, o ideário liberal, ao postular uma sociedade composta de indivíduos para que se cumpram finalidades individuais, também se distancia da verdade, porque o indivíduo é uma pessoa humana 5 . São as necessidades desta que devem prevalecer sobre as individuais, para que a “exaltação do elemento material” não se erija a partir de restrições à “esfera da dignidade humana” (TELLES, 1940a, p. 4). Estas teses partem da perspectiva neotomista de Maritain que considera o homem como indivíduo e pessoa, mas enfatiza a prioridade ontológica dessa em relação àquele. Para Maritain, é por ser pessoa e ter direito à dignidade que o indivíduo deve ter o mínimo de bem-estar, que não comprometa sua sobrevivência física, a ponto de destituir-lhe o direito a dedicar-se à realização na esfera a-temporal (fim último). Refutando o liberalismo e o comunismo, o Serviço Social, segundo Telles, deve apoiar-se em uma terceira via: uma doutrina que represente um meio termo entre o individualismo (doutrina liberal) e o coletivismo (perspectiva socialista), cujo parâmetro seja o exercício vital inerente à pessoa humana: o aperfeiçoamento com vistas ao fim supratemporal. Nesta terceira via, o modelo societário refere-se à harmonia entre as classes sociais organizadas sobre o ideário do bem comum postulado pela filosofia neotomista. Os primeiros assistentes sociais acreditavam que uma das maneiras possíveis para alcançar o bem comum era o retorno aos antigos modelos associativos das corporações medievais 6, identificados como formas de preservar o princípio natural da vida associativa necessária para que o homem, ser incompleto sem a sociedade, possa atingir seu fim último. Ao idealizar este modelo associativista, esses assistentes sociais partilhavam das críticas à sociedade moderna e voltavam-se a modelos de produção ultrapassados historicamente. Segundo Ferreira, a Revolução Francesa, uma das fontes de inspiração para a sociedade moderna, foi o “último golpe nos resquícios da sociedade medieval”, porque aboliu sem “substituir por coisa alguma as corporações” [...] “Indivíduo e Liberdade encontram-se frente a frente. Liberdade de Produção. Liberdade de Consumo. Liberdade de Indústria. Mas o operário sem nenhuma garantia diante do patrão. Sua liberdade consistia em aceitar, sem protestos, o salário e as condições que este lhe impunha, se não quisesse morrer de fome” (FERREIRA, P.L, 1939, p.6). A idealização do modelo medieval não se limita às corporações. Os assistentes sociais criticavam os valores morais e as diretrizes políticas e econômicas nascidas no mundo moderno. Neste sentido, Mancini salienta: “A sociedade moderna padece de graves deficiências [...] A crise de que sofre o mundo moderno [...] é uma crise da vida espiritual [...] O mundo sofre, sofrem o Estado e os homens” (MANCINI, 1940b, p. 7). O homem moderno, continua Mancini, encontra-se mutilado, porque se distanciou de Deus e se dispôs às incertezas da sociedade política. Assim, o homem teria perdido a dimensão da eternidade: “o homem eterno não se caracteriza por um conjunto de traços que se diluem no tempo, mas pela permanência dos seus aspectos essenciais” (MANCINI, 1940b, p. 7). Cabe, portanto, ao assistente social, segundo Mancini, desenvolver um trabalho com vistas à preservação da pessoa humana e não visando promoção da cidadania (vinculada à sobrevivência física, a dimensão do indivíduo). Neste sentido, diz Mancini, “mais que cidadãos, precisamos de homens”. (MANCINI, 1940b, p. 7). Esta exaltação de Mancini ao homem, neste contexto, refere-se à promoção da dignidade humana, peculiaridade inerente ao homem que é criatura de Deus (Ato Puro).
A prática do assistente social a partir da concepção neotomista de pessoa humana A sociabilidade essencial, atributo da natureza humana, remete à prática do assistente social para duas instâncias: o indivíduo e a sociedade. Esta precisaria ser restaurada em seus ideais comunitários destruídos pelo ideário liberal e aquele deve ser elevado à condição de pessoa humana. A restauração da sociedade exige o conhecimento prévio de “sua estrutura, seus males, suas deficiências, suas possibilidades, as relações de ordem jurídica, as transformações de ordem econômica, a grande interdependência moral econômica e social existente no mundo” (RAMOS, 1940, p.23). É uma restauração necessária ao desenvolvimento do homem, o qual não pode prescindir do apoio da sociedade para suas “concretizações mais particularizadas como o grupo profissional, a escola, as obras de auxílio mútuo, etc.” (MALHEIROS, 1939). Com relação à elevação do indivíduo à condição de pessoa, os primeiros assistentes sociais idealizavam um processo educativo erigido, sobretudo, a partir de dois atributos constitutivos neotomista da pessoa humana: a inteligibilidade e a liberdade. O homem, por ser pessoa, é dotado desta inteligibilidade e pode superar sua própria condição, caso esta seja precária em termos materiais e espirituais, fortalecendo-se para sua realização enquanto pessoa humana. Assim, diziam os assistentes sociais: “a lei do ser é a razão” (TELLES, 1940, p.14), qualquer ação de cunho educativo deve inserir-se num contexto que considera a razão dos que nela estão envolvidos, daí a necessária participação dos indivíduos em atividades a ele concernentes. Diante desta ênfase, dizia Baers (1940, p.1) não devemos ter piedade de nossos irmãos, mas dedicar-lhes as nossas forças para que possam cumprir “o fim que lhes é próprio” (BAERS, M. 1940, p.1), ou seja, contribuir para que eles possam aperfeiçoar a busca da adequação à destinação cristã. Neste contexto, salienta Ferreira, diferentemente de outras obras de socorro, beneficentes e caritativas – todas paliativas, porque impotentes diante da doutrina subversiva – tem início uma nova “forma de assistência que indaga as causas do mal, que pede a colaboração do beneficiado e que serve tanto ao indivíduo como à coletividade [..] É o Serviço Social” (FERREIRA, F.P., 1940, p.13). Sendo o homem uma pessoa humana, é um ser dotado de inteligibilidade natural, o que torna possível sua adaptação às circunstânciaspostas por épocas diferentes. Assim, o homem pode responder às exigências de novas épocas e, ao mesmo tempo, cumprir a destinação cristã. Ressalta Junqueira: “Embora a natureza seja sempre a mesma, a forma das instituições ou dos grupos variam conforme a época e tem que se adaptar à vida” (JUNQUEIRA, 1940, p.9), e o Serviço Social (como a ação social) “visa dar ao homem condições normais de vida, necessárias ao pleno desenvolvimento, supõe uma filosofia de vida: o que é o homem e qual o seu fim último” (JUNQUEIRA, 1940, p.9). Este trabalho, conclui a autora, a partir de uma noção exata do que é o ser humano com seu “potencial e seus desvios”, situa-se na perspectiva de um “futuro extraterreno, conforme os da natureza racional do homem e a destinação cristã” (JUNQUEIRA, 1940, p. 10). O assistente social não pode prescindir, em sua atuação profissional, da certeza de que o homem é dotado de uma inteligibilidade natural. Neste sentido, salienta Mancini: “Lidamos com homens [...] devemos, então, fazer o trabalho de razão e não de mecânica” (MANCINI, 1940c, p. 2) Por ser dotado de inteligência, o homem pode dar sentido à sua vida e contribuir para que a vida social se organize em direção à realização de um fim último. Assim, o assistente social, em sua intervenção junto a indivíduos desajustados, deve dirigir-se “diretamente ao espírito” e “corrigi-lo das suas más formações, construindo ali o alicerce de sua obras” (MANCINI, 1940c, p. 2). Deve firmar no homem “a vontade de aperfeiçoamento[...] Como pessoa humana, seja qual for a classe, ou o grupo a que pertença [...] dar a consciência da condição de desajustado e a consciência das condições normais a que pode chegar por si mesmo” (MALHEIROS, 1939 ) A inteligibilidade humana é, enfim, um atributo que denota a viabilidade de um projeto educativo voltado à construção de uma nova moral. Assim, como já salientamos, os assistentes sociais, interpretando a questão social como uma questão moral, preconizavam a atuação profissional junto às “deficiências sociais e individuais”, com vistas à construção de uma nova ordem social. Ao princípio da inteligibilidade, os primeiros assistentes sociais, ainda na trilha do neotomismo, vinculavam a liberdade da pessoa humana. Respeitar esta liberdade, na atuação profissional, significa respeitar a liberdade do assistido. Esta seria, segundo Pereira, uma das mais sérias dificuldades do assistente social, uma vez que ele deveria usar, o mais possível de sua influência, sem faltar, entretanto, ao devido respeito à liberdade humana. Há uma tendência do ser moral e intelectualmente mais forte de impor ao mais fraco. Contra esta tendência, terá de lutar a assistente, toda vez que se encontre diante de alguém que, em virtude das circunstâncias, esteja, em relação a ele numa situação inferior ou de dependência. Acima de tudo, está a dignidade da pessoa humana, o ser livre, que deverá ser esclarecido, orientado, porém, nunca coagido (PEREIRA, 1940, p.10). Dentre as instâncias de atuação profissional, nas quais se preservam elementos constitutivos essenciais da pessoa humana, estão a família e o trabalho. Estas instâncias, segundo Ferreira, seriam o “esteio moral” que garantiria a obediência aos “verdadeiros valores” da sociedade. Enquanto meio para formação moral, o trabalho deve completar a educação dos operários. Segundo Ferreira, “não bastam os segredos da fiação, da cerâmica ou da siderurgia, mas é necessária a aragem vivificadora de outras zonas: a zona da moral e da religião” (FERREIRA, F.P, 1940, p.26). O cumprimento de tarefas do assistente social junto aos trabalhadores – “orientar vocações, prevenir acidentes de trabalho, melhorar as condições de vida do empregado e, ao mesmo tempo, garantir o rendimento da empresa; estabilizar as condições de trabalho, implementar medidas de proteção à saúde, etc.” (RIBERA, 1940, p.6) – deve gravitar “em torno da situação física e moral do trabalhador” (RIBERA, 1940, p.6) Assim, no desempenho de suas tarefas, o assistente social intervém na esfera da preservação da dignidade humana e do desenvolvimento da personalidade. Esta atuação profissional deve, ainda, condicionar-se ao compromisso com a ordem social que, conforme as diretrizes das Encíclicas Papais, circunscreve-se na obediência ao direito natural, fundamento para a justificativa da necessária existência de duas classes sociais harmoniosamente conciliadas: a dos patrões e a dos operários. Com este trabalho, pretendia-se “beneficiar” os trabalhadores e “comprometê-los com a ordem social” (RIBERA, 1940, p.6 ). Nesse contexto, a conscientização, uma das diretrizes da atuação dos primeiros assistentes sociais, dirigiu-se, sobretudo, à classe trabalhadora e tem como perspectiva a conciliação das classes sociais. O editorial do primeiro periódico das publicações dos assistentes sociais anuncia: o Serviço Social, entre outras coisas, visa despertar a consciência da classe trabalhadora, estabelecer contato entre os operários, de forma a “criar um bloco cuja ação se caracteriza pela unidade, pela visão de conjunto, pela percepção total da situação do meio, conhecimento imprescindível ao bom êxito de suas iniciativas”. Este objetivo não pode ser cumprido, se desvinculado da atuação na raiz do problema: a ausência de Deus. Sem a orientação religiosa, alerta Ferreira, a assistência social não é uma verdadeira conscientização, mas cumpre apenas uma função de analgesia, pois as “consciências continuam adormecidas para um tratamento de justiça, conforme a dignidade da pessoa humana” 7. Segundo Mancini, a conscientização preconizada pelos assistentes sociais, ainda na via da construção da unidade dos trabalhadores, tem o intuito de fazer frente à desalienação e à união dos proletariados propostas pelos comunistas. A unidade, à qual se referiam os assistentes sociais, objetivava a extinção das “desagregações espirituais e rebeldia” (FERREIRA, P. L., 1939, p. 6) preconizadas pelo comunismo. Ao mesmo tempo, esta unidade visava refutar a incorporação cega ao ideário liberal que teria destituído o espírito associativista e a possibilidade de conciliação entre as classes sociais, necessária à justa ordem do capital a qual tem por base “o direito natural e é, portanto, justificada pela ordem moral” (TELLES, 1939, p.2). Ordem é, continua Telles reportando-se a Sto Agostinho, “um arranjo das coisas de tal maneira que cada um tenda ao lugar que lhe convém” (TELLES, 1939, p.2). A preservação da ordem social não se faz sem a família. Esta é a outra instância fundamental sobre a qual deve recair o trabalho do Serviço Social. Entende-se, neste contexto, que a família é um meio através do qual o homem pode desenvolver-se para viver em harmonia na sociedade. É instância intermediária entre o homem e a sociedade e deve, portanto, ser a base da educação para a ordem social. Sem cumprir este papel, afirma Junqueira, a família gera problemas de natureza individual e social. A causa desta falha, continua Junqueira 8, está no laicismo que “na sua marcha destruidora da ordem social [...] culminou na destruição da família”. A família, “ambiente natural à formação dos homens” (TELLES 1940b, p. 9), fica comprometida em quadros familiares que se constituem em “ambientes promíscuos e sem formação moral” (TELLES 1940b, p. 9), os quais, muitas vezes, devem-se: à “precariedade de habitações” como os cortiços, “situações como a de concubinato, abandono do lar pelo chefe, mãe solteira, separação de cônjuges, menores pervertidos e alcoolismo”. (TELLES 1940b, p. 9). O trabalho sobre a família que vive nestas condições deve começar pelo próprio homem, o qual, para viver dignamente, precisa “ possuir o mínimo de bem-estar” (TELLES 1940b, p. 9). Assim, conclui a autora, o trabalho educativo como o “gosto pela ordem e o asseio” ( TELLES 1940b, p.9) deve ser acompanhado da viabilização de uma “habitação aconselhável” ( TELLES 1940b, p.9).
Os assistentes sociais, ao se posicionarem a favor de um projeto de sociedade que pudesse reconstruir a ordem social destruída pelo desrespeitoà dignidade humana, situavam a prática profissional em uma perspectiva idealista vinculada às diretrizes da Igreja Católica daquele período. Postulavam uma ação profissional pautada na reeducação moral, seguido de um mínimo de bem estar ou de atividade profissional que assegurasse condições mínimas de sobrevivência, tais como: restaurantes em ambientes de trabalho, assistência a menores e algumas garantias legais para minorar as condições de trabalho. A formação técnica e moral dos primeiros assistentes sociais Insistem os primeiros assistentes sociais, quanto ao caráter técnico aliado à sólida formação moral como requisitos necessários aos profissionais de Serviço Social. Nesse sentido, as escolas de Serviço Social deveriam, segundo Ferreira, “desenvolver a personalidade dos alunos, garantir sua formação profissional, dando-lhes o conhecimento dos problemas sociais e a técnica do trabalho a ser realizada [...] Para atingir sua finalidade o programa de ensino deve ser vivificado por uma sólida doutrina e, por outro lado, corresponder às necessidades do Serviço Social em geral e às necessidades e possibilidades particulares da sociedade que ela quer servir” (FERREIRA, O.C., 1939, p.2). Caso contrário, não se consolida o propósito principal da profissão: ação que responde “honesta e eficazmente aos atritos sociais [..]) a solução verdadeira das graves questões” ·. Doutrina e técnicas são, neste contexto, parâmetros básicos para a atuação do assistente social. A doutrina oficial da Igreja Católica (1930/1940) considera o homem como pessoa sobre a qual é possível reconstituir os valores morais da sociedade, que deve caminhar para o bem comum.Segundo os primeiros assistentes sociais, o cumprimento desta doutrina é assegurado por uma sólida formação moral. Assim, salienta Malheiros: “O preparo técnico não basta ao assistente social; é necessário que a ele seja aliado a uma sólida formação moral porque, quase sempre, terá o assistente social de pôr à prova seus princípios morais, quer aconselhando, quer adotando uma atitude frente a um problema moral daqueles que procura reajustar” (MALHEIROS, 1939). Ainda na perspectiva da formação moral e técnica, os assistentes sociais destacam a importância do estágio em que ocorre a “adaptabilidade” dos futuros assistentes sociais às circunstâncias sociais e situações que lhes são estranhas e que pode chocá-los ou escandalizá-los. Contudo, a formação moral e o aperfeiçoamento, segundo Ferreira (1941, p. 25-27) devem ser constantes entre os assistentes sociais, para que sua técnica não se degenere em tecnicismo, sua ciência em cientificismo e a profissão em profissionalismo. O assistente social não é apenas um profissional, mas alguém que se preocupa, prioritariamente, “em fazer o bem e contribuir para a solução mais perfeita dos problemas sociais” (1941, p.27). Uma das premissas sobre as quais se erige o aperfeiçoamento profissional é o respeito à pessoa humana. “Sem este pressuposto, sem esta marca profunda de humanidade, o Serviço Social seria desastroso” (MANCINI, 1940d, p. 12). Cabe, portanto, ao assistente social, “como uma aranha que tece delicadamente seu fio” (MANCINI, 1940d; 12), desenvolver as profundezas e as riquezas de tons de que se reveste o conteúdo surpreendente da personalidade (MANCINI, 1940d, p. 12). Sua vida privada não pode ser contaminada com heterodoxias, mas subordinar-se [...] à ordem sobrenatural e ser ministrada [...] principalmente com unidade doutrinária” (MANCINI, 1940, p.12). Esta é a base segura que, como uma “bússola que tanto mais é solicitada, quanto pior o tempo e desorientado o navegante” (TELLES, 1940a, p. 4), socorre aos que estão imersos no “labor cotidiano [...] só lida com pessoas ou grupos que saíram da rota habitual da vida normal” (RAMOS, 1940b, p. 23); é preciso que estes tenham “ uma noção exata do porto a atingir, dos caminhos certos ou nocivos que possa encontrar” (RAMOS, 1940b, p. 23). Na prática do assistente social, segundo Ramos, a inteligência e a vontade são colocadas a serviço da pessoa humana que caminha para Deus. Movendo-se, ainda, sob a perspectiva do neotomismo, na qual a pessoa humana dotada de inteligência pode orientar-se e orientar os outros para o bem comum, os assistentes sociais nesse período enfatizavam o aspecto vocacional contido na atuação profissional. Mais que uma escolha profissional, o Serviço Social em sua gênese se coloca como um compromisso de vida com o projeto de uma sociedade erigida sobre a idealidade cristã, aos moldes daquela postulada por Maritain. Sob tais propósitos, delineiam-se os atributos que deve ter um assistente social: “responsabilidade, sacrifício, perseverança, jovialidade, desinteresse material, capacidade de sentir, capacidade de adequar-se ao ritmo acidentado dos necessitados, maturidade (para não se assustar com a realidade a ser conhecida)” (TELLES ; MANCINI. In: CARLOS, 1993, p.200).
CONCLUSÃO Os primeiros assistentes sociais idealizavam a construção de um projeto societário, através da reeducação de valores morais e obediência a princípios cristãos, mas argumentavam que este projeto só se viabilizaria, se fossem asseguradas as mínimas condições de bem-estar social. Na defesa da viabilização deste projeto, os assistentes sociais restringiam a atuação profissional à esfera privada, como se os valores morais fossem construídos apenas a partir de vontades individuais e as precariedades materiais de existências fossem amenizadas com esforços individuais. Contudo, ao mesmo tempo, estes assistentes sociais criticavam a ênfase no indivíduo posta pelo liberalismo, o que nos coloca diante de uma aporia. A reflexão sobre essa aporia nos levou a entender que os assistentes sociais, ao seguirem, sem reservas, às orientações das Encíclicas Papais, partilhavam das críticas erigidas pela Igreja Católica ao liberalismo e ao socialismo. Situavam-se na perspectiva de uma terceira via: o humanismo cristão que defende a construção de valores cuja premissa básica é o respeito à dignidade da pessoa humana. Esta premissa , na descrição da compreensão da prática dos primeiros assistentes sociais nos coloca diante de uma possível dicotomia entre teoria e prática. É como se naquele momento (1939/2940) nos pressupostos teóricos dos assistentes sociais, o homem fosse compreendido como uma pessoa humana e na atuação profissional fosse compreendido como um indivíduo que precisa de ajuda para sair do ambiente decaído, no qual, a condição de vida operária o coloca. Neste contexto, a recuperação de quadros sociais degenerados, segundo esses assistentes sociais, se dá, sobretudo, a partir da atuação profissionais junto a indivíduos e famílias, mas a perspectiva teórica que anima essa prática profissional é a realização da pessoa humana, que se dá numa esfera transcendente à materialidade das condições de vida. Enfatizamos que a concepção do homem como pessoa humana, nos moldes da filosofia neotomista, permitia aos primeiros assistentes sociais compactuar com as diretrizes doutrinárias da Igreja Católica na década de 30. Por esta via, o Serviço Social acreditava diferenciar-se de ações meramente filantrópicas. Estas limitar-se-iam à assistência material e a atuação profissional do assistente social teria um caráter técnico, porque ancorava –se em uma doutrina que permitia aos indivíduos elevarem-se da precariedade material com vistas à realização em uma esfera atemporal.
Apesar da pouca quantidade de escritos sobre a história da homossexualidade numa concepção dialética e materialista, se faz necessária uma posição firme dos comunistas ante o crescimento do movimento LGBT manipulado pela burguesia liberal, assim como ante o crescimento de uma onda reacionária em todo o mundo. Diante desse cenário, devemos sempre ter como ponto de princípio para nossas análises a ciência proletária e as noções de infra e superestrutura. A violência destinada ao público LGBT é histórica e vem crescendo: um LGBT (lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual) morre a cada 25 horas no Brasil, ou seja, praticamentetodos os dias uma pessoa é assassinada pelo preconceito. A violência psicológica também atormenta diariamente – e muito – esse grupo de pessoas, pois a maioria diz já ter sofrido alguma agressão verbal, intimidação ou discriminação, seja em casa, na rua, na escola ou no trabalho, por ser LGBT. Porém, acreditamos que para falar da opressão sofrida pelos LGBTs não é necessário reduzir este texto a dados numéricos, mas faz-se necessário mostrar, na verdade, a razão pela qual esses casos acontecem e qual a verdadeira solução para este problema. Costuma-se atribuir a culpa da opressão à moral da sociedade e também à religião. É certo que a religião é responsável por muitas deficiências na consciência e também na moral, mas não é responsável por isso. Para explicar esse ponto é preciso ter em mente as noções de superestrutura e de infraestrutura. A religião, a moral, a cultura, o Estado, a mídia, etc., são produtos da superestrutura, que é regida pela infraestrutura (economia). Karl Marx explica essa relação: “Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou seja, a classe que tem o poder material dominante numa sociedade é também a potência dominante espiritual. A classe que dispõe dos meios de produção material dispõe igualmente dos meios de produção intelectual; de tal modo que o pensamento daqueles a quem é recusado os meios de produção intelectual está submetido igualmente à classe dominante”. Isso significa que no sistema capitalista, a moral vigente, a religião, a cultura e a mídia servem à burguesia para consolidar e manter seu poder sobre os trabalhadores e o povo. Engels explica a existência do patriarcado como meio de conservação das riquezas em poucas mãos e, para isso, as relações amorosas-sexuais são reduzidas à reprodução, garantindo, por meio da herança, a continuidade daquele poder, restringindo a cada vez menos pessoas os meios de produção e criando dentro das famílias hierarquias de poder para que, dentro do lar, o “senhor” não precise se preocupar com a criação dos filhos e a organização da casa, deixando esse trabalho para a “escrava do lar”, a esposa. A estrutura patriarcal criou alguns fenômenos, como, por exemplo, o machismo, a desigualdade de gênero e também a LGBTfobia. As relações homossexuais não são capazes de gerar uma prole, ou seja, não podem gerar filhos para serem ou futuros donos de meios de produção ou futuros trabalhadores. A homofobia só existe porque, para o capitalismo, não basta escravizar só o trabalhador, tem que escravizar toda sua descendência e se o trabalhador não pode gerar uma prole, torna-se um inútil, uma anomalia. Assim, como as pessoas transexuais que, por sua própria tendência biológica, subvertem as relações de poder entre os gêneros que o patriarcado criou. Por exemplo, para mostrar a relação dos grupos LGBT com o desenvolvimento do patriarcado, a exploração de classe e a dominação dos meios de produção, usaremos a sociedade viking. Quando esta sociedade vivia de maneira coletiva, eram comuns as relações homossexuais, que eram vistas com naturalidade e praticadas em muitas ocasiões como rito de passagem ou de fertilidade. A história nos mostra os escritos encontrados de Ptolomeu (Século II), que afirmam que ali existiam “homens sem paixão por mulher”, que os escandinavos dessa época viviam em clãs e tribos (organizações familiares coletivas) e amuletos com figuras de casais (homo e heterossexuais) usados em casamentos e talvez nascimentos. Com o início das expansões e invasões a outros territórios, a apropriação individual das riquezas conquistadas começou a existir para aquele povo e, com a apropriação individual, desenvolveu-se também um sistema de classes, em que uns tinham as riquezas e poderiam subjugar outros pelo trabalho. Dessa época também data a existência dos primeiros reis e escravos (muitas vezes guerreiros inimigos derrotados). A partir da existência de classes, fez-se necessária a criação do Estado e, por meio deste, passou a existir a repressão (leis) para colocar na consciência popular as ideias das classes dominantes. A humanidade presenciou depois disso a propriedade privada passar de mão em mão até chegar às mãos dos burgueses, dos capitalistas, as mesmas que continuam a perpetuar a dominação de classe, o patriarcado, a repressão institucional, etc. Numa sociedade baseada na exploração do homem pelo homem, a opressão entre os gêneros existe para manter a exploração geral dos trabalhadores, assim como o preconceito, o racismo, a homofobia e a transfobia para dividir a população, atrasando a mentalidade da classe trabalhadora, colocando povo contra povo.
Como a dialética parte do movimento, da mudança, para que a pesquisa seja materialista histórico-dialética, exige-se uma constante revisitação e reconstrução da teoria, justamente porque este enfoque parte da historicidade do fenômeno e, por se tratar de conhecimento histórico, é parcial, provisório e relativo, necessitando ser revisitado e reconstruído constantemente. As políticas educacionais fazem parte da totalidade social e não se pode tratá-las de modo isolado. O estudo da sua gênese, de seu movimento e de suas contradições direcionará a pesquisa para a constante busca de um conjunto amplo de relações, particularidades e detalhes que possibilitarão captar o seu movimento nesta totalidade. Considerando ainda que a implementação de uma política pública é marcada por interesses econômicos, políticos e ideológicos, não é possível captar o significado de uma política educacional sem compreender a lógica global do sistema orgânico do capital. Neste sentido, a articulação entre singularidade, particularidade e universalidade que o enfoque materialista histórico-dialético proporciona enriquece as reflexões decorrentes do processo de investigação sobre políticas educacionais. Singularidade, no sentido de que a análise de uma política educacional é um recorte da realidade que ganha significado tanto na particularidade do momento histórico em que é concebida como nas determinações universais do capitalismo global. A investigação sobre políticas educacionais implica, portanto, no resgate da historicidade do fenômeno, buscando investigá-lo sob a perspectiva histórica no sentido de desvelar os conflitos, contradições, interesses e ideologias que estão por detrás da implementação de tais políticas e, neste sentido, é preciso reconhecer o campo das políticas educacionais como um domínio de investigação histórica, resgatando a historicidade cíclica e superando a investigação puramente narrativa e descritiva dos fatos. A mediação histórica no estudo das políticas educacionais permite uma 9 compreensão global do fenômeno em seu desenvolvimento, elucidando como o presente dá significação ao passado, de modo que, numa perspectiva materialista históricodialética, potencialize a capacidade dos agentes históricos, ou seja, o conhecimento da mudança. Não há como compreender o presente sem o aporte substancial da história, sem o debruçar crítico sobre as injunções dos acontecimentos passados no fenômeno presente. No entanto, não podemos ignorar o fato de que na concepção materialista do conhecimento o esforço reflexivo não deve se limitar à análise crítica. A análise crítica da realidade de modo despertar a conscientização deve estar associada a uma prática social que é o fundamento e o limite do processo de conhecimento entendido como práxis transformadora e instrumento de luta. Isso atribui ao conhecimento produzido um caráter não somente histórico, mas também político na medida em que, para além da formação da consciência e da resistência nas situações de conflito, propõe uma participação ativa dos agentes históricos na organização social. Por este motivo, a marca da postura crítica do enfoque materialista vai além do desvelamento do conflito de interpretações sobre a realidade. Esta visão, por manifestar um interesse transformador da realidade, busca muito mais desvelar o conflito dos interesses. O pesquisador, na condução das pesquisas sobre políticas

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