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CONTABILIDADE AMBIENTAL AULA 4 Profª Ana Lizete Farias 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula vamos aprofundar nossos conceitos sobre sustentabilidade e a sua relação por meio de diferentes contextos e atores. Primeiro, vamos compreender quais as principais questões do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, quais os temas que estão presentes no dia a dia da nossa sociedade, inclusive com base em um ponto de vista histórico. A ética, nesse contexto, surge quase de forma natural, por isso veremos quais as implicações no tocante à responsabilidade ambiental. Na sequência, veremos como um ator importante, que é o setor empresarial, tem se posicionado no tema da sustentabilidade e como isso se deu ao longo das últimas décadas. A seguir, aprofundaremos a nossa compreensão sobre Desenvolvimento Econômico e meio ambiente, aprendendo a distinção entre Economia Ambiental e Economia Verde. Por fim, vamos então discutir sobre o conceito de desenvolvimento sustentável, aprendendo que não há uma definição única. E, para dar início à nossa aula, na qual falaremos sobre o tema da sustentabilidade, partiremos do recorte de dois relatórios da Oxfam sobre o cenário brasileiro dos últimos em termos sociais. Se queremos um mundo mais sustentável, precisamos compreender qual cenário precisamos realmente transformar. Vamos à nossa aula! CONTEXTUALIZANDO Neste momento, o 1% mais rico da população mundial possui a mesma riqueza que os outros 99%, e apenas oito bilionários possuem o mesmo que a metade mais pobre da população no planeta. Por outro lado, a pobreza é realidade de mais de 700 milhões de pessoas no mundo. Trata-se de uma situação extrema. A desigualdade e a pobreza não são inevitáveis. São, antes de mais nada, produtos de escolhas políticas injustas que refletem a desigual distribuição de poder nas sociedades. Mudar essa realidade requer novas escolhas políticas, reiteradas ao longo do tempo, e sustentadas por uma sociedade com igual acesso à democracia. Entre 1990 e 2013, quase um bilhão de pessoas deixaram a condição de pobreza, ou seja, passaram a viver com mais de US$ 1,90 por dia – critério que, apesar de usual, é pouco ambicioso. Calcula-se que outras 200 milhões de pessoas poderiam ter tido igual destino se, no mesmo período, o crescimento médio da renda dos mais pobres fosse superior ao crescimento médio da renda dos mais ricos, reduzindo as distâncias entre a base e o topo da pirâmide social. Em setembro de 2015, os países reunidos na 70ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) acordaram uma nova agenda de desenvolvimento até 2030 – os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – reforçando o 3 compromisso de erradicação da pobreza no mundo. Um dos grandes avanços nessa agenda em relação aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) é o estabelecimento de um objetivo para redução de desigualdades econômicas, o ODS 10, que prevê medidas para uma economia mais inclusiva até 2030. Trata- se de um objetivo que requer grande ambição prática e compromisso político. A roda da redução de desigualdades parou no Brasil. Entre 2017 e 2018, houve uma conjunção de indicadores negativos que contam a triste história de um grave recuo do progresso social no país. São retratos recentes de um processo que teve início há mais tempo e que não mostra sinais de reversão. Tendo-se em conta os últimos cinco anos, houve aumento da proporção da população em condição de pobreza, do nível de desigualdade de renda do trabalho e dos índices de mortalidade infantil . O coeficiente de Gini de renda domiciliar per capita, índice que mede a desigualdade de renda no país e que vinha caindo desde 2002, estagnou entre 2016 e 2017. Considerando o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável – ODS 10, que preconiza a “redução de desigualdades dentro dos países e entre eles”, o Brasil caminha a passos largos para trás. Entre 2016 e 2017, os 40% mais pobres tiveram variação de renda pior do que a média nacional. (...) Nesse mesmo período, mulheres e a população negra tiveram pior desempenho de renda do que homens e a população branca, respectivamente, o que significou um recuo na equiparação de renda. (...) Tal cenário é a marca de uma crise econômica, fiscal e política que vivemos desde fins de 2014. Houve retração geral da renda nacional desde então, produto da recessão que praticamente fez dobrar o desemprego no país, de 6,8% em 2014 para 12,7% em 201714. Tal movimento afetou muito mais os pobres, as mulheres e a população negra. (Oxfam, 2017) TEMA 1 – QUESTÕES AMBIENTAIS LIGADAS À SUSTENTABILIDADE Há muitos elementos em jogo quando falamos de meio ambiente e sustentabilidade: desde o comportamento das empresas em relação à apropriação dos recursos naturais, o papel das instituições que nos governam, até os nossos atos enquanto cidadãos comuns que integram a sociedade. Por isso, julgamos interessante e oportuno trazer esse breve recorte de dois relatórios feitos pela Oxfam International (<https://www.oxfam.org.br/>), em 2017 e 2018, uma confederação de 20 organizações e mais de 3000 parceiros, que atua em mais de 90 países na busca de soluções para o problema da pobreza, desigualdade e da injustiça, por meio de campanhas, programas de desenvolvimento e ações emergenciais. No texto, podemos ter uma ideia do quão grande são as desigualdades existentes no nosso país, desigualdades essas que impactam significativamente a condição dos recursos naturais. Além disso, o texto também faz uma menção aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, uma renovação ou mesmo ampliação de compromissos outrora assumidos por meio dos Objetivos do Milênio, ainda inconclusos, agora intitulados Agenda 2030. 4 Partindo desse cenário, vamos entender por que precisamos, de forma urgente, avançar na direção de uma sustentabilidade ambiental. Começaremos com um pouco de história. É de compreensão usual que a Terra teve sua evolução determinada pelas forças geológicas desde sua origem, há cerca de 4,5 bilhões de anos, as quais incluem transformações significativas em sua crosta e atmosfera, mas, com o início da Revolução Industrial, na segunda metade do Século XVIII, um novo agente de mudança se somou às transformações geológicas: o homem. A partir do final da Segunda Grande Guerra Mundial, no entanto, o desenvolvimento da sociedade humana passou a gerar implicações negativas no ecossistema terrestre num crescimento exponencial de degradação. (Marques, 2015) Uma das expressões máximas dessas advertências foi seguramente a configuração de um novo período geológico, o Antropoceno, caracterizado pelo fato de que o homem passa também a contribuir de forma expressiva como um agente geológico de transformação da paisagem global (Artaxo, 2014). Também é importante relembrar algo que já comentamos, brevemente, em nossas aulas anteriores, acerca do programa de pesquisas sobre mudanças ambientais, que teve como objetivo avaliar a situação dos principais ecossistemas do mundo, com o apoio das Naçoes Unidas, chamado Avaliação Ecossistêmica do Milênio ou Millennium Ecosystem Assessment. Os primeiros resultados, divulgados no ano de 2005, deram o alerta inicial sobre o impacto negativo irreversível de de’predação dos nossos recursos naturais, indicando que a situação constatada tende a se agravar significativamente nos próximos 50 anos (Millennium Ecosystem Assessment, 2005). Mais recentemente, cientistas líderes enumeraram nove outros limites planetários que não devem ser cruzados para que a Terra permaneça habitável para humanos e muitas outras espécies. Essascalamidades inter-relacionadas incluem (Steffen et al., 2015): 1. Mudanças climáticas; 2. Perda de ozônio estratosférico; 3. Acidificação dos oceanos; 4. Ciclos biogeoquímicos de nitrogênio e fósforo; 5. Mudanças na integridade da biosfera associadas à perda de biodiversidade; 6. Mudanças no uso do solo; 5 7. Uso de recursos hídricos; 8. Carga de partículas de aerossóis na atmosfera; 9. Introdução de entidades novas e poluição química. O cenário descrito anteriormente, na realidade, fala sobre os sintomas da “insustentabilidade ambiental” com as quais temos que nos deparar sobre os impactos globais que pautam as manchetes e, por conseguinte, o dia a dia das empresas. Sabemos ainda que as previsões acerca das pressões sociais e econômicas revelam tendências de aumento crescente nas próximas décadas. A compreensão dessa realidade é necessária e urgente para que possa contribuir para a criação de um sistema de governança global que nos permita superar esses desafios. TEMA 2 – ÉTICA E RESPONSABILIDADE AMBIENTAL Diante de condições tão desiguais em termos sociais e ambientais no mundo e em nosso país, a ética e a responsabilidade ambiental são temas com uma grande sinergia. Além disso, é importante destacar, como temos visto por meio do percurso das aulas, quão importantes são os trabalhos do contador ambiental. Trabalho este que envolve análise de dados diversos, incluindo, num sentido mais amplo, os aspectos filosóficos que referem à tomada de decisões na contabilização ambiental. Por isso, é imprescindível falarmos de ética e responsabilidade ambiental, uma vez que o contador pode vir a enfrentar dilemas circunscritos aos conceitos de dever, direito, justiça e responsabilidade quando abordar as questões ambientais. Mas, afinal, do que falamos quando pensamos em ética? Em Ribeiro (2017), encontramos que a palavra ética tem origem grega – ethos – e está relacionada aos costumes, aos hábitos dos homens ou, ainda, Ethos é o lugar em que habitamos, é a nossa casa. Uma das possíveis definições de ética seria ainda, segundo Ribeiro (2017), a de que é uma parte da filosofia e, portanto, também pertinente às ciências sociais, que lida com a compreensão das noções e dos princípios que sustentam as bases da moralidade social e da vida individual. Em suma, podemos dizer que se trata de uma reflexão sobre o valor das ações sociais consideradas tanto no âmbito coletivo como no âmbito individual. 6 Nesse caso, a ética também é uma reflexão acerca da influência que o código moral estabelecido exerce sobre a nossa subjetividade, como lidamos com isso, se aceitamos de forma integral ou não esses valores normativos e até que ponto conferimos efetivo valor a tais códigos. Em relação ao meio ambiental, podemos entender como uma ética ambiental aquela que advém da necessidade de reexaminarmos nossos valores e princípios em razão dos problemas ambientais e da necessidade de compreendermos as razões que definem a relação do homem com a natureza. Segundo Cortella (2010), é impossível pensar em ética se não pensarmos nas nossas relações, seja com outras pessoas seja com o mercado profissional. Segundo ele, a ética seria a perspectiva para olharmos os nossos princípios e os nossos valores para existirmos juntos. Nesse sentido, ao olharmos para as questões empresariais, o autor diz que ainda devemos demarcar aquelas que dizem “fazemos qualquer negócio” daquelas que dizem “não fazemos qualquer negócio”. Essa é uma boa reflexão, portanto, ao contador ambiental. Cortella (2010) reforça que as empresas que sustentam o princípio de que não se submetem são aquelas que têm capacidade de desenvolver conhecimento e tecnologia para gerar vida e não a diminuir. O filósofo afirma que a ética é um conjunto de valores e princípios que usamos para responder a três grandes perguntas da vida humana: Quero? Devo? Posso? Isso seria algo que não nos dá conforto, mas sim algo que nos coloca dilemas (Cortella, 2010). Essa reflexão, numa forma mais prática, pode ser contextualizada por meio do que entendemos por uma produção sustentável com base em nossa responsabilidade na manutenção dos recursos naturais. Por meio dessa ótica, é possível compreender que cada produto extraído da biodiversidade apresenta determinadas características não somente ecológicas e etno-botânicas distintas, mas também relacionadas à sua forma de extração da natureza, em especial à absorção de trabalho, manutenção de estoque, desenvolvimento de mercado, validade e bem como a origem da organização socioeconômica. Concluindo, a ética, de forma inerente, está ligada à conservação ambiental e à valorização social por meio de parcerias estabelecidas entre empresas, comunidades locais e consumidores. Devemos analisar cautelosamente a realidade de nosso planeta, pois esse trabalho somente se legitima se contribuir para um desenvolvimento sustentável em escala global. 7 TEMA 3 – SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL O cenário descrito nos temas anteriores desta aula conduz a falarmos mais especificamente de um ator importante em termos de sustentabilidade, que é o setor empresarial. A partir dos anos 1990, as questões ambientais passaram a integrar o mundo dos negócios, mostrando a capacidade da criação de valor para clientes, acionistas e outras partes interessadas. Podemos, inclusive, dizer que o movimento da globalização reforçou a necessidade das empresas de incorporar a dimensão socioambiental nos seus planejamentos e estratégias de negócios. Como consequência disso, as empresas buscaram e buscam, cada vez mais, associar suas marcas a projetos, iniciativas e parcerias com ONGs, associam-se aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, implantam as ISOs, divulgam suas ações por meio de relatórios de sustentabilidade. A ideia de sustentabilidade, como dissemos anteriormente, começou em grande parte com a preocupação ambiental, que acabou por envolver as dimensões econômica e social e, a partir dos anos 1990, passou a incluir a responsabilidade social empresarial. Um dos conceitos mais inovadores e que causou profundas transformações no mundo corporativo foi o Triple Botton Line, ou Tripé da Sustentabilidade. Criado nos anos 1990 por John Elkington, cofundador da organização não governamental internacional SustainAbility, representa a expansão do modelo de negócios tradicional [...] para um novo modelo que passa a considerar o desempenho ambiental e social da companhia, além da financeira (Elkington, 2012). No auge do crescimento da América Corporativa, mas também do acirramento do debate ambiental, John Elkington se esforçou para medir a sustentabilidade empresarial em meados da década de 1990. Essa estrutura, que de certa forma se constitui numa espécie de contabilidade (não é à toa que é usual se usar o termo accountability), e que está além das medidas tradicionais de lucros, oferece um retorno sobre investimento e valor ao acionista ao incluir as dimensões ambiental e social. Diz respeito ao desempenho nas dimensões inter-relacionadas de lucros, pessoas e o planeta se constituindo assim numa ferramenta importante para apoiar as metas de sustentabilidade. 8 Essa “contabilidade” incorpora três dimensões de desempenho: social, ambiental e financeira, o que a torna diferente das estruturas de relatórios tradicionais, pois inclui medidas ecológicas (ou ambientais) e sociais que podem ser difíceis de atribuir aos meios de medição apropriados. As dimensões Triple Botton Line também são comumente chamadas de três Ps: pessoas, planeta e lucros, ou 3Ps. Numa síntese, pode-sedizer que o tripé da sustentabilidade busca captar a essência da sustentabilidade empresarial medindo o impacto das atividades de uma organização no mundo, incluindo tanto sua rentabilidade e os valores dos acionistas quanto seu capital social, humano e ambiental. Desta forma, portanto, quando falamos em sustentabilidade empresarial, referimo-nos ao conjunto de ações adotadas pelas empresas com o objetivo de atuar de maneira consciente. Hoje ainda são discutidos novos pilares, como a questão cultural, tecnológica, mesmo esses avanços. No entanto, não tem sido suficiente para que o mundo possa mudar a direção para longe do processo destrutivo para o qual tem caminhado (Guimarães, 2009). A competividade das empresas é um dos grandes questionamentos quando se aborda os temas sociais e ambientais, existindo o predomínio de uma visão clássica na qual incorporar os aspectos sociais e ambientais para além da obrigação legal eleva os custos, reduzindo o lucro a ser obtido. Nesse sentido, as discussões acerca do conteúdo e extensão da responsabilidade social nos negócios tem sido, de certa forma, até exaustivo para que se contraponha desempenho econômico ao social e ambiental. Do ponto de vista ético, as empresas devem buscar lucros de longo prazo, obedecendo às leis e regulamentações, considerando o impacto não mercadológico de suas decisões, buscando também maneiras de melhorar a sociedade com base em uma atuação com responsabilidade e sustentabilidade dos negócios. Dentro do modelo econômico capitalista, a sustentabilidade é uma nova forma de fazer negócios, que tem como pressuposto o novo papel da empresa na sociedade. Um modelo de negócios orientado por esses pressupostos se alinha às perspectivas de longo prazo, incluindo a visão e demandas das partes envolvidas, permitindo que os princípios da ética e a transparência precedam a implementação de processos, produtos e serviços. 9 TEMA 4 – DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO EM RELAÇÃO AO MEIO AMBIENTE Outra discussão importante que atravessa o debate da sustentabilidade é a discussão acerca do desenvolvimento econômico e o meio ambiente. O pensamento tradicional econômico entende que é possível esgotar determinada classe de recurso natural, movendo-se imediatamente para outro, sem que isso se torne um impeditivo para a vida no planeta. A ideia por de trás desse conceito é a de que o investimento compensaria as gerações futuras pelas perdas de ativos causados pelo consumo e produção correntes, pensamento ainda predominante na visão econômica tradicional (Foladori, 2001). Dois aspectos centrais, a finitude dos recursos e o crescimento ilimitado da economia, permeiam a discussão das correntes metodológicas, a Economia Ambiental e a Economia Ecológica, que buscam interpretar o problema ambiental e determinar ações que busquem resultados eficientes, partindo de considerações acerca das características de tais recursos. O debate entre essas duas correntes é a visão de como o sistema econômico e seus modos de produção afetam o sistema natural e, por sua vez, se os impactos oriundos da degradação ambiental restringiriam, ou não, o crescimento econômico. Inicialmente, é importante relembrar que, quando se fala em Economia Ambiental, essa não é uma abordagem no tocante aos problemas oriundos da degradação ambiental, mas sim a interpretação de uma escola de pensamento econômico, a saber, a neoclássica, desenvolvida pelo economista britânico John Maynard Keynes, a qual passou a incorporar o meio ambiente como objeto de estudo. A Economia Ambiental tem como base os mesmos pressupostos da teoria neoclássica e concentra a sua análise sobre a escassez de bens e serviços. Portanto, os bens – tudo aquilo que pode satisfazer as necessidades humanas – são valorados segundo a sua abundância ou não: quando escassos, são considerados bens econômicos e quando abundantes são bens não econômicos. Dentro dos pressupostos da Economia Ambiental, está presente o conceito de externalidade, que diz respeito à definição de quem pertence, afinal, os custos dos efeitos das atividades econômicas que recaem sobre terceiros. 10 Dentre as várias definições de externalidades, utilizamos a apresentada por Longo (1983), que explica que “uma externalidade é uma imposição de um efeito externo causado a terceiros, gerada em uma relação de produção, consumo ou troca”, podendo ser classificadas como externalidades positivas ou negativas. No caso de externalidades negativas, os exemplos são aquelas atividades que geram custos para os demais agentes envolvidos, como a poluição atmosférica, dos rios, oceanos, desmatamento ilegal, poluição sonora. Já as externalidades positivas são aquelas que acontecem quando existe um beneficiamento sobre os terceiros, ainda que involuntário. Investimentos realizados por corporações em projetos que fortaleçam a infraestrutura local, como manutenção de estradas rurais nas quais essas empresas estejam estabelecidas, ou ainda voltados à questão energética, tecnológica, programas sociais beneficiando comunidades são exemplos dessas externalidades. A Economia Ecológica ou Economia Verde é o modelo que surge como resposta à corrente da economia ambiental e que busca integrar a análise de ecossistemas aos sistemas econômicos. Em May (2003), encontramos essa definição: “Campo de conhecimento transdisciplinar, desenvolvido a partir do reconhecimento de que, de um lado, o sistema socioeconômico baseia-se e depende dos sistemas naturais e, de outro lado, ele interfere e transforma o funcionamento destes últimos” (May, 2003, p. 12). Nessa escola, a economia é como um processo aberto dentro de um sistema maior, o ecossistema Terra, e por isso não deve ser analisada em si mesma, mas sim com base nas suas inter-relações com os ciclos biogeoquímicos que ocorrem no planeta (Foladori, 2004). De acordo com a definição apresentada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), “uma Economia Verde é a que resulta em melhora do bem-estar humano e da equidade social, enquanto reduz significativamente riscos ambientais e a escassez ecológica” com três características fundamentais: Crescimento em renda e emprego devem ser baseados em investimentos públicos e privados que reduzem emissões de carbono e poluição; Aumento da eficiência energética e de recursos; Redução da perda de serviços da biodiversidade e dos ecossistemas. 11 Ambas correntes de pensamento econômico apresentam diferenças que divergem, afinal, acerca do entendimento do que é o mundo. Em relação à Economia Ambiental, um dos seus aspectos mais controversos e objeto de crítica é o ponto sobre a abordagem do processo produtivo. Sob a ótica desse ponto de vista, não há o esgotamento de recursos naturais, tudo é solucionável pelo alto avanço tecnológico. De acordo com esse ponto de vista, por exemplo, caso houvesse uma seca ou inundação generalizada que causasse um colapso em termos de agricultura, em que mesmo assim o Produto Interno Bruto (PIB) se mantivesse com base no crescimento de outros setores da economia, não se teria um problema de ordem econômica. Em relação à Economia Verde, as críticas também são duras, principalmente em relação a duas questões: primeiramente, a inclinação em privatizar os serviços ambientais; segundo, o fato de que não parecem realmente se ter perspectivas de mudanças na questão de preservação e degradação do planeta sem uma mudança no modelo de desenvolvimento atual. Diante dessas duas correntes, nas quais ambas têm aspectos contraditórios entre si, a questão posta seria a seguinte: que outroscaminhos seriam possíveis para superar a dicotomia entre meio ambiente e desenvolvimento econômico? TEMA 5 – DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Com base no que vimos nos textos anteriores, podemos então discutir sobre o conceito de Desenvolvimento Sustentável, apresentado em 1987, no célebre Relatório Brundtland pela Comissão Mundial da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Naquela época, esse conceito foi definido como “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” (ONU, 1988, p. 46). O termo sustentabilidade se consolidou como um princípio da sociedade, ou seja, que mantém as características necessárias para um sistema social justo, ambientalmente equilibrado e economicamente próspero por um período de tempo longo e indefinido; no entanto, isso não tem acontecido. Outras correntes de pensamento como propostas de Desenvolvimento Sustentável também surgiram e, dentre elas, a corrente do Ecodesenvolvimento, 12 proposta pelo pensador Ignacy Sachs (2002), na qual, segundo o pensador, há a possibilidade de se constituírem novos “estilos de desenvolvimento” baseados no potencial ecológico das diferentes regiões e na capacidade própria dos povos do Terceiro Mundo. Sachs (2002) defendeu uma nova ética da natureza agregando a proposta de ações, como a introdução de tecnologias apropriadas e a orientação do sistema educativo para propiciar os conhecimentos necessários ao manejo ecologicamente correto dos recursos, repudiando a dependência cultural e técnica. De acordo com Pierri (2002), apesar da ampla divulgação que obteve, não atraiu nem o interesse nem a força necessários para convencer da urgência e viabilidade da proposta. Segundo a autora, a proposta do eco desenvolvimento é humanista e crítica, porém, a crítica é limitada, de tal modo que, ao mesmo tempo em que anima movimentos sociais a favor de certas mudanças, limita o horizonte ideológico dessas lutas ao sugerir que as soluções podem existir dentro dos mecanismos do mercado, ao qual pretende descentralizar, incentivando as pequenas empresas e reduzindo as escalas de produção, bem como “civilizar” com regulamentações que atendam aos imperativos ecológicos e às necessidades sociais da maioria. Outra proposta que, segundo Pierri (2002), realmente contemplaria uma visão humanista, crítica e profunda, seria enunciada pela Fundação Bariloche, por meio do Modelo Mundial Latino-americano, no qual o eco desenvolvimento teria como objetivo fundamental satisfazer pelo menos as necessidades humanas básicas de toda a sociedade, administrando os recursos e zelando pelo meio ambiente. Essa concepção repudiaria a tese dos limites físicos ao desenvolvimento como absolutos e diz que, nas escalas temporais e espaciais que importam atualmente para a humanidade, os limites operantes são sócio- políticos e não físicos; a crise não está no futuro, mas no presente, posto que a maioria dos seres humanos vive na pobreza. Pierri (2002) descreve que os elementos básicos dessa nova sociedade seriam: equidade em todos os níveis, não consumismo (no sentido de que a produção e o consumo sejam determinados pelas necessidades sociais e não pelo lucro privado), e o reconhecimento de que essas necessidades podem ser definidas de modo diferente segundo as diferentes culturas. Vemos, portanto, que o debate do Desenvolvimento não aponta para apenas um modelo de desenvolvimento possível e, por isso, exige profundidade 13 na sua discussão, representando uma alternativa que busca responder às relações entre sociedade e meio ambiente, que eminentemente são estreitas e interdependentes. TROCANDO IDEIAS Vimos questões importantes ao longo da aula que nos levam a questionar para onde caminhamos dentro do modelo atual de desenvolvimento econômico proposto. Você concorda com isso? Como pensar a implantação de um cenário mais justo social e ambiental num planeta, e em especial, nosso país, com tantas dificuldades socioambientais? Você conhece algum exemplo, em sua comunidade ou cidade, que tem buscado alternativas ao atual modelo? NA PRÁTICA Por mais que a mente humana tenha se tornado tão engenhosa em seu curto e recente período na linha do tempo da Terra, não há como comparar com os 3,8 bilhões de anos de evolução da natureza. Se existe um lugar onde o ser humano pode encontrar boa parte das respostas e soluções para problemas ligados à vida de qualidade, é neste formidável laboratório a céu aberto, que está em permanente trabalho de desenho e redesenho. Felizmente, tem crescido a percepção de que é possível encontrar muitas respostas nas Soluções baseadas na Natureza – expressão cunhada entre os anos de 2009 e 2010 pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). Mas o que são exatamente as Soluções baseadas na Natureza? Segundo a IUCN, trata-se das intervenções que utilizam a natureza e as funções naturais de ecossistemas saudáveis para enfrentar alguns dos desafios mais urgentes do nosso tempo. Esse tipo de solução ajuda a proteger o ambiente, mas também proporciona inúmeros benefícios econômicos e sociais. (...) As SbN valem-se de atributos e processos do sistema complexo da natureza, como sua habilidade de armazenar carbono e regular o fluxo hídrico, com o objetivo de alcançar determinados resultados. Por exemplo, reduzir o risco de desastres, melhorar o bem-estar humano e promover a economia verde e socialmente inclusiva. Com isso, podem transformar os desafios sociais e ambientais em oportunidades inovadoras, fazendo do capital natural uma fonte de prosperidade. [...] um dos casos de SbN selecionados busca aproveitar os ativos da própria natureza para criar produtos de limpeza sem o uso excessivo de água e com transparência na relação com o consumidor. Lançada neste ano por Marcelo Ebert, a YVY é uma marca de produtos de limpeza formulados com ingredientes de origem natural, sem a utilização de petroquímicos, cloro e fosfatos. “Esta marca é resultado de dez anos de desenvolvimento de soluções em limpeza para empresas e indústrias”, explica Ebert. “Nossa proposta é mostrar que é possível limpar de verdade com ingredientes vindos da natureza, sem precisar de uma quantidade excessiva de produtos.” A base dos ingredientes da YVY é o terpeno, composto encontrado em sementes, flores, folhas, raízes e madeira de plantas. Na natureza, o terpeno é responsável pela assepsia e pelo equilíbrio químico do meio. Com o uso da tecnologia desenvolvida pela YVY, pode-se extrair blends bactericidas, assim como especializados em solvência e neutralização 14 de odores. A esses blends são acrescentados óleos essenciais, que farão o papel de fragrância dos produtos. “Como os produtos da YVY são formulados apenas com ingredientes de origem natural, a chance de uma intoxicação ou de que você desenvolva um processo alérgico durante o uso é significativamente menor”, argumenta Ebert. “Além disso, evitamos a poluição da água e a contaminação de organismos aquáticos por substâncias petroquímicas.” Além da composição química natural, os produtos da YVY não consomem água e outros recursos desnecessariamente, já que as embalagens, em formato de cápsulas recicláveis e usadas com borrifadores permanentes, contêm a quantidade exata do produto superconcentrado. O modelo de negócios de YVY também é inovador para o setor. Por meio de um sistema de assinaturas, os clientes da marca recebem mensalmente cerca de 1 quilo de produtos de limpeza, entre desinfetantes, detergentes e outros, o que equivale a 15 quilos caso produtos convencionais fossem adquiridos. (P22_ON, S.d.) O texto buscamostrar que, apesar da imensa destruição das nossas bases ambientais que sustentam não somente as atividades econômicas como o bem-estar das pessoas e a vida de todas as espécies, há uma busca por parte de determinados setores produtivos em obter soluções que amparem um desenvolvimento sustentável em termos ambientais, mostrando o exemplo real da empresa TerpnOil. Na linha do que vimos em aula, o texto também mostra as novas tendências em direção a um tipo de economia circular, que é restauradora e regenerativa por sua própria essência, provendo uma maior produtividade dos recursos, objetivando reduzir os desperdícios. As SbN também apoiam os conceitos de crescimento verde e de economia verde, como vimos ao longo da nossa aula. FINALIZANDO Começamos nossa aula com base na leitura de um texto bastante expressivo sobre o cenário de desigualdade no planeta e no Brasil. O texto proporcionou a base para entendermos as principais questões do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, quais os temas que estão presentes no dia da nossa sociedade atual, inclusive com base em um ponto de vista histórico. Na sequência, vimos a ética e sua relação com responsabilidade ambiental fundando um compromisso inalienável do contador ambiental. Após, aprendemos o que é sustentabilidade empresarial com base em um conceito inovador, o Tripple Botton Line, que trouxe profundas mudanças a esse setor a partir dos anos 1990. 15 Aprendemos a diferença entre Economia Ambiental e Economia Verde, que são as diferentes correntes que têm fundamentado a discussão sobre Desenvolvimento Econômico e meio ambiente. Por fim, aprendemos sobre o conceito de Desenvolvimento Sustentável com base em diferentes modelos de pensamento. Em nossa prática, vimos o caso da empresa TerpenOil, um modelo – dentre tantos outros já existentes – de produção baseado em soluções da natureza, evidenciando que a transformação do nosso modelo atual produtivo poluente é possível, além de urgente e necessária. 16 REFERÊNCIAS A DISTÂNCIA que nos une: um retrato das desigualdades brasileiras. OXFAM Brasil, 2017. Disponível em: <https://www.oxfam.org.br/publicacoes/a-distancia- que-nos-une-um-retrato-das-desigualdades-brasileiras>. Acesso em: 28 ago. 2019. ARTAXO, P. Uma nova era geológica em nosso planeta: o Antropoceno? Revista USP, São Paulo, n. 103, 2014, p. 15. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/revusp/article/viewFile/99279/97695>. Acesso em: 29 ago. 2019. CORTELLA, M. S. Qual é a tua obra? Inquietações propositivas sobre gestão, liderança e ética. Rio de Janeiro: Vozes, 2010. ELKINGTON, J. Sustentabilidade: canibais com garfo e faca. Edição histórica de 12 anos. São Paulo: M. Books, 2012. FOLADORI, G. Limites do desenvolvimento sustentável. Campinas: Ed. Unicamp. São Paulo: Imprensa Oficial, 2001, p. 163-201. GILDING, P. A grande ruptura: como a crise climática vai acabar com o consumo e criar um novo mundo. Rio de Janeiro: Apicuri, 2014. GUIMARÃES, R. P.; FEICHAS, S. Q. Desafios na construção de indicadores de sustentabilidade. Ambiente & Sociedade, v. 12, n. 2, p. 307-323, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414753X200900020000 7&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 29 ago. 2019. LONGO, C. A. Finanças públicas: uma introdução. São Paulo: IPE-USP, 1989. MARQUES, L. Capitalismo e colapso ambiental. Campinas, São Paulo: Ed. Unicamp, 2015. MAY, P. H. (Org.). Economia do meio ambiente: teoria e prática. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. p. 33-48. MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT. Ecosystems and Human Well- being Synthesis. 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