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Maria Lucimar Pereira Rodrigo Eduardo Zambon Políticas setoriais e políticas setoriais contemporâneas Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Pereira, Maria Lucimar ISBN 978-85-522-0316-2 1. Administração. I. Zambon, Rodrigo Eduardo. II. Título. CDD 352.081 Maria Lucimar Pereira, Rodrigo Eduardo Zambon. – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2018. 160 p. P436p Políticas setoriais e políticas setoriais contemporâneas / © 2018 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente Acadêmico de Graduação Mário Ghio Júnior Conselho Acadêmico Alberto S. Santana Ana Lucia Jankovic Barduchi Camila Cardoso Rotella Danielly Nunes Andrade Noé Grasiele Aparecida Lourenço Isabel Cristina Chagas Barbin Lidiane Cristina Vivaldini Olo Thatiane Cristina dos Santos de Carvalho Ribeiro Revisora Técnica Maria Ângela Santini Editoração Adilson Braga Fontes André Augusto de Andrade Ramos Leticia Bento Pieroni Lidiane Cristina Vivaldini Olo 2018 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Unidade 1 | Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos______________________________________________________________ Seção 1 - Anos de 1980: da década perdida à Constituição Federal de 1988 1.1 | A década perdida: o aumento da desigualdade social e as mobilizações da sociedade________________________________________________________ 1.2 | A mobilização pelas Diretas Já_____________________________________ Seção 2 - A nova constituição e a participação da sociedade_____________ 2.1 | A conquista da sociedade para a participação na Constituinte_____________ 2.2 | A construção federal como produto de conquista popular________________ 2.3 | Os direitos sociais consagrados na Constituição Federal de 1988_____________ 2.4 | A Constituição do Estado de direito democrático______________________ Seção 3 - A participação e controle social como conquista de cidadania e democracia______________________________________________________ 3.1 | Espaços de participação e controle_________________________________ 3.1.1 | Os conselhos gestores como espaços democráticos__________________ Unidade 2 | Políticas setoriais: trabalho, educação, habitação, saúde, álcool e drogas_______________________________________________________ Seção 1 - Política setorial de trabalho_________________________________ Seção 2 - Política setorial de educação________________________________ 2.1 | Política setorial de educação______________________________________ Seção 3 - Política setorial de habitação________________________________ Seção 4 - Política setorial de saúde___________________________________ 4.1 | Política setorial de saúde_________________________________________ Seção 5 - Política setorial de álcool e drogas___________________________ Unidade 3 | Políticas setoriais: família, criança e adolescente, idoso, pessoa com deficiência________________________________________________ Seção 1 - Política setorial de família___________________________________ Seção 2 - Política setorial de crianças e adolescentes______________________ Seção 3 - Política setorial da pessoa idosa_______________________________ Seção 4 - Política setorial da pessoa com deficiência_____________________ 4.1 | Política setorial pessoa com deficiência_______________________________ Unidade 4 | Políticas setoriais: mulher, LGBT, comunidades tradicionais (quilombolas, indígenas, ribeirinhos); gênero, migrantes_________________ Seção 1 - Políticas públicas para o público lésbica, gay, bissexual, travesti, transexual e transgênero – LGBTTT__________________________________ 1.1. | Violências e garantia de direitos____________________________________ Seção 2 - Comunidades tradicionais e as políticas públicas______________ Sumário 7 11 11 14 17 17 21 23 25 29 30 31 43 46 52 52 59 65 65 70 83 86 92 100 103 103 115 119 119 131 Apresentação O livro Políticas Setoriais e Políticas Setoriais Contemporâneas tem por objetivo apresentar a dinâmica das políticas setoriais no Brasil, especialmente aquelas que foram regulamentadas a partir da Constituição Federal de 1988. As unidades propõem provocar a reflexão sobre as mudanças no campo da proteção social, do direito do cidadão e da responsabilidade do Estado. É necessário e urgente que os alunos do curso de Serviço Social conheçam o processo e a trajetória da construção das políticas sociais, bem como seu arcabouço jurídico, considerando que é neste contexto que se executa a ação profissional. A primeira unidade do livro apresenta o contexto político, econômico e social no período marcado pelo processo de mobilização e reinvindicação que levou à aprovação da Constituição Federal de 1988, bem como aos avanços no campo da proteção social, especialmente com a ampliação e universalização dos direitos sociais e da política de seguridade social. Na Unidade 2, você poderá realizar uma aproximação introdutória acerca de algumas políticas sociais setoriais em seu contexto legal e suas propostas de efetivação na esfera da política pública. Vamos apreender brevemente o contexto das políticas sociais setoriais de trabalho, educação, habitação, saúde, álcool e drogas. Na Unidade 3, você poderá realizar uma aproximação introdutória acerca das políticas sociais setoriais de família, criança e adolescente, idoso, pessoa com deficiência, em seu contexto legal e suas propostas de efetivação na esfera da política pública. Na Unidade 4, e última deste livro, serão apresentados para a você os direitos dos grupos minoritários da sociedade, tais como as pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros – LGBTTT –, e as populações indígenas e quilombolas. Ainda nesta unidade também será registrado o processo de reconhecimento e promoção destes direitos fundamentais destas populações historicamente excluídas no Brasil. Desejamos que este conteúdo venha ao encontro da necessidade de aprendizagem dos alunos e contribua para somar com os conteúdos já estudados e, sobretudo, aprimore o olhar e a ação dos futuros profissionais de Serviço Social. Tenha um ótimo estudo!!! U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 7 Unidade 1 Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos A primeira unidade do livro Políticas Setoriais e Políticas Setoriais Contemporâneas tem como objetivo de aprendizagem apontar para os alunos os acontecimentos anteriores à aprovação da Constituição Federal de 1988, bem como os cenários político, econômico e social. Discutiremos nesta mesma unidade sobre os avanços contidos neste documento legal, que possibilitou as condições para a construção do processo de proteção social no país no campo legal. Objetivos de aprendizagem Na primeira seção da unidade serão abordados os antecedentes da promulgação da Constituição Federal de 1988, destacando os cenários político, econômico e social da década de 1980 e a mobilização da sociedade para as “Diretas Já” para eleições presidenciais neste mesmo período. Seção 1 | Anos de 1980: da década perdida à Constituição Federalde 1988 A segunda seção apresentará o processo da Constituinte, a trajetória da elaboração da Constituição Federal de 1988 e a participação da população na elaboração do texto constitucional e na conquista de direitos elementares do cidadão. Seção 2 | A nova Constituição e a participação da sociedade A terceira seção tratará dos avanços alcançados e registrados na Constituição Federal de 1988 no que se refere aos direitos de participação da sociedade civil na gestão das políticas públicas, destacando os espaços de exercício de controle social disponibilizados constitucionalmente. Seção 3 | A participação e controle social como conquista de cidadania e democracia Maria Lucimar Pereira U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos8 U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 9 Introdução à unidade A última versão da Constituição brasileira foi promulgada em 5 de outubro de 1988, depois de muita mobilização popular. Nela constam os direitos sociais essenciais ao exercício da democracia e da cidadania quando estabeleceu os mecanismos para o cumprimento dos referidos direitos sociais e criou instrumentos que garantiram a participação da sociedade na gestão das políticas sociais. A Constituição Federal de 1988 representou um importante marco na conquista dos direitos. Por isso também foi conhecida, inclusive mundialmente, por Constituição Cidadã. Raichelis (2006) destaca que para chegar neste produto, houve uma participação em massa dos movimentos sociais formados por estudantes, trabalhadores, entidades sociais, partidos políticos, sindicatos e outros no período de sua elaboração, o chamado, período da Constituinte. Este processo de participação da sociedade passa a ganhar importante espaço também na própria Constituição, pois passa a ser uma diretriz e um direito a ser exercido pelos cidadãos brasileiros além de ganhar novos contornos e dimensões na esfera pública. Vale destacar que o processo de mobilização da sociedade que culminou na aprovação da Constituição Federal iniciou na década anterior, ou seja, na década de 1980, na contraposição ao regime ditatorial que acontecia no Brasil desde 1964 que se fortaleceu com o Movimento pelas “Diretas Já”. Este último movimento foi um importante marco político no processo da mobilização da sociedade, pois movidas pelo desejo de voltar a eleger o presidente, milhões de pessoas ocuparam as ruas, praças e outros espaços públicos exigindo eleições diretas para presidente da República. No desdobramento das lutas, os movimentos também se organizavam em torno do direito de condições elementares de vida, por direitos sociais básicos a todo cidadão e por políticas sociais implantadas para que pudessem acessar esses direitos e ainda pelo direito da participação, considerando os anos de exclusão das decisões acerca das questões políticas do país. O resultado deste processo foi o maior avanço no campo social de todas as constituições brasileiras, pois ampliou o conjunto de direitos U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos10 civis e políticos e abrigou o conjunto de direitos sociais, iniciando o sistema de proteção social universal. Dentre eles, os direitos sociais mais destacados foram a saúde, como direito universal, e a assistência social, como política pública não contributiva, consolidando-se, assim, em termos legais, direito do cidadão e dever do Estado. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 11 Seção 1 Anos de 1980: da década perdida à Constituição Federal de 1988 Introdução à seção Os anos 1980 foram chamados pelos economistas de década perdida devido à estagnação no desenvolvimento econômico vivido tanto no Brasil como em países da América Latina. Essa estagnação na produção industrial provocou uma das maiores crises econômicas representada pela inflação alta, desemprego e, consequentemente, impactou no aumento (histórico) da desigualdade social. Entretanto, a década de 1980 também foi marcada por importantes mobilizações para a história do país. As pressões para o fim da ditadura militar, para as eleições para presidente da República e para uma Constituição que atendesse às necessidades da população. 1.1 A década perdida: o aumento da desigualdade social e as mobilizações da sociedade A década de 1980 é chamada tanto no Brasil como na América Latina como a “década perdida”, especialmente no âmbito da economia. A queda da produção industrial que levou à estagnação de grande parte da indústria, consequentemente, levou ao desemprego, até então nunca visto na história brasileira. Paralelo a tudo isso, ainda tinha a questão política. Em 1985 finda o Regime Ditatorial Militar, que perdurou no Brasil de 1964 a 1985, pelo menos oficialmente. Assim, inicia, neste período, a construção do processo de redemocratização do Estado de Direito Democrático. Como define Faquin (2010), o Estado Democrático de Direito vige um conjunto de leis, através do qual todos os cidadãos são considerados iguais e o Estado só pode atuar conforme o que está prescrito em leis. Como cidadãos, as pessoas têm seus direitos garantidos. O crescimento do Produto Interno Bruto – PIB – caiu expressivamente comparando a década de 1970, que foi de 7%, e de U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos12 1980, que foi de 2%. Além disso, as taxas de juros da dívida externa, que já vinha aumentando no período da ditadura militar, fizeram crescer ainda mais a dívida do Brasil com instituições financeiras americanas. Mestriner (1992) afirma que neste período o Brasil vivenciou muitas crises, como a econômica, a financeira, a política, a social, a do Estado e a de credibilidade, e destaca que os altos índices da inflação e do desemprego levaram 40% da população à situação de pobreza. A área social foi vítima diretamente das consequências da economia nacional e para piorar a situação da população, acrescente-se a herança das desigualdades sociais provocadas pelo “milagre econômico brasileiro” de 1968 a 1973. Milagre Econômico foi o nome dado a um período de crescimento econômico durante o período da ditadura militar no Brasil. Apesar da economia ter crescido consideravelmente, este mesmo período não registrou melhora alguma nas condições de vida da população, aliás, registra-se aumento nas desigualdades sociais com a concentração de renda para a população mais rica. A dívida social na década de 1980 é a soma da forma como a condução da política econômica, em detrimento da política social, foi conduzida nas últimas décadas. O aumento do desemprego, como consequência da estagnação da indústria e da alta da inflação, influenciou ainda mais a dramática situação em que vivia a população, repercutindo nas carências sociais. Entre as piores situações encontravam-se a desnutrição, o aumento da mortalidade infantil nas áreas mais pobres, das doenças endêmicas, da favelização urbana, e a baixa taxa de escolarização. O aumento das demandas sociais era dinâmico e a oferta de bens e serviços públicos estava muito aquém da necessidade apresentada. Para agravar ainda mais o quadro, o governo federal recuou na política de investimentos sociais e em infraestrutura, e adotou medidas de controle austero do orçamento público. Draibe (1988) destaca que esta forma de gestão do Estado rapidamente teve reflexos no campo das políticas sociais no sentido negativo. O orçamento da política de educação teve seu orçamento limitado e percentual fixo, isso fez com que logo perdesse a capacidade de investimento e abortasse as metas de médio e longo prazo que foram anteriormente planejadas para o sistema educacional. A restrição financeira também atingiu outras áreas sociais,como U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 13 o sistema previdenciário, que diante das restrições financeiras impostas pela política econômica, redimensionou as porcentagens de arrecadação e limitou os benefícios pagos, justificando que seria a forma para manter o equilíbrio orçamentário. Draibe (1988) reforça ainda que a forma seletiva das políticas sociais daquele período foi mais marcante devido ao conjunto de medidas administrativas, que a partir delas passaram a regular o acesso aos direitos sociais que estavam previstos na legislação vigente. Para o governo, a forma para a retomada das condições econômicas necessitaria da determinação de um contingenciamento no consumo da população, pois isso levaria à geração de poupança interna que seria capaz de disparar os níveis de produção da economia nacional. A estratégia era clara. Sequer era anunciado alguma proposta de combate à pobreza, bem como para melhorar as condições de acesso da população pobre, vítima das políticas econômicas e das políticas públicas. Questão para reflexão A década de 1980 foi marcada pela intensa crise econômica e também pelo fim da ditadura militar que perdurou no Brasil de 1964 a 1985. O retorno do processo democrático permitiu uma reorganização do movimento social, num patamar nunca visto até aquele momento, mas as opiniões se dividem: esta década foi de fato uma “década perdida”? Apesar da crise política e da estagnação da economia, quais dos indicadores que esta década pode ter sido a alavanca para as conquistas fundamentais? Para contribuir com a reflexão sugerimos a leitura do texto: Anos 1980, década perdida ou ganha? Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/ desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2759:catid =28&Itemid=23>. Acesso em: 18 jun. 2017. Era evidente que a condução política e econômica do regime militar havia agravado as condições de vida da população, especialmente das classes subalternizadas. As situações que mais provocaram a instabilidade na sociedade foram o crescimento do endividamento da Brasil frente às instituições financeiras americanas, a queda do PIB e o arrocho salarial, pois derrubavam por terra o discurso de desenvolvimento dos governos militares e cada vez mais a população aumentava sua insatisfação com relação ao governo. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos14 Essas insatisfações somadas a outros fatores levaram vários setores da sociedade a expressar-se nas ruas e em espaços públicos. Assim ressurgiram os movimentos sociais contestando as políticas do governo e do regime. 1.2 A mobilização pelas Direitas Já O processo de construção de um Estado Democrático perpassa vários fatores que contribuem e impulsionam. O movimento pelas “Diretas Já” constitui um destes devido à sua grande relevância para a política contemporânea brasileira. Este processo fez parte da abertura política, da participação e mobilização popular e da construção do sentimento de pertencimento e nacionalismo que se mobilizou em torno das eleições diretas para presidente da República. Este movimento marcou a história do Brasil. Milhões de brasileiros foram para as ruas, em todos os estados brasileiros, movidos pelo desejo de eleger o presidente depois de mais de duas décadas de regime ditatorial, em que este direito foi cerceado. Bazaga (2013) relata que muitos comícios foram realizados em todo país. O que teve a maior concentração de pessoas foi na Praça da Sé, em São Paulo, em 1984, com a presença de 1.500.000 pessoas. Este evento teve a participação de operários, estudantes, intelectuais, artistas, políticos que reforçaram a importância da mudança. Para saber mais Para saber mais sobre a mobilização do movimento da sociedade em torno da reivindicação por eleições diretas para presidente da República no Brasil, acesse o documentário “Diretas Já” que mostra alguns momentos de concentração da população em comícios com políticos, artistas, trabalhadores. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=6uD8xQ9aoWM>. Acesso em: 18 jun. 2017. As mobilizações e pressões populares movidas em torno das eleições diretas provocavam o então presidente, o Sr. João Figueiredo, a tomar medidas de repressão contra essas manifestações, principalmente nos grandes centros, já que eram neles que mais se concentrava a organização popular. As medidas do governo consistiam U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 15 na força policial, inclusive com as forças armadas controlando todos os espaços, o exército nas ruas e a aeronáutica no espaço aéreo. No dia 25 de abril de 1984 foi a votação da emenda Dante de Oliveira, que previa a alteração da Constituição Federal de 1969 para o restabelecimento das eleições diretas, ou seja, direito de a população eleger o presidente da República. Neste dia faltaram 22 votos para a aprovação desta emenda. Foram 298 votos a favor, 65 contrários, 113 deputados não compareceram para votar e 3 se abstiveram. Por tratar de uma emenda constitucional eram necessários dois terços dos votos, ou seja, 320 votos. Este dia foi de grande confronto entre governo e movimentos sociais. O Presidente João Figueiredo manteve a capital, Brasília, em estado de sítio, a sede da Ordem dos Advogados do Brasil foi fechada pelo exército e a cidade de Goiânia e outras nos arredores foram alvo de medidas semelhantes. A derrota da ementa provocou importante debate para a transição política no Brasil no que se refere à democracia, pois de um lado destacou o regime militar que estava desmontando devido ao desgoverno e a desarticulação da sua base política no congresso, e por outro, o movimento de oposição a este governo e regime que se encontravam em uma situação privilegiada devido à mobilização da população que clamava por avanços no campo social. Além disso, era necessário buscar uma solução para as crises de forma negociada, correndo o risco de trair a confiança e vontade popular e continuar a reproduzir as conciliações que beneficiavam a elite como fora historicamente. Em 1985, aconteceu a eleição indireta para presidente. O eleito pelo Congresso Nacional, em janeiro de 1985, foi Tancredo Neves, entretanto, ele não chegou a governar, devido ao seu falecimento em 21 de abril de 1985. Quem assumiu, então, foi o vice, José Sarney, que, durante o seu mandato (1985-1990), manteve aproximação com as Forças Armadas para ter respaldo político (NOZABIELLI, 2008). O início do processo de transição democrática foi complicado, pois o presidente que tomou posse tinha uma história de aproximação com o regime que a oposição se esforçou por anos para acabar. O governo Sarney foi dinâmico no que se refere às tentativas de estabilização da economia. Em março de 1986 apresenta uma reforma radical trocando a moeda do país que até então era Cruzeiro, passando-a para Cruzado, além disso congelou os preços e salários o que atingiu o sistema de cálculo da inflação. Esta era a grande meta. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos16 Foi neste governo que se elaborou e aprovou a Constituição Federal de 1988. Nesta nova Constituição foi atendido o grande apelo político dos movimentos sociais: eleições diretas para presidente da República. Definiu-se que a partir da próxima eleição a população elegeria o novo presidente. Atividades de aprendizagem 1. A década de 1980 ficou conhecida no Brasil e nos países latinos como a “década perdida”, especialmente no âmbito da economia. Qual foi o principal fator que provocou esta situação? a) A dificuldade de escolha na profissão por parte dos estudantes. b) A violência cometida por parte do regime militar. c) A queda da produção industrial. d) A cassação dos políticos corruptos. e)A queda do regime nazista em países europeus. 2. Foi apresentada uma Emenda Constitucional em 1982 que propunha a alteração na Constituição Federal com o objetivo de realizar eleições diretas para presidente da República em 1985. Isso era necessário, pois a Constituição da época havia sido elaborada durante a ditadura militar e nela estava suspenso o direito à escolha deste cargo por parte da população. Como ficou conhecida esta emenda? a) Emenda Tancredo Neves. b) Emenda Delfin Neto. c) Emenda João Figueiredo. d) Emenda Dante de Oliveira. e) Emenda Paulo Maluf. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 17 Seção 2 A nova constituição e a participação da sociedade Introdução à seção Atualmente, a expressão ‘participação popular’ está em todas as partes: nas orientações das políticas públicas, nas organizações privadas e nos programas de governo de todos os partidos políticos. O direito à participação que temos nos dias de hoje é resultado do processo que foi se construindo desde meados da década de 1970, quando surgem os novos movimentos sociais. Foi com a Constituição Federal de 1988 que consagrou a relevância da sociedade intervir na gestão ‘das coisas públicas’ a partir da instituição de vários mecanismos que possibilitaram a participação e o controle social. 2.1 A conquista da sociedade para a participação na Constituinte A história política do Brasil é recheada de manifestações populares particulares. Com o golpe militar de 1964 e os 21 anos de ditadura militar, a conjuntura política e social foi radicalmente alterada. Até o final da década de 1950 e os primeiros anos da década de 1960, as lutas populares multiplicavam-se. Destacam-se, neste período, os movimentos urbanos pela casa própria, pela redução da tarifa do transporte coletivo, por serviços públicos e, no meio rural, o movimento pela reforma agrária (ROCHA, 2008). Até a década de 1960 a participação nas políticas sociais limitava a “cidadania regulada”, sendo que os símbolos das políticas sociais eram a carteira de trabalho e a previdência social, pois apenas o trabalhador era reconhecido como cidadão. Entretanto, não eram todos os trabalhadores, havia a especificidade. A profissão deste trabalhador deveria ser reconhecida e ter um sindicato e este deveria ser reconhecido pelo Estado para poder atuar. Além disso, outro indicador para ser cidadão era necessariamente ser contribuinte do sistema previdenciário. Durante o regime militar, a estratégia de atuação das políticas sociais foi no sentido de ampliar a intervenção do Estado, alargando a capacidade da gestão governamental que favorecia as classes U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos18 sociais mais altas em detrimento das classes mais baixas, situação que acentuou enormemente a desigualdade social na segunda metade do século XX. O período da ditadura militar foi de apropriação do espaço público. Os interesses de alguns setores da sociedade, como os políticos e empresários, tinham acesso privilegiado às decisões das políticas sociais centralizadas. Essa dinâmica de funcionamento das políticas sociais distanciava-se do objetivo do combate à miséria (ROCHA, 2008). Questão para reflexão A participação social na gestão das políticas públicas é recente na história do Brasil. Esta conquista também é social e faz parte da construção da proteção social ao longo do século XX. Para chegar no arcabouço que se tem atualmente, quais os principais desafios enfrentados nesta jornada? Para contribuir no processo de reflexão, sugerimos a leitura do texto: A participação social como processo de consolidação da democracia no Brasil, disponível em: <http://cebes.org.br/site/wp- content/uploads/2014/03/A-Participacao-Social-como-processo-de- consolidacao-da-democracia-no-Brasil.pdf>. Acesso em: 29 ago. 2017. O marco mais expressivo de participação popular brasileira originou no seio da resistência contra o regime a partir dos anos de 1970 e durante os anos de 1980. Neste contexto surgem novos movimentos populares que se reorganizam em torno das demandas urbanas, sendo que estes foram iniciados antes do golpe militar e fortalecidos na década de 1980 com a crise política, econômica e social. As maiores reivindicações eram em torno de direitos sociais básicos, como educação, saúde, moradia, saneamento básico e condição de deslocamento, ou seja, transporte. Na história contemporânea do Brasil estão registrados mais de 20 anos vividos sob o regime autoritário da ditadura militar. Nesta ocasião, a participação em espaços políticos era totalmente limitada, em caso de discordar com o regime era impossível contar com espaços disponíveis e autorizados, entretanto, essas situações não impediram a exploração de espaços para além dos oficiais e controlados. A partir disso, uma multiplicidade de experiências participativas surgiu no seio da sociedade. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 19 O regime militar reprimia todas as organizações e expressões políticas contrárias ao regime, controlava e restringia a liberdade de expressão e das formas de organização de indivíduos e grupos. Por isso, inicialmente, as lutas eram às escondidas, especialmente nos primeiros 10 anos. Mesmo com as perseguições ainda havia espaços de mobilização e debate sobre a sociedade brasileira e seus contextos. Esses espaços foram ocupados por milhares de organizações em pouco tempo, tanto no campo formal como informal. Ao final da década de 1970 apontam novas expressões de mobilizações a partir das comunidades eclesiais de base, o Movimento Operário do ABC e Movimento Estudantil. É com o espírito de resistência e luta que em 1979 acontece a retomada da União Nacional dos Estudantes – UNE – e no início dos anos de 1980 surgem a Central Única dos Trabalhadores – CUT – e o Movimento dos Sem Terra – MST. Esse período é marcado pela ascensão dos movimentos populares no Brasil devido às suas lutas. Esses movimentos, além de reivindicarem condições dignas de vida, também reivindicavam o direito de participar nos processos decisórios e na gestão das políticas sociais. Isso se dava a partir da compreensão de que a população desejava, podia e devia contribuir para o debate frente aos problemas sociais e indicar propostas para o enfrentamento do déficit social da população, especialmente a excluída da proteção social estatal. A institucionalização da democracia no Brasil passou a fazer parte da pauta dos movimentos sociais da década de 1980. O amadurecimento deste processo levou à participação da sociedade em outro importante momento da história brasileira, o processo da nova Constituinte, ou seja, os mais diferentes movimentos sociais participaram do processo de elaboração da nova Constituição Federal que iniciou em novembro de 1986 (ALBUQUERQUE, 2006). Os movimentos sociais apresentaram um manifesto com mais de quatrocentas mil assinaturas a partir da iniciativa popular, reivindicando à Assembleia Nacional Constituinte o direito de participar do processo de elaboração da Constituição Federal. Com a apresentação do referido documento e ainda a organização e mobilização, foi aceita a participação junto às comissões de elaboração de emendas populares orientadas pelo Regimento Interno da Assembleia Constituinte. Este processo foi pioneiro no Brasil no que refere à participação ativa da sociedade no campo da elaboração de propostas para a nova Carta Magna. Para mobilizar, motivar e possibilitar a participação da população e U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos20 tornar o mais público possível esta agenda, o movimento “Participação Popular na Constituinte” mobilizou para a aprovação das emendas populares, entre elas encontram-seas emendas sobre os direitos da criança e do adolescente como prioridade absoluta e sobre meio ambiente, que ao final do trabalho dos atores envolvidos resultou nos artigos 225 e 227 da Constituição Federal, sendo: Artigo 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. [...] Artigo 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) (BRASIL, 2015). Além destas duas importantes áreas, o movimento Participação Popular na Constituinte provocou uma gama de discussões temáticas que eram necessárias problematizar com o governo naquele momento, por exemplo, a luta por moradia. Para esta demanda e outras, como a saúde universal, saneamento, especialmente para os trabalhadores dos centros urbanos, somou-se uma diversidade de movimentos sociais. Neles agregaram estudantes, representantes de categorias profissionais, organizações não governamentais – ONGs – e funcionalismo público comprometido com a ampliação dos direitos sociais e a democracia na gestão das políticas sociais. O período da Constituinte ficou marcado pelo envolvimento da sociedade na luta pela democracia, dos direitos sociais e políticos na perspectiva da operacionalização dos direitos pela via da implantação e implementação de políticas públicas, ampliando a responsabilização do Estado na proteção social. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 21 2.2 A Constituição Federal como produto de conquista popular A Constituição Federal brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, foi a sétima versão da Constituição desde o período do Império, em 1924. A última versão da Constituição foi mundialmente conhecida como Cidadã por conter uma série de mecanismos de proteção social e de instrumentos constitucionais que garante maior participação cidadã, como nunca houve na história brasileira. Para saber mais Características que se destacaram nos diferentes anos de atualização da Constituição Brasileira: 1824: A Constituição Imperial – a primeira brasileira. 1891: A Constituição Republicana – inaugurou a República. 1934: A Revolução Constitucionalista de São Paulo – pôs fim à República Velha. 1937: Era Getúlio Vargas – início do Estado Novo. 1946: Constituição Democrática – redemocratizou o país. 1967: Ditadura Militar – emendada pela EC Nº 1/69. 1988: Constituição Cidadã – trouxe de volta o Estado Democrático. Para saber mais sobre a história da Constituição Brasileira, sugerimos o material didático História Constitucional do Brasil. Disponível em: <http://www.iesp.edu.br/newsite/assets/2012/11/HistoriaCB.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2017. Foi expressiva a participação da sociedade no processo Constituinte, resultado que levou o nome de Constituição Cidadã, não apenas pelos avanços na área social, mas também pela participação dos movimentos sociais. A partir de 1988 os temas referentes à participação da população nos espaços públicos ocupam novos contornos e dimensões nas esferas públicas (RAICHELIS, 2006). Esses espaços foram conquistados a partir da mobilização que antecedeu ao fim da ditadura militar e a garantia de espaços participativos foi consagrada na Constituição Federal de 1988 e reafirmada nas legislações específicas de cada política pública. Diversas políticas públicas foram consagradas na Constituição U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos22 como direitos sociais, por exemplo, saúde, previdência e assistência social que compuseram a seguridade social. Além de garantir o direito de o cidadão acessar os serviços, programas, projetos e benefícios das políticas, ainda foi definido nas diretrizes destas mesmas políticas públicas que a participação na gestão também é um direito. Destaca-se também nesta Constituição o art. 3º que trata dos objetivos fundamentais da República, em especial o que tem como finalidade de construir uma sociedade livre, justa e solidária, promovendo o bem de todos sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 2015). Entretanto, sem dúvida, o maior avanço no campo do capítulo da ordem social é o que consagra a seguridade social, no art. 194, definindo um conjunto interligado de ações de responsabilidade tanto dos poderes públicos como também de organizações da sociedade, propostas para afiançar os direitos garantidos nas áreas da saúde, previdência, e assistência social. Esse conjunto de ações passou a fazer parte do novo sistema de proteção social brasileiro para além do trabalhador inserido no mundo do trabalho, mas estendido a todos os cidadãos brasileiros. Foi a partir deste marco que o Estado reconheceu a saúde como um direito social. Até aquele presente momento, a assistência à saúde estava intrinsicamente atrelada à política previdenciária, confiada àqueles inscritos em tal política que contribuíam mensalmente ao Instituto Nacional de Previdência Social – INPS. Distinguir a saúde como um direito social e para tanto requer política pública para que os cidadãos acessem tal direito é reconhecer que este assunto é de relevância pública e ainda que as condições de saúde da população têm relação com o contexto das políticas sociais e econômicas. Para operacionalizar esse direito na mesma norma jurídica, institui-se o Sistema Único de Saúde – SUS –, nacional, público, universal e igualitário. Para o financiamento, não apenas do SUS, como de todas as políticas da seguridade social, a Carta Magna determina também um sistema de financiamento a partir de tributos e das contribuições sociais, ou seja, cabia ao Estado a responsabilidade de garantir os recursos para o financiamento das políticas sociais. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 23 2.3 Os direitos sociais consagrados na Constituição Federal de 1988 A expectativa que se tem com a implementação dos direitos sociais na Constituição Federal de 1988 é que eles assegurem uma vida com dignidade para o povo brasileiro no que refere às suas demandas mais elementares. Falar em direitos sociais é falar de um assunto relativamente novo. Esses direitos passaram a fazer parte da vida em vários países apenas a partir do século XX, especificamente após a Segunda Guerra Mundial. Vale destacar que depois, em meados da década de 1940, os problemas sociais se intensificam, principalmente o desemprego, a fome e o desemprego. Os direitos sociais foram introduzidos no Brasil nas décadas de 1930 e 1940, especificamente no governo do Presidente Getúlio Vargas e durante o período da ditadura militar, após o golpe de 1964. Nestes dois momentos, tanto no período Vargas como durante a ditadura militar, o Estado cumpriu um papel fundamental na implantação dos direitos sociais, sobretudo para os trabalhadores. O maior destaque que não podemos deixar de citar foi a elaboração da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT – em 1943. Outro importante destaque foi a inclusão social dos trabalhadores rurais, que apenas em 1971 foram atendidos no sistema previdenciário através do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural –FUNRURAL. Por um lado, o Estado concedeu direitos sociais, por outro, restringia a população à participação, informaçãoe expressão de ideias. Durante a ditadura militar que perdurou por longos 21 anos foram ordenados Atos Institucionais, conhecidos como AIs, sendo estes a manifestação máxima da suspensão dos direitos civis e políticos. Carvalho (2002) relembra que o AI nº 1 suspendeu por dez anos o exercício dos direitos políticos de operários, intelectuais, sindicalistas, parlamentares e as organizações políticas como sindicatos foram fechadas ou ainda vítimas de intervenções. O AI nº 2 revogou o direito às eleições diretas para presidente da República, o presidente eleito indiretamente apenas por dois partidos teve seu poder ampliado e a opinião pública restringida. O Ato Institucional que mais provocou indignação foi o AI nº 5, pois este fechou o Congresso Nacional, suspendeu o habeas corpus para atos contra a segurança nacional e deliberou que todos os atos praticados pelo Estado decorrentes do AI U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos24 nº 5 não seriam analisados judicialmente (CARVALHO, 2002). Como já vimos anteriormente, nesta mesma unidade, a sociedade brasileira teve um papel fundamental durante o processo pelo fim da ditadura militar. Foi a partir da insatisfação e indignação com este regime que a sociedade se reorganiza e se mobiliza. Este processo culminou ao final da década de 1980 com a aprovação da Constituição Federal de 1988, na qual foram introduzidos novos direitos de cidadania, desta vez destacando que todos os brasileiros devem acessar os direitos sociais à educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Esta foi a primeira versão dos direitos sociais nesta Constituição. Atualmente, após algumas emendas constitucionais, ampliaram-se estes direitos que se consagram no artigo 6º da Constituição Federal “[...] educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 2015b). Além da consagração dos direitos elementares, como a saúde e a educação, esta Constituição também incluiu a assistência social como direito do cidadão e responsabilidade do Estado. Ficando para o passado que o amparo a segmentos mais vulneráveis como as pessoas pobres, as crianças, as pessoas com deficiência não é mais uma ação caritativa e espontânea da sociedade, mas um dever do Estado com todos os cidadãos que necessitarem. Esses direitos são fundamentais para os cidadãos por que o acesso a eles contribui para o desenvolvimento pessoal e o usufruto, inclusive, de outros direitos, como o direito à participação popular e o direito de ir e vir. Frota (2017) cita dois exemplos que podem ilustrar a importância destes direitos na conversão com outros direitos: • A educação pública de qualidade é um direito social, o acesso a este direito possibilita o desenvolvimento de confiança para usar livremente a cidade, ou seja, o usufruto do direito de ir e vir sendo este um direito civil, ou seja, com o acesso à educação e consequentemente à informação, pode-se escolher as melhores alternativas e principalmente, saber que entrar em espaços públicos é um direito de todos, como em tribunais, escolas, museus, cinemas e outros sem a preocupação de ser barrado. • O outro exemplo citado pela autora é que quando uma U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 25 criança acessa a rede de saúde, pública e de qualidade e tem uma alimentação adequada, ou seja, esta criança acessa direitos sociais, ela terá mais sucesso na escola e mais possibilidades de ser um jovem cidadão informado e participativo, inclusive podendo ser um líder no seu território, ocupando um cargo público, assim usufruindo de seus direitos políticos. A mesma autora ainda parafraseia o ditado popular “uma coisa leva a outra”, o que quer dizer que um direito provoca o acesso do outro (FROTA, 2017, p. 28). 2.4 A Constituição do Estado de Direito Democrático O Brasil definiu-se como um Estado de Direito Democrático na sua última Constituição Federal, deixando claro logo em seu primeiro artigo em que direciona como fundamentos da República a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político e ainda no único parágrafo estabelece que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 2015, p. 7). Desta forma, para concretizar a democracia e a cidadania do seu povo, faz-se necessário medidas que viabilizem condições para o exercício destes. A participação de um povo em seu país é um direito elementar de uma democracia, desta forma, materializando o Estado Democrático de Direito. Para Barroso (2013), para a constituição de um Estado de Direito Democrático é imperativo assegurar o respeito às liberdades individuais e ter como sagrado os direitos humanos e os direitos fundamentais garantidos em uma Constituição. Neste modelo de Estado a representação popular é a prioridade diante da vontade do Estado, ou ainda, dos representantes dele. É nesta perspectiva que a Constituição Federal de 1988 conferiu ao Estado de direito um caráter democrático que entende que o povo é a base do poder, portanto, é assegurado a ele a participação nas instituições públicas. Somente a partir desta normativa foi possível destacar nas políticas públicas diretrizes de descentralização, de participação popular e de municipalização, redefinindo e limitando o papel do Estado, o U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos26 qual passou a ser responsável pela criação de espaços de efetivas participações da sociedade civil e por outro lado empoderando a população no controle do que é público. A Constituição Federal de 1988 instituiu importantes instrumentos jurídicos para garantir a participação popular, tais como plebiscito, iniciativa popular de lei, audiência pública, orçamento participativo, fóruns, conferências e conselhos. Essas formas de possibilitar a participação modificaram a gestão das políticas públicas nos três níveis de governo, principalmente na esfera municipal, pois permitiram novas instâncias deliberativas, propositivas, articuladas, controladas e fiscalizadas, além de flexibilizar os processos sociais. A Constituição Federal permitiu que as decisões e operacionalizações das políticas públicas fossem transferidas aos municípios. Além da implantação de um sistema descentralizado e participativo, também é de sua responsabilidade a execução de programas, serviços, ações, projetos e benefícios, necessitando envolver a população em todo processo, nas discussões e decisões e nas fiscalizações sobre suas demandas e interesses. A participação popular enquanto processo da gestão das políticas públicas, deve ter caráter democrático e descentralizado. Neste contexto, a sociedade deve fiscalizar e controlar o Estado para que este cumpra a função de garantidor de acesso aos direitos sociais. O exercício da participação popular requer a ocupação dos espaços, principalmente aqueles definidos constitucionalmente, como os conselhos e as conferências entre outros, que primam pela discussão e decisão da população. A descentralização de poderes aumentou e possibilitou maior participação das organizações locais, sendo aquelas da sociedade civil organizada e, consequentemente, aumentaram as possibilidades de controle social. Para Mestriner (1992), a promulgação da Constituição de 1988 não foi suficiente para a transposição de um modelo de Estado assistencial para o Estado de direito. Ainda haveria que se enfrentar um longo caminho, comalternância de avanços e retrocessos durante esse processo histórico e político. O capítulo da ordem social, que trata entre outros assuntos sobre U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 27 a seguridade social, determina que as ações nas áreas das políticas de saúde, previdência e assistência social, necessariamente devem ter a participação dos cidadãos. Na gestão da política da previdência social o princípio da participação está definido no artigo 194, inciso VII, assinalando que além do caráter democrático também deve ser descentralizado e com a participação da comunidade, especialmente dos trabalhadores, dos empresários e dos aposentados. No que refere à política de saúde, o art. 198 que trata das ações e dos serviços, enquanto a diretriz geral é sobre a participação da comunidade. No caso específico da política de assistência social, em seu art. 204 inciso II da Constituição Federal, orienta que a participação é “por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis” (BRASIL, 2015). Foi a partir da regulamentação desses artigos, por normativas específicas, que foi privilegiada a implantação de diversas estruturas, como os conselhos gestores de políticas públicas. Cada política organizou seu conselho a partir de suas dinâmicas próprias, considerando a mobilização dos movimentos sociais da área. Os conselhos gestores das políticas sociais que compõem a seguridade social tiveram destino diferenciado, enquanto instrumento e espaço de participação popular e exercício de controle. Atividades de aprendizagem 1. O Governo autoritário que se instalou a partir de 1964 no Brasil não admitia qualquer expressão de mobilização popular. Diante disso, assinale a opção INCORRETA: a) A única forma de expressão era o teatro, o cinema e a música. Estas formas não sofreram forma de repressão alguma. b) A preocupação do governo era manter o controle social por meio dos mecanismos repressores e de coerção. c) Toda e qualquer participação era proibida, inclusive a eleição para diretorias dos sindicatos. d) Estimulava o exercício de uma política assistencialista como forma de manipular os trabalhadores. e) O silêncio atribuído à classe operária foi alimentado com a aceitação de suas principais lideranças. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos28 2. A Constituição Federal brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, foi a sétima versão da Constituição desde o período do Império em 1924. A última versão foi mundialmente conhecida como cidadã, por qual motivo levou este título? a) Por expressar o reconhecimento patronal com os trabalhadores, bem como a responsabilidade dos patrões em garantir a proteção social. b) Por conter uma série de mecanismos de proteção social e de instrumentos constitucionais que garantem a maior participação cidadã. c) Pela preocupação ambiental em proteger a flora e a fauna, em especial aqueles em risco de extinção, responsabilizando toda a sociedade. d) Pela implantação e implementação de políticas econômicas responsáveis pelo desenvolvimento econômico e consequentemente social. e) Pela retomada da democracia. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 29 Seção 3 A participação e controle social como conquista de cidadania e democracia Introdução à seção O conceito de participação social na esfera pública sempre foi condição elementar para o exercício da democracia e da cidadania em um Estado, dito, de Direito Democrático. A democracia implica participação corresponsável e a interação entre os diferentes atores do processo. Isso indica que o Estado e a sociedade civil decidem juntos os rumos das políticas públicas. Sem dúvida, esta conquista que consta na Constituição Federal de 1988 foi fruto dos movimentos que surgiram na base da sociedade no contexto da ditadura militar nas décadas de 1970 e 1980, que a partir da mobilização e reivindicação conseguiriam imprimir nesta normativa a democratização no nível institucional. A democratização do Estado brasileiro foi para além da consagração dos direitos sociais e da seguridade social, foi também o direito de decidir sobre a gestão das políticas sociais. Esses direitos também foram impressos na Constituição e ainda nos espaços de participação na gestão destas políticas. Entre esses espaços, os conselhos gestores são os mais presentes na vida da população, que, além de garantir o direito de participar também exercem o controle social. O controle sobre o Estado e suas ações. Para saber mais Exercer o controle social é participar na gestão das coisas públicas e ainda uma forma de prevenir a corrupção, pois com a fiscalização do dinheiro público, com o que é gasto e a forma que é gasto pela população ficará difícil desviar a finalidade do recurso. Entretanto, para isso, são necessários informação e conhecimento sobre recursos, orçamentos, legislações e outros assuntos que perpassam a gestão pública. Por isso sugerimos o material: Controle social: orientações aos cidadãos para participação na gestão pública e exercício do controle social, elaborado e publicado pela Controladoria-Geral da União (CGU). Disponível em: <http://www.cgu. gov.br/Publicacoes/controle-social/arquivos/controlesocial2012.pdf>. Acesso em: 8 ago. 2017. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos30 3.1 Espaços de participação e controle Demo (1996) afirma que participar implica envolver-se, debater, propor e partilhar ideias e que a participação é um processo de conquista a partir das relações de envolvimento, iniciativa com a ação. A participação requer que o sujeito se expresse e se envolva efetivamente nas atividades, ações e serviços das políticas públicas nas quais está envolvido. Bravo (2007) reafirma que a participação social envolve a gestão de todo processo nas políticas, desde o planejamento até a fiscalização em momento da operacionalização realizada pela sociedade civil organizada. Atualmente, no Brasil, a participação dos cidadãos no sistema político é fato. A partir da Constituição Federal de 1988 é direito e responsabilidade de cidadania a participação na implantação e gestão das políticas públicas juntamente com o governo na divisão de responsabilidades das decisões públicas. Além de garantir este direito, a Constituição também instituiu mecanismos de participação por meio da ampliação de espaços democráticos. A participação exercida pela sociedade é uma das condições para o exercício do controle social para garantir os direitos sociais e ultrapassar as formas tradicionais de controle técnico e burocrático, sendo esta condição elementar para a operacionalização de outra diretriz, a descentralização. Oliveira (1999) afirma que o controle é exercido sobre o campo público, e que se compreende que todos os cidadãos brasileiros são detentores deste poder de controlar, entretanto, para o exercício desta importante função se faz necessário apropriar-se de conhecimento e informação, especialmente sobre os seus direitos. Depois de muito tempo de ditadura militar, foi conquistado o direito de o cidadão expressar a sua opinião, além disso, de participar de decisões políticas, praticando sua cidadania, mas é necessário que a construção da cidadania seja contínua e para tal é essencial que tenha estímulo e condições apropriadas para o exercício do direito à participação social. Um dos espaços mais utilizados para a execução da participação são os conselhos municipais de políticas públicas, mas estes não são os únicos garantidos constitucionalmente. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 31 3.1.1 Os conselhos gestores como espaços democráticos A Constituição Federal de 1988proporcionou a implantação de mecanismos de participação popular nas gestões, baseada nos princípios da descentralização e da democracia. Um desses mecanismos são os espaços dos conselhos gestores de políticas públicas que são aparelhos que admitem a sociedade civil participar da elaboração, implantação, implementação e fiscalização dessas políticas. “Os conselhos constituem, no início deste novo milênio, a principal novidade em termos de políticas públicas” (GOHN, 2001, p. 7). De forma objetiva Gohn (2001, p. 7) conceitua os conselhos como “canais de participação que articulam representantes da população e membros do poder público estatal em práticas que dizem respeito à gestão de bens públicos”. Quando propostos na Constituição esses conselhos foram idealizados como espaços inovadores e essenciais que viabilizassem, de fato, o exercício da cidadania ativa, pois apresentam-se como espaços públicos, formados paritariamente por membros da sociedade civil e dos poderes públicos com poderes deliberativos e consultivos. É nestes espaços que a sociedade tem o direito e a responsabilidade de cogestão da administração pública, já que pode decidir (discutir e deliberar) em relação às questões da gestão. Além da participação nas decisões, cabe aos cidadãos brasileiros a fiscalização intransigente da utilização dos recursos públicos. Este modelo de participação antecede a Constituição e se insere na história no Brasil nos anos 1970 e 1980, quando são criados os conselhos comunitários, como exigência do poder público, para negociar as demandas apresentadas pelos movimentos populares, ou seja, os conselhos eram formados por representantes do movimento que negociavam com representantes do Estado. Esta experiência foi um embrião importante para o processo constituinte. Para Gonh (2001), o que prevaleceu foi a compreensão do conselho como um dos espaços de participação que possibilita a mudança da forma de se fazer a gestão pública, especialmente na construção das políticas sociais, na expectativa da democratização e transparência, sendo o espaço de relação entre a sociedade e o Estado para a mediação de conflitos. Os conselhos gestores de políticas públicas como espaços de participação popular favorecem novas formas de relações entre o U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos32 Estado e a sociedade, pois neste espaço há a participação de diferentes representações sociais para a tomada de decisões e construção de políticas e ainda empoderar os conselheiros para o cumprimento da vigilância sobre a operacionalização do que foi deliberado e a qualidade destas ações, sem perder de vista o cuidado com o recurso público, inclusive da prestação de contas por parte do executivo. Atualmente, os conselhos gestores passaram a fazer parte da gestão das políticas públicas nos municípios brasileiros. Alguns destes conselhos, por exemplo, o de saúde, tem influência na definição das prioridades nesta área é maior do que o poder da Câmara de Vereadores e de outros órgãos locais. Em 2009 havia no Brasil mais de 43 mil conselhos municipais, deste montante o que se verifica em maior número são os Conselhos de Política de Assistência Social, naquele momento presentes em 99% dos municípios, depois os Conselhos de Alimentação Escolar, em 98% das cidades e, posteriormente, os Conselhos de Saúde com 97% e os Conselhos do FUNDEB em 94% (BUVINICH, 2013). Este crescimento quantitativo dos conselhos infelizmente não significou, na mesma proporção, o seu sucesso em superar os desafios impostos durante o processo de implantação e que ainda permanecem na realidade e resistem para ser superados. Além disso, a questão da qualidade da participação dos e nos conselhos é um tanto quanto desalentadora, como apresenta Carvalho (2017), pois há fragilidades na representatividade dos conselheiros no que refere à competência de deliberar e exigir suas decisões frente aos representantes do governo. Tatagiba (2003) destaca outra grave situação que é a resistência dos governos em respeitar e operacionalizar as decisões destes espaços, necessitando abrir mão do diálogo, do debate e utilizando estratégias de negociação para ter alguns poucos avanços. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 33 Questão para reflexão Como vimos até aqui, os Conselhos Gestores de Políticas Públicas são formados por espaços institucionais, permanentes, autônomos, compostos por membros da sociedade civil e poder público com a responsabilidade de propor políticas públicas, deliberá-las, acompanhá- las e fiscalizá-las. Desde sua reformulação com a Constituição Federal de 1988, a participação da sociedade e governo é paritária, sendo assim, o Governo está presente em todo processo, portanto, não deveria ser resistente para a implantação do que se delibera neste espaço. A mesma autora, Tatagiba (2003, p. 98), aponta outra fragilidade observada no processo: “os conselhos apresentam, no cenário atual, uma baixa capacidade propositiva, executando um reduzido poder de influência sobre o processo de definição das políticas públicas”. Essas dificuldades apresentadas, e outras vividas no cotidiano dos conselhos, fazem com que seja colocada em dúvida a viabilidade deste importante espaço de participação social conseguir alcançar os objetivos para o qual foi proposto na Carta Magna de 1988, em especial de ser por excelência o espaço democrático, de cidadania e do exercício do controle social. Temos que lembrar que o processo democrático está sendo construído e que a construção tem avanços e retrocessos, pois temos na nossa história duas grandes ditaduras, do período do Presidente Vargas e outra muito recente que é a ditadura militar. Além disso, ainda estamos construindo a cultura da participação, portanto, faz- se necessário e urgente tornar público o direito à participação e à responsabilidade do cuidado do que é público, como as políticas sociais, o que desperta nos cidadãos o desejo da participação e da escolha, como citação de Rousseau (apud NASCIMENTO, 1998, p. 237): Entre todos os povos do mundo, não é em absoluto a natureza, mas a opinião, que decide a escolha de seus prazeres. Melhorai as opiniões dos homens, e seus costumes purificar-se-ão por si mesmos. Ama-se sempre aquilo que é belo ou que se julga belo. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos34 Atividades de aprendizagem 1. A inserção dos processos democráticos e do controle social nas políticas públicas tem sua institucionalização na Constituição Federal de 1988, que ordena a participação da sociedade na gestão destas políticas. Entre os pressupostos principais dos conselhos gestores destaca-se: a) A separação e distanciamento entre a formulação dos conselhos e o controle social, pois estes são construídos por instituições prestadoras de serviços às quais têm inseparável relação com o Estado. b) A implantação de espaços democráticos constituídos na diretriz da descentralização administrativa, cujo avanço está relacionado com a capacidade técnico/gerencial dos membros da sociedade civil. c) A construção de espaços democráticos que busquem, principalmente, a expansão da democracia, a construção da cidadania e ainda proporcione tanto o exercício do controle social quanto as demandas da sociedade. d) O caráter apenas consultivo dos conselhos gestores de políticas públicas o impedem de exercer o controle social devido à sobreposição de atribuições com as instâncias legislativas. e) A participação de membros em espaço dos poderes públicos com a prerrogativa de fiscalização das ações das organizações da sociedade civil. 2. A Constituição Federal de 1988 implantou mecanismos e dispositivos importantes para garantir e proporcionar a participação da sociedade. Entreos espaços institucionais de participação, quais os espaços mais utilizados pela população? a) As redes de serviços socioassistenciais. b) Os projetos de responsabilidade social privada. c) As secretarias municipais de políticas públicas. d) Os conselhos gestores de políticas públicas. e) As organizações comunitárias e sociais. Fique ligado • A década de 1980 ficou conhecida como a “Década Perdida”, tanto no Brasil como nos países latino-americanos, devido à queda da produção industrial, que provocou a estagnação de grande parte da indústria e consequentemente levou ao desemprego até então nunca visto na história brasileira. • Em 1985 finaliza oficialmente o regime da ditadura militar, que perdurou no Brasil de 1964 a 1985. Iniciam neste período as condições U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 35 para a construção do processo de redemocratização do Estado de Direito Democrático. • Na década de 1980, o Brasil vivenciou muitas crises, como a econômica, a financeira, a política, a social, a do Estado e a de credibilidade. Destaca-se neste momento, o alto índice da inflação e do desemprego, o que levou 40% da população à situação de pobreza, especialmente no Brasil. • A construção do processo democrático perpassa por vários fatores que contribuem e impulsionam, um deles foi o movimento pelas “Diretas Já” devido à sua grande relevância para a política contemporânea brasileira. • O movimento pelas “Diretas Já” não conseguiu a eleição direta para presidente da República em 1985, definiu-se que a partir da próxima eleição a população elegeria o novo presidente, entretanto, seguiu no sentido de mobilizar para o processo Constituinte. • Até os anos 1960, a participação nas políticas sociais limitava a ‘cidadania regulada’, e as políticas sociais destinavam-se aos contribuintes da previdência social por meio da carteira de trabalho, pois apenas o trabalhador do mundo formal era reconhecido como cidadão. • O marco mais significativo de participação popular brasileira surgiu no meio da resistência e enfrentamento contra o regime da ditadura militar a partir dos anos de 1970 e durante os anos de 1980. • Para mobilizar, motivar e possibilitar a participação da população e tornar o mais público possível esta agenda, o movimento “Participação Popular na Constituinte” mobilizou-se para a aprovação das emendas populares, entre elas as emendas sobre os direitos da criança e do adolescente como prioridade absoluta e sobre meio ambiente, que ao final do trabalho dos atores envolvidos resultou nos artigos 225 e 227 da Constituição Federal. • A última versão da Constituição foi mundialmente conhecida como cidadã por conter uma série de mecanismos de proteção social e de instrumentos constitucionais que garantem maior participação cidadã, como nunca houve na história brasileira. • A Constituição Federal permitiu que as decisões e U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos36 operacionalizações das políticas públicas fossem transferidas aos municípios. Além da implantação de um sistema descentralizado e participativo, também é de sua responsabilidade a execução de programas, serviços, ações, projetos e benefícios, necessitando envolver a população em todo processo, discussões, decisões e fiscalizações sobre suas demandas e interesses. • Demo (1996) afirma que participar implica envolver-se, debater, propor e partilhar ideias e que a participação é um processo de conquista a partir das relações de envolvimento, iniciativa com a ação. • Ultimamente, no Brasil a participação dos cidadãos no aparelho político é fato. Isso foi possível a partir da Constituição Federal de 1988, que estabeleceu o direito da participação na implantação e gestão das políticas públicas juntamente com o governo na divisão de responsabilidades das decisões públicas. • “Os conselhos constituem, no início deste novo milênio, a principal novidade em termos de políticas públicas” (GOHN, 2001, p. 7). • Os conselhos gestores de políticas públicas como espaços de participação popular favorecem novas formas de relações entre o Estado e a sociedade, pois há a participação de diferentes representações sociais para a tomada de decisões e construção de políticas. • Os conselhos gestores passaram a fazer parte da gestão das políticas públicas nos municípios brasileiros. Alguns destes conselhos, como o de saúde, têm mais influência na definição das prioridades nesta área do que o poder da Câmara de Vereadores e de outros órgãos locais. Para concluir o estudo da unidade Na história do Brasil, as constituições foram evoluindo ao adotar os direitos sociais paralelamente aos direitos civis e políticos. A última versão da constituição inovou mais ainda quando amplia os direitos sociais a todos os cidadãos brasileiros e consagra a seguridade social como um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 37 saúde, à previdência e à assistência social” (BRASIL, 2015, p. 117). Para além dos direitos sociais, também foi conquistado na Carta Magna o direito à efetiva participação da população e o exercício do controle sob as ações do Estado. Para o usufruto deste direito, o espaço por excelência são os Conselhos Gestores de Políticas Públicas, que têm em sua natureza todas as condições de realizar o controle social de forma democrática por terem sido constituídos de caráter plural e com poder de deliberação. Entretanto, o usufruto dos direitos, de todos os direitos duramente conquistados, perpassa pelo conhecimento destes e ainda do processo de conquistas, portanto, faz-se necessário que, você tome conhecimento destes fatos e aproprie-se do conhecimento e das informações para tornar-se um agente de mudança, conforme orienta o código de ética da profissão. Para tanto, sugerimos o bom uso do material aqui apresentado e das pesquisas nos endereços eletrônicos sugeridos, além da participação no fórum da disciplina e nas aulas atividade. Também sugerimos que se façam buscas em outros materiais e fontes de informações, lembrando que o assunto é dinâmico e se faz necessária sempre sua atualização. Atividades de aprendizagem da unidade 1. A Constituição Federal de 1988 foi mundialmente conhecida como “constituição cidadã”, pois foi considerada uma grande conquista democrática para os brasileiros após longo período de regime militar. Aponte, entre as alternativas, qual direito contribuiu para a Constituição adquirir tal apelido. a) Concurso público para os cargos públicos. b) Consagração da seguridade social. c) Conquista dos direitos individuais. d) Imigrantes como cidadãos de direitos. e) Direito ao meio ambiente equilibrado. 2. Em 1985 finda o Regime ditatorial militar no Brasil. Assim, inicia neste período a construção do processo de redemocratização do Estado de Direito Democrático. Como define Faquin (2009), o Estado Democrático de Direito vige um conjunto de leis, através do qual todos os cidadãos são U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos38 considerados iguais e o Estado só pode atuar conforme o que está prescrito em leis. Como cidadãos, as pessoas têm seus direitos garantidos. Qual foi o período em que perdurou a ditadura militar no Brasil? a) 1930 a 1945. b) 1937 a 1950. c) 1945 a 1960. d) Não houve ditaduras no Brasil. e) 1964 a 1985. 3. Os Conselhos Gestores de Políticas Públicas são canais institucionais, plurais, permanentes, autônomos, compostos por representantes da sociedade civil e do poder público, cujas maiores funções são propor diretrizes das políticas públicas, fiscalizá-las, controlá-las e deliberar sobre elas. Apartir da Constituição Federal de 1988 foi possível esta forma de gestão nas políticas públicas. Quais as fragilidades mais presentes no cotidiano dos conselhos? a) Composição desproporcional, mais membros representantes dos poderes público em relação à sociedade civil. b) Baixa capacidade propositiva dos conselheiros e resistência dos governos em respeitar as deliberações. c) A implantação e implementação dos conselhos não faz parte da realidade dos municípios brasileiros. d) Conflitos nas disputas para ocupar os espaços dos conselhos como conselheiros. e) Falta de legislação específica para a regulamentação dos Conselhos Gestores de Políticas Públicas. 4. A seguridade social brasileira constitui um conjunto de ações proporcionadas pelos poderes públicos e pela sociedade aos cidadãos em momentos de redução ou perda de renda, contingências como doenças, acidentes, maternidade ou desemprego, entre outras. Para garantir essas proteções, quais políticas sociais são necessárias? a) Trabalho, educação e saúde. b) Trabalho, moradia e previdência social. c) Saúde, previdência e assistência social. d) Habitação, trabalho e previdência social. e) Saúde, habitação e trabalho. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos 39 5. Com relação aos Conselhos Gestores de Políticas Públicas, analise as afirmativas a seguir: I. Os conselhos gestores tornaram-se instituições importantes no âmbito das políticas públicas a partir da Constituição Federal de 1988. II. Os conselhos gestores têm como principal desafio constituir espaços democráticos e promover a construção da cidadania. III. Os conselhos gestores são formados por representantes de diversos segmentos da sociedade civil, como usuários, trabalhadores e prestadores de serviços das políticas públicas. Assinale a alternativa que está correta: a) I apenas. b) II apenas. c) III apenas. d) I e II apenas. e) II e III apenas. U1 - Redemocratização da sociedade brasileira e a conquista de direitos40 Referências ALBUQUERQUE, M. C. (Org.).z Participação popular em políticas públicas: espaço de construção da democracia brasileira. São Paulo: Instituto Pólis, 2006. BARROSO, L. R. B. Direito constitucional contemporâneo. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. BAZAGA, R. G. As “Diretas Já”: Uma análise sobre o impacto da campanha no processo de transição política brasileira. XXVII Simpósio Nacional de História. Natal: 2013. Disponível em: <http://www.snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1364952315_ARQUIVO_ ARTIGOANPUH_1_.pdf>. Acesso em: 30 jul. 2017. BOSCHETI, I. Seguridade social e trabalho: paradoxos na construção das políticas de previdência e assistência social no Brasil. Brasília: Letras Livres - UNB, 2006. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 48. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015. 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U2 - Políticas setoriais: trabalho, educação, habitação, saúde, álcool e drogas 43 Unidade 2 Políticas setoriais: trabalho, educação, habitação, saúde, álcool e drogas Nesta unidade, você poderá realizar uma aproximação introdutória acerca de algumas políticas sociais setoriais em seu contexto legal e suas propostas de efetivação na esfera da política pública. Vamos apreender brevemente o contexto das políticas sociais setoriais de trabalho, educação, habitação, saúde, álcool e drogas. Objetivos de aprendizagem Nessa Seção, você estudará o trabalho como política setorial a partir dos pressupostos legais e à luz da literatura vigente. Identificará os tipos de trabalhadores e as suas relações com o trabalho. Seção 1 | Política setorial de trabalho Na Seção 2, trataremos da política setorial de educação. Apresentaremos as políticas e programas voltados para o ensino. Seção 2 | Política setorial de educação Neste momento, o estudo está voltado para a política setorial de habitação, será apresentado um breve apanhado histórico e as principais ações do governo para garantir tal direito. Seção 3 | Política setorial de habitação Nessa Seção, a política setorial estudada é a saúde. Definimos saúde e apresentamos algumas políticas vigentes no país. A política setorial sobre álcool e drogas é apresentada nessa seção. Você constatará que se trata de um problema
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