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Apego e patologia da personalidade - Resumo

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APEGO E PATOLOGIA DA PERSONALIDADE
Há uma sinergia vital entre os processos de apego e o desenvolvimento da capacidade da criança de entender o comportamento interpessoal em termos de estados mentais. Chamamos essa capacidade de mentalização, e tentamos descrever como nosso entendimento de nós mesmos e dos outros como agentes mentais se origina da experiência interpessoal e particularmente do relacionamento criança-cuidador.
A capacidade de mentalizar é vital para a auto-organização e para regulação do afeto.
A mentalização envolve tanto um componente reflexivo como um componente interpessoal; ela é baseada tanto na observação dos outros como na reflexão sobre seus estados mentais; é tanto implícita como explícita e diz respeito a sentimentos e cognições. 
John Bowlby (criador da teoria do apego) postulava uma necessidade humana universal de formar laços estreitos; dizia que os comportamentos de apego do bebê humano (p. ex., busca de proximidade, sorriso, agarramento) são retribuídos por comportamentos de apego do adulto (toque, colo, conforto) e essas respostas reforçam o comportamento de apego do bebê com aquele adulto em particular. 
O objetivo do sistema de apego é uma experiência de segurança. Portanto, o sistema de apego é primeiro e acima de tudo um regulador da experiência emocional.
Ao final do primeiro ano, o comportamento do bebê parece ser baseado em expectativas específicas. Suas experiências passadas com cuidador são agregadas a sistemas representativos que Bowlby denominou modelos operantes internos do self. Ele propôs que esses modelos operantes internos do self e dos outros estabelecidos na infância forneçam os protótipos para todos os relacionamentos posteriores. Visto que funcionam fora da consciência eles são resistentes a mudança. 
Mary Ainsworth, a segunda grande pioneira da teoria do apego, desenvolveu um procedimento laboratorial conhecido como uma "Situação estranha": quando separados brevemente de seu cuidador e deixados com um estranho em um ambiente desconhecido, os bebês mostram um de quatro padrões de comportamento.
	PADRÕES DE APEGO NA SITUAÇÃO ESTRANHA
	Classificação do Apego
	Características
	Observações
	Seguro
	Torna-se ativo prontamente na presença do cuidador
Ansioso na presença do estranho e o evita
Angustiado pela ausência breve do cuidador
Busca rapidamente contato com o cuidador no reencontro
Tranquilizado por contato renovado e retorno a atividade
	O comportamento é baseado em experiências repetidas de interações bem-coordenadas e sensíveis nas quais o cuidador raras vezes é estimulador em excesso e é capaz de estabilizar as respostas emocionais desorganizadas. Logo, eles regulam o afeto.
	Ansioso/
esquivo
	Parece ficar menos ansioso pela separação
Pode não buscar contato com o cuidador após a separação
Pode não preferir o cuidador ao estranho
	Passaram por experiências em que sua excitação emocional não foi reestabilizada pelo cuidador ou nas quais foram excessivamente estimuladas por meio de parentagem intrusiva.
Super-regulam o afeto. Evitam situações com a probabilidade de serem angustiantes. 
	Ansioso/
resistente
	Apresenta atividades e brincadeiras limitadas
Altamente angustiado pela separação
Dificuldade de se tranquilizar no reencontro
Ansiedade e raiva parecem impedi-lo de obter conforto do contato
	Sub-regulam o afeto, intensificando sua expressão de sofrimento, talvez na tentativa de provocar uma resposta no cuidador.
	Desorganizado/
desorientado
	Comportamento não direcionado/bizarro (p.ex., redução de temperatura, batidas das mãos batida da cabeça)
Tenta escapar da situação mesmo na presença do cuidador
	O cuidador serviu como uma fonte tanto de medo como tranquilização. Ele busca o cuidador mas esse gera ativação excessiva dos sistema de apego.
A estabilidade do apego foi demonstrada por estudos longitudinais de bebês que foram avaliados até a adolescência ou a idade adulta jovem com a Entrevista de Apego Adulto (outro instrumento clinico que usa a narrativas de relacionamento de apego na infância.
	CARACTERÍSTICAS DAS CATEGORIAS DE APEGO DA ENTREVISTA DE APEGO ADULTO (AAI)
Estudo baseado na perda ou trauma de infância.
	Categoria do Apego
	Características
	Seguro/
autônomo
	Integra coerentemente as memorias em uma narrativa significativa
Demonstra valorizar os relacionamentos de apego
	Inseguro/
desligado
	A narrativa não tem coerência
Incapaz de lembrar memorias especificas em apoio argumental geral
Idealiza ou desvaloriza os primeiros relacionamentos
	Inseguro/
preocupado
	A narrativa não tem coerência
Mostra confusão, raiva ou medo em relação a figuras de apego
As vezes ainda se queixa de desrespeito na infância
	Não resolvido/
desorganizado
	Confusões semânticas e/ou sintáticas em narrativas relativas a lutos ou traumas de infância
Esses estudos demonstraram uma correspondência de 68-75% entre as classificações de apego na infância e a classificação na idade adulta. Esse é um nível de consistência sem paralelos entre o comportamento observado na infância e os desfechos na idade adulta, embora seja importante lembrar que tal comportamento pode ser sancionado por ambientes consistentes, bem como por padrões estabelecidos no primeiro ano de vida. Além disso, os relacionamentos de apego desempenham um papel fundamental na transmissão de privação transgeracional. Adultos seguros têm de três a quatro vezes mais probabilidade de ter filhos seguramente apegados a eles.
A NEUROBIOLOGIA DO APEGO E SUA LIGAÇÃO COM A MENTALIZAÇÃO.
O apego assegura que os processos cerebrais que servem à cognição social sejam adequadamente organizados e preparados para nos capacitar a conviver e a trabalhar com outras pessoas.
Uma consideração da dependência de drogas pode nos fornecer indícios importantes para o entendimento da neurobiologia do apego. O sistema de recompensa dopaminérgico mesencefálico tem sido implicado no processo de dependência de drogas. Substâncias que levam a liberação de dopamina nesse sistema também causam dependência (p. ex. psicoestimulantes). Visto ser improvável que um sistema cerebral existisse especificamente para atender ao abuso de drogas e álcool, é provável que a dependência seja parasitária em um sistema biológico que desempenhe algum outro papel evolucionário essencial. Jaak Panksepp foi o primeiro a delinear uma neurobiologia comum dos relacionamentos de apego românticos e mãe-bebê, bebê-mãe ligados ao mesmo circuito de recompensa dopaminérgico mesocorticolímbico. MacLean especulou que abuso de substâncias e dependência de drogas poderiam ser entendidos como tentativas de substituir opióides ou fatores endógenos normalmente fornecidos por vínculos sociais. 
Demonstrou-se que o sistema de processamento de recompensa dopaminérgico e o sistema oxitocinérgico desempenham papéis fundamentais na promoção e na manutenção do comportamento maternal.
Estudos publicados em 2003 e posteriormente ressaltaram o papel desempenhado pela oxitocina de facilitar a convenção social.
Experiências negativas nos primeiros cuidados tem impacto sobre o sistema de oxitocina em macacos e nos seres humanos com níveis mais baixos de oxitocina no líquido cerebrospinal relatados em macacos criados em berçário do que criados pelas mães. Além disso, níveis de oxitocina periférica reduzidos foram observados em crianças adotadas de orfanatos com história de negligência precoce, as quais também exibem prejuízo grave na reciprocidade social.
Portanto, podemos ver que a formação de relacionamentos de apego é apoiada por pelo dois sistemas neurobiológicos:
O sistema ligando experiências de apego a recompensa e prazer, motivando o cuidador (e com toda a probabilidade também o bebê) a buscar experiências de proximidades;
Um sistema ligando entendimento social aumentado ao contexto do apego, com vínculos mais estreitos ativando sistemas biológicos com probabilidade de aumentar a sensibilidade a sinais sociais.
ENTENDENDO O RELACIONAMENTO DE APEGO EMENTALIZAÇÃO
Definimos mentalização como uma forma de atividade mental imaginativa sobretudo pré-consciente, isto é, percepção e interpretação do comportamento humano em termos de estados mentais intencionais (p. ex. necessidades, desejos, sentimentos, crenças, metas propósitos, razões). 
A mentalização deve ser imaginativa porque temos de imaginar o que as outras pessoas poderiam estar pensando ou sentindo. Um indicador importante de uma mentalização de alta qualidade é a consciência de que não podemos saber ao certo o que se passa na mente de outra pessoa. Sustentamos que a capacidade de mentalizar se desenvolve da experiência interpessoal, em particular nas relações objetais primárias.
Mentalização e parentagem: Parentagem é determinante fundamental da segurança do apego. 
A capacidade da mãe de pensar sobre a mente do seu filho é chamada variadamente de orientação mental materna, perceptividade e função reflexiva. Pais mentalizadores poderiam facilitar o desenvolvimento de mentalização em seus filhos.
Discurso familiar: A exposição a conversas familiares normais parece ser uma pré-condição da mentalização.
Diversão: É outro aspecto de um contexto de apego seguro. 
Brincar pode ser importante para aquisição de mentalização. 
Maus-tratos: Desorganizam o sistema de apego.  O déficit de mentalização associado a maus-tratos na infância pode ser uma forma de dissociação ou inibição, ou mesmo uma reação fóbica a mentalizar. Podem contribuir para uma "cegueira mental" parcial adquirida, comprometendo a comunicação reflexiva aberta entre pais e filhos.
DESENVOLVIMENTO DE UM SELF AGENTIVO: AQUISIÇÃO SOCIAL DE COGNIÇÃO SOCIAL
Em seus primeiros meses de vida, o bebê começa a entender que é um agente físico cujas ações podem ocasionar mudanças em corpos com os quais ele tem contato físico imediato. Ao mesmo tempo, ele começa a entender que é um agente social, à medida que aprende que seu comportamento afeta o comportamento e as emoções de seu cuidador.
A preocupação inicial da criança com estimulação perfeitamente contingente à resposta (fornecida pelo feedback sensorial proprioceptivo gerado por suas próprias ações) lhe permite se diferenciar de seu ambiente e construir uma representação primária de seu self corporal.
Aproximadamente entre 3 e 4 meses, a preferência dos bebês parece mudar. Eles começam a ser atraídos mais para contingências altas-mas-imperfeitas do que para a contingência perfeita - o nível de contingência que caracteriza as respostas de espelhamento empático de um cuidador sintonizado com as exibições emocionais de um bebê.
A experiência repetida dessas respostas permite que o bebê comece a diferenciar seus estados de self internos, um processo a que chamamos de biofeedback social. Um relacionamento de apego congênito e seguro contribui de modo vital para o surgimento das primeiras capacidades de mentalização possibilitando que o bebê “descubra” ou “encontre” seu self psicológico no mundo social.
Os bebês aprendem a diferenciar os padrões internos de estimulação fisiológica e visceral que acompanham diferentes emoções observando as respostas de espelhamento facial ou vocal de seus cuidadores.
Duas condições precisam ser satisfeitas para que a capacidade de entender e regular as emoções possa se desenvolver:
1. razoável congruência de espelhamento, pela qual o cuidador combina exatamente com o estado mental do bebê.
2. marcação do espelhamento, pela qual o cuidador é capaz de expressar um afeto embora indicando que não está expressando seus próprios sentimentos.
Se o espelhamento do cuidador for incongruente, a resultante representação do estado interno do bebê não corresponderá a um estado de self constitucional, e isso poderia predispô-lo a desenvolver uma estrutura de personalidade narcisista. Se o espelhamento for não marcado, a expressão do cuidador pode parecer externalizar a experiência do bebê e pode oprimi-lo, fazendo sua experiência parecer perniciosa e intensificando, mais do que regulando, seu estado. Uma predisposição a experimentar emoção por meio de outras pessoas (como na estrutura de personalidade borderline) poderia ser estabelecida. 
REGULAÇÃO DO AFETO, CONTROLE DA ATENÇÃO E MENTALIZAÇÃO
A mentalização não apenas permite o ajustamento de estados afetivos, mas mais fundamentalmente ela é usada para regular o self.
Estágios de desenvolvimento da capacidade de mentalização:
O agente teleológico (6 a 12 meses) 
Entendimento do self e dos outros como agentes teleológicos:
– Entende as relações causais entre ações, seus agentes e o ambiente
– Entende a agência (ação) puramente em termos de ações e restrições físicas
O agente intencional (12 a 24 meses)
Entendimento do self e dos outros como agentes intencionais:
– Entende que as ações são causadas por estados da mente anteriores (p. ex., desejos) e que podem ocasionar mudanças nas mentes bem como nos corpos
– Adquire linguagem do estado interno e capacidade de raciocinar de forma não egocêntrica sobre sentimentos e desejos nos outros
– Ainda não é capaz de representar estados mentais independentemente da realidade física
– Às vezes experimenta a realidade interna como muito mais convincente do que o mundo físico, e outras vezes como ilógica a ele (modos de equivalência psíquica e faz de conta)
O agente representativo (3 a 4 anos)
Entendimento do self e dos outros como agentes representativos:
– Entende que as ações das pessoas são causadas por suas crenças
– Tem probabilidade cada vez maior de se sair bem na tarefa da crença falsa
– Sabe que as pessoas nem sempre sentem o que parecem sentir e que as reações emocionais são influenciadas por humor atual e experiências emocionais anteriores
	
Representação do self temporalmente estendido (em torno dos 6 anos)
- Capacidade de relacionar memórias de atividades intencionais e experiências em uma organização causal-temporal coerente
- Estabelecimento do self temporalmente estendido
SUBJETIVIDADE ANTES DA MENTALIZAÇÃO
É importante entender que a criança pequena inicialmente supõe que aquilo que ela conhece seja conhecido pelos outros e vice-versa.
Uma razão para que as crianças pequenas sejam tão propensas a acessos de raiva e frustração pode ser o fato de o mundo e as mentes individuais não serem demarcadas com clareza; elas esperam que as outras pessoas saibam o que elas estão pensando e sentindo e vejam as situações da mesma maneira que elas. Assim, a frustração de seus desejos parece maligna ou intencionalmente obtusa, em vez de o resultado de um ponto de vista ou prioridades alternativas diferentes.
Ao descrevermos o desenvolvimento normal da mentalização em crianças de 2 a 5 anos, sugerimos que exista uma transição de um modo de experiência cindido para a mentalização.
Especulamos que a criança muito pequena equipare o mundo interno com o externo. O que existe na mente deve existir lá fora, e o que existe fora deve também existir na mente. Nesse estágio não há espaço para perspectivas alternativas: “Como eu vejo é como é”.
A insistência das crianças pequenas ou da criança em idade pré- -escolar de que “há um tigre debaixo da cama” não é dissipada pela tranquilização dos pais. Essa “equivalência psíquica” como um modo de experimentar o mundo interno pode causar intenso sofrimento, porque a experiência de uma fantasia como potencialmente real pode ser aterrorizante. A aquisição de um sentido de faz de conta em relação a estados mentais é, portanto, essencial.
Enquanto brinca, a criança sabe que a experiência interna pode não refletir a realidade externa, mas então o estado interno parece não ter implicações para o mundo exterior (faz de conta).
Via de regra, em torno dos 4 anos, a criança integra esses modos para chegar à mentalização, na qual estados mentais podem ser experimentados como representações. A realidade interna e a externa podem então ser vistas como ligadas.
TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE E APEGO
As dificuldades características com a regulação da emoção e as reações intensas à perdade vínculos emocionais colocam o TPB na esfera do apego.
Gunderson (1984, 1996) descreveu que a intolerância da solidão estava no centro dessa patologia e que a incapacidade daqueles com TPB de invocar um “introjeto calmante” se devia a fracassos de apego na infância. Ele ligou os padrões típicos de disfunção borderline às reações exageradas do bebê inseguramente apegado, como agarramento, medo em relação a necessidades de dependência, terror de abandono e monitoração constante da proximidade do cuidador.
Os maus--tratos sofridos no contexto de um relacionamento de apego poderiam criar um círculo vicioso de apego medroso, no qual o medo ativa a busca de proximidade, e a proximidade, uma vez conseguida, por sua vez desencadeia mais ansiedade
Os maus-tratos criam uma outra complicação profunda nesse mecanismo, quando a criança usa partes cindidas do self para obter controle ilusório sobre o abusador. Quando internaliza o estado mental do vitimizador na parte alienada do self, a criança experimenta uma parte de sua própria mente como torturadora, empenhada na destruição do ego. Isso leva a um estado emocional insuportavelmente doloroso no qual o self é experimentado como perverso e odioso. Nessas circunstâncias, pode parecer que a única solução seja voltar o ataque de dentro da mente contra o corpo por meio da autoflagelação.
Por intermédio da identificação projetiva, as partes persecutórias do self são localizadas em outra pessoa. Dessa forma, a necessidade de que as experiências do alienado sejam possuídas por outra mente pode levar ao envolvimento do indivíduo em uma sequência de novos relacionamentos abusivos.
Indicações de hiperatividade do apego estão entre os sintomas centrais de TPB. Eles podem incluir esforços frenéticos para evitar o abandono, com relacionamentos interpessoais instáveis e intensos formados em um ritmo que cresce com rapidez, passando velozmente do conhecimento para grande intimidade. A ativação do sistema de apego poderia desorganizar ainda mais o indivíduo suprimindo a mentalização
DÉFICITS NA MENTALIZAÇÃO RELACIONADA AO APEGO NO TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE
Nos últimos anos, o conceito de mentalização, quando usado como um marcador para formas específicas de psicopatologia, tem sido adequadamente criticado por ser muito amplo e multifacetado para ser operacionalizado (Choi-Kain e Gunderson, 2008; Holmes, 2005; Semerari et al., 2005). Tentamos especificar ainda mais o conceito, identificando uma série de componentes ou dimensões de mentalização, cada um deles sustentado por sistemas neurais bastante distintos (Luyten et al., 2009, submetido).
 Portanto, falar de uma perda de mentalização no transtorno da personalidade é provavelmente uma forma resumida de descrever um quadro mais complexo e multifacetado.
COMPONENTES DA MENTALIZAÇÃO
Implícita: suposições, inconsciência 
Explícita: reflexão sobre suposições, atenção ao mundo externo, consciência
Focalizada no interior mental: automonitoração, inibição
Focalizada no exterior mental: dificuldade de se enxergar, hiper-reatividade ao outro
Cognitiva: atitude do agente / ex. ‘a mãe acredita que João pegou os biscoitos’ – diferenciar estado interno da realidade/ perspectiva de terceira pessoa
Afetiva: afetivo do self / ex. ‘lamento que você esteja sofrendo’ – experimentar e entender a emoção nos outros 
Equilíbrio entre duas redes neurais distintas, ambas as quais são mais ou menos compartilhadas por processos ligados a autoconhecimento e conhecimento dos outros: a saber, o sistema de neurônio-espelho frontoparietal (Rizzolatti et al., 2006) e o sistema reflexivo localizado no córtex pré-frontal medial, no córtex cingulado anterior e no pré-cúneo (Frith, 2007; Frith e Frith, 2006).
A mentalização explícita é um processo consciente, verbal e reflexivo que requer atenção, intenção e esforço e é relativamente lento. 
A mentalização implícita é um processo automático, não consciente, não verbal e não reflexivo que requer pouco esforço ou atenção focalizada.
A diferença entre mentalização explícita e implícita pode nos ajudar a entender o transtorno da personalidade, já que a alta excitação pode facilitar a mentalização automática enquanto inibe os sistemas neurais associados à mentalização controlada
A excitação emocional em pacientes com transtorno da personalidade pode ativar suposições e expectativas estereotipadas, rígidas e automáticas sobre os relacionamentos, e a capacidade de refletir sobre essas suposições pode ser muito limitada devido à perda de mentalização explícita.
A focalização nos interiores mentais do self e dos outros envolve a rede frontoparietal medial, enquanto a focalização nos exteriores durante a mentalização, usando ações físicas e aspectos visíveis, recruta uma rede frontotemporal lateral.
Ao diferenciarmos mentalização cognitiva e afetiva nos baseamos nas ideias e achados de Simon Baron-Cohen (p. ex., Baron-Cohen et al., 2008). Baron-Cohen diferencia dois sistemas de mentalização de nível relativamente alto, o mecanismo da teoria da mente (TOMM), responsável pelo raciocínio de crença-desejo, e o sistema empatizante (TESS), que opera para entender o afeto no interior do self. 
Enquanto as representações de estados mentais do TOMM assumem a forma de proposições de atitude do agente, como “a mãe acredita que John pegou os biscoitos”, o TESS cria proposições do estado afetivo do self, como “lamento que você esteja sofrendo”. Nas proposições de atitude do agente, a declaração sobre a crença pode ser verdadeira mesmo que a crença seja incorreta. A mãe pode acreditar que John pegou os biscoitos, mesmo se ele não tenha pegado. Experimentar e entender a emoção nos outros sempre envolve o sistema de self e tem que ser consistente com nosso próprio estado emocional. É por essa razão que as emoções são sentidas mais do que deduzidas.
Duas redes neurais distintas no cérebro parecem estar envolvidas no autoconhecimento e no conhecimento dos outros. 
O primeiro sistema é o muito divulgado sistema “imitativo” de neurônio-espelho frontoparietal, por meio do qual é gerado um entendimento da experiência dos outros. O entendimento da experiência dos outros gerado pelo sistema de neurônio- espelho tem uma qualidade imediata e intuitiva, e é provável que as representações da experiência dos outros geradas dessa forma estejam muito estreitamente fundidas com nossas representações do self.
O segundo sistema é composto do córtex pré-frontal medial, do cingulado anterior, da junção temporoparietal e do pré-cúneo. Ele é ativado quando fazemos julgamentos tanto sobre nós mesmos quanto sobre os pensamentos e sentimentos de outras pessoas. Esse sistema é tradicionalmente considerado o sistema- chave subjacente aos aspectos de raciocínio crença-desejo clássico da mentalização (Frith e Frith, 2006).
Consequências da falha de Mentalização
	A ausência de espelhamento marcado, a falta de um ambiente lúdico de mentalização e, em caso extremo, maus-tratos poderiam todos desempenhar um papel no enfraquecimento da capacidade de mentalização e no aumento da vulnerabilidade do indivíduo para reagir a estresse interpessoal por perda ou redução estratégica da capacidade para mentalização. Podemos pensar nisso como uma dissociação adaptativa, mas que pode resultar em mais do que uma adaptação, pois o trauma precoce também pode alterar os mecanismos neurais da excitação de modo que estímulos emocionais relativamente leves podem ativar o sistema de excitação que sustenta a ativação cortical posterior, enquanto mantêm as partes mentalizadoras frontais do cérebro desconectadas.
	Seja qual for a causa imediata dessa dissociação, sua consequência é o ressurgimento 3 modos de pensar sobre os estados internos que antecedem a capacidade de mentalização adulta totalmente madura. Todos os três são observáveis com relativa facilidade nos padrões de pensamento típicos de indivíduos com TPB (Transtorno de Personalidade Borderline), são eles:
Postura teleológica: expectativas relativas à atividade dosoutros estão presentes, mas estas são formuladas em termos restritos ao mundo físico. O entendimento das ações ocorre conforme desfechos físico. Ex: terapeuta disponível por telefone, sessões extras nos finais de semana.
Equivalência psíquica: a criança muito pequena equipara o mundo interno com o externo; isso pode causar intenso sofrimento, visto que a experiência de uma fantasia como potencialmente real pode ser assustadora. Tanto flashbacks como uma intolerância para perspectivas alternativas sobre quais poderiam ser as intenções dos outros são característicos do ressurgimento deste modo. Ex: se eu acho que você fechou a sua porta porque você quer me rejeitar, simplesmente você quer me rejeitar.
Faz de conta: a criança sabe que a experiência interna pode não refletir a realidade externa, mas o mundo mental é dissociado da realidade. As indicações do ressurgimento deste modo no desenvolvimento futuro são a) sentimentos de vazio, inexpressividade e dissociação na esteira de trauma e b) conversa interminável, inconsequente sobre pensamentos e sentimentos. 
	Os relacionamentos de apego disfuncionais característicos de indivíduos com TPB não são apenas consequência de dificuldades em reter na mente uma representação estável e consistente da mente dos outros e de sua própria mente. Eles também estão ligados à desorganização do self. 
O relacionamento complexo entre o Estresse, Apego e Mentalização
	
Parece haver uma estreita ligação entre a excitação emocional e a ativação do sistema de apego, e essa ativação por sua vez tem um impacto sobre a capacidade de mentalização.
	Os prejuízos de mentalização em pacientes com TPB parecem ter relação com uma tendência à hiperativação do sistema de apego, talvez associada com experiências traumáticas.
	Apego seguro: a ativação do sistema de apego previsivelmente envolve um relaxamento de estratégias normais de cautela interpessoal. Há boa evidência de que a ativação intensa desse sistema está associada à desativação dos sistemas de regulação da excitação e do afeto, bem como à desativação de sistemas neurocognitivos que poderiam gerar desconfiança interpessoal – ou seja, aqueles envolvidos na cognição social ou na mentalização. 
	Apego Desligado: tendem a negar necessidades de apego. Eles afirmam autonomia, independência e força diante de estresse, usando estratégias de desativação do apego.
	Apego preocupado ou ansioso: está associado ao uso de estratégias de hiperativação do apego. Essas estratégias têm sido associadas de forma consistente à tendência a exagerar a presença e a gravidade de ameaças e com esforços frenéticos para encontrar apoio e alívio, com frequência expressos em comportamento exigente, adesivo. Estudos mostraram predominância em pacientes com TPB.
Obs: A história de trauma em geral observada de indivíduos com TPB apoia a hipótese de que a história de apego afeta a configuração do “interruptor” que muda o sistema de mentalização de cognição planejada, controlada e organizada para processamento automático com atenção diminuída, mal sustentada e vigilância aumentada para rupturas do apego, como rejeição e abandono. 
As estratégias de apego ansioso-preocupado, que são características de muitos pacientes com TPB, estão associadas a um limiar diminuído para ativação do sistema de apego e um limiar mais baixo para desativação da mentalização controlada, logo eles tem um limiar mais baixo para responder ao estresse. A hipótese em si poderia oferecer uma explicação abrangente para um dos aspectos dinâmicos centrais desses indivíduos: sua tendência a formar apegos fácil e rapidamente, muitas vezes resultando em decepções. Esse padrão seria devido a seu limiar baixo para ativação do sistema de apego e seu limiar baixo para desativação de sistemas neurais associados à cognição social controlada, incluindo os sistemas neurais envolvidos no julgamento da confiabilidade dos outros. Os ciclos interpessoais viciosos que são tão característicos de muitos pacientes com TPB, portanto, podem ser entendidos em termos de circuitos de feedback excitatório levando a vigilância aumentada para sinais relacionados a estresse no apego ansioso, sobretudo o apego caracterizado por alta ansiedade e alta esquiva.
	Desativação do apego: são capazes de manter “conectados” a mentalização controlada e julgamento da confiabilidade de outras pessoas durante o estresse leve, assim como os de afeto seguro. Entretanto, quando o estresse se torna grave, a estratégia de desativação deles provavelmente falha, levando a uma forte reativação de sentimentos de insegurança, a uma reativação aumentada de autorrepresentações negativas e a níveis aumentados de estresse.
	A partir dos achados, é sugerido que o tratamento deva ter como objetivo encontrar o equilíbrio ideal entre ativação do apego e mentalização. Além disso, tratamentos cujo foco é alcançar uma percepção do passado – e particularmente do passado traumático, que costuma envolver altos níveis de estresse – poderiam ser contraindicados em pacientes com prejuízos sérios na mentalização. Visto que o trauma está em geral associado à insegurança do apego, em particular com apego ansioso e desorganizado, os tratamentos orientados ao insight poderiam ser especialmente perigosos para o subgrupo de pacientes com TPB que sofreram trauma.
	ESTRATEGIAS DE APEGO, EXCITAÇÃO E MENTALIZAÇÃO CONTROLADA VERSUS AUTOMATICA
	Categoria do Apego
	Limiar para Mudança
	Força da resposta automática
	Recuperação da mentalização controlada
	Seguro
	Alto
	Moderada
	Rápida
	Hiperativador
	Baixo: hiper-responsividade a estresse
	Forte
	Lenta
	Desativador
	Relativamente alto: hiporresponsividade a estresse, mas com falha sob crescente estresse
	Fraca, mas moderada a forte sob crescente estresse
	Relativamente rápida
	Desorganizado
	Incoerente: hiper-responsividade a estresse, mas frequentemente com tentativas frenéticas de regulação descendente
	Forte
	lenta
Mentalização especifica do relacionamento: Mentalização no contexto
	A teoria do apego são em grande parte baseadas na suposição de que os modelos congitivo-afetivos de relacionamentos (modelos operantes internos) são relativamente estáveis ao longo do tempo e ativados em uma ampla série de relacionamentos interpessoais, incluindo os com pais, companheiros e amigos. Porém, é provável que a mentalização apresente flutuações consideráveis ao longo do tempo e entre contextos de relacionamento, não apenas em razão de estresse, mas também devido a qualidade de determinados relacionamentos.
	Quanto mais forte o apego em um determinado relacionamento, em um determinado momento, maior a probabilidade de aparecer anomalias na mentalização. Certamente, a evidência fornece forte sugestão de que, quando os laços afetivos entre terapeuta e cliente se intensificam, a qualidade da mentalização de pacientes com TPB tende a se deteriorar. Em geral, à proporção que o tratamento progride e a transferência se intensifica, – ativando os modelos operantes internos do paciente e o sistema de apego em geral – a qualidade da disposição psicológica provavelmente se deteriora de forma significativa, e a capacidade do paciente de perceber a mente do terapeuta como diferente de seu próprio estado mental às vezes é bastante limitada. 
Implicações no Tratamento
	A meta do tratamento deve ser estimular o apego e o envolvimento do paciente com o tratamento e ao mesmo tempo ajudá-lo a manter a mentalização. Deve-se evitar situações nas quais se espere que os pacientes falem dos estados mentais que não conseguem ligar à realidade sentida subjetivamente. Portanto, em relação a terapias dinâmicas, isso significa que deve: 
Reduzir foco nas interpretações do inconsciente, em favor do conteúdo consciente ou quase consciente;
Meta é recuperar a mentalização e não buscar insights;
Evitar descrever estados mentais mais complexos já que a mentalização do paciente é vulnerável;
Evitar discussão de trauma, exceto quando útil para reflexão de experiências atuais;
Promover curiosidadesobres estados mentais dos outros e suas ações, bem como os estados mentais explicam as ações do self;
Terapeuta deve evitar ser um novo espelho incongruente
Obs: Qualquer abordagem que siga na direção de alegar “saber” como os pacientes “são”, como devem se comportar e pensar e “por que são do jeito que são” provavelmente será prejudicial para indivíduos com uma capacidade de mentalizar vulnerável. 
	
As atitudes do Terapeuta devem incluir: 
Humildade – derivada de um não saber do terapeuta;
Identificar diferenças nos pontos de vista;
Legitimar e aceitar pontos de vista diferentes;
Questionar experiência do paciente: descrição da experiência em vez de explicação;
Evitar a necessidade de entender o que não está claro
Um componente importante dessa postura é a monitoração dos próprios erros como terapeuta. Esses momentos também oferecem oportunidades inestimáveis de explorar como os erros podem se originar de suposições equivocadas sobre estados mentais opacos e como malentendidos podem levar a experiências perturbadoras. Nesse contexto, é importante estar consciente de que o terapeuta está em constante risco de perder a capacidade de mentalizar diante de um paciente não mentalizador.

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